29 de mai. de 2014

267) O ESTADO MÍNIMO


Na minha crônica da semana passada, “PAÍS DE PIDÕES MIMADOS”, em que apontei as consequencias negativas do excesso de programas sociais, eu recorri às ideias de um pensador político americano da maior expressão, Robert Nozick (1938 - 2002). 

Nozick foi um daqueles pensadores que tiveram, em tempo, a lucidez de migrar de um ideário inicialmente de esquerda para uma visão liberal e de apoio ao livre mercado. Influenciou-o bastante a leitura atenta que fez de Friedrich Hayek (1899 - 1992) e Ayn Rand (1905 - 1982). Hayek foi severo crítico do planejamento como instrumento de controle governamental e Rand sustentava a ideia de que a interferência excessiva do Estado opera sempre como obstáculo ao desenvolvimento humano. Só com base nisso já dá para se ver que o pensamento de Nozick condena o formato gigantesco que alguns governos tende a assumir e a nefasta consequência que disso decorre, ou seja, a elevado carga tributária necessária para saciar o gigante.

Qualquer pessoa que já tenha minimamente observado como os governos funcionam deve concordar com Nozick (eu concordo plenamente) de que ao Estado, entendido como governo, deveria se limitar a cuidar tão somente dos direitos básicos de seus membros como, por exemplo, a segurança interna e externa, a proteção dos contratos e outras poucas atividades que por suas naturezas não fossem interessantes para a atividade privada. Quando o Estado se vê envolvido em atividades que extrapolam a sua área de competência ele passa a desrespeitar os direitos da cidadania e com isso cria obstáculos ao desenvolvimento do país. A conclusão que se tira de imediato é exatamente o que sugere o título desta minha crônica: O estado mínimo, como solução. Mas, o que podemos entender por estado mínimo?

Primeiramente, algumas características da administração privada e da pública: Na iniciativa privada, o patrão, na figura direta de seu dono da empresa ou na forma de representantes dos acionistas, com o fito de estimular seus colaboradores a serem eficientes e eficazes, tem o poder de punir ou gratificá-los com base em seus desempenhos pessoais. Na atividade pública, exceto quando cometidas faltas graves e desde que previstas em lei, o funcionalismo conta com a estabilidade vitalícia do emprego. Sem medo de ser punido com a demissão, o funcionário público tende, dependendo por óbvio do caráter de cada um, a se acomodar fazendo tão somente o básico e raramente ultrapassando as expectativas de quem lhes controla ou supervisiona, mesmo porque - em geral – não há incentivos para desempenhos de alto nível. Segue-se a isso o fato de que o “patrão” do funcionalismo público não é um ente visível, pois o Estado não existe em matéria viva, senão se faz representar por cidadãos eleitos ou escolhidos por critérios políticos. São, portanto, transitórios. E o que é transitório não precisa ser temido.

Em segundo lugar, o poder de compra de um estado grande é muito forte. Isso desperta a ambição de fornecedores de bens e serviços de toda ordem a abocanharem fatias desse grande e generoso cliente. As regras legais necessárias para controle da lisura e eficiência das compras são tão detalhadas que contraditoriamente provocam efeitos contrários: Geram custos elevados, demandam tempo excessivo para as decisões e abrem frestas para falcatruas, corrupção, suborno e o desmando. O conluio entre os que querem lucrar com o cliente governo e os operadores da máquina estatal em seus diversos níveis propicia o que todos nós sabemos: Desperdício de recursos, custos elevados, obras e serviços mal feitos e demorados.

Em terceiro lugar, a ideia de que o estado é capaz de gerar o dinheiro que for preciso, quer via aumento dos impostos, ou até mesmo gerando endividamento torna a administração pública quase que imune ao principio que prevalece na iniciativa privada de que os dispêndios precisam ter contrapartida em recursos. O Estado nunca vai à falência, por isso o sistema orçamentário é uma ficção. Agrava-se o fato de que existe uma explicita promiscuidade política entre os poderes Legislativo e Executivo. Aquele, quando mancomunado e beneficiário de benesses especiais propiciadas pelo poder que tem a chave do erário acaba por produzir leis que suportam o aumento dos gastos públicos sem zelar pela qualidade dos retornos esperados. Embora tenhamos a ilusão de que os três poderes da República sejam independentes não é isso o que acontece na prática.

A consequência nefasta de um estado gigante pode ser resumida em dois pontos muito simples de se entender: O Estado é ineficiente, pois tenta fazer algo que não lhe é da natureza e é levado a cobrar cada vez mais impostos para fazer face aos seus crescentes gastos. Na iniciativa privada quando uma empresa produz mal e gasta muito, o destino lhe reserva a falência. O governo quando também produz mal e gasta muito há também uma falência em jogo. Não a do próprio Estado que sempre pode se virar, mas a do cidadão que de tão oprimido se converte em escravo gerador de impostos sendo forçado a trabalhar cada vez mais e ficar com cada vez menos. Portanto, até mesmo por uma questão de sobrevivência só nos resta lutar por um estado pequeno, que custe menos e que dê mais liberdade à iniciativa privada.

Edson Pinto
Maio’ 2014

22 de mai. de 2014

266) PAÍS DOS PIDÕES MIMADOS

Não é minha intenção fazer aqui o confronto clássico entre socialismo e capitalismo, esquerda e direita. Este não é um ensaio político/sociológico/econômico. É apenas uma crônica do nosso cotidiano. Se isso, contudo, se encaixar nesses conceitos, tudo bem. Não foi a minha intenção inicial...

Quando falamos que alguém, que algum partido, que algum regime político e econômico ou que alguma tendência é socialista, não queremos necessariamente nos referir ao processo revolucionário marxista que, se tivesse dado certo, teria levado boa parte do mundo ao comunismo. Até mesmo os regimes abertamente capitalistas incorporaram muitos dos conceitos e teses sociais que podem tranquilamente conviver com sistemas econômicos liberais. Afinal, o bom propósito de governos de quaisquer tendências ideológicas acaba por incorporar programas de proteção e suporte aos mais fracos ao mesmo tempo em estimulam a redução das desigualdades sociais, pois, isto – queiram o não – é bom para todos.

Remonta ao século XVIII, quando da Revolução Francesa, uma separação que se tornou clássica: Sentavam, por coincidência, na Assembleia Nacional Constituinte, à esquerda do auditório, aqueles que defendiam a ideia de um novo governo voltado para o combate das desigualdades sociais de então. A todos que se identificavam com aquela ideologia passou-se a chamar de “Esquerda”. Do lado direito, daí denominar-se de “Direita”, encontravam-se aqueles que suportavam a manutenção o “status quo”, isto é, a continuidade, na época, do velho regime. Desde então, ter ideia de esquerda ou de direita vem sendo associado aos conceitos socialismo de um lado, capitalismo/conservador, do outro. Não importa! O que é relevante é que ninguém – em sã consciência – é totalmente uma coisa ou totalmente outra.

Dizer que o PT é puramente de esquerda é balela. Em que pese defender teses socialistas importantes como todo o aparato de programas sociais que fez vicejar nos últimos 12 anos, isto não o impediu de ter posturas bem capitalistas. Basta consideramos toda a farra com o sistema produtivo para benefício de partidos políticos e até mesmo dos bolsos de muita gente que passou a fazer parte da nova elite. Nem é correto dizer que o período PSDB começado por Itamar Franco e completado por Fernando Henrique Cardoso fora totalmente conservador. Vários dos programas de suporte social como o “Bolsa Família” foram gestados naquela época. Portanto, é mais correto dizer que certo partido, ou certo regime, é de tendência, isto é, tem traços, tem jeito, é mais afinado com a Esquerda ou com a Direitista, e só...

