23 de abr. de 2015

291) NO PAÍS DAS PEDALADAS


O prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, concebeu e vem aos trancos e barrancos executando um ambicioso plano para prover a cidade com 400 quilômetros de ciclovias e “ciclofaixas” até o final de seu mandato. A diferença entre os dois termos é sutil e não vem ao caso de aqui perder preciosas linhas para o esclarecimento. Usarei apenas o terno ciclovia que além de mais sonoro é o que se encontra registrado no Aurélio. O importante é que, obviamente mirando-se em exemplos de cidades europeias, quer o prefeito petista fazer de Sampa uma terra de ciclistas e assim passar glorificado para a história. Neste mérito me recuso a entrar...

Como todo projeto polêmico este anda eivado de criticas pelo seu fraco planejamento e principalmente pela forma atabalhoada com que vem sendo executado. Os moradores e comerciantes das ruas afetadas não são previamente ouvidos e, não raro, faixas pintadas de vermelho sobrepõem-se a buracos e encontram postes e árvores e outros obstáculos intransponíveis pela frente. O importante para a Administração petista é tocar as obras, custe o que custar. Neste particular, a propósito, há até quem já apontou que vêm custando muitíssimo mais do que custa em outros países. Mas isso é outra questão. De outro lado, um grande contingente de ciclistas aprecia em muito a iniciativa e isso é positivo...

O ciclismo é uma atividade impecável. Eu mesmo já tive, no passado, a experiência de usufruir de saudáveis pedaladas quando por dois anos morei na Holanda. Posso dizer, portanto e por experiência pessoal, que esse simples e econômico meio de transporte aperfeiçoado pelos ingleses no final do século XIX continua sendo – dada as circunstâncias – o que há de melhor, pois alia meio de locomoção prático e econômico com a saudável atividade física e - em tempos de acirrada preocupação com o meio ambiente – um ato ecologicamente perfeito. Eu disse perfeito e não prefeito...

Há, contudo dois grandes obstáculos para o sucesso dessa iniciativa em muitas das cidades brasileiras: A primeira é que as vias urbanas já estão definidas e nessa circunstância é muito mais difícil achar espaço para as ciclovias do que tê-las já definidas quando do projeto urbanístico. Construir uma faixa para uso exclusivo de ciclistas rouba espaço do transporte público, dos automóveis, das áreas de paradas e até mesmo dos pedestres. O outro problemão refere-se à topografia. Na Holanda, o país referência para o ciclismo, é um território essencialmente plano. Os ciclistas têm condições confortáveis para pedalar e o clima de ameno a frio ajuda em muito. Em São Paulo, salvo em áreas bem especificas, temos muitas vias íngremes que dificultam em muito a prática confortável do ciclismo, especialmente quando sob temperaturas elevadas. As realidades, com se vê, são bem distintas, porém não de todo irreconciliáveis.

De qualquer forma, eu sou daqueles que consideram que a ideia é boa e que mesmo se pouco se avançar nesse projeto pelo menos ele já terá o mérito de despertar a consciência dos planejadores urbanos para que os novos projetos viários considerem o espaço adequado e seguro para os ciclistas. Cidades menores e mais planas certamente têm muito a ganhar, e muitas já ganham, com criação de ciclovias. Até mesmo por uma questão econômica, pois custa muito menos construir ciclovias do que construir grandes avenidas para suportar o crescente aumento da frota de automóveis.

A lição que nos fica desse projeto é que ele – infelizmente para o prefeito Haddad – é a associação que somos levados a fazer entre as pedaladas ciclísticas com as maluquices que o seu partido, o PT, vem demonstrando na condução da economia do País. Não sei quem imita quem, mas o fato é que Dilma, mesmo morando em Brasília, mostrou-se também fã de pedaladas, só que de natureza fiscais e não ecológicas. Já se desconfiava, mas agora o Tribunal de Contas da União demonstrou a prática da criminosa pedalada com as contas públicas em flagrante desrespeito à lei de Responsabilidade Fiscal.

Para mostrar que as contas andavam bem, o governo (Tesouro Nacional) deixava de transferir aos bancos os valores para pagamento de obrigações como, por exemplo, o Bolsa Família. Passava a ideia de que fazia superávit fiscal o que significa boa administração e deixava, o que é proibido e, portanto criminoso, que os Bancos oficiais como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil fizessem os pagamentos numa forma oculta de empréstimo. No mês seguinte pagava-se o devido e fazia-se nova jogada. A isso, o mundo dos negócios convencionou chamar de pedalada. É como, ao andar de bicicleta, não poder interromper as pedalas sob pena de se levar um tombo.

Agora estamos neste imbróglio: Brasília pedalando, São Paulo de Haddad pedalando e o povo pagando a conta. Ou quem sabe, o povo, já massacrado com a carga tributária e com a inflação corroendo suas rendas, também já não aprendeu a pedalar a sua sobrevivência?

Afinal, parodiando Fernando Pessoa: viver não é preciso, pedalar é preciso...

Edson Pinto

Abril’2015 

16 de abr. de 2015

290) QUASE UMA SANTA



Decidimos e vivemos muito mais em função de fatores psicológicos do que de circunstâncias objetivas. Quem gosta, acompanha e entende um pouco de futebol, essa paixão popular, sabe bem do que estou falando: O elenco é de alto nível, os salários dos jogadores estão sendo pagos rigorosamente em dia, a torcida é fiel, vibrante e apoiadora, mas o time, misteriosamente, insiste em não vencer, até mesmo desafios considerados fáceis.

Observem que, em geral, não se atribui o fracasso do time a um ou a poucos de seus jogadores, mesmo quando eles não andam na melhor de suas formas físicas e técnicas.  A responsabilidade é na maioria das vezes atribuída ao técnico. Como forma de se contornar esse problemão, o técnico invariavelmente é trocado. Tanto faz o quão convincente e admirável seja o seu currículo profissional.

Como visto, o que prevaleceram não foram exatamente os fatores objetivos da realidade, mas sim os psicológicos. Quando algo precisa mudar, nossas mentes se condicionam a achar que as coisas só podem tomar outro rumo se removido o líder. Fica difícil para a mente humana acreditar que quem está errando no que faz tenha condições de admitir isso e assim assumir uma mudança substancial em suas ações.

Ações, como sabemos, decorrem dos pensamentos e das condições intuitivas e das crenças arraigadas que temos.  Isto é psicológico e, portanto, elemento determinador de grande parte de nossos atos. O técnico que tenha consciência disso e sabedor de que a sua permanência pode mais prejudicar do que ajudar o time, não raro toma a iniciativa de acertar com a direção do clube a sua saída. Nessas circunstâncias sair com espontaneidade adquire até um caráter de grandeza espiritual.

Transportada essa situação para a política o que vimos hoje é uma presidente que anda errando muito na condução de seu time. Mesmo que apontem fatores objetivos que viessem a sustentar a sua permanência, o psicológico da questão já se sobressai a tudo o mais. Até mesmo aqueles mais crédulos que alimentavam a esperança de uma reviravolta na forma como a nossa presidente vem conduzido o país já se renderam às evidencias de que é necessário trocar o técnico do time. Infelizmente, a encrenca em que nos metemos requer, agora, muito mais desprendimento e espírito cívico elevado do que se possa imaginar.

Quando o humor das massas entra em desequilíbrio como tem ocorrido presentemente tornam-se pouquíssimas as esperanças de que o mal possa ser corrigido com a técnica que foi responsável por ele. Assim como um clube que não pode prolongar em excesso a sua trajetória de insucesso, um país também não pode seguir sangrando por mais quatro anos só porque tem que sustentar a decisão infeliz de ter reconduzido a líder que não vai nada bem. Mais do que uma questão de honra e de defesa de interesses políticos o que se faz de maior relevância é a necessidade de que não deixemos o país ficar pior a cada dia.

Penso que o processo de impeachment mesmo sendo legal é uma “via crucis” que submete a toda a nação a um sofrimento de grandes proporções. Penso mais ainda que tudo isso seria evitado para o bem de todos se a presidente, fortalecida de sua civilidade e patriotismo, apresentasse a sua renúncia. Mostraria, no mínimo, a nobreza de espírito que caracteriza os grandes líderes. Passaria para a história como a presidente que abriu mão de suas vaidades e não a imagem da teimosa que conduziu o País ao descalabro.

Como Pedro Stédile, líder dos MST, recentemente definiu Dilma Rousseff como praticamente uma “santa”, bem faria a ela se acatasse de pronto essa designação e tal qual Santa Maria Madalena, na foto que ilustra este texto, também renunciasse de suas posses e passasse para a história santificada e não amaldiçoada. Deixaria de ser “quase” para ser uma verdadeira santa...

Edson Pinto

Abril’2015