23 de dez. de 2015

302) RASTELANDO O BRASIL PARA UM FELIZ 2016

Nossos corpos são nossos jardins, nossas vontades são nossos jardineiros. (William Shakespeare)
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Meus amigos mais próximos sabem que cultivo, há anos, o hábito de caminhadas regulares. Enquanto caminho, penso na vida, vejo jardins alheios, perscruto novos pássaros que me cruzam a senda, e me ligo em um "podcast", recurso moderno em favor da velha sabedoria de que neurônios precisam manter-se ativos. Assim, uno o útil ao agradável...

Contudo, Ivo, o caseiro de quase duas décadas, saiu de férias. Ordenei, então, a mim mesmo: Vou cuidar pessoalmente do jardim! Substituo as minhas caminhadas pela jardinagem. Exercício garantido para o corpo e para a alma! Dito e feito:

No primeiro dia, confesso, doeram-me um pouco as costas e suei bastante. No segundo, lamúrias vieram dos músculos das pernas agora mais usados na faina de agachar para coletar folhas e arrancar as ervas daninhas. No terceiro e seguintes, comecei a sentir um prazer inenarrável: À medida que via o resultado do meu trabalho e os músculos cessaram seus queixumes tudo me pareceu perfeito. Ver o gramado limpo, viçoso, as flores resplandecentes me deu orgulho, ânimo e vontade de continuar. Acho que vou me tornar um jardineiro...

A cabeça a mil me leva a memória de Justin Quayle, o personagem de John Le Carré do livro O Jardineiro Fiel, em que o diplomata britânico era apaixonado pela jardinagem. Lembrei-me igualmente de Pu Yi, o último imperador da China, que ao abdicar-se do trono tornou-se jardineiro. De Camões, que, em Os Lusíadas, dedica impressionantes versos às advertências que fizera o velho do restelo. Mas lembrei-me também do meu amigo Raul Canovas que não só concebeu o jardim de minha casa como me deu, há anos, lições de jardinagem que, infelizmente e por tanto tempo deixei de pôr em prática. Como terapia ocupacional – salvo melhor juízo – poucas coisas se mostram mais eficientes do que a jardinagem. Imaginei as turmas do Mensalão, do Petrolão e de tantos outros "ãos" rastelando e refletindo...

Enquanto jardino, impossível também não ver semelhança com a vida do país em que vivemos: Não se consegue um jardim, ou mesmo um país bonito se não lhes tiramos as ervas daninhas que malversam o alimento e o espaço das plantas e pessoas de bem; se não lhe podamos os galhos secos, inúteis que roubam a seiva vital da Nação e impedem que os ramos novos brotem e cresçam; se não lhe aguamos na medida certa para que as folhas cresçam verdes e as flores surjam multicoloridas honrando a natureza bela e pródiga que Deus deu a nós brasileiros. Há também o rastelar permanente do gramado que nos dá a exata ideia do que foi este ano de 2015 que ora se esvai e o que serão os próximos para o nosso querido Brasil.

Precisamos ter em mente que o rastelo metafórico deve estar sempre às mãos de cada um de nós. É com ele que afastaremos as folhas secas, os galhos decaídos e revolveremos aquilo que impede que o "Brasil-Jardim" fique bonito. Um país bonito é, portanto, um país permanentemente bem cuidado. Vamos fazer de 2016 o ano da virada! Bom Natal e um 2016 rigorosamente rastelado!

 Edson Pinto

Dezembro’2015 

14 de set. de 2015

301) QUESTÃO DE VALOR


“Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas da consideração que ele tem pelos seus próprios interesses. Apelamos não à humanidade, mas ao amor-próprio, e nunca falamos de nossas necessidades, mas das vantagens que eles podem obter.” (Adam Smith).



Quem como eu já não se pôs em algum momento da vida a refletir sobre o valor que as pessoas, em geral, dão aos objetivos da vida social? Seria maravilhoso se partisse da pureza d’alma de cada um - se é que todas as almas são puras - a força motriz que promoveria, pelo apreço ao ideal do bem comum, a renúncia ao egoísmo.

As pessoas de todas as ideologias, classes sociais ou mesmo religiões não só entenderiam, mas efetivamente se portariam com denodo e elevado espírito público, deixando em segundo plano os seus interesses pessoais. Algo como o que fazem as abelhas, as formigas, as vespas e mesmo os cupins que priorizam a vida comunitária em detrimento de objetivos individuais. Seria espetacular, mas, infelizmente, a vida nos tem mostrado tratar-se isso da mais autêntica utopia.

