Talvez não devesse insistir em
continuar falando da Copa do Mundo recentemente encerrada. Pode parecer algo
como a deselegante inconveniência de se ficar cutucando a ferida quando o
melhor seria deixar que ela se cicatrizasse com o tempo. Sim! O Brasil deu o
que podia dar nessa Copa. O atestado definitivo da sua capacidade (ou seria
incapacidade) foi emitido simbólica e formalmente no grande evento do último
dia 8 de julho lá no Mineirão com o histórico 7 a 1. Ganhou até epíteto:
Mineirazo.
Felizmente, joga a nosso favor a
grande contribuição que só o passar do tempo é capaz de dar aos derrotados, ou
seja, o esquecimento, mesmo que não total e absoluto, mas pelo menos amenizador.
No entanto - por ora - não dá para apagar da memória um questionamento que se faz
ainda presente e de forma azucrinante a todos nós brasileiros: Por que nossos meninos
demonstraram, especialmente naquela partida contra o Chile, nas oitavas de
finais, em 28 de junho e também no Mineirão, tamanho descontrole emocional? Teria
sido aquilo uma vantagem ou uma desvantagem perante os desafios daquele momento
em particular? Em que extensão aquele show de emoções nos ajudou ou prejudicou
tanto naquela partida como nas que a ela se sucederam?
Transcorridos alguns poucos dias dos fatos e vendo
agora o desfecho do famigerado oito de julho, com direito a repeteco em 12 de
julho com o 3 x 0 da Holanda, isso até pode nos sugerir que aquelas manifestações
de emoções exacerbadas registradas no jogo contra o Chile já seriam o prenúncio
de que algo bem pior estava por acontecer. As emoções dos nossos jogadores estavam
em seu ponto extremo. Enquanto nossos meninos choravam convulsivamente e
tremiam, os jogadores de outros países em jogos diversos - com raras exceções, é
claro - pareciam administrar seu emocional com a devida parcimônia. Os alemães,
por exemplo, vinham se comportando como seres robóticos desprovidos de alma e
com pleno domínio da razão. Mas, afinal, o esporte, futebol em especifico, é
emoção ou razão?
Fui checar isto com mais cuidado e
descobri que existe um campo da Psicologia que se dedica ao estudo, e por
consequência ao entendimento, dos propósitos pelos quais as emoções existem e
como elas nos ajudam a sobreviver ou até mesmo a nos desenvolver. Este mesmo
campo de estudo da psicologia dedica igual atenção a outro processo a que conhecemos
como “sentimentos”. Emoções e sentimentos são processos inconscientes, isto é,
surgem fora do controle da nossa razão, porém cada qual tem suas peculiaridades.
No seu livro seminal “As leis da emoção” o psicólogo holandês, Henri Frijda, demonstra as regras que regem as emoções: Para ele - e é fácil aceitar esse argumento - as emoções se situam na encruzilhada de nossa carga biológica com a nossa capacidade cognitiva, ou seja, a consciência. Várias emoções que são fundamentais à preservação da vida nós as herdamos pela via biológica, como, por exemplo, o medo. São forças produzidas espontânea e inconscientemente para nos preparar para enfrentar determinados perigos imediatos. Induz-nos a agir com eficiência e de forma concentrada para defender, atacar e a fugir do perigo. As emoções, portanto, fogem completamente de nosso controle consciente. Curiosamente, elas podem ser facilmente lidas pelas outras pessoas pelo simples observar das expressões físicas que produzimos: um semblante de pavor, uma risada, um arrepio, um grito e até mesmo um choro ameno ou convulsivo, por exemplo.
Quando, contudo, o nosso
consciente consegue interpretar essas emoções, passamos a produzir o que se
chama de “sentimentos”. Estes já deixam de ser meramente biológicos e passamos
a controlá-los de forma consciente. Assim, com base nos sentimentos, podemos
tomar decisões importantes. Uma vez que os sentimentos são submetidos ao
controle da consciência, isto é, da razão, podemos deliberadamente camuflá-los e
- ao contrário do que ocorre com as emoções - impedir que os outros os leiam
com base no nosso comportamento ou mesmo expressões físicas como ocorre com as
emoções e disso tirem proveito tático e estratégico. Não devemos esquecer que um
jogo de futebol é como uma guerra. O inimigo está sempre à espreita para captar
os nossos pontos fracos...
Podemos aceitar que o que
realmente vale não é tanto a carga de emoções biologicamente produzida, mas sim
a forma como nós, racionalmente, as transformamos em sentimentos. Estes, bem
administrados, podem nos ser mais úteis do que as emoções em seu estado puro. Quem
disse que os alemães, aparentemente frios e autocontrolados, não se encontravam
também submetidos às mesmas intensas emoções como aquelas dos nossos meninos? Claro
que estavam. Isto foi demonstrado nitidamente depois de se sagrarem
tetracampeões mundiais, quando extravasaram toda a alegria e abriram os
corações ao declarar amor ao futebol, à família, à sua pátria e até mesmo ao
Brasil. Faltou-nos, portanto saber como canalizar nossas “emoções brutas” em “sentimentos
úteis” e assim não ter deixado que os adversários tivessem lido nas faces de
muitos de nossos ainda impúberes garotos o temor que os dominava naquelas
batalhas.
Como se muda isto?
Só há uma resposta:
amadurecimento. Só o tempo e as experiências, principalmente as negativas,
podem propiciar esse aprendizado ao ser humano. Culpa parcial dos dirigentes
que preferiram abrir mão de alguns craques com mais experiência de vida, talvez
não em tão boa forma física como os meninos quase adolescentes, mas com a alma
calejada e já tendo desenvolvido suficientemente a capacidade de transformar
emoções em sentimentos produtivos.
Vivendo e aprendendo!
Edson Pinto
Julho’2014
2 comentários:
De: Edson Pinto
Para: Amigos
Caros amigos (as):
Duas leis comportamentais são atribuídas a Murphy:
“Nada é tão ruim que não possa piorar” e
“Na guerra, o inimigo ataca em duas ocasiões: quando ele está preparado e quando você não está”.
Ambas retratam a situação do futebol brasileiro do pós-oito de julho de 2014, a data do 7 x 1 histórico.
A primeira tem tudo a ver com a solução, agora adotada para salvar a paixão nacional, via o exercício paleontológico de desenterramento do já fossilizado Dunga. Esse mesmo que faz do mau-humor a sua marca registrada. Torço para que dê certo, porém - já estando na 6ª década de vida - afirmo nunca ter visto exemplos concretos de mudanças reais de temperamentos. Será que poderemos vislumbrar, neste caso, um milagre?
A segunda é a que me levou a refletir sobre o estado emocional dos nossos pupilos. A crônica desta semana, FUTEBOL, EMOÇOES E SENTIMENTOS visa a buscar em outra área do conhecimento humano, a Psicologia, um entendimento ligeiramente mais aprofundado sobre o que aconteceu com os nossos jovens craques na Copa do Mundo recém-concluída.
Bom final de semana a todos!
Edson Pinto
De: Luiz Ragatieri
Para: Edson Pinto
Olá Edson,
Você é formidável...........
Os textos são todos muito prazerosos de ler, esse sobre os meninos da Seleção então..........você acertou na mosca.
Parabéns,
Abraço,
Luiz Regatieri
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