16 de mar. de 2008

10) BARRADOS EM BARAJAS (março'08)

Os jornais repercutiram durante as últimas semanas os tristes episódios dos brasileiros que são impedidos de entrar, ora na Espanha, ora nos Estados Unidos, ora nos demais países da Comunidade Européia e não sei lá mais onde...

Parece que ninguém gosta mais da gente. Seria isso mesmo ou não passa de mais um desses efeitos morais purificadores de conotação catártica que nos assolam vez por outra? Seria como - ou seria o contrário - do que Augusto Meyer em “A Chave e a Máscara” nos lega ao se referir a Hamlet, de Sha-kespeare? "Tragédia sem catarse que, ao lento cair do pano, só nos deixa, como objeto de meditação e fruto amargo, uma interminável fila de interrogações..."

E o pior: Justamente agora que a economia do país parecer ter inflado a sua grande vela e com isso passa a turbinar orgulhosamente a nossa auto-estima. Enchemos a nossa própria bola e aí vem uma “autoridadezinha” da Imigração de um país qualquer e nos diz ao estilo da Hebe Camargo: “Nan-nan-nin-nan-não”, agitando-nos o indicador como se fosse um limpador de pára-brisas. E, “pluft”, nos botam cabisbaixos no primeiro avião de volta ao patropi.

E dá-lhe falação...

O que observo, infelizmente, é que, poucos analistas têm considerado, até agora, em suas abordagens a este polêmico tema que essa problemática se manifesta tendo como pano de fundo o traço psicológico mais marcante do povo brasileiro que – ou o mundo não quer compreender ou nós não conseguimos, ainda, fazê-los nos entender e nos apreciar. Aos diabos com a modéstia...

Somos diferentes, sim, senhor! Fazer o que?

Sem que entendamos bem isto, é quase impossível tentar acomodar-nos ao mundo. Assim dito - humildemente - para não sugerir o contrário...

Nizan Guanaes escreveu sobre o seu orgulho de ser baiano, enaltecendo a alegria e a luz de seu povo, a beleza de seu céu sem igual. Até este simples escriba, aqui - vira e mexe - gasta tinta também para expressar o seu orgulho de ser mineiro.

Todos nós brasileiros, tal qual fazemos com a paixão pelo futebol que nem inventamos (isto se atribui aos ingleses), mas amamos e expressamos nossa paixão sem limites para com o clube de coração, fazemos também o mesmo para com o nosso rincão de origem, com o nosso Estado, com a Região de nossa procedência, com o Brasil, enfim.

É incrível, como somos diretos e não poupamos falta de modéstia quando falamos das nossas coisas. Bem ao estilo futebolístico, mesmo: O meu time pode estar na zona de rebaixamento, ou já rebaixado como um grande de fato está, mas, mesmo assim e, apaixonadamente, argumentamos que ele é e será para todo o sempre, o melhor. É assim também com o Brasil.

Quer país de estradas mais esburacadas do que o nosso? E que venha um gringo criticar nossas estradas. Ficamos tão ofendidos que até somos capazes de encontrar alguma vantagem, antes impensável e insustentável, para defendermos aquela cratera, como a que me custou dois pneus quase novos em recente viagem pela Fernão Dias.

Esse amor ao que é nosso é que nos confunde a todos quando nos confrontamos com o mundo. O brasileiro vai para Boston, Michigan, Montreal, Lisboa ou Madri, mas não consegue se libertar de sua origem, de sua essência. “Se eu me chamasse Raimundo seria apenas rima, não seria solução”, e não muda... É o Drummond que habita cada um de nós.

Regras para entrar no país dos outros? Que nada! Sempre conseguimos dar um tapinha nas costas, soltar um sorriso, batucarmos um sambinha em uma caixa de fósforos, tomarmos uma cerveja bem gelada e entabular uma conversa fiada para que tudo se resolva a nosso favor. Sempre funcionou no Brasil, por que não funcionaria na Imigração de Atlanta, de Heathrow em Londres, de Schipool em Amsterdã ou na de Barajas em Madri?

Está na hora de entendermos que temos sim de agir e parecermos “Raimundos”, esforçando-nos para - além do simples propósito de rima - ser também uma solução, pelo menos quando sairmos de casa.

Embora prevaleçam os temores do pós 11 de setembro que contagiaram o mundo tornando-o menos interessante, há por trás de toda essa neurose de controle sobre o livre fluxo de pessoas, razões de ordem econômica, o protecionismo ao mercado de trabalho, a negação dos benefícios do “welfare state” que, egoisticamente, se lhe reservam.

É curioso o fato de que centenas de milhares de brasileiros que já migraram têm a força extraordinária de se submeterem às vicissitudes inerentes aos alienígenas, sem saberem que, com muito menos força, poderiam agir dentro do nosso próprio país para – politicamente - contribuírem para a melhoria de nossas condições de vida. Não nos falta solo, não nos falta sol, nem água, nem rios nem florestas. O país tem tudo e muito mais. Só nos falta um pouco mais de racionalidade face ao muito de paixão que nos caracterizam.

Mas se um dia – qualquer que seja a sua razão – tenha trocado o Brasil por outro país e sendo confrontado por um Agente de Imigração sobre o fato de que - sendo o Brasil um país tão bom - o porquê de não fica lá, você possa responder, como Nizan respondeu pela mesma questão sobre a sua Bahia: Saí do Brasil porque lá não consigo me destacar, pois todos são brasileiros.

Edson Pinto
16/03/08


(domingo carrancudo com o São Paulo levando de 4 x 1 do Palmeiras)

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