Os meus poucos, mas fiéis
leitores notaram que fiquei mais de 30 dias sem publicar novos textos no blog.
Alguns quiseram saber se eu estava bem de saúde, se tinha viajado ou que diabos
teriam me desestimulado a dar prosseguimento ao hábito que tanto prezo e que me
faz bem que é o de colocar sistematicamente no papel aquilo que gira solto na
minha cabeça. Sei e reconheço que a maioria, contudo, deve ter ficado feliz
pela trégua que lhes dei. Afinal, temos mais tarefas e agitação do que tempo
para satisfazê-las.
Gosto muito de futebol, sem,
contudo, ser um especialista e fanático. Conforme já havia dito em meu texto de
nº 264, “A
Pátria de Chuteiras”, eu estava não só entusiasmado como até mesmo me
preparando para viver intensamente esta maravilhosa Copa do Mundo que acaba de
ser realizada aqui no nosso País. Pensando bem, o futebol é apenas uma parte do
espetáculo. Todo o conjunto de manifestações sociais, políticas,
relacionamentos pessoais, oportunidades de turismo e lazer é que, tudo somado,
fazem da Copa do Mundo um evento ímpar.
Todavia, por mais que eu me
deleite com este esporte, sinceramente, não me disporia a pagar milhares de
dólares por um único ingresso aos estádios como vimos abundantemente serem
vendidos por cambistas ligados à própria FIFA. Esporte e esperteza não
combinam. Aos que praticam o esporte com o uso ilícito do doping aplica-se a
punição do banimento. Aos que dele se aproveitam financeiramente e trapaceiam reserva-se
o xilindró. Além do mais, a tecnologia moderna nos oferece condições excelentes
de imagem, áudio e de informações que, estar assistindo aos jogos de casa ou de
algum ambiente de maior aglomeração social, como um bar ou um clube supre-nos
em abundância com as emoções que emanam das partidas. E eu queria – como de
fato consegui – assistir, pela TV e com amigos, todas as partidas realizadas,
exceto uma... E é sobre esta em especifico que quero falar.
E por que a esta “uma” eu não a
assisti pela TV? Quis o destino que, pelo site da FIFA, através do sistema de
sorteio, ter conseguido, meses antes de iniciada a Copa, comprar ingressos para
a partida de nº 61, semifinal no Estádio Mineirão em Belo Horizonte no dia 8 de
julho. Podia ser qualquer time a estar lá naquele glorioso dia, mas botei fé de
que assistiria a uma partida do Brasil. E pela análise que fazia com a família,
com grande certeza daria o Brasil contra a Alemanha. De fato, tudo ocorreu como
sonhado: O Brasil iria enfrentar a poderosa Alemanha exatamente naquele jogo.
E lá estávamos, família em peso,
cheios de alegria e confiança. Nem o fato de termos perdido o Neymar e o
zagueiro Thiago Silva para aquela partida foi suficiente para tirar a nossa
esperança por uma vitória redentora. Estávamos em casa; as condições
climáticas, ambientais e até a atmosfera estavam a nosso favor. Tudo funcionou
bem e organizadamente. Há anos não entrava em um banheiro de estádio tão limpo;
não sentava em cadeiras tão confortáveis; o estádio dispunha de telões com
imagens reluzentes que nos davam informações úteis. “Tudo bacana”, para usar um
termo comum na época em que ainda adolescente, no final dos anos 60,
frequentava aquele mesmo Mineirão de arquibancadas rusticamente cimentadas.
Já havia jurado nunca mais voltar
a estádios enquanto não fosse respeitado como consumidor consciente. Os nossos
estádios, até que o padrão FIFA se fez presente, eram infames, verdadeiras
pocilgas. Aquele oito de julho se me apresentava como a redenção de todos os
nossos pecados terceiro-mundistas. As pessoas se confraternizavam até mesmo com
os adversários do dia, os alemães, como se estivéssemos ali não para tentar
superar um já tricampeão mundial, mas sim para comemorar uma vitória que de
antemão já se dava como certa.
Mas eu vi... E digo como dizia o
velho chefe timbira ao narrar as proezas do índio tupi no romance “I-Juca
Pirama” de Gonçalves Dias: Meninos eu vi! Eu vi um time desfigurado, impotente,
atônito, humilhado ser massacrado por magricelas de pernas longas e cabelos
louros que passavam bola de pé em pé assemelhadamente ao que os Globetrotters
faziam como as mãos. E foram sete gols que nos fizeram pequeninos como nunca
antes na “história deste País”. E se o futebol não funcionou, todo o resto
tomou aspectos nebulosos, perderam a graça como quando se desperta de um sonho tão
fabuloso quanto irreal.
Meninos, eu vi o semblante das
pessoas que estavam ao meu redor transmudarem de expressivos para apáticos; de
sorridentes para carrancudos; de fraternais para agressivos e perplexos.
Lembrei-me - ato contínuo - de outro texto que escrevi em 02 de julho de 2010
quando o Brasil havia perdido naquelas quartas de finais para a Holanda, na copa
da África do Sul. Vide meu texto de nº 127, “Cinco
Minutos de Tristeza”. Mas senti que, ao contrário daquela derrota de quatro
anos antes, esta do Mineirão e nas condições em que ocorreram, apenas cinco
minutos não seriam suficientes para apagar o desalento que se abateu sobre nós.
O céu que naquele dia
apresentava-se aberto, lindo, ensolarado, de repente começou a mudar para um tom
cinzento que causava medo. E não era chuva, meninos, eu vi! Era certamente de
tristeza pela frustração de não apenas não vermos realizada um sonho legítimo,
pois afinal somos o país do futebol, mas uma decepção de tamanha monta que
procurar culpados ou encontrar justificativas de qualquer ordem torna-se
desnecessário e contraproducente.
Mas, a vida continua e os fatos
mudam as percepções que temos dela. Em tudo o que ocorre há sempre uma lição a
ser extraída, a menos que não queiramos. O futebol para mim tem muito a ver com
o curso da nossa própria existência: ganhamos ou perdemos. Nada de novo! O
importante é termos consciência de que as maiores lições vêm-nos dos momentos
em que fracassamos e não dos momentos de vitórias. É preciso crer, portanto, na
real possibilidade de sermos derrotados. Só assim, as vitórias que esperamos
para o futuro serão comemoradas com glória.
Até à Rússia em 2018...
Edson Pinto
Julho’2014
2 comentários:
De: Edson Pinto
Para: Amigos
Caros amigos (as):
Embarquei no “Costa Concórdia” da Copa do Mundo e sumi por mais de 30 dias.
Volto agora contando na crônica desta semana MENINOS, SEM QUERER, EU VI a minha experiência de brasileiro apreciador do esporte bretão. Ou seria alemão?
Bom final de semana a todos!
Edson Pinto
Gostei muito do texto e especialmente da sua experiência "Eu vi ..." e da reflexão sobre a nossa vida. É isso...realmente.
Excelente.
Abraços
Cristina Taurizano
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