9 de dez. de 2012

224) MEU LIVRO: DE TUDO UM POUCO...


 A Editora AGBOOK acaba de disponibilizar para encomendas online o meu livro “DE TUDO UM POUCO...” (vide capa na figura acima).

Embora o lançamento oficial nas livrarias aconteça somente após as festas de final de ano - momento em que convidarei os amigos para o evento - estou antecipando a possibilidade de que possam, se julgarem que vale a pena, tê-lo em mãos já de imediato.

Neste meu livro de 272 páginas, falo de tudo um pouco, como sugere o seu título. Posso garantir que se trata de uma leitura fácil, pois publico 80 textos curtos sobre assuntos variados e independentes que pode ser lido em doses homeopáticas.

Muitos dos textos já passaram pelo meu blog pessoal, mas, agora agrupados em quatro temáticas, amor, cotidiano, vida e política e devidamente prefaciado formam um todo que dá bastante sentido às reflexões que venho fazendo sistematicamente sobre temas os mais diversos.

Se quiserem adquirir o livro pela Internet e recebê-lo em casa por SEDEX ou mesmo enviá-lo diretamente para um amigo, como presente, basta clicar no link abaixo ou nos links do título do livro e do nome da editora. O site da AGBOOK está preparado para atendê-los.

Link para acesso à Editora: https://www.agbook.com.br/book/136881--DE_TUDO_UM_POUCO

                                        (orelha da capa)      
                                                                     


(orelha da contra-capa)


 

                                     (contra-capa)


 

28 de nov. de 2012

223) ROBIN HOOD E ÉTICA

Solange estava muito contente com o desempenho de sua empregada doméstica, Zélia. Mesmo antes do nascimento de Pedrinho que já tinha chegado aos oito anos, Zélia já estava lá, cuidando com capricho da casa, preparando o café da manhã, o almoço e o jantar. Passava a roupa da casa e enchia o pimpolho de cuidados quase maternais. Além disso, Solange tinha absoluta confiança em deixar o filho sob os cuidados da fiel e confiável empregada quando precisava, duas vezes por semana, ficar todo o dia fora por conta de um trabalho profissional que exercia. Zélia tinha história e isto colocava Solange na mais absoluta zona de conforto.

Uma coisa, contudo vinha atormentando Solange a ponto de achar-se estressada ou mesmo vitima precoce desses males que caracterizam a velhice. Estava com a memória fraca e com isso perdendo o controle da própria rotina doméstica: Cada vez mais ela sentia falta de objetos que lhes eram importantes. Um dia dava pelo desaparecimento de uma determinada peça de seu vestuário. Onde a deixei, meu Deus? Outro dia, não conseguia compreender como aquele colar que tanto gostava já não era mais encontrado. Será que o perdi em minhas saídas de casa? Alguns trocados que deixara sobre a banqueta do quarto tinham, misteriosamente, também desaparecidos. Pode ser que nem cheguei a deixá-los ali, exclamava de certo modo conformada com a situação. Tudo era possível – concluiu - menos que Zélia tivesse algo a ver com isso. Zélia tinha história e suspeitar dela não fazia o menor sentido.

Por via das dúvidas, e aconselhada por uma amiga, Solange instalou de forma muito discreta algumas câmeras em pontos estratégicos de sua casa. E foi com doída surpresa que as gravações feitas revelaram uma Zélia que ela desconhecia: Zélia levava roupas de Solange, limpava os bolsos das calças de seu marido, vasculhava assiduamente as bolsas da patroa e até foi flagrada com um namorado muito estranho no quarto do casal. Não era a Zélia que Solange imaginava. O que fazer agora?

A amiga disse: Demita-a de imediato! Solange ponderou: Mas ela é tão útil para nossa família. Quem vai fazer o café da manhã, cuidar do Pedrinho, arrumar as camas, limpar os móveis, nos preparar o almoço e o jantar? Zélia tem uma história importante lá em casa. Penso que devo relevar essas ocorrências. Talvez devesse fazer uma conversa com ela. Explicar que essas coisas feias não devem ser feitas e perdoá-la. Você não acha? A amiga, perplexa, simplesmente abaixa a cabeça e diz candidamente: Você é que sabe! Em seguida, faz meia volta e deixa a amiga Solange ruminando, sozinha, o dilema ético que deveria enfrentar.

À noite, na TV, ao lado do marido, aguça sua atenção no noticiário que relata o desenrolar do julgamento do Supremo da ação penal do mensalão. A defesa enfatiza que José Dirceu, José Genoíno e outros arrolados deveriam ser perdoados pela história de cada um. Tinham lutado pela democracia contra o regime de exceção instalado em 1964. Foram presos, anistiados e agora que chegaram ao poder com o seu projeto de governo popular haveriam de ser compreendidos com heróis e não como vilões por terem articulado os malfeitos que surrupiaram milhões e milhões dos cofres públicos. Afinal, Lula já tinha perdoado Sarney porque o homem também tinha história. Seria algo como uma caderneta de crédito e débitos onde os envolvidos tinham mais pontos a favor do que contra?

A questão era puramente de ética. Poderia alguém ter direito a praticar intencionalmente atos condenáveis só porque já havia feito, anteriormente, outros bons? Alguém pode agir de forma ética e aética ao mesmo tempo e considerar isso normal? Embora romântica, a história de Robin Hood, aquele que roubava dos ricos para distribuir aos pobres, faria ainda sentido nos dias de hoje? E quando o que parece ser uma questão de justiça não mascara interesses pessoais escusos?

Solange, ao ver a condenação dos mensaleiros pela quase totalidade dos juízes, exceto pelos dois que todos sambemos, viu que o caminho correto era o da ética. Há de ser honesto e ético a todo o momento de nossas vidas. O apelo à história que se construiu ao longo dela só se justifica quando for para dar reforço aos bons atos que se pratica e nunca para compensar as más condutas. Pensando como o mundo seria muito melhor se as pessoas agissem com ética e não com farsas decidiu pela demissão de Zélia. É verdade que chorou muito e lamentou que tivesse que rever toda a sua comodidade de vida por sentir-se compungida a respeitar um valor maior que era o do comportamento correto. Era o que ela valorizava e era ainda o que o nosso Supremo também quis nos ensinar...

Edson Pinto
Novembro’ 2012

16 de nov. de 2012

222) LIBERDADE

“A liberdade, Sancho, é um dos dons mais preciosos que aos homens deram os céus: a ela não se podem igualar os tesouros que a terra encerra nem que o mar encobre; pela liberdade, assim como pela honra, se pode e se deve arriscar a vida e, ao contrário, o cativeiro é o maior mal que pode ocorrer aos homens” (Miguel de Cervantes em Dom Quixote de la Mancha)

Quem em algum momento na vida já tenha lido a grandiosa obra de Miguel de Cervantes, Dom Quixote de la Mancha, certamente se lembrará da frase acima reproduzida. Ela foi proferida pelo personagem ingênuo, desmiolado, mas, no fundo, um verdadeiro filósofo, Dom Quixote, ao seu fiel ajudante, Sancho Pança. A razão pela qual empreenderam aquela pitoresca odisseia pode ser resumida na mencionada magistral frase. Não é por outra razão que essa obra de Cervantes, verdadeira paródia dos romances de cavalaria da época, é considerada como uma das melhores já escritas em todos os tempos. E não é para menos: Cervantes toca em temas que são cruciais a toda a humanidade, entre os quais, a liberdade.

Vivemos constantemente à busca da liberdade, mesmo que não nos demos conta disso. Parece-nos e, de fato é, algo que podemos considerar inato à nossa espécie. Encontra-se gravado em nossos genes o anseio por liberdade e é por ela, mesmo que de forma inconsciente, batalhamos no curso dessa breve passagem terrena. Somos criaturas dotadas da faculdade de ação segundo as nossas próprias vontades. O que nos limita o exercício irrestrito e irracional dessa prerrogativa é-nos, contudo, benéfico por razões mais nobres. Consideramos a submissão aos limites impostos pelas leis, pela ética e pelos bons costumes apenas e porque eles são garantidores do bem maior que é a harmônica convivência social.

