23 de set. de 2014

277) A FOME DE MARINA

Será que a “Nova Política” tão propalada pela candidata à Presidência, Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima (é assim mesmo, e é bom que comecemos a nos familiarizar com este nome tão longo quanto pitoresco), ou simplesmente Marina Silva, para demonizar o PT e o PSDB ao mesmo tempo é assim, de fato, tão nova? Ela diz que irá governar com os “melhores” independentemente de quais partidos venham ou pertençam. Isso soa como música aos ouvidos de todos os brasileiros que já se acostumaram a identificar os políticos e os que compõem a máquina do Estado como sendo gente de baixa qualificação técnica e princípios morais duvidosos.

Diz também que será paradigma de honestidade; combaterá a corrupção como nunca e governará com o povo, blá-blá-blá, blá-blá-blá... Tão logo indicada para substituir Eduardo Campos e, no calor da comoção que o desaparecimento do jovem governador de Pernambuco, deu um salto gigantesco nas pesquisas. Mesmo perdendo alguns pontos nas duas últimas semanas já começa a consolidar seu eleitorado em nível tal que dificilmente deixará de marcar presença no segundo turno das eleições. Para ir à presidência, então, é só contar com o voto da boa parte dos apoiadores de Aécio Neves, aqueles que correm da Dilma e do PT mais do que o diabo da cruz.

Mas o PT arrepiou-se todinho com a inesperada exuberância eleitoral de Marina e resolveu abrir a sua caixa de ferramentas: Disparou impropérios à nossa Madre Teresa de Calcutá tupiniquim, culminando com a própria Dilma a fazer uso de uma ardida injúria quando diz que, se eleita, Marina acabaria com o Bolsa Família. Algo parecido a isto teria sido insinuado ou mesmo dito: “Vocês, povo brasileiro, vão voltar a passar fome porque o Bolsa Família não mais existirá se Marina tomar o meu lugar”.  

Pegou, evidentemente, bem direto no estomago da magérrima Marina que - mais do que simplesmente ter sido afetada em algo que lhe é, por experiência própria, muito caro - ou seja, a vida em um ambiente pobre no longínquo e muito tropical estado do Acre, viu a oportunidade de dar o troco à altura. O único problema é que a forma que escolheu para fazê-lo foi lançando mão de um dos mais clássicos recursos da “Política Velha”, exatamente aquela que ela atribui aos adversários e que não só abomina como promete combater diuturnamente. O Povo, dentro do conceito de Política Velha, só decide pela emoção. Disso ela já tinha certeza desde o dia 13 de agosto quando a desdita levou o candidato Eduardo Campos abrindo-lhe a oportunidade de substituí-lo como candidata titular da chapa.

Marina Silva foi uma verdadeira artista: De um palanque em Fortaleza contestou veementemente Dilma com o argumento de que jamais acabaria com o "Bolsa Família", pois ela, mais do que ninguém, sabia muito bem o que significava passar fome. Juntou fatos com característica de verossimilhança (no Aurélio: aquilo que parece verdadeiro, que não repugna a verdade, provável) com uma emoção tão convincente que lhe embargou a voz por vários segundos. Tudo muito parecido com o que o experiente Lula, com extrema maestria, sempre soube usar para comover suas plateias:

"Dilma, você não pode combater com as suas armas a nossa verdade, o nosso respeito e as nossas propostas. Nós vamos manter o Bolsa Família. Sabe por quê? Porque eu nasci no seringal Bagaço, eu sei o que é passar fome. Tudo o que minha mãe tinha para oito filhos era ovo, um pouco de farinha e sal. Eu me lembro de olhar para minha mãe e meu pai e perguntar: vocês não vão comer? E eles responderam: 'Nós não estamos com fome'. E uma criança acreditou naquilo, mas eu depois entendi que eles há mais de um dia não comiam. Quem viveu essa experiência jamais acabará com o Bolsa Família. Não é um discurso, é uma vida".