Foi o que o um professor do ensino médio constatou e contou-me quando de uma agradável e recente palestra pessoal em que nos pusemos a filosofar sobre a impossibilidade de se tornar concreto o sonho do comunismo que tanta gente ingênua ainda aspira. Deu-me ele, com o conhecimento de quem procura com afinco educar cerca de 40 jovens de uma mesma classe de aula, um exemplo que reputo digno de ser compartilhado com os meus amigos.  Deliciei-me com a sua narrativa. Prestem bem a atenção!

“Incomodava-me - disse-me ele - as frequentes ausências de meus alunos. Um dia não compareciam cinco deles. Em outros, a classe não chegava sequer a 20 alunos. A continuidade do ensino que deve ser feita como o subir de uma escada, isto é, degrau a degrau, ficava muito comprometida. Além disso, - acrescentou, - nem metade dos alunos cumpriam as tarefas de casa. Perdia eu um tempo enorme para dar uma ajeitada no conhecimento daqueles jovens. Mesmo assim, era frustrante chegar ao final do ano letivo tendo passado a matéria de forma tão superficial. Como professor me sentia derrotado”.

Então lhe ocorreu uma ideia que, solenemente, explicou a seus alunos:

“Todos os dias farei uma pergunta a cada um de vocês sobre a matéria da aula anterior. Quem acertar levará ¼ de ponto para somar à prova do mês. Tenho dez pontos para distribuir diariamente. Se alguém não comparecer, ou comparecendo não conseguir responder satisfatoriamente a pergunta, o seu 1/4 de ponto será distribuindo proporcionalmente aos alunos que acertarem as suas respectivas perguntas”.

Dito e feito...

No primeiro mês por não terem entendido completamente a ideia do professor alguns alunos malandros consideraram que o 0,25 ponto percentual  seria pouco e, portanto continuaram ou faltando ou não estudando a matéria. Só vieram a entender o mal que lhes fazia a opção pela malandragem quando viram que os colegas assíduos e estudiosos chegaram com facilidade à nota máxima. Foram, como consequência, ficando cada vez mais para trás até que se deram conta de que para serem aprovados seria necessário se esforçar vencendo a preguiça de ir às aulas e estudando para fazer jus às notas que lhes passariam de ano.

Num determinado dia choveu muito e o professor imaginou que a frequência seria baixa e que, portanto aqueles poucos que sempre demonstraram maior empenho e interesse em se destacarem iriam abocanhar mais meios pontos dos faltosos. Para sua surpresa, a sala estava completa com todos os alunos. Propositadamente, perguntou a alguns daqueles que no inicio do ano eram os mais relapsos sobre a razão de estarem ali em que pesasse tanta chuva lá fora. A resposta que obteve: “Imaginei que outros não viriam e que valeria a pena habilitar-me aos pontos deles”. Todos pensando assim, a classe foi em frente e o ano letivo foi altamente proveitoso com alunos e professores felizes com o resultado que obtiveram.

Se há uma lição a se tirar desse episódio é a de que o ser humano precisa ser incitado, incentivado, despertado para que transforme o egoísmo que lhe é da essência em ações úteis para a sociedade como um todo. Prover de forma paternalista as necessidades dos outros sem exigir-lhes esforço para que melhorem, prejudica mais do que ajuda. O Comunismo fracassou e continuará a fracassar enquanto a sociedade através dos governos e mesmo do senso comum não entenderem que o importante é ensinar a pescar e não fornecer graciosamente e de forma continua o peixe.

Edson Pinto                                                                  

Agosto’ 2015

11 de ago. de 2015

300) DOBRANDO A META...

Para um determinado programa governamental, a presidente Dilma andou recentemente falando que não tinha estabelecido meta. Mas, sugeriu que, quando se atingisse a meta, então, deveriam dobrar a meta. Se alguém entendeu esse intricado raciocínio, que bom. Parabéns! Se não, vai aqui uma interpretação: Não ter meta é o mesmo que meta zero, não é? Então, se você atinge esse zero e depois dobra esse mesmo zero, logo a meta final continuará sendo zero, pois, segundo a Matemática, zero multiplicado por qualquer número será sempre zero, ou não é mais? É claro que ela não quis zombar nem enganar ninguém de forma consciente. O problema é que ela é confusa assim mesmo. Provas disso se espalham por toda a vida nacional. Mas isso é assunto de política e eu quero, hoje, é falar apenas dos textos do meu blog.