Contudo, privar-se da liberdade que poderia ser exercida dentro dos limites social e moralmente impostos, é atitude típica dos fracos. Os fortes, ao contrário, alavancam suas motivações para a grande batalha da vida exatamente no conjunto de restrições que vão encontrando ao longo do caminho. A expressão, muitíssimo comum, de “matar um leão a cada dia” retrata com simplicidade o que é a batalha pela sobrevivência digna. Claro que estou falando das restrições a liberdades lícitas, isto é, aquelas que pela força do contrato social não ferem a obrigação de respeitarmos certas regras, desempenhar certos procedimentos e respeitar direitos dos outros. Não faz sentido arrogar a si o direito inato da liberdade para produzir malfeitos. Não se deve roubar, nem trapacear, nem praticar quaisquer outros deslizes, pois isso fere direitos e liberdades dos semelhantes. Mas, lutar pelo direito de expor suas ideias, de exercer um trabalho legal, de ir e vir, de votar e ser votado sob as condições da lei, de prosperar intelectual e materialmente dentro das normas vigentes, isto sim é a legitima utilização da liberdade que nos deu o Criador e que se constitui no verdadeiro sentido da vida.

Nos dias que correm, há em nossa nação um verdadeiro clamor por justiça no caso ora em julgamento referente ao chamado “mensalão”. Em uníssono, vozes populares bradam por punições àqueles que malversaram as coisas públicas para benefício de objetivos escusos. Não vem mais ao caso discutir agora se agiram certo ou não, pois pelos mecanismos institucionais de apuração dos fatos e respeitados o universal direito ao contraditório, já ficou sobejamente provado que erraram sim. Por isso, devem pagar pelo que fizeram. E o pagamento se dá de várias formas. Cito apenas três delas: manchando o nome dos malfeitores pela perda do respeito da sociedade; reembolsando valores apropriados de forma indevida e por último, mas, a mais importante das três, cerceando a liberdade dos condenados.

Aqui está, portanto, o busilis, ou seja, o “xis” da questão: Imaginam os condenados que perder o prestígio social é algo até reversível, pois muitos no passado já o fizeram. Por que eles também um dia não dariam a volta por cima? Reembolsar o dinheiro desviado é outro obstáculo contornável, pois, hábeis que são nas coisas da locupletação, nada os impediria de encontrar uma forma de liquidar a fatura. O que não há remédio é para os males decorrentes da perda da liberdade. Liberdade de ir e vir quando quiserem, de estar com os entes queridos e amigos na hora de suas conveniências, de participar da vida social sem restrições, de comer o que lhes apetece e de mandar seguindo os próprios instintos. E o pior - agora candidamente confessado pelo nosso ministro da Justiça - encarcerados em presídios que de tão impróprios levam a pensar ser preferível morrer a neles ter que cumprir pena...
Não quero ser vingativo a ponto de desejar para os condenados do mensalão o inferno dos presídios brasileiros. Nem desejo o mesmo para quaisquer outros malfeitores que por lá já se encontram ou que para lá ainda irão. Penso, contudo, que para a turma do colarinho branco que sempre conseguiu se safar da cruel punição do encarceramento fique a lição para que não seja tentada a trair a confiança do povo e os princípios da república. Afinal, é como disse Dom Quixote ao seu fiel escudeiro Sancho Pança: “O cativeiro é o maior mal que pode ocorrer aos homens”

Edson Pinto
Novembro’2012

8 de nov. de 2012

221) A PRAGA DO MONOPÓLIO

Sábado, 10 horas da manhã, com um envelope a ser expedido nas mãos vou à agência dos Correios mais próxima de minha casa. Na porta uma plaqueta: “Funciona somente de 2ªs às 6ªs”. Pego o carro e vou à seguinte. Outra plaqueta dizendo que não abria no dia. Novamente, pego o carro e já estou a mais de 10 quilômetros de casa e adivinhem? A terceira agência - esta operada diretamente pela EBCT - nem mesmo uma plaqueta de horário ostentava, mas sim uma grossa corrente fechando a sua porta. Claro, também não funcionava nesse dia.

Volto pra casa frustrado e, já conformado, leio no jornal do dia que a EBCT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), judicialmente, havia conseguido impedir que o Consulado Americano de São Paulo parasse de enviar passaportes que lá estavam para a obtenção de visto, por quaisquer outras empresas que não fosse a monopolista EBCT, os Correios. O judiciário acolhera os argumentos da Estatal, pois o artigo 21, inciso X, da Constituição Federal de 1988, reza que “compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”. Assim, a lei 6.538/08 que regulamenta a atividade dos correios é constitucional e que a entrega de correspondências é um serviço público e não uma atividade econômica.

Lembrei-me ainda de outro contencioso pendente: A SABESP modernizou e reduziu o custo de faturamento de forma bem criativa: Um funcionário com uma maquininha lê o hidrômetro de nossas casas e imediatamente imprime a conta que nos é entregue no ato. Maior velocidade, precisão do trabalho, pois elimina etapas posteriores sujeitas a erros e baixo custo. Sabe o que anda acontecendo? A EBCT obteve liminar que proíbe o procedimento, obrigando parte de São Paulo a receber as contas pelos Correios. Onde estão os princípios da racionalidade, do bom-senso e do menor custo? O consumidor que se lixe pagando o custo da burocracia e do monopólio estúpido...

Paremos, no entanto, por aqui e façamos três perguntas pontuais:

Primeira: Se entregar correspondência é atividade tipicamente pública, então o que não dizer da Educação, da Saúde Pública (que é pública até no nome) e da Segurança, também pública?

Segunda: Em sendo estas também de interesse público, por que o Estado não organiza, opera e arca com todo o custo do sistema de educação, saúde e segurança, poupando-nos de custear a educação dos filhos em escolas particulares, pagar planos de saúde e contratar vigilantes particulares para nos dar segurança no condomínio?

Terceira: Por que considerar a entrega de um envelope como sendo algo do maior interesse público, atividade protegida pelo Estado, se, com a evolução dos meios de comunicação, a carta nos moldes tradicionais está perdendo para o ciberespaço onde velocidade e confiabilidade estão disponíveis a custo acessível, menor - me arrisco a dizer - do que o custo de postagem de um mero envelope pelos Correios?

As respostas? Só não as vê quem não quer. Explico melhor: No passado quando as comunicações e o transporte eram atividades penosas e custosas, até justificava a intervenção e o domínio do Estado para garantir integração e cidadania. Poucos empreendedores se disporiam a manter atividade econômica para prover um rincão de um serviço básico de comunicação, incluindo a prosaica distribuição de correspondências e telegramas. Nos tempos atuais, contudo, em quase todos os países de vanguarda as atividades de seus correios, incluindo telefones e telégrafos, já foram privatizadas. A razão é óbvia: Na iniciativa privada, sob o rigor da concorrência os custos são menores e os serviços melhores.

Mas isso não vale para o Brasil? Claro que sim! Exceto pelas nossas particularidades em gerir o leviatã que nós mesmos criamos. Como abrir mãos de uma empresa gigantesca com receita garantida pelo monopólio de muitos bilhões de reais e dezenas, senão centenas, de belos cargos que podem ser manipulados pelos partidos políticos e de lá sacados consideráveis valores para os fins escusos dos quais já estamos sobejamente cientes?

Não! Nada será feito para que eu, como um simples cidadão, tenha o envelope despachado no sábado; nem que os nossos passaportes nos cheguem rapidamente para viabilizar uma viagem ansiosamente aguardada; nem que o custo Brasil seja reduzido e o País consiga ser competitivo no mercado internacional e nem mesmo para que os Maurícios Marinho, os Waldomiros Diniz e os Carlinhos Cachoeira se afastem das tetas da EBCT para satisfação de transações tenebrosas.

Já que falei da tecnologia moderna em comunicações de que já dispomos, incluindo a Internet, vejo-me na obrigação de justificar o porquê andava eu a procura de uma agência dos Correios em pleno sábado quando poderia alternativamente usar o meio eletrônico. Na verdade, eu precisava enviar uma ficha chinfrim sobre um livro para a Fundação Biblioteca Nacional, FBN, que fica no Rio de Janeiro. Pelas normas da importante entidade, considerada pela UNESCO como uma das dez mais importantes do mundo, infelizmente, tal ficha só pode ser enviada pelos Correios e não por meios eletrônicos.

A propósito, a FBN, antiga Real Biblioteca fundada por D. João com base no acervo trazido de Portugal quando a família real por aqui aportou em 1808, tem sua diretoria nomeada pelo presidente da República, portanto, com sabor, textura e aroma bem estatais. Fico a pensar: Será que, por ser órgão estatal, não anda a fazer o jogo da proteção dos monopólios, neste caso, gerando clientela e faturamento para os Correios? Afinal, se a EBCT um dia vier a ser privatizada ou ganhar concorrentes, seca-se mais umas das tetas nas quais políticos espertalhões já se acostumaram a mamar...

Edson Pinto
Novembro’2012

1 de nov. de 2012

220) AOS TRANCOS E BARRANCOS

Há várias formas de se avaliar o crescimento de um país. Os indicadores econômicos e sociais apurados e divulgados por entidades sérias são, evidentemente, os mais confiáveis e os que deveriam servir de fundamentos para nossas lucubrações. Inundam os jornais diários, as revistas semanais, a TV e fazem a festa de quem - para o bem ou para o mal - se utiliza deles. Na banca de revista, diante a tantas cifras e análises não nos resta outra coisa, principalmente para os mais coroas, senão nos lembrar da famosa canção dos anos 60, de Caetano Veloso, no Festival da Record e perguntar: Quem lê tanta notícia?”

O que não nos faltam são estatísticas de tudo, indicadores de desempenho disso, daquilo, IDH, índice de felicidade, PIB, arrecadação tributária, índice de alfabetização, resultados da balança de pagamentos, da balança comercial, taxa de mortalidade infantil, nível de emprego, movimento das bolsas de valores, entrada de capital estrangeiro no País e tantos outros. Os que são bons enchem os governos do momento de orgulho. Os ruins, normalmente, turbinam os argumentos da oposição. E assim a vida segue...

Na posição de simples cidadãos que vivem o cotidiano, às vezes o que mais nos vale é a observação direta, empírica, daquilo que se capta da experiência que a vida nos proporciona. Não é cientifico - eu sei - mas não há como negar que até mesmo as ciências se constroem sobre a observação metódica do que é real, palpável, visível e sensível. É sob este ponto de vista que quero transmitir a avaliação que venho fazendo em anos recentes:

Há quase 40 anos morando entre São Paulo e em outras plagas, vez por outra faço viagens de cunho familiar até Belo Horizonte pela Rodovia Fernão Dias. Quantas vezes, no passado, não amaldiçoei a estrada que era de pista única e perigosa bem como os precários restaurantes de que dispúnhamos em seu percurso. Além disso, condoia-me com a feiúra e pobreza das pequenas cidades que ia apreciando enquanto avançava na mal conservada estrada, única a ligar dois dos mais importantes centros urbanos do País. Não havia outro jeito. Era aquilo ou uma viagem aérea que levava de aeroportos ruins para outros piores. A viagem, como podem imaginar, era um horror. Salvo as maravilhosas montanhas de Minas que sempre estiveram lá, por obra do Criador, tudo o mais que fora feito pelo homem deixava muitíssimo a desejar.

De algum tempo para cá e fazendo a mesma viagem, observo que o cenário mudou muito, e para melhor. A antiga estrada está toda duplicada e privatizada. Há muito mais segurança e conforto. O asfalto tem sido constantemente renovado, restaurantes e postos de serviços bons surgiram quase que por encanto e a paisagem urbana das pequenas cidades que se consegue observar da estrada demonstra progresso nunca antes visto. Normalmente, divido minha viagem em duas partes: Vou até Três Corações que dista exatos trezentos quilômetros de São Paulo, onde tenho parentes, e depois, se for o caso, sigo até Belo Horizonte.

Já deixando São Paulo, logo após Bragança Paulista, entro em Minas tendo a sua primeira cidade, Extrema, como um verdadeiro cartão de visitas. Há um grande parque industrial florescendo à beira da estrada. Empresas recém-instaladas ali com galpões gigantescos que ostentam placas vistosas. A cidade, para quem puder observar à direita, está repleta de bairros novos e construções de bom nível. Prossigo passando por Itapeva, Camanducaia, Cambuí, Pouso Alegre e outras cidades até chegar a Três Corações no entroncamento com a estrada de Varginha.

Tudo o que observo ao redor me parece mais atual. Vejo dinamismo, vejo progresso. Admiro os cafezais verdejantes que antes não existiam, as fazendas salpicadas de gado branquinho, campos de morangos a perder de vista e prédios novos nas cidadezinhas. Penso se não seria melhor apenas casas, tendo tanto terra disponível? Mas, acho que, para aquela gente, morar em prédio deve ser uma questão de ascensão social. Por isso, imagino, lá estão eles cada vez em maior quantidade para confirmar que o Brasil dos rincões também é próspero.

Em Três Corações, por sinal a terra de Pelé que acaba de homenageá-lo com a revitalização de sua casa natal, 72 mil habitantes, sinto-me ainda mais confortável. Do 9º andar do prédio, apartamento de minha mãe, lanço olhar no horizonte e não vejo favelas, não vejo ruas sem pavimentos, não vejo a miséria que era a marca registrada da paisagem urbana brasileira. Carros novos deslizam por ruas bem conservadas, enquanto parques e clubes da cidade acolhem a todos indistintamente. O sino da matriz toca como sempre, o Rio Verde que faz três caprichosos meandros no formato de corações dentro da cidade segue sereno, indiferente à locomotiva que sobre uma de suas pontes apita rouca levando minério, trazendo carvão, levando bobinas de aço de e para o mundo.

Fico pensando: Que bom que já começamos a perceber que o nosso país tem também o seu próprio “destino manifesto”. Sabemos que há ainda muito por ser feito. Estamos distantes dos níveis de qualidade de vida de muitos países, mas devemos reconhecer que, mesmo aos trancos e barrancos, a vida caminha para melhor. É aqui que reside o ponto fundamental da cidadania: Não devemos, como no passado, achar que tudo vai bem e assim placidamente deitarmos no berço esplendido deixando que os velhacos de sempre usurpem as nossas riquezas e as nossas almas. Mesmo que a política continue sendo uma atividade eivada de más condutas, não devemos perder a noção de que ela é essencial.

Quando tivermos completado a faxina que a política nacional necessita, como a do atual julgamento do mensalão e outras tantas que estão na fila, alguém ainda será capaz de duvidar do futuro brilhante nos aguarda?

Vejam que, mesmo com todos os problemas que temos, esta terra abençoada consegue produzir e mostrar o que pode. Vamos continuar andando firmes como nos sugere o comercial de uma famosa marca de bebidas.

Keep walking, Brazil!

Edson Pinto
Novembro’2012

22 de out. de 2012

219) AVENIDAS VAZIAS DO BRASIL

Convenhamos! O poder da Globo para fazer nossas cabeças é algo tão forte que já faz por merecer dos bons cientistas sociais análises antropológicas de cunho cultural profundas. É de se tirar o chapéu para a capacidade da emissora em pautar nossas vidas, de nos reter em casa quando quiser, de deixar restaurantes, teatros e cinemas às moscas, de parar o trânsito caótico das nossas megalópoles e ainda de nos convencer de que o “mundo”, literalmente falando, acompanhava extasiado o fenômeno da novela brasileira.

Há de se reconhecer que poucas pessoas teriam argumentos fundados para desqualificar a novela “Avenida Brasil” que teve o seu apoteótico capitulo de encerramento neste último final de semana. Como outras grandes produções da emissora, a citar Irmãos Coragem, Selva de Pedra, Pecado Capital, Roque Santeiro, O Bem Amado, Vale Tudo e Passione, esta também mexeu com a família brasileira. Mas, não precisava - admitamos - do estado de quase comoção nacional no qual a Globo, inteligentemente, nos fez enredar.

Primeiro, lançando mãos do seu fenomenal expertise em gerar emoções e utilizando-se do seu alto grau de penetração nos lares do País criou, na semana que antecedeu ao final da novela, um clima de expectativa e suspense. Em seguida, induziu-nos, como fazem as pesquisas eleitorais marotas e como ela mesma já faz com o tal do Big Brother Brasil, à situação de elevado interesse por um tema corriqueiro. Isso se faz com entrevistas com meia dúzia de fanáticos pelo assunto, divulgando-as como se fossem uma amostra altamente representativa da população. Cria-se, desse modo, os fenômenos popularmente chamados de “Maria-vai-com-as-outras” e “efeito manada”. Tudo assim feito, e com o elevado padrão global, a sexta-feira, 19 de outubro, à noite, foi de ruas e avenidas vazias, pois a nação, em peso, ficou a roer unhas em frente à telinha para ver o grande desfecho do folhetim.

Diziam serem cinco os desfechos possíveis para a novela. Como ficção, tudo bem, mesmo que muitos deles desafiassem a lógica com a qual os telespectadores atentos vinham considerando consentâneas com o principio da verossimilhança e expectativas de ordem moral. Vale dizer: Quem peca - para exemplo à sociedade - deve ser punido; quem fez o bem deve vencer. De certo modo, isso até aconteceu, mas, eu faria um final diferente. Já que o autor tinha várias alternativas para o encerramento da novela, eu me atrevo a conceber outra que combinasse a lógica da trama como os propósitos econômicos maiores da emissora. Vejam como seria:

DESFECHO DO NÚCLEO PRINCIPAL

Jorginho faz, neste último capitulo, a sua única coisa útil durante toda a novela: Ao preparar a entrega do resgate exigido por Santiago, compra duas malas Primicia, Sierra, preta, com rodinhas iguaiszinhas (merchandising, $$$). Numa, como de fato fez, coloca os R$20 milhões. Noutra, coloca vários produtos comprados às pressas nos Supermercados Carrefour (novo merchandising, $$$). No momento da entrega da mala, o jovem deliquente, Lúcio, é forçado pela mãe, Janaína, a trocar a mala dos seqüestradores da mesma forma que fizera com a mala de Nina onde Carminha havia colocado droga para incriminá-la.

Santiago e Carminha logram fuga usando o jatinho Legacy 650 da Embraer (outro merchandising, $$$), enquanto a família de Tufão, incluindo o detetive Zenon que passou a novela inteira sem desvendar um único mistério, fica a observar o avião tomar altura. Dentro do avião, Carminha e Santiago em gargalhadas febris abrem a mala para ver a dinheirama que lhes proporcionará uma vida paradisíaca. E o que encontram? Um saco de arroz Tio João, parboilizado, 5 quilos, sobre o qual a câmera dá um zoom (novo merchandising, $$$). Reviram, nervosamente, a mala e encontram, igualmente exibidos pelas câmeras na forma de zoom, Margarina Qualy, cremosa da Sadia, Café do Ponto, “a paixão por café”, Leite Parmalat, Longa Vida, Suco de Uva Maguary, concentrado, e vários produtos que tornam o dia a dia da dona de casa mais fácil e saboroso (merchandising, merchandising, merchandising, $$$)

Desesperados com a armadilha em que caem, Carminha vale-se de uma garrafa de azeite da marca Gallo, extra virgem, baixa acidez, em promoção no Carrefour, dois por R$18,00 (novo merchandising, $$$) e nocauteia o piloto do jatinho. Da terra, Tufão e família presenciam o mergulho mortal do jatinho seguido de enorme explosão. Pronto! Os malfeitores pagam assim tudo o que de ruim fizeram.

DESFECHO DO NÚCLEO DO DIVINO

Adauto fora companheiro de futebol de Tufão. Este já aposentado há muito. Como poderia, então, estar Adauto ainda em forma para aquela partida final do campeonato? Na minha versão, Adauto havia se tornado o presidente do Divino Esporte Clube. O adversário que arruinara a sua vida no passado quando soprou-lhe o segredo, motivo de seu grande trauma, agora é o técnico do time adversário. Marcado o pênalti, Diógenes interfere e relembra Neném Prancha, o filósofo do futebol que todo apreciador de futebol conhece e diz: “Pênalti é tão importante que deve ser cobrado pelo presidente do clube”.

Tudo assim posto, Adauto desce das arquibancadas, entra em campo, faz cara de homem inteligente e sob suspense geral bate o pênalti. A galera grita: Gol, gol, gol! Adauto corre até o técnico adversário, seu algoz do passado, enfia a mão no bolso e tira uma legitima e revolucionária chupeta Avent, bpa, transparente da marca Philips levando-a a boca. Close na chupeta (merchandising final, $$$). Enquanto seu rosto empalidece, a palavra FIM surge lentamente na tela...

Edson Pinto
Outubro’ 2012

14 de out. de 2012

218) O VOTO DO PERNILONGO


Lá vem o segundo turno para vários municípios onde os prefeitos não foram eleitos por maioria absoluta neste último sete de outubro. Como é sabido, isso se aplica quando a cidade tem mais de 200 mil eleitores e o vencedor do primeiro turno não consegue obter 50% + 1 dos votos válidos. Por essa razão, muitas cidades, especialmente capitais de estados por serem as maiores, voltarão obrigatoriamente às urnas. Independente, contudo, da situação de cada município, há, no meu sentir, lições que podemos extrair do pleito eleitoral:

Aqui no meu discreto enclave da área metropolitana da capital paulista, Santana de Parnaíba, que nem na regra de segundo turno se enquadra, fomos surpreendidos com o fato de o candidato até então menos cotado, em flagrante contrariedade às pesquisas, acabar empunhando o cetro de alcaide-mor da municipalidade. O prefeito atual, figura simpática, homem sério, bom gestor, ainda jovem e escolado nas artimanhas da política tinha atributos mais do que sólidos para somar aos seus quatro anos de vereador e mais doze de prefeito do município, mais quatro outros. A enquete da publicação Folha Paulistana de 5/10/12, dois dias antes da eleição, mostrava sua vitória esmagadora com 72% dos votos contra 25% do segundo colocado.

Mas aí apareceu um pernilongo na história. Na verdade, milhares, milhões... Exatamente, aqueles que ficam na espreita até a tardinha começar a se fazer e então pulam para dentro de nossas casas para fazer do nosso sangue o vinho da sua festa. O prefeito disse que não. Até relevou publicamente uma das metas do opositor quando este estampou como promessa de campanha o “combate ao pernilongo”.

Coitado do pernilongo! Seria justo atribuir a esse minúsculo díptero que já nos é tão familiar a proeza de ser protagonista na mais nobre das faculdades do sistema democrático que é o voto? Não! Assim diziam muitos, inclusive o prefeito. Há, sim, temas maiúsculos a serem sopesados, como o do trânsito cada vez mais caótico, o elevado valor do IPTU (dizem o mais alto do Brasil), o da segurança pública, súplice permanente de melhorias, a verticalização exagerada das construções, mas, o pernilongo? Isso não!...

Fechadas, isto é, desconectadas as urnas eletrônicas, foi necessário pouco mais do que uma hora para termos a revelação de que o 72% virara 47% e, o antes 25%, virara 52%. Uns juram que as pesquisas e enquetes amplamente divulgadas eram enganosas, vale dizer, feitas apenas para induzir o voto daqueles que mesmo indecisos não gostam do sabor da derrota. Outros dizem que é o conjunto dos fatos que se impôs no momento crucial em que os cidadãos assentam suas mentes para determinar o destino do seu voto, na véspera ou mesmo no dia do pleito. Outros ainda atribuem à sede de mudança que ora se apodera de mentes e corações do eleitorado cada vez mais crítico. Haveria um clamor latente de mudança ávido para explodir como as flores primaverais do pós-equinócio do hemisfério sul, mesmo que seja mudar apenas por mudar?

O Supremo acaba de carimbar de impróprias as estripulias da cúpula do PT e de gente de diversos outros partidos que se lambuzaram nas tetas generosas da mãe pátria, tudo com base num estranho projeto de perpetuação de poder. O auspicioso desenrolar do julgamento do mensalão estaria re-injetando ânimo na cidadania já desesperançada quanto ao rumo da política, de tal modo que a encorajou a fazer mudanças? Mudança de nomes, mudança de partidos políticos, mudança de projetos de governo, de práticas comunitárias ou de qualquer outra espécie uma vez que ficar sempre no mesmo é se conformar com o imobilismo...

Acho que tudo isso é possível, inclusive e principalmente o despertar das consciências de que a política, embora nos pareça ser uma atividade humana abominável, é-nos muitíssimo importante para o ideal de uma vida social equilibrada e digna. A ministra Carmem Lúcia do STF não conclamou os jovens a não desistirem da política porque a alternativa a ela seria a guerra? Então? Deve ser isso o que anda acontecendo Brasil afora, embora em uma magnitude ainda pequena, porém crescente. Já temos a lei da ficha limpa para barrar os carimbados pela Justiça. Já temos um caso exemplar de condenação de malfeitores como nunca antes acontecido no País, demonstrando que as instituições da Republica podem funcionar, sim senhor...

Aqui, contudo, tenho suspeitas de que mais do que o quadro geral que esbocei acima algo tacanho possa ter influenciado o voto do munícipe. Aceitem minha tese, ou não, propugno que os pernilongos da redondeza fizeram a diferença. Afinal, mais do que qualquer outro meio de comunicação de massa, eles desempenharam um papel fundamental na escolha do novo prefeito. Somente eles e não mais ninguém poderia fazer com eficiência o que todo candidato sonha: transmitir de forma audível e diretamente no ouvido de cada eleitor uma mensagem política útil. Os nossos pernilongos foram e continuam sendo invencíveis nesse mister...

Edson Pinto
Outubro’ 2012

4 de out. de 2012

217) EXCELÊNCIA


Por nada neste mundo dona Florinda abriria mão de sua soneca vespertina. Era sagrado: Após o almoço, acomodava-se em seu quarto e só se dava por satisfeita lá pelas quatro quando o aroma de café recém-coado vinha da cozinha. Aos oitenta e pico vivia tranquila, boa saúde, filhos e netos criados. Seu Amoroso já tinha partido há algum tempo, mas deixou-lhe a vida bem estruturada. Morava perto de filhos e netos, mas sempre sozinha, pois não abria mão de continuar dando as cartas no que considerava ser o seu território inexpugnável, a casa em que morava.

Sozinha, em termos, pois tinha a presença de Joselina, a empregada de confiança. Era Joselina quem fazia o almoço, arrumava a casa e paparicava dona Florinda a não mais poder. Entendiam-se perfeitamente. E na falta de interlocutores outros, era entre si que trocavam pontos de vista sobre o cotidiano, sobre as picuinhas da política, o tempo seco, o tempo chuvoso, o nível do rio que não parava de subir ou baixar, a vida... A sesta de dona Florinda era, no entanto, como um rito sagrado a ser respeitado acima de quaisquer outros compromissos.

Mas, aí apareceu o julgamento do Mensalão. Dona Florinda, sempre antenada nas coisas do mundo, não demorou a perceber que a sesta sagrada lhe roubava aquele grandioso prazer de assistir o melhor programa que já vira na TV. Nem os três volumes de “Os Miseráveis”, de Victor Hugo, que já tinha a leitura por finalizar não lhe traziam tantas emoções. Para surpresa, numa rara decisão que contraria a arraigada mania dos seres provectos de não mudar seus hábitos, ela decide sacrificar, nas terças, quartas e quintas, a sua soneca vespertina. Não tem preço assistir a um entrevero entre Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, assentiu dona Florinda.

E, lá pelas 14 horas, já está em frente à TV, impaciente, porém feliz, aguardando o inicio de mais uma sessão do Supremo. Com a mente ágil que tem, não só se apega ao mérito dos debates como ainda observa, condoída, o balé do relator para mitigar a sua permanente lombalgia. Coitado! Como um homem desses, com tal incômodo físico, tão dedicado ao ofício, e tendo produzido um relatório tão bem fundado e demolidor contra a camarilha dos 38, não pode, às vezes se exasperar com os flácidos contra-argumentos do revisor? Desabafa com Joselina.

Joselina, por sua vez, sempre às espreitas, também cismou de acompanhar o Mensalão. E não é que se aguçou, igualmente, em tirar o máximo de proveito do montão de novidades que se lhe apresentavam. Não foram necessárias mais do que cinco sessões do Supremo para que Joselina substituísse o familiar “dona Florinda” por algo ainda mais politicamente correto: “Vossa Excelência”, para se dirigir à estimada patroa.

Um dia desses, para discordar da forma como dona Florinda a repreendera por não lograr a correta preparação de uma substanciosa salada para o almoço, a que, pejorativamente, a patroa chamara de “Saladão”, usou um solene “data venia”. Quando dona Florinda (coisa de velho, é claro) voltou a insistir na queixa, Joselina saiu-se com o defensivo argumento de que dona Florinda, estava incorrendo em um evidente “bis in idem”.

Por fim, instada a falar menos e a fazer mais, numa clássica advertência de que quem mandava na casa era dona Florinda, Joselina recorreu ao seu sagrado “direito ao contraditório e da ampla defesa” e insinuou que estava sendo vitima de perseguição política. Tentou, no limite, argumentar que o “Saladão” nunca existira e que o problema do almoço mal preparado não passava de verduras “não contabilizadas”, isto é, não agregadas a ela.

Foi lá pela vigésima sessão do Supremo quando Joselina apareceu com uma capinha preta sobre os ombros é que dona Florinda percebeu que as coisas não andavam bem. Joselina estava mais para Ricardo Lewandowski, para Dias Toffoli e para Márcio Thomaz Bastos, enquanto ela, Florinda, continuava se condoendo com a cervical de Joaquim Barbosa. Decidiu, então, desligar a TV, retornar às antigas sestas diárias e se informar sobre o julgamento somente nos jornais noturnos quando Joselina já tivesse se recolhido.

Afinal, não há quem agüenta um desfecho tão longo para uma punição tão clara, tão necessária e mais do que previsível, mesmo que joselinas achem que o Direito pode ser entortado fazendo-se do mal o bem...

Edson Pinto

Outubro’ 2012

20 de set. de 2012

216) O PROBLEMA DO JÔ


Sem querer praticar um trocadilho infame, refiro-me, via o título desta crônica, ao nosso famoso e muito querido comediante, escritor, artista plástico, dramaturgo, diretor teatral, músico, ator e apresentador de televisão, José Eugênio Soares, o Jô Soares. O trocadilho se impõe por essa sua última habilidade, a de apresentador de TV, que chega aos nossos lares em horário incerto, exceto de que é sempre bem depois da meia-noite, ou seja, “O Programa do Jô”.

Quem nunca ficou até mais tarde prejudicando o seu sagrado e necessário sono reparador para acompanhar a entrevista previamente divulgada de uma figura notória ou de uma pessoa especialista em um determinado tema de seu interesse?

Eu, vez por outra, dou-me a essa irresponsabilidade de ir para a cama lá pelas 2 da manhã, porque a entrevista fartamente anunciada parecia-me compensadora. O próprio Jô já é, em si, uma figura muitíssimo agradável. Não sei se é porque todos os gordinhos, em geral, são simpáticos, ou se é pela história que ele construiu ao longo de tantos anos de TV e que nos estimula a admirá-lo e a assisti-lo. Certamente, ninguém deve apegar-se ao querido artista por apreciar a sua performance chinfrim no mini bongô que normalmente faz para dar brilho a sua entrada no programa. Trata-se de um artista, e isso, por si só, já é mais do que suficiente para perdoar-lhe a desnecessária exibição da sua pobre faceta como músico.

Não há, entretanto, como deixar de reconhecer que a sua simpatia e a sua veia humorística dão às suas entrevistas uma característica toda especial. É sempre uma entrevista leve, intimista, recheada de pitadas de humor que não só podem aliviar a eventual aridez do tema tratado como ainda tornar o momento mais relaxante. Contudo, o que ultimamente venho percebendo é que toda a “mise-en-scène” do Jô, em geral, põe a perder o conteúdo que poderíamos extrair da entrevista. Poderíamos supor uma de duas hipóteses: O entrevistador Jô Soares nunca está devidamente preparado para fazer a entrevista, o que demonstraria uma fraca produção a suportá-lo, ou deve-se a tendência do artista ao improviso fazendo-o passar sobre a pauta para priorizar seus gracejos, sua indiscutível especialidade.

Tudo bem! Ele é um humorista acima de quaisquer outras atividades. Porém, do ponto de vista de quem espera uma contribuição cultural, científica e histórica a ser extraída da entrevista, isso soa como a mais pura perda de tempo. Perde-se assim o precioso sono e vai-se para a cama com a sensação de que o sacrifício da vigília não compensou. Todos aqueles gracejos superficiais que ficavam muito bem quando ele atuava na “Família Trapo” ou no “Viva o Gordo” ou ainda em suas engraçadas performances no teatro se esvai pelo desperdiço da oportunidade de ter feito uma entrevista consistente.

Sugiro que façam uma experiência para verificarem se o meu ponto de vista procede. Peguem uma entrevista qualquer de cujo tema você tenha algum domínio. Tenho certeza de que ao final da entrevista você estará decepcionado com a contribuição que foi legada aos ouvintes do seu auditório ou a nós, os telespectadores.

Cito um caso: Em 15/8/2012, Jô Soares levou ao seu programa a bióloga e taxonomista Marie Bartz para falar sobre os seus estudos dos animais anelídeos e sua importância para a vida no planeta. Esperei pela entrevista, pois gosto do tema. O que assisti? Gracejos vários sobre a beleza da moça e muita ênfase da representação fálica dos exemplares de minhocas que a competente bióloga encontrava e vinha classificando cientificamente. Sobre a importância das minhocas para a fertilização do solo; sobre as pesquisas de Charles Darwin que dedicou um tratado fundamental sobre o tema e de como seria possível reduzir o lixo orgânico que polui as cidades via a atividade da minhocultura, nada ou muito pouco. Só muitos gracejos do humorista.

O problema do Jô, finalmente, pode ser atribuído tão somente a enorme quantidade de atividades às quais ele se lança. Não tem como ser bom em tudo. Pode-se ser razoável em muitas habilidades ao mesmo tempo, mas dificilmente consegue-se ser profundo em todas elas. Ou entendemos que o Jô Soares deva ser visto desta forma, ou ficaremos, ver por outra, decepcionados com o seu desempenho.