Quem não se emocionaria com um discurso desses? As pessoas que já sofreram privações em algum momento das suas vidas são sempre muito emotivas, sabemos disso. É por isso que o bom entrevistador sabe muito bem a importância de se buscar aqueles pontos de fragilidade emocional do entrevistado sempre com o propósito de levá-lo, se possível, às lágrimas. Marina foi esperta ao receber essa bola levantada por Dilma. Sem pestanejar, enfiou um rebote de primeira e marcou, do ponto de vista político, um gol espetacular. Disso ninguém tem dúvidas.

O que as pessoas não conseguem racionalmente colocar em suspeição é se aquela história do ovo, da farinha e do sal retratava exatamente o que era a vida de uma família seringueira. Não quero por em xeque as agruras que devem ter realmente passado, mas me pergunto: Como uma família ambientada na floresta onde abundam alimentos consegue passar fome? Dá até para entender que podem faltar coisas que independam da floresta: faltar uma ferramenta para o dia a dia, um remédio, a eletricidade, uma roupa apropriada, o combustível para o barco, a televisão, a geladeira e coisas tais. Mas - convenhamos - não ter o que comer quando a floresta dá alimentos vegetais, peixes e caças em abundância, já me parece um exagero.

Claro que não tem McDonalds, nem Pizzarias, mas tem tacacá, tucupi, jambu, tucumã, banana, guaraná, castanha, cupuaçu. E dos seus caudalosos rios, os maiores do mundo, o tambaqui e o pirarucu só para citar algumas das riquezas extrativistas da floresta. Passar fome nessas condições é como diz a voz do povo, padecer no paraíso. Lula - "como nunca antes na história deste país" - é mestre em explorar essa fragilidade emocional das massas. É da velha Política e parece que agora que também da Nova. Mais uma vez corremos o risco de votar pela emoção. Quem tem um histórico de fome, independente das razões que o levou a esse infortúnio, tem mais chances de se eleger do que outro que em sua vida já tenha superado isso.  

Já que o estilo é o da Política Velha será que a campanha do Aécio não poderia inventar uma história de fome também? Sugiro na falta de uma ideia melhor, que o Aécio rememore em um discurso carregado de emoção que uma vez sua babá esqueceu-se de lhe preparar a mamadeira e que ele, assim e por várias horas, passou fome... Deve funcionar!

Edson Pinto
Setembro’ 2014

18 de set. de 2014

276) ME ENGANA QUE EU GOSTO...

Quem já trabalhou em uma empresa razoavelmente organizada, especialmente em uma de grande porte, sabe muito bem do que falo:

É muitíssimo provável, quase certo, diria, que eventuais malversações gigantes sejam rapidamente descobertas e exemplarmente punidas em curtíssimo prazo. As múltiplas e variadas pequenas malversações podem até demandar mais tempo para serem detectadas, mas, mesmo assim, ainda que em longo prazo, tendem a ser igualmente punidas e coibidas. Contudo, a perversa condição de que grandes malversações possam permanecer ocultas por um prazo muito longo ou mesmo que nunca sejam descobertas é, na prática, quase tão impossível quanto submergir no Mar Morto. Tal qual rolhas de cortiça, as “lambanças”- para não usar outro termo de ordem escatológica - ficam flutuando para conhecimento de todos, especialmente daqueles que mantém interesse no sucesso da empresa, da organização, do Estado...

Embora a chamada Ciência Administrativa mostre sua face como tal somente a partir da Revolução Industrial da Inglaterra em meados do século XIX e que os princípios da boa administração de Fayol, Ford e Taylor são avanços da aurora do século XX, o homem sempre soube controlar com razoável competência as suas contas. Não quero fazer uma digressão histórica, mas peço que considerem que os Faraós do Egito, três mil anos antes de Cristo; a administração pública das cidades/estados gregas, séculos VI a IV a.C; o Império Romano no início da Era Cristã; toda a estrutura de registros da Igreja Católica aos longos dos últimos dois mil anos e as grandes navegações dos séculos XV e XVI desenvolveram formas de controles adequados para que os recursos escassos de sempre fossem bem administrados.

Em uma empresa da atualidade tudo é - ou deveria ser - muito bem controlado. Não se entra em suas instalações sem a devida identificação; tudo o que se movimenta com reflexo nos resultados e no patrimônio da empresa é registrado pela Contabilidade na famosa e cientifica forma de que a cada débito corresponde um crédito; Há gestores de gastos, gestores de contratos, gestores de receitas, gestores de tudo. Há, ainda, Auditoria Interna, Auditoria Externa, Conselho Deliberativo, Conselho Fiscal, Conselho de Administração e várias outras instâncias que controlam o que as outras fazem.

Agora imaginemos a nossa Petrobrás: Criada em 1954 por Getúlio Vargas em resposta ao clamor popular nacionalista do “O Petróleo é Nosso”. Sessenta anos de existência; exitosa na prospecção, no refino e na distribuição de petróleo e seus derivados; mais de oitenta mil funcionários; por bons anos uma das maiores empresas do mundo e com atuação de destaque em um setor de vital importância como é o da energia, acaso não contaria com os tradicionais e bem testados sistemas de controles internos e externos para se evitar a vexatória ocorrência de mais uma deslavada rapinagem como a do recente episódio Paulo Roberto Costa em favor dos interesses escusos daqueles que dirigem o País?

Por onde andaram nos últimos 12 anos de governo petista os contadores da Petrobrás; os seus auditores internos e externos; os seus Conselhos Deliberativo, Fiscal e de Administração e toda a miríade de controladores que desta grande empresa recebem regiamente suas contrapartidas em salários, benefícios sociais, bônus e remuneração de contratos com prestadores de serviços? Sumiram ou se omitiram? É difícil pontuar corretamente o que foi que aconteceu, mas por uma simples lógica cartesiana dá para se concluir: se os órgãos existem, se os sistemas de controle estão disponíveis e se o seu pessoal é de bom nível técnico, então só nos resta concluir tratar-se de omissão. Pronto!

É inadmissível o fato de um Diretor, mesmo que todo poderoso como o Engº Paulo Roberto Costa, tenha executado tantos desmandos como o dinheiro da Petrobrás sem que gente a ele subordinada; de áreas paralelas ou mesmo seus superiores; os órgãos de controles da empresa como Auditoria e Conselhos não tenham, em doze anos, percebido que algo de anormal vinha ocorrendo. Só dá para inferir que a estrutura, de alto a baixo, esteve também comprometida com os desmandos, caso contrário, estaria faltando créditos para débitos na contabilidade; existiriam notas nos relatórios de auditórias; pedidos de esclarecimentos nas atas dos Conselhos e até mesmo desconfiometros ativados daqueles que tem a obrigação de zelar pela coisa comum, seja pública ou privada, porque – lembremos – a Petrobrás além de ser uma empresa pública conta com a participação acionária de centenas de milhares de brasileiros que ali puseram suas poupanças e até mesmo o seu FGTS na forma de ações.

E o pior é o caradurismo daqueles que deveriam se sentir responsáveis pela empresa que ainda propagam ser ela detentora de uma administração exemplar, orgulho dos brasileiros e paradigma das melhores do ramo. Pode? Sim, pode, pois é exatamente essa irresponsabilidade e ganância sobre o patrimônio público é que está por trás dos desmandos que ora se revelam assustadores. Não fosse uma articulação intencional e o aparelhamento conveniente das diversas instâncias operacionais e de controle da empresa, tais abusos não teriam ocorrido.

Fica aqui, amigos, uma grande lição. E ela vale tanto para a coisa pública quanto para a coisa privada: Os sistemas de gestão e controles são bons e funcionam a contento tão somente quando as pessoas que têm o poder das decisões são sérias. O único lenitivo que nos acorre é o de que mais cedo ou mais tarde, com as ferramentas oferecidas pela Administração moderna, um ato impróprio sempre será descoberto. O único problema é quando os interessados no sucesso da empresa sem omitem. Assim, fica indiferente para os espertinhos se seus atos flutuem como nas águas densas do Mar Morto, ou não.

Enquanto isso, só nos resta o alinhamento ao que a sabedoria popular nos lega de forma propositalmente jocosa na forma de “Me engana que eu gosto”.

Edson Pinto

Setembro’2014 

12 de set. de 2014

275) FORÇA DE VONTADE


Assim como a gasolina move o carro, a eletricidade dá imagem ao televisor e o vento gira a pá do moinho, a força de vontade interna também movimenta a nossa existência. Thomas Carlyle nos legou a frase de que “o homem nasceu para lutar e que por isso a vida é uma eterna batalha”. Já que temos tanta certeza de que um ser humano apático, desprovido de motivação, de força de vontade tende a ser um pária, por que então nos ocorre de ver tanta gente arruinada pelo simples fato de não conseguir se organizar e de se motivar para fazer das suas vidas um projeto exitoso?

De todas as deficiências que podem acometer o ser humano, certamente a falta da chamada “força de vontade” é uma das maiores. Ela imobiliza o homem naquilo que tem de mais precioso e que se constitui no maior dom recebido do Criador: o seu livre-arbítrio. Se fosse para viver imobilizados, sem atitudes e sem contar com a força de vontade que movimenta o nosso corpo, as nossas decisões, as nossas atitudes para superar desafios, então teria sido melhor que tivéssemos nascido no ramo vegetal e não no animal. Como plantas, estaríamos - pelo menos em tese - libertos da necessidade de criar motivações para agir, mas estaríamos, por certo, condenados a viver no mesmo local e a depender do que outras forças da natureza viessem a nos ofertar graciosamente como a água, o adubo, o sol e a brisa que refresca.

William Shakespeare metaforizou que o nosso corpo é como se fosse um jardim, e que a nossa força de vontade é como se fosse o jardineiro que o faz prosperar viçoso. O que devemos entender é que a determinação, o poder de tomar decisões e as ações que disso decorrem são como o combustível que nos faz mover e nos faz acontecer no palco transitório da vida. Quando não se tem vontade, não se tem força para nada. Um homem forte fisicamente, mas que não tem a vontade de remover um objeto que lhe obstrui o caminho certamente não prosseguirá na sua caminhada. Ao contrário, uma vontade férrea para ser aprovado no vestibular de uma determinada Faculdade dará força e concentração suficientes para o sucesso profissional e pessoal de um jovem determinado a vencer na vida.

Há uma janela de oportunidade para o desenvolvimento do poder de decisão e da “força de vontade” no ser humano. Como quase todas as demais facetas do caráter, esta também se encontra aberta, de par em par, no período da infância. Aos pais e educadores cabem criar estímulos que levem as crianças a exercitar a suas iniciativas e o enfrentamento de desafios bem como das obrigações que precisam ser vencidas para a consecução de certos propósitos. Aqueles que são criados com a ajuda e assistência exageradamente generosa de provedores fartos tenderão - no futuro - a continuar na dependência dos outros ou, o que é ainda pior, estarão sempre postergando decisões e ações que por suas naturezas clamam pela necessária, pessoal e intransferível “força de vontade”.

Você é do tipo que está sempre deixando para fazer amanhã aquilo que já poderia ter sido feito hoje mesmo?

Se sim, saiba que você pode ter sido acometido dessa que é a mais básica das deficiências do ser humano. Se não tem organização e vontade para fazer as coisas acontecerem, com muita certeza, todos os outros problemas que reconhecidamente você já tem, não serão resolvidos. A mesma falta de vontade que o impede de começar a caminhar para ter uma saúde física mais saudável; iniciar aquele curso que sempre imaginou; podar aquela árvore de sua casa que está com o crescimento para o lado errado ou marcar aquela consulta sempre adiada a determinado médico especialista é a mesma que lhe rouba a disposição para se tornar mais paciente com os outros; menos arrogante; prestar mais atenção ao que lhes falam; colocar mais ordem na própria vida e tantas outras deficiências que o impede de ser feliz ou mais feliz ainda do que já é.

Lembremo-nos de Ésquilo: “Quando um homem tem força de vontade, os deuses dão uma ajuda”. E de Mahatma Gandhi: “A força não provém da capacidade física, mas sim da vontade férrea”.

Edson Pinto

Agosto’ 2014