15 de nov. de 2017

306) ANÕES DE JARDIM? SIM, ELES EXISTEM!




Confesso, prazerosamente, que gosto de mexer no jardim de casa. Às vezes sozinho. Normalmente, porém, com o suporte do polivalente Ivo, nosso caseiro, mais hábil, mais jovem, mais rápido e mais entendido na matéria que eu.

No pré-sono, não raro, devaneios me assolam: “Amanhã farei isso e aquilo no jardim”. Lembro-me do cantinho das flores que segue desprestigiado; do gramado com ervas daninhas insistentes. Lembro-me também daquela arvorezinha que agora começa a tomar corpo e já se faz merecedora de um escoramento; da premência de algumas podas, há muito, absolutamente necessárias; da manutenção de alguns canteiros. Planejo até mesmo rasteladas pontuais, pois, as gerais e o corte da grama, eu as deixo para o Ivo; Ufa! 

Para quem anda verdadeiramente procurando trabalho, o jardim - asseguro com absoluto conhecimento de causa - é um enorme demandante de mão de obra. Habilite-se, principalmente se você for do tipo meio filosofo, como eu. Aos benefícios próprios dos exercícios físicos tão comprovadamente eficazes para se mitigar os males da vida provecta, tem-se a oportunidade de uma satisfação de ordem espiritual. O trabalho com as mãos em direto contato com a natureza, magicamente, nos cria facilidades para reflexões metafísicas. 

Acreditam?

Pois saiba que a vida é como um jardim. Cada pequena intervenção do bem vai melhorando as suas condições de sobrevivência. É como a nossa própria vida. Cada ato útil praticado nos melhora a existência como um todo. O jardim fica mais viçoso, a vida também; as flores aparecem com mais frequência, atrai pássaros, borboletas, abelhas... Um jardim, tal qual a nossa própria vida, ao receber os cuidados essenciais resplandece e chama a atenção. Que bom, não?

O vizinho, transeunte eventual, passa, alheio - penso - ao requerido rigor do trabalho e dos cuidados dedicados à vida e ao jardim. Só tem a passiva percepção estética do que lhe salta aos olhos. Gentilmente me cumprimenta emendando questão objetiva sobre o segredo existente por detrás - na percepção dele - do meu bem cuidado vergel. Apoio-me no rastelo, dou um sorriso inocente e digo: “Vou te contar o segredo. Eu também só o descobri recentemente”:

Madrugada dessas, tendo perdido o sono, calhou-me ouvir sussurros que vinham deste jardim. Furtivamente fiquei atrás da cortina daquela janela (apontei a janela) e por uma fresta vi e ouvi o que ocorria neste espaço. Custei a acreditar, mas prossegui na espreita.  Eram sete anões que, com enorme agilidade, faziam todas as tarefas que o seu líder, entendi chamar-se Mestre, determinava: Limpe aquele canteiro ali, Feliz! Não durma Soneca, temos pressa! Atchim recolha as folhas! Zangado e Dunga cortem logo essa grama! Dengoso, regue as plantas! Agora vamos!  Recolham as ferramentas, pois ainda temos de fazer o jardim de Branca de Neve!

Assim é, pois, tanto a vida como o jardim... Às vezes real. Às vezes pura lenda. Tudo depende - é claro - do quanto nós nos damos conta - ou não - de que a vida e o jardim somos nós mesmos que fazemos. O resto é lenda...

 Pensem nisso!

Edson Pinto

Novembro’ 2017

20 de ago. de 2017

305) TUDO FLUI COMO UM RIO


Heráclito de Éfeso, filósofo grego, (535 a.C. – 475 a.C.) foi quem disse: “Não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio”.

Faz sentido?

Sim, faz! Principalmente se considerarmos que a água que flui e faz o rio no exato momento em que nele nos adentramos não será a mesma nos momentos seguintes, nem também seria a mesma dos momentos anteriores. Ela flui para seu destino e é renovada, substituída permanentemente.

Já percebeu que a vida também é assim?

Cada momento se faz diferente. As oportunidades surgem e desaparecem à medida que também ficamos menos iguais ao que éramos. A Biologia nos ensina que renovamos nossas células com razoável frequência. Enquanto os neurônios nos acompanham por toda a vida, as hemácias se renovam a cada quatro meses. Outras, em tempos ainda menores. De qualquer forma, tal qual o rio, não somos hoje exatamente o que éramos há meses, nem seremos iguais nos seguintes.

O que quero dizer com isso?

Tudo muda à medida que nossas vidas caminham para o fim. É inexorável que isso aconteça. Nem o rio, nem nós, somos mais os mesmos. Felizes aqueles que mesmo mudando conseguem uma existência longeva, produtiva, alegre e com saúde. Quem envelhece desta forma não pensa em outra coisa a não ser como tirar de sua própria vida o máximo do melhor que ela pode lhe dar.

Como nunca saberemos exatamente como é e o que nos reserva o misterioso “lado de lá”, só nos resta filosofar sobre a própria condição humana. Se nós temos consciência de que a vida é bela, boa, instigante e real, por que não nos permitir colocar ao menos um pé na água agradável desse rio que flui ininterruptamente?

Existem pessoas que, ainda com muito tempo de vida pela frente, podem ser colhidas por doenças incapacitantes ou impedimentos de natureza diversa que as privem de gozar as mesmas prerrogativas dos idosos saudáveis e bem resolvidos. Infelizmente, a vida não é igual para todos.

É de se compadecer, contudo e por essa razão, daqueles que, mesmo aquinhoados com essas vantagens, se entregam a mais triste das atitudes que é a da renúncia ao sagrado direito de gozo pleno da fase derradeira da sua merecida e bem sucedida jornada que celeremente se aproxima do fim.

Dói ver semelhantes, saudáveis física e mentalmente, a vegetar enquanto aguardam - como disse Raul Seixas em sua celebre canção Ouro de Tolo - “com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”...

Agora, se - sem que se esperasse - a vida lhe desse de presente alguns recursos extraordinários e te encontrasse com saúde boa, filhos bem encaminhados, boa intuição para controle das finanças pessoais, gosto por ser dono do próprio nariz e achando que vale muito a pena manter sua independência moral, emocional e financeira, o que faria?

Não sei da vida de cada um, mas, no meu caso, colocaria logo, não um, e sim os dois pés no rio que ora flui. Afinal, minha alegria de viver depende da preservação da minha independência para praticar os atos que quiser, quando quiser, como quiser, até quando Deus quiser...

Podemos mudar e envelhecer, mas não necessariamente perder o domínio do próprio destino. Cada momento da vida é diferente, apresentam-se desafios e obstáculos novos, mas também oferecerem-nos oportunidades que nem imaginávamos.

É pra pensar!

 “Não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio”.

Edson Pinto

Agosto’ 2017