Com a performance no seu mini bongô, como já disse, é uma vergonha. As entrevistas, essas, ficam a critério da análise de cada um. Afinal, elas são boas ou não também muito em função do que esperamos delas e da percepção de cada um...

Edson Pinto
Setembro’2012

13 de set. de 2012

215) A FALÁCIA DA UTILIDADE DOS JUROS ALTOS

O Estadão do último domingo, 9/9/12, nos brindou com um artigo altamente revelador do debate que se trava, há anos, sobre o uso da taxa básica de juros como instrumento maior do controle da inflação. (clique aqui para acesso ao artigo “Rumo a 5%”, do mestre em finanças públicas, Amir Khair)

Quem não acompanha com regularidade temas como esse talvez nunca tenha percebido que a gestão da taxa de juros é a razão maior da existência de um banco central como o nosso. Embora a matéria pareça, a princípio, árida e ao mesmo tempo envolta em muita tecnicidade, ela é de uma simplicidade franciscana. Explico a seguir:

Com base na famosa “Lei da Procura e da Oferta”, sabe-se que, do ponto de vista da “Procura”, quanto mais alto o preço de qualquer bem ou serviço (vide eixo do preço “P” no gráfico acima) menor é a sua procura (eixo de quantidade “Q” no mesmo gráfico). O inverso é igualmente verdadeiro: Quanto mais baixo o preço, maior será a procura. Do ponto de vista da “Oferta” ocorre exatamente o contrário (vide os mesmos efeitos de preços e quantidades ofertadas refletidos pela curva da Oferta sobre os eixos “P” e “Q”). O ponto “E” demonstra o equilíbrio entre as duas forças.

Como a inflação (aumento de preços) ocorre quando a procura é maior do que a oferta, a forma enraizada e erroneamente considerada como a única na política econômica tupiniquim para reequilibrá-las, tem sido a elevação das taxas de juros. Não é totalmente falso o efeito de que o preço mais elevado do dinheiro, no primeiro momento, leva à redução da demanda e com isso o controle da inflação. O que tem sido uma falácia é a argumentação de que não existem outros instrumentos ou outras oportunidades que se aplicadas corretamente poderiam dispensar o uso exclusivo da política de elevação da taxa de juros.

Redução do custo Brasil; redução da burocracia governamental que impõe custos elevados para as empresas e para os cidadãos; utilização das oportunidades momentâneas ofertadas pelo mercado mundial; estímulo ao empreendedorismo popular; aumento da eficiência dos governos e combate à corrupção. Essas são apenas algumas das boas alternativas disponíveis.

Se entendermos que o dinheiro que tomamos emprestado para financiar a compra de um produto ou serviço, incluindo os juros nele embutidos, como sendo também uma mercadoria qualquer, logo percebemos que em país de juros elevados, como no nosso, não existe melhor negócio do que vender dinheiro.

Funciona assim: Se mercadorias ou serviços são mais procurados do que ofertados, os produtores ou prestadores de serviços aproveitam para aumentar seus preços o quanto possível e com isso fazerem bons lucros. Para evitar que isto aconteça em detrimento dos consumidores, o Banco Central do Brasil, através da taxa SELIC, aumenta os juros que vão se refletir nos preços de tudo o que compramos. Aqui entra o sistema financeiro e apossa-se do benefício extra que os vendedores de mercadorias e serviços esperavam embolsar em função do desequilíbrio que lhes era favorável na balança oferta/procura.

Existem outras razões que melhor expliquem os enormes ganhos dos bancos brasileiros? Será que ganham muito por que são muito eficientes? Por que emprestam muito dinheiro a taxas honestas ou quaisquer outros motivos saudáveis? Claro que a razão primordial é a mamata propiciada pelas elevadas taxas de juros. Na verdade, os bancos nem precisam muito emprestar dinheiro às empresas e aos consumidores finais. Basta colocar as suas sobras de caixa em títulos púbicos que são os mais seguros e que remuneram com a, até recentemente, mais alta taxa de juros do mundo.

O governo se compromete a pagar aos investidores em títulos públicos, juros altíssimos. E de onde sai o dinheiro para pagar essa fortuna de juros? Dos impostos que pagamos, é claro. É por isso também que temos uma das maiores cargas tributárias do mundo. E o pior: o dinheiro que é destinado aos juros dos títulos do governo faz falta para a manutenção das nossas horrorosas estradas, ao nosso precário sistema de saúde, ao deficiente sistema educacional do País, entre outros.

O circulo virtuoso seria, então: Juros menores; menos pagamento aos investidores de títulos públicos forçando-os a investirem na economia real; mais recursos que ficariam disponíveis para investimentos em infraestrutura; menor custo Brasil; maior estímulo para que produtores e prestadores de serviços aumentassem a oferta; mais consumo; mais progresso...

E por que demorou tanto tempo para que as autoridades entendessem que só o sistema financeiro estava se beneficiando da política de juros altos?

Edson Pinto
Setembro’ 2012

30 de ago. de 2012

214) VOX POPULI, VOX DEI


Todas as vezes que ouço a expressão “Juiz não pode se pautar por opinião pública”, como recentemente repetida, à exaustão, pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, em referência a absolvição que concedeu ao deputado João Paulo Cunha na ação penal do Mensalão, tenho meu lado filosófico despertado de seu natural estado de torpor.

O bom juiz, conjeturo, tem toda a razão em apegar-se ao conjunto probatório contido nos autos. É assim que se diz referindo-se a todas as provas documentais, testemunhais bem como às suas respectivas contraprovas e outros indícios que suportam a decisão soberana que a ele compete tomar. Não é por outro fundamento que a magistratura deve ser composta por homens doutos e imparciais. Não sou jurisconsulto, mas tenho discernimento suficiente para entender que o bom veredito prescinde de evidências robustas, caso contrário, haverá sempre o risco de se cometer uma injustiça. Entendo ainda que uma condenação injusta faça mais mal a sociedade que a absolvição decorrente das faltas de provas e convicção sólida do julgador.

O verbo pautar tomado em sua forma pronominal, tal qual contido na frase acima citada, significa “guiar-se” e “orientar-se”. Está, assim, no grande Aurélio. Não tem, portanto, a força do verbo “obrigar”. "Pautar-se", não me parece ser um absurdo, nem mesmo uma interferência indevida na nobre função do magistrado. Seria apenas uma orientação a ser confirmada com base na sua ética, no seu bom senso e no seu domínio da ciência jurídica.

Sempre esteve registrado nas nossas cartas constitucionais: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta constituição (artigo 1º, parágrafo único CFB de 1988). Isso nos leva ao entendimento de que a o desejo do povo, adicionalmente ao valor maior contido no importante preceito democrático, encontra-se até mesmo registrado no artigo de abertura da nossa carta magna, exatamente, penso, para servir de parâmetro para todos os 249 artigos que ao primeiro seguem.

No que me toca como cidadão, acompanho regularmente, entre outros, dois grandes órgãos da imprensa nacional: Sou assíduo leitor da coluna “Fórum dos Leitores” do Estado de São Paulo e da seção “Leitor” da Revista semanal Veja. Salvo eventual distração de minha parte, posso afirmar nunca ter encontrado uma só opinião de leitores defendendo a posição de qualquer dos mensaleiros. Todas as manifestações expressam sempre a indignação pelo descalabro na gestão da coisa pública e manifestam explicitamente o desejo de punição aos malfeitores. Há de se perguntar, aqui, a razão das praticamente inexistentes opiniões em contrário: Por que só uma das partes (a que condena e pede punição aos malfeitores) se manifesta? Por que os defensores dos acusados não se manifestam, mantendo-se silentes? Será que aqui prevalece a máxima popular de que “quem cala consente”?

Acuin de York, no século VIII, repudiou a expressão “a voz do povo é a voz de Deus”, título deste meu texto, pela mesma razão que Tito Lívio (59AC - 17AD) também o fizera no contexto da cultura Greco romano de sua época. Sugeriu Acuin a Carlos Magno não dar ouvidos a tal frase, uma vez que “a voz da turba era mais parecida com a voz da loucura do que com a sabedoria divina”. Por outro lado, Nicolau Machiavelli (1469 - 1527) em “O Príncipe” enaltece a importância da opinião pública cuja voz era mais sábia do que a dos príncipes e Jean Jacques Rousseau (1762) em “O Contrato Social” vai ao extremo de defender o direito do povo de se rebelar contra o monarca em consonância com a voz da natureza brotada da alma de cada súdito.

Com quem, então, está a razão?

Nos tempos modernos, os meios de comunicação elevaram a patamares nunca vistos a universalização do conhecimento. A todos é possível chegar informações que lhes permitem formar juízo e libertarem-se da escravidão da ignorância. O coroamento desta nova fase é a Internet que nos dá liberdades preciosas como as de pesquisar, informar, debater e até mesmo disseminar pontos de vista que deságuam na formação da opinião pública. É, contudo, aceitável e desejável que as instituições democráticas adotem mecanismos que evitem o julgamento precipitado que eclode da indignação generalizada do povo. Um indivíduo, isoladamente, tem um comportamento, mas fazendo parte da massa pode ter atitudes pavorosas. Vejam as torcidas dos times de futebol, ou os grupos ensandecidos de Sem-Terras, ou as turbas de grevistas irresponsáveis. Há de se ter, evidentemente, muito cuidado...

Por fim, tudo isso e muito mais levado na devida conta, há ainda algo que foge à ciência e ao bom senso. Trata-se da questão do falível ponto de vista inerente de cada pessoa. Não constitui surpresa termos tantas descrições diferentes de um mesmo fato quantas forem as pessoas que as narram. A visão do ministro Lewandowski, em que pese a cuidadosa leitura que deve ter feito dos fatos e das provas, pode ser diferente das dos demais julgadores, assim como pode ser diferente da leitura feita pela opinião pública.

Afortunadamente, a voz do colegiado há de ser tomada como uma amostra qualificada, moderada e fidedigna da voz do povo. Se a maioria, com o bom senso e ciência que domina entender que as provas não são boas ou que os indícios de crime não sejam convincentes, que absolvam os acusados. Ao contrário, se achar que são robustas, que sejam condenados. O importante é nunca perdermos de vista a esperança de que a razão, os fatos e o “pautar-se na opinião pública” nos conduzam ao destino certo. O caminhar do julgamento até a data de hoje não só nos enche de esperança quanto ao funcionamento de nossas instituições democráticas como parecem confirmar que, de fato, a voz do povo está em consonância com a voz de Deus...

Edson Pinto

Agosto’ 2012

23 de ago. de 2012

213) SANTINHOS EM RESTAURANTE

Uma instituição tipicamente brasileira, salvo maior conhecimento sobre outras culturas eventualmente tão ou mais liberais do que a nossa, é a questionável algazarra que às crianças é permitido fazer dentro de restaurantes.

Nada contra a espontaneidade e alegria de nossos pimpolhos, mesmo quando em ambientes públicos, até porque, agregado a sua inocência e vitalidade lúdica, encontra-se o primordial exercício da socialização tão importante para uma vida adulta mais afável.

Em contraponto, o que há de se perguntar é até onde se encontra bem calibrado o desconfiômetro desses pais modernos que presentemente sucedem a nossa geração para, corretamente, indicar em seus painéis de controle que alguma coisa não anda bem?

Ato 1:

Noite de sexta-feira fechando mais uma semana agitada como é normal nas grandes cidades: Poucos discordariam de que um jantar a dois, no restaurante predileto e regado a um bom vinho repõe-nos as forças e nos redime das agruras da vida. Desde há muito, poucos atos humanos são tão prazerosos como uma boa companhia, um bom cardápio e um vinho redentor. São momentos relaxantes, impagáveis, que merecem ser sorvidos sob a luz mortiça de uma vela e com o silêncio na justa medida.

Ato 2:

Mal o gentil maître tivesse feito a abordagem de praxe e tomado o pedido, o lourinho endiabrado passa tangenciando a nossa mesa mais rápido do que o Usain Bolt nos seus melhores momentos olímpicos. Em seguida e em curtíssimo intervalo de tempo, também o moreninho, a encantadora garotinha de vestidinho xadrez, o gordinho mandão e a pequenina sardenta, esta, pelo que pude perceber, como a vitima frágil da patota ensandecida. Não se pode, de crianças, esperar silêncio, nem comportamento de adulto, apenas a moderação apropriada ao ambiente que os pais podem ensinar e devem exigir.

Ato 3:

O jantar agora perturbado pela algazarra permitida pelos pais ali reunidos em uma mesa que comportava vários casais, tem que ser abortado quando a paciência de qualquer Ser Humano medianamente equilibrado se esgota. Nem olhares aflitivos dirigidos aos omissos pais foram suficientes para obter algo além de um cândido “Fica quieto, filhinho!”, obviamente inócuo. Quando o lourinho, aos gritos, decide passar por debaixo da nossa mesa e quase derrubar o vinho ficou claro que o jantar, tal qual previamente imaginado, tinha definitivamente fracassado.

Ato Final:

Frustrada a noite, só restou voltar ao lar na esperança de que amenidades outras substituíssem o desconforto daquele jantar ruidoso. Na TV, a ensandecida Nina em sua vingança interminável não seria o refresco merecido pela mente ainda cansada. Ainda, o horário eleitoral com suas figuras patéticas e o julgamento do Mensalão, principalmente pela catadupa de defesas desavergonhadas, faz tanto ou mais barulho do que aqueles capetinhas do restaurante.

No limite, e para me penitenciar da rabugice com os ruidosos pimpolhos, só me restou pegar um livro de poesias. E o que encontro?

“Oh! que saudades que tenho / Da aurora da minha vida, / Da minha infância querida / Que os anos não trazem mais!” (Casimiro de Abreu)

Edson Pinto
Agosto’ 2012

9 de ago. de 2012

212) O SEGREDO DOS TRÊS ENVELOPES

Pertence ao folclore do mundo empresarial e até mesmo do político a alegoria das três cartas. Pode conter exageros quando tomada de forma genérica, porém, quando contextualizada a casos específicos, tem o poder de jogar muita luz sobre como as coisas funcionam na vida real. Resumo da metáfora:

Um líder ao substituir outro que deixava o mesmo cargo após uma fracassada gestão, recebe dele três cartas em três envelopes distintos bem como a prudente recomendação de só abri-los, e sempre na ordem crescente, quando e se os problemas da sua organização voltassem a ocorrer. Dito e feito! Face à primeira crise e constatado a sua incapacidade de saná-la, o novo líder se vê compelido a abrir o envelope de número 1. A carta ali encontrada continha a seguinte instrução: “Atribua e divulgue enfaticamente que a culpa dos problemas deve-se à má gestão do seu antecessor”.

Malgrado a provisória atenuação do embaraço geral causado pelas dificuldades da organização voltar a ser bem sucedida, nova crise, aparentemente também sem solução, leva o novo líder a recorrer à abertura do segundo envelope. Na carta, novas instruções: “Demita e substitua todos os antigos colaboradores da sua organização, até mesmo os competentes e fieis”. No início das novas providências tudo parecia ir bem. Centros produtivos fechados, downsizing impiedoso, substituição da produção local por importados baratos e outras medidas heterodoxas eram espalhafatosamente divulgadas o que conferia aos da nova turma o status de gênios. Tinham encontrado a fórmula mágica para se fazer da moribunda organização um novo caso de sucesso.

E não é que veio a terceira e mais resistente de todas as crises. O novo “líder gênio” já acostumado com as orientações fantásticas das cartas não demora muito a abrir o terceiro e último envelope. Nele, certamente, esperava encontrar a solução definitiva para todos os males da sua gestão. Lá estava a derradeira instrução: “Redija três novas cartas como as que você recebeu, coloque-as em envelopes numerados de 1 a 3 e entregue o seu cargo”.

Agora pergunto:

Será que Dona Maria das Graças Foster que herdou do petista José Sérgio Gabrielli uma Petrobrás capenga e que vinha ocultando marotamente as suas deficiências precisará abrir o terceiro envelope? E as fantásticas descobertas de petróleo anunciadas com o ufanismo redentor de Lula? A multibilionária capitalização da empresa ocorrida há menos dois anos? A invejável situação de monopolista da empresa? A dádiva do pré-sal?

Ninguém tem dúvidas de que a Sra. Foster já teve de amenizar, mas sem fugir completamente das suas responsabilidades, a implantação rigorosa da instrução da carta do primeiro envelope. Atualmente, parece aplicar os seus conhecimentos de sambista da União da Ilha para evoluir com as instruções da segunda carta. A própria presidente Dilma também tem dado indícios de que - mesmo fazendo vistas grossas, por razões óbvias, da instrução contida na carta do primeiro envelope - tem dado mostras de que ao menos as orientações do segundo estão sendo seguidas. Passou a vassoura no ministério lulista e anda marcando de perto outros malfeitores.

Mas não é só no Estado que envelopes metafóricos vêm sendo abertos, até mesmo de forma obsessiva, pelos novos líderes. Basta ver na economia privada quantas empresas andam freneticamente trocando de gente, de produtos, de objetivos e de formato.

No frigir dos ovos, a lição que fica é a de que nada é sólido e permanente, exceto - ao que tudo indica - a infinda produção das três famosas cartas e de seus respectivos envelopes numerados de 1 a 3...

Edson Pinto
Agosto, 2012

2 de ago. de 2012

211) CUSTO BRASIL


A expressão “Custo Brasil” tem sido amplamente utilizada para designar o conjunto dos custos que a realidade brasileira impõe a tudo o que é aqui produzido e que destoa dos padrões mundiais das economias saudáveis. Infelizmente, ela nos demonstra que as chances do País voltar a ter, como já teve no passado, uma economia competitiva, ficam cada vez mais distantes. O mundo moderno não comporta mais isolamento com fronteiras fechadas. Globalização é a ordem que vigora. Portanto, ser competitivo é pré-requisito para continuar fazendo parte do jogo. Sem isso, só restará aos incompetentes a amargura do subdesenvolvimento.

São exorbitantes as taxas dos nossos pedágios rodoviários; a qualidade do manuseio de mercadorias em nossos portos marítimos e aeroportos está muito aquém dos padrões mundiais. Tudo aqui é lento e absurdamente caro. A nossa descomunal burocracia, além de criar dificuldades para tudo, ainda abusa com taxas elevadas, tarifas de mil naturezas e a vergonhosa e crônica corrupção que induz cidadãos e empresas a pagar propinas como se isso fosse algo natural. Tudo isso, sem falar da indústria de multas sobre os veículos dos pobres cidadãos que por falta de transporte coletivo decente são obrigados a se locomover com o próprio carro.

E os impostos? Os efeitos nefastos de custos elevados, subinvestimento na modernização e aumento de eficiência podem, em grande parte, ser atribuídos à elevada carga tributária do País. Pagamos cerca de 40% de tudo o que é aqui produzido na forma de impostos. Uma das mais altas taxas do mundo. Alguns impostos são diretos e podemos percebê-los destacados em documentos de compras e nossa declaração anual do Imposto de Renda. Há ainda o ICMS, o ISS, o IPI, o IPTU, o IPVA, o PIS, o COFINS, e tantas outras siglas tributárias que nos esfolam impiedosamente. O pior é que grande parte dos tributos é invisível, mas existe. Eles estão embutidos nos preços de cada objeto que compramos ou cada serviço que contratamos para cobrir o pagamento do tributo que o agente econômico arcou na operação anterior. No frigir dos ovos, essa montanha de impostos nos exige 150 dias de trabalho dos 365 do ano.

A situação, ao que parece, está ficando tão critica que já não dá mais para suportar. Vivemos aquele momento histórico em que o estresse atinge o seu auge e disso decorre uma ruptura brusca, uma explosão, talvez até mesmo um big-bang. Não basta colocarmos a culpa no câmbio ou nas ações de outros países para a defesa de suas moedas. O problema está aqui dentro de nossa própria casa. Sob o manto protetor do ideário petista, o corporativismo tomou conta da máquina estatal. Na contramão da tendência mundial por Estados mais enxutos e mais eficientes, o que se fez foi o contrário. Crescemos de 486 mil funcionários públicos federais ativos no início do primeiro governo Lula para 543 mil atuais e a folha de pagamentos cresceu mais do que o dobro da inflação do mesmo período.

Olhando os primeiros dados que começam a ser publicados sobre as folhas de pagamento de vários órgãos públicos por força da recente “Lei de Acesso à Informação” fica demonstrada de forma inequívoca, a razão da necessidade de tanta arrecadação tributária que, como conseqüência, determina o Custo Brasil. Além de salários reais que podem superar em muito os limites legais há ainda o que se denominou chamar de “penduricalhos” como os relativos às férias que são, conforme indicam as informações já liberadas, sistematicamente vendidas. (clique aqui para acesso aos dados oficiais)

Não há nada no sistema de controle dos poderes da Republica que obriguem seus servidores a gozar efetivamente as férias que a lei lhes concede. Há de se especular: Ou o Estado é cruel e, portanto, mau patrão ao exigir de seus servidores tanta dedicação ao trabalho, ou as férias são, na realidade, gozadas por subterfúgios de mil naturezas e a venda das férias oficiais acabou por se tornar o 14º ou mesmo 15º salário. Como, diferentemente de uma empresa privada onde o dono zela pelo seu resultado, o Estado, por ser um ente sem face, é omisso, perdulário e irresponsável, pois sabe que basta aumentar os impostos para cobrir o furo de seu caixa. Mas isso tem limites...

É preciso muita responsabilidade até mesmo daqueles que se alimentam das tetas transbordantes do governo, pois a continuar neste ritmo não demorará muito até que nem o razoável será mais viável. Afinal, na gestão da coisa pública, tanto quanto no dia a dia de nossas vidas, deveria prevalecer a máxima de que “quem tudo quer, tudo perde...”

Edson Pinto
Agosto’2012

26 de jul. de 2012

210) LULA E SUA TEORIA DA ATMOSFERA IMÓVEL

Todo mundo deve ter tomado conhecimento da teoria de Lula sobre os efeitos nefastos da poluição atmosférica sobre o nosso sofrido planeta. Caso não, então, recordemos:

Durante uma de suas corriqueiras falas em público, mas precisamente em Brasília, no dia 19/06/2009, revelou ao mundo a sua tese de que a Terra gira independentemente da atmosfera que a rodeia. Simplíssimo e objetivo como sempre, deu a todos entender que o dióxido de carbono (CO2) expelido pelas fábricas e automóveis mundo afora sobe à atmosfera e lá fica parado, estagnado, imóvel. À medida que a Terra gira (e gira mesmo, pois disso já sabemos há muito tempo), as várias partes da sua superfície vão passando por aquela atmosfera poluída, paradinha lá em cima. Na teoria sustentada por Lula, incluindo uma complexa reflexão freudiana, a atmosfera permanece imóvel enquanto o globo terrestre gira no seu interior. Assistam ao filmete disponibilizado no final desta crônica para melhor entendimento do tema.

Justiça seja feita! Lula tem noção da esfericidade da Terra. Demonstra, também, saber que há um movimento de rotação e mais do que isso, que a Terra tem a sua própria atmosfera. Só que agora, parece contribuir com um elemento nunca antes considerado em todo o sistema cosmológico já amplamente difundido: A atmosfera da Terra não acompanha o seu movimento.

Eureca!

Ninguém havia pensado nisto antes... Como pode? Galileu Galilei, Isaac Newton e até mesmo Santos Dumont não tinham dado conta disso. Ora, se a atmosfera fica estática enquanto a Terra gira, Lula acaba de detonar uma revolução tecnológica sem precedentes. Arrisco-me a dizer que nenhuma outra descoberta do homem ao longo de toda a sua existência teria tamanho impacto sobre as nossas vidas. Sendo verdadeira essa “Teoria da Atmosfera Imóvel” solenemente enunciada por Lula, e o povão acredita que sim, temos que repensar tudo da Física à Astronomia, passando pelas Comunicações até mesmo aos meios de transporte. Fiquemos, porém apenas com este último:

O avião, tal qual o conhecemos, deixará de existir. Desenterrem Alberto Santos Dumont e dê-lhe infinitas chibatadas como castigo por ter inventado o veículo espacial errado. Usando agora os princípios científicos de Lula bastaria aprimorar os balões que já existiam. Requintados hotéis, em formatos e acomodações que a mente humana viesse a criar, seriam levados à atmosfera, verticalmente, e a baixíssimo custo, pois o gás hélio é abundante. Lá ficariam estáticos esperando a Terra fazer a rotação que lhe é inata.

Das janelas do hotel flutuante passageiros confortavelmente instalados apreciariam o passar dos pontos geográficos: Vejam! Lá vem o Mato Grosso do Sul; agora vem a Bolívia; Vixe, já está passando lá embaixo o Peru; Daqui a pouco vem o Pacífico. O Japão já está visível no horizonte. É onde queremos chegar. Vamos baixar o balão!

Adeus turbinas de jato, aeroportos sofisticados, acidentes aéreos e conseqüências outras da tecnologia arcaica atual.

E os bêbados? Mesmo os que fazem discursos? Sim! Ah! Esses se ergueriam também em balões a espera que suas casas chegassem...

Glupt!!!


Edson Pinto
Julho’ 2012