O grande problema é quando uma das correntes vai muito a fundo na radicalização de sua tendência naquela base maniqueísta do “tudo ou nada”. Pobre e desafortunado é o governo que não sabe dosar essas benesses sociais. Infelizmente – e a história está aí para nos confirmar – o comunismo fracassou exatamente porque radicalizou a ideia de redistribuir a riqueza sem prestar atenção às diferenças existentes entre as pessoas. A sociedade é uma forma ampliada da individualidade. Se uma criança é criada com mimos e superproteção o resultado é aquele que todos nós sobejamente já sabemos: Teremos um adulto incapaz de prover as suas próprias necessidades dependendo sempre da ajuda do “papai” ou da “mamãe” Aqui, vale aquela máxima popular de que é mais importante ensinar a pescar do que simplesmente ficar por toda a vida fornecendo o peixe.

O nosso governo atual é pródigo em distribuir a riqueza gerada pelos outros. Já temos 50 milhões de brasileiros acomodados com o programa social da Bolsa Família. Muitos outros milhões vivem de aposentadorias especiais para as quais não contribuíram suficientemente para a formação dos fundos, mas são suportados pelo tesouro, ou melhor, pelos impostos que pagamos. Há, ainda, vários programas sociais e benesses de mil formatos que exigem cada vez mais impostos para cobrir orçamentos cada vez maiores. O pensador político americano, Robert Nozick, em seu livro Anarquia, Estado e Utopia, descreveu a carga tributária como uma forma de escravidão ao considerar que uma parcela da sociedade se apropria do trabalho de outra, no caso os contribuintes, para ter satisfeitas as suas necessidades. O contribuinte passa, então, a ser um escravo espoliado de forma impiedosa...

Já temos tempo suficiente de bolsas sociais para ver que muita gente que delas se beneficia está acomodada com as benesses e passa a fazer disso um meio de vida. Recusam trabalhos para não perderem os benefícios; reclamam do baixo valor dos benefícios e se viciaram em pedir mais e mais. A mulher que está oito anos recebendo o “Bolsa Família” reclama aos brados, na TV, que o benefício não lhe é suficiente para comprar uma “calça de marca” para a filha adolescente. Outra quer por que quer ganhar um apartamento do governo; outra ainda pleiteia terras; outros exigem ingressos para os jogos da Copa; outros querem passes livres para usar os meios de transporte e a lista não se esgota de tantos pedidos. Viramos um país de pidões mimados. A ordem é pedir, pedir e pedir... Ninguém pede mais trabalho ou mais escolas para estudar. Nem se organiza com os vizinhos para cuidar daquela praça judiada de sua vizinhança ou para ajudar na reforma e na limpeza da escola pública onde os filhos estudam de graça.  O governo que, franciscanamente, sabe muito bem que é dando que se recebe costuma não falhar nessa permuta. Dá benesses e espera receber votos. Assim, com o trabalho de uma parte da sociedade, tem dinheiro suficiente para manter a outra que lhe dá votos e ainda se perenizar no poder. Bingo!

O único problema é que quando a outra metade que tem que suportar com impostos cada vez maiores e de forma permanente as benesses concedidas aos outros, começa a sentir o mesmo que sofreram os comunistas produtivos: A banda útil começa a questionar o seu papel de mero contribuinte e diminuirá o nível de seu esforço. A sociedade como um todo será menos produtiva; o bolo diminuirá de tamanho, e no final, nem todos terão dele um pedacinho sequer...

Edson Pinto

Maio’ 2014

15 de mai. de 2014

265) LIBERDADE DOS GRILHÕES


O corre-corre da vida moderna acaba por monopolizar e canalizar nossos pensamentos para as situações mais práticas e de cunho imediatista. O que devo fazer agora? Compro isto ou não? Vou ao encontro de tal pessoa ou não? Estudo isto ou deixo o tema passar despercebido? Tem sido reservado, obviamente não de propósito, aos pensadores, ao longo do tempo, refletir sobre as situações mais transcendentais e de maior profundidade sobre a vida. Uma dessas questões versa sobre o real significado daquilo que convencionamos chamar de liberdade:

Primeiramente, o que significa sermos livres?

Isaiah Berlin, o filósofo russo/britânico que viveu quase integralmente o século XX (1909 – 1997) foi a fundo nesta questão quando escreveu o seu famoso ensaio “Dois Conceitos de Liberdade”, publicado em 1958. Nele, ele faz uma clara distinção entre dois tipos de liberdades aos quais nos encontramos expostos:
A “liberdade positiva” que corresponde ao atributo humano do livre-arbítrio que nos permite escolher e determinar o nosso próprio destino e, por extensão, os objetivos da vida que queremos ter. Nossas decisões de vida são dependentes exclusivamente de nós mesmos e não de autoridades externas a nós. Decidimos por nós e não nos apraz sermos conduzidos por outros como se não passássemos de animais irracionais ou de escravos incapazes de ter a correta interpretação do que é a própria vida. A liberdade positiva não se aplica exclusivamente ao âmbito pessoal quando a exercemos sobre o nosso próprio destino, mas ela pode também ser exercida em nível social e político.

A “liberdade negativa” diz respeito objetivamente ao sentimento e certeza que temos ou precisamos ter de que nenhum outro homem ou mesmo instituição nos tolhem a liberdade de fazer o que consideramos bom para nós mesmos: Não estou algemado ou acorrentado, como pode acontecer com um prisioneiro; Não estou sendo oprimido ou coagido para além de um ponto tal em que, por razões justificáveis, se mostra adequado ao meu sentimento de liberdade. Se tenho, ou se temos tal sentimento, então podemos nos considerar livres. Essa liberdade “negativa” é o que podemos considerar como a essência da liberdade, a liberdade de se encontrar livre dos obstáculos externos. Em termos de convivência social, a liberdade política seria, dentro deste conceito de liberdades negativas, aquela área preservada e desejavelmente intocável dentro da qual podemos agir sem que nos submetamos ao constrangimento do jugo do poder.

Considerando que tanto os nossos objetivos pessoais e/ou políticos, na forma de liberdade positiva, podem afetar o grau de liberdade negativa de outras pessoas, ou de nós mesmos, temos então um grande problema sobre o qual deveríamos nos preocupar. Pessoalmente, a minha liberdade para votar em um determinado partido político (liberdade positiva) cujo programa de governo contém medidas que por certo violarão partes de minhas liberdades negativas pode trazer contradições insanáveis. Por exemplo, a necessidade de pagar mais impostos do que aquilo que eu julgo razoável ou de me ver proibido de livre acesso a informações na forma de uma imprensa livre, são evidentemente fatores de conflito ao antagonizar liberdade e opressão.

Regimes totalitários com tendência a se perpetuarem no poder (nem preciso falar ao quais me refiro) mantêm expectativas muito inflexíveis sobre os objetivos da vida das pessoas que se encontram momentaneamente subjugadas ao seu controle. A consequência é que, com o propósito de maximizar o que eles consideram como sendo a felicidade geral do povo, acabam por impor severas restrições às liberdades negativas individuais, aquelas mesmas que deveriam ser minimamente respeitas de tal modo a se evitar o conflito entre as liberdades possíveis. Como e onde se vê isto? Ao nosso redor e olhando para os estados com regimes que querem controlar a liberdade de pensamento e opinião cerceando a imprensa, por exemplo. Veremos sempre um estado que tutela de forma extremada o cidadão como se ele fosse um idiota que precisasse de um tutor oficial para atingir a sua própria felicidade. O risco é o que todos já sabemos: “O uso do cachimbo faz a boca torta”. Cinquenta milhões que se beneficiam com os programas sociais fogem do mercado de trabalho e, de lambuja, dão ao governo o presente de uma pequena taxa de desemprego e por que não, também muitos votos...

Se a esta altura você está ansioso para saber qual a solução para este conflito entre liberdades positivas e negativas fica aqui apenas um lenitivo terapêutico: Só nos cabe continuar acreditando no espírito que rege o conceito de liberdade como sendo o repúdio incessante ao que podemos considerar como intimidação e dominação. O sentido maior disto é que nunca permitamos que nossa visão de vida venha a se tornar assemelhada aos grilhões que aprisionam. Em nossas cabeças, é como se estivessem presos em nossos pés de tal forma a nos impedir de dar andamento à vida, pois o verdadeiro sentido da liberdade é a liberdade dos grilhões.

Edson Pinto

Maio’ 2014 

8 de mai. de 2014

264) A PÁTRIA DE CHUTEIRAS


Temos sido bombardeados com informações, análises, campanhas e manifestações, até mesmo públicas, de grupos organizados contrários à realização da Copa do Mundo de Futebol aqui no Brasil. Dois seriam os argumentos centrais que sustentam as bandeiras do “Não vai ter Copa” ou do “Vou torcer contra o Brasil”:

Primeiro, os gastos excessivos com o evento em detrimento da mitigação de problemas maiores do País como as péssimas condições da saúde pública, a baixa qualidade da educação entre outros descalabros notoriamente conhecidos por todos. O segundo argumento, este de ordem bem política, é de que, saindo-se bem o Brasil, na Copa, isto é, sagrando-se campeão do mundo pela sexta vez, o governo petista, hoje mais execrado do que cão sarnento, tirará proveito para angariar votos para a reeleição da atual presidente.

Começo dizendo que continuarei entusiasmado com a Copa aqui no Brasil, mesmo porque isto já é um fato consumado e impossível de ser revertido sem que consequências muitíssimo piores afetem a todos nós. Vou torcer como sempre fiz pelo meu País, pois sou patriota. E, por fim, informo aos amigos que até já consegui ingressos para pelo menos uma das semifinais e que não abro mão de ser entusiasta participe deste grande evento, pois isso me proporciona unir o gosto pelo futebol ao orgulho de ser brasileiro.

Meus argumentos:

(i) Em 1950 quando da primeira Copa no Brasil eu tinha apenas um ano de idade e, obviamente nada acompanhei. Tudo o que sei a respeito daquela Copa foi-me contado pelos mais velhos e/ou li em textos legados pela história.

(ii) Aprendi como a maioria dos brasileiros a gostar de futebol, este esporte de agradável plasticidade, de arte, de vigor, de caráter democrático que encanta a quase totalidade das pessoas. Hoje, como se sabe, todo o mundo aprecia o futebol e a Copa do Mundo é considerada o maior evento esportivo da Terra, superando até mesmo os jogos Olímpicos.

(iii) Nós brasileiros amamos o futebol desde a infância, talvez porque combina muito bem com o nosso clima e como a espontaneidade social do nosso povo. Não foi por outro motivo que o saudoso Nelson Rodrigues nos legou a expressão símbolo desta paixão nacional, “a pátria de chuteiras”, título desta crônica.

(iv) Estou com 65 anos e não tenho esperança de viver outros 65 anos até que o Brasil venha a sediar outra Copa, torcendo para que até lá o País tenha antes resolvido todas as suas outras infindáveis mazelas. É, portanto, agora ou nunca...

A favor de minha posição filosófica sobre o tema tenho ainda a consciência correta de que política e futebol não se misturam na cabeça das pessoas de bom senso. Ao contrário – e as provas nos são abundantes – toda vez que políticos tentam tirar proveito dessa paixão nacional que é o futebol, o tiro acaba saindo pela culatra. Na situação presente em que prevalece o sentimento generalizado de que o governo com todos os seus partidos e seus 40 ministérios, a desacreditada classe política, os desarranjos da economia, a falta de segurança pública, a infraestrutura paupérrima entre outras encrencas têm jogado uma balde de água fria no tradicional otimismo do brasileiro. Impossível, portanto, encontrar momento mais inconveniente do que o atual para se misturar as duas coisas, isto é, política e futebol. Como água e óleo o futebol assume a posição do óleo sobre a água mal cheirosa da politicagem. Vença o Brasil todas as partidas e se torne o campeão, ou perca todas e se desclassifica, nada mudará o meu voto que já está definido. Política e futebol são departamentos diferentes...

A presidente Dilma já disse que se limitará a balbuciar rapidamente a clássica e obrigatória expressão “Declaro aberta a Copa do Mundo 2014” e torcer para que as vaias sejam, na melhor das hipóteses, em nível moderado. Mas que vaias virão, não tenho dúvidas... Sejamos francos! Dá pra imaginar o deputado André Vargas, este que tem relações de negócios com o doleiro Alberto Youssef na história do Labogen mostrando a cara numa partida de futebol ou dando uma entrevista para comentar um gol de Neymar? Dá pra imaginar a Dilma afirmando que o bom desempenho do escrete do Felipão é decorrência dos programas sociais do governo ou que o drible de Davi Luiz no jogo contra a Croácia estava previsto no PAC2?

Não! Definitivamente não dá para misturar as duas coisas. Quem achar que isto é possível deve ter outra razão que eu suponho seja única: Não gostar de futebol, assim como tem gente que não gosta de sol, outras não gostam de praia, outras detestam o campo, odeiam as cidades, desprezam os momentos de lazer e praguejam pela vida que têm. O futebol – nem precisa ser um de seus praticantes – tem essa magia: soma de arte, de juventude, de confraternização, de amor e de paixão. Muita paixão, mesmo...

Que me perdoem os jovens que são contra a Copa do Mundo no Brasil. Vocês ainda terão muitos anos pela frente para manterem as esperanças de verem uma Copa menos onerosa, em um Brasil mais justo, no futuro. Eu como não tenho mais tempo para isto, só me resta tirar todo o proveito possível desta de 2014. Não me conformo em partir para a outra dimensão sem ter presenciado ao vivo e a cores o extravasamento da alegria deste povo sofrido em um grande grito de gol. Quiçá de HEXACAMPEÃO!

Edson Pinto

Maio’ 2014 

2 de mai. de 2014

263) VIDA JURÁSSÍCA


Toda nova tecnologia encontra resistência de segmentos da sociedade. Existe até uma chamada “Curva de Adoção de Tecnologia” que mostra isto cientificamente: 2,5% de pessoas podem ser rotuladas de “Inovadores”, ou seja, aquelas pessoas que estão sempre à frente na aceitação de novas tecnologias. Não se incomodam de passar a noite em uma fila para a compra dos primeiros produtos lançados no mercado; 13,5% da população são constituídas de “Visionários”. São entusiastas e se dispõem não só a rapidamente adotar a nova tecnologia como também a divulgar o seu uso, especialmente aos amigos; 34% constituem a “Maioria Inicial”. Adotam a nova tecnologia quando percebem a sua utilidade e os benefícios que ela pode lhes trazer.

Na segunda parte da curva encontram 34% das pessoas que são rotuladas de “Maioria Tardia”. São os conservadores que só adotam as tecnologias modernas quando todos os que a rodeiam já a tem. Às vezes até como necessidade para continuarem merecendo a aceitação dos grupos com os quais relacionam ou mesmo até serem respeitados dentro do seio familiar; E, finalmente, existem 16% da população que são caracterizados como “Retardatários”. Nem Santo Antonio com um gancho os fará adotar uma tecnologia inovadora, um smartphone, um tablet, um computador ou mesmo um já quase ultrapassado telefone celular, por exemplo.

Em qual parte dessa curva e do segmento da sociedade você se enquadraria? Mas seja honesto! Se for até na metade da curva, tudo bem. Mas se estiver nas duas categorias finais lamento dizer que você já morreu e apenas esqueceu-se de cair. Brincadeira, óbvio, mas com um fundo de verdade.

Vejamos os argumentos em que se apegam os conservadores, o seja, aqueles dois grupos que ficam na rabeira da curva:

“O celular e esse tal de smartphone acabaram com o relacionamento interpessoal ao qual estávamos acostumados. Você vê em um restaurante, hoje, em quase todas as mesas, as pessoas com aquele aparelhinho luminoso digitando coisas e aparentemente quase nenhuma conversa entre elas. Isso é um absurdo. Por que então estão juntas?” Normalmente o conservador ainda fecharia o seu argumento dizendo: “Eu me recuso a adotar esse aparelhinho dos demônios” ou ainda: “Saudades dos tempos em que podíamos prosear olhando uns nos outros dos outros”.

Agora imagine a seguinte situação em dois momentos distintos:

Primeiro momento (antes do smartphone): Pedro é tímido. Sempre foi. Angélica, por natureza, mais ainda. Entram num restaurante e, sentados, ficam perdidos na manutenção de uma conversa descontraída e prazerosa. É da essência de ambos. Fazer o quê? Pedro só chegou à Angélica porque uma amiga comum promovera o encontro e fez-se de cupido. Agora que isso já aconteceu, cabe a eles se entenderem da melhor maneira possível. Mas, infelizmente, está difícil...  

Segundo momento (depois do smartphone): Angélica dá boas risadas enquanto Pedro lê em um site que acessou de seu recém-adquirido smartphone uma piada de salão. Ele também se diverte. E mais, quando no restaurante toca uma música que a ambos traz recordações, mas são incapazes de lembrar o nome da banda, a época e outros detalhes, Pedro faz uma pesquisa no Google e não só obtém as respostas procuradas com ainda se recorda de outras canções da mesma banda. Isso é a dica para que Angélica, agora descontraída, faça comentários sobre os bailinhos de outrora e de amigas que lhe vinham à memória. Planejando uma viagem de férias, é também no smartphone que Angélica busca informações sobre preços e épocas adequadas. O ambiente do restaurante é-lhes muitíssimo propício para a troca de ideias, com informações adequadas e precisas sobre a viagem. E o entrosamento corre fluído como nunca antes. A noite passa agradável...

Perceberam como a tecnologia, se bem entendida e bem usada, pode melhorar a vida de muita gente? Se o casal pertencesse, por principio, ao grupo dos que normalmente refutam novas tecnologias só porque veem apenas os seus malefícios (aqueles 16% da população), então nada poderia ser útil para ajudá-los na melhoria de suas vidas. Tem gente que odeia faca porque com ela pode-se matar alguém, mas se esquece das mil utilidades que tem na culinária e em tantas outras atividades. Odeia carros porque com eles pode-se atropelar alguém, mas se esquece do quão necessários são para o transporte e o lazer. Odeia televisão porque nela se vê tantas bobagens e pornografia, mas desconsidera o que pode obter de informações e de serviços úteis.

Como veem, é uma questão de posicionamento frente à vida. Quem é negativista só vê as coisas pelo lado ruim. Quem é otimista, às vezes, pode até ver somente as coisas boas e inocentemente deixar passar as coisas ruins. O ideal é, portanto, o bom senso; o meio termo; a decisão analisada, ponderada de quem consegue ter uma visão realista, mas com tonalidades de otimismo.

Hoje, quando vejo pessoas nos restaurantes olhando para seus smartphones, sempre penso que elas estão buscando informações que são úteis para se tornar aquele momento mais produtivo e agradável. Nunca imagino que a sua companhia está sendo desprezada só porque o aparelhinho está ligado, pois quando a companhia não agrada não deve ser por causa da nova tecnologia, mas por razões outras que precisam, psicologicamente, antes serem superadas.

Edson Pinto
Abril’ 2014