Não vou falar, repito, das metas da Dilma, mas sim das minhas próprias metas relacionadas com o meu esforço prazeroso de publicar com certa regularidade textos neste blog. Em outubro de 2008 atingi a minha meta de 50 textos publicados. Na época impus-me dobrar a meta e fui para o 100º texto que publiquei um ano depois no mês de outubro de 2009. Impus-me, então e novamente, dobrar a meta para 200 e isso aconteceu em abril de 2012. Na ocasião, claro, não fui leviano a ponto de prometer novo dobro da meta, pois entraria numa exponencial impossível de realização. Quem não se lembra de Malba Tahan em “O Homem Que Calculava” que conta essa deliciosa história:

Um Rei, para gratificar um sábio que lhe prestara bons serviços concede-lhe o direito da escolha de um presente. O sábio pede, então, que seja presenteado com grãos de trigo. Seguindo o desejo do sábio, mas surpreso com a singeleza de seu pedido, o Rei ordena que lhes trouxessem um tabuleiro de xadrez. O sábio então diz: coloquem 1 grão de trigo na primeira casa do tabuleiro, 2 na segunda, 4 na terceira, 8 na quarta e continuem dobrando a quantidade de grãos até concluir as 64 casas do tabuleiro. Será que o Rei foi capaz de atender ao pedido do sábio? Ao final do texto volto ao assunto.

Este meu texto de hoje é o de número 300, como pode ser visto no seu título. Este e os outros 299 encontram-se postado no blog e podem ser acessados facilmente. Pode ser pouco para quem vive profissionalmente de publicar seus pensamentos fazendo critica do cotidiano ou mesmo externando sua criatividade na forma de textos ficcionais. Mas pode ser muito para quem, como eu, já faz contagem regressiva e tem consciência da preciosidade de cada novo dia que ganha de presente quando levanta da cama ao amanhecer. É como regular o consumo das trufas que se esgotam da última caixa. Cada uma delas merece ser saboreada com prazer extremo. Para um homem maduro, cada novo dia vale mais do que vale para um jovem que tem uma infinidade de dias pela frente. Não se deve desperdiçá-los nem deles fazer uso impróprio. Escrever, por óbvio, não é usar irresponsavelmente o dia que se ganha de presente, mas a vida, convenhamos, tem muitas outras tarefas igualmente prazerosas.

Atingi 300 textos investindo ao redor de igual quantidade de meus preciosos dias. Agora que atingi a meta torno-me propenso a acatar o brilhante raciocínio de Dilma. Não colocarei meta adicional alguma. Se me virem eventualmente dobrando a meta é porque não produzi mais nada. O dobro de zero, como já dito, será sempre zero. A única coisa que gostaria de continuar tendo como meta seria o de sempre agradecer aos amigos que ao longo destes meus 8 anos de blog tiveram a paciência de ler os meus textos. Muitos se manifestaram e ainda se manifestam sobre o que escrevo. Obrigado a todos! Se não me virem escrevendo no blog, fiquem tranquilos! Estarei fazendo jardinagem, caminhando pelas ruas do bairro, cuidando da horta caseira, passeando com a família, almoçando ou jantando com amigos ou mesmo lendo blogs dos outros...

A propósito, o Rei, mesmo com toda a sua fortuna pessoal somada a do seu reino, não conseguiu presentear o sábio com os grãos de trigos que ele pediu de presente. Se tivessem conseguido dobrar os grãos nas 64 casas do tabuleiro de xadrez, seriam necessários exatos 18.446.744.073.709.551.615 grãos de trigo (18,4 quintilhões). É sabido que 1 m³ desse cereal contém aproximadamente 15 milhões de grãos. Extrapolando para o fantástico número de 20 algarismos acima mencionado isto ocuparia um espaço correspondente a 12.000 km³.  Considerando as dimensões do celeiro como sendo 4 metros de altura por 10 metros de largura, teríamos um comprimento de 300 milhões de quilômetros lineares, ou seja, o correspondente a uma estupenda viagem de ida e volta deste nosso maravilhoso planeta ao rei Sol.  

Edson Pinto

Agosto’2015

23 de jul. de 2015

299) FALÁCIA “TU QUOQUE” (VOCÊ TAMBÉM)


Em decorrência da apuração de suposto desvio de bilhões dos cofres de uma empresa pública, um dos envolvidos se encontra preso em uma cela da Polícia Federal em um lugar qualquer deste imenso País. Embora diminuta, a cela tem duas portas vigiadas por dois policiais protegidos por máscaras para não serem identificados. As portas, igualmente não identificadas, têm cada qual um destino. Uma leva à liberdade, a outra à morte moral e política.

É dada ao preso a oportunidade de escolha de uma das portas para dali sair. Obviamente ele quer escolher a porta que o leve à liberdade. O carcereiro permite-lhe fazer apenas uma pergunta a um dos dois policiais que vigiam as portas. É dito ainda que um dos policiais, sem que se identifique qual, fala sempre a verdade, enquanto o outro é um mentiroso contumaz.

Estivesse você no lugar do preso, que pergunta você faria a um dos guardas?

Volto à resposta ao final do texto.

Antes:

Adaptei esse clássico e já bem conhecido problema de lógica para mostrar que vivemos um momento ímpar da vida nacional. Como nunca antes visto, recorrer aos ensinamentos da Filosofia se tornou tão necessário quanto o ar que respiramos, o alimento que ingerimos e a água que bebemos. Na Grécia antiga – não nessa Grécia estropiada de hoje – filósofos como Aristóteles já haviam detectado a importância de se estudar os processos intelectuais que levam ao conhecimento correto de tudo o que nos rodeia. Só assim seremos capazes de entender quais argumentos são verdadeiros e quais são falaciosos, mentirosos...

Vivemos em um mundo de falácias quando argumentações com aparência de verdades são produzidas para os propósitos de engano. Tanto na esfera da lógica como na esfera da retórica as falácias pululam de forma permanente como recurso para livrar a cara daqueles que agem política e moralmente de maneira condenável. Não raro, argumentos que vêm embrulhados em lindo papel de verdades incontestes não trazem mais do que um conteúdo falso. Entre dezenas de tipos já classificadas de falácias, quero pinçar e comentar sobre uma delas:

A falácia “Tu quoque”, ou “você também”: É o argumento daquele partido político - por exemplo - que já não tendo encontrado justificativa convincente para as suas pedalas fiscais não encontra outra saída senão a de admitir os seus erros, mas justificá-los com o fato de que outros também o cometeram. Assim, imaginam que ao se igualarem a outros pecadores que por quaisquer razões não foram punidos também deveriam merecer o mesmo tratamento. Lembrem-se daquele personagem do saudoso Chico Anysio, Tavares, um hipócrita assumido, bêbado, que sempre saia com a máxima de: “Sou, mas quem não é?”.

O governo que esta aí e com o volume de problemas que conseguiu acumular, por mais boa vontade que tenhamos para com ele, já deve ter esgotado todo o arsenal de falácias possíveis e imaginárias na tentativa, hoje, vã de transformar mentiras em verdades. Se acontecer uma reviravolta do quadro atual mantendo-se os mesmos personagens será não só um milagre, mas a contestação histórico/milenar de que a lógica e a coerência deveriam sempre reinar sobre os atos da vida. A Filosofia e a sua afilhada, a Lógica, seriam colocadas de cabeça para baixo...

A propósito, a única pergunta que levaria o preso para o caminho da liberdade seria pergunta a qualquer um dos guardas: Qual porta o outro guarda indicará como sendo a da liberdade?

Explico:

Primeiro, se a pergunta cair para o guarda mentiroso, ele certamente dirá que o outro guarda (por exclusão o que fala a verdade) apontará determinada porta como a porta da liberdade. Estaria, como sempre, mentindo, distorcendo, a verdade do outro.

Segundo, se a pergunta cair para o guarda que só fala a verdade e sendo este sabedor que o outro guarda sempre mente, este também apontará para a mesma porta como sendo a porta que levará à liberdade.

Conclusão: Como ambos indicariam a porta da morte como sendo a que pressupostamente levaria à liberdade, bastaria então seguir para a outra porta, ela sim a porta da liberdade.

O preso não viu, pois os guardas encontravam-se mascarados. Soube, contudo e apenas depois de já se encontrar em liberdade, que o guarda mentiroso tinha em seu peito a tatuagem de uma estrela vermelha.

Edson Pinto

Julho’2015

3 de jul. de 2015

298) O CUSTO DA BURRICE

Qualquer pessoa minimamente observadora, especialmente aquelas que já visitaram outros países ou que já adotam o salutar hábito de pesquisar preços na internet, sabe muito bem que tudo aqui na nossa terrinha, com raríssimas exceções, custa mais do que alhures. E não é só a questão do valor relativo entre moedas, pois o nosso cada vez mais pobre Real vem sofrendo desvalorização considerável nos últimos meses e mesmo assim nossos preços continuam exorbitantes.

Os economistas referem-se a isso como sendo o “Custo Brasil”. Ele é formado, entre outros fatores, pela nossa elevada carga tributária; pela precariedade da nossa infraestrutura que nos impõe custos elevados de transporte, armazenamento e logística em geral; pelo protecionismo tarifário de certos segmentos de bens e serviços; pelas elevadas taxas de juros; pela corrupção; pela excessiva burocracia que herdamos do período colonial e, acrescento, por minha própria conta; pelo despreparo de nossos profissionais e pela nossa arraigada falta de educação, ambos estes fatores geradores do que popularmente conhecemos como “burrice”.

Qualquer um poderia listar exemplos que não se esgotam de casos em que o custo Brasil, com base nos diversos fatores que citei, fica bem evidente. Hoje, contudo, quero falar apenas desse último bloco que denominei “burrice”:

Este substantivo pode ser encontrado em qualquer dicionário sempre com a definição de que se refere à falta de inteligência, parvoíce, idiotice e outros termos não menos depreciativos. A característica comum da burrice é que ela, em geral, impede uma pessoa de agir racionalmente e de forma produtiva. Sintetizo meu pensamento com a menção ao que disse o economista e historiador italiano Carlo Cipolla: “Uma pessoa burra é aquela que causa algum dano à outra pessoa ou a um grupo de pessoas sem obter nenhuma vantagem para si mesmo – ou até mesmo se prejudicando”

Claro que existe burrice decorrente da formação escolar falha, insuficiente, inadequada. Mas, há burrice oriunda do egoísmo, da preguiça ou da visão destorcida de mundo que uma pessoa tenha desenvolvido ao longo de sua existência. E olha que Roberto Campos já tinha alertado que a “burrice não respeita fronteiras ideológicas”... O problema é quando burrice se junta a outros interesses, outros fatores e engorda o Custo Brasil...

Experiência desta semana que comprova a existência irrefutável da burrice:

Estando este modesto escriba no balcão de uma farmácia, observa que um senhor bem mais idoso do que ele, agravado pelo fato de demonstrar certa dificuldade de caminhar, chega esbaforido com uma receita na mão e a entrega ao balconista que cuida da chamada Farmácia Popular, esse justo programa social pelo qual o governo devolve uma ínfima parte dos impostos que pagamos na forma de entrega “grátis” de certos medicamentos notadamente os ligados ao combate da hipertensão arterial.

O velhinho diz: “Voltei ao médico e agora ele colocou o carimbo e a assinatura também no anverso da receita”. O quê?  - Interferi dirigindo-me diretamente ao balconista. “É que são três medicamentos – tenta me explicar - os de números 1 e 2 estão no anverso da receita e o de número 3 está no verso onde se encontra o carimbo e a assinatura do médico. Tive que pedir que ele, (o velhinho coxo, lembrem-se!) que voltasse ao seu médico para que ele repetisse o carimbo e assinatura no anverso da receita, se não, como saberia que ele está pedindo os 3 remédios? Além disso – completou com a singeleza de um asno manso - quando eu tirar uma cópia da receita, na primeira parte, não terá o carimbo e assinatura do médico”...

Se isso não é algum truque comercial para levar a uma transação mais lucrativa, ou se não é uma espécie doentia de sadismos que lhe dá prazer em ver um velhinho com dificuldade de locomoção ter que voltar ao médico, enfrentar novas filas só para pegar um carimbo que já estava no devido lugar, isto é no final do receituário, ou qualquer outro enigma que um ser humano normal não consegue captar, então concluo:

Só pode ser burrice...

Para tirar essa dúvida, aproveito uma visita posterior à outra farmácia onde conheço de longa data balconistas bem mais preparados e questiono sobre o fato que acabo de narrar. O que ele me explica é de estarrecer a um marciano, mas não a um brasileiro calejado como eu: Nada disso é necessário, me asseverou. Não temos essa exigência aqui na nossa Farmácia Popular. Pelo contrário, até facilitamos ao máximo o atendimento ao programa, pois o governo nos reembolsa pelo valor de tabela do medicamento enquanto aos clientes avulsos concedemos até 30% de desconto.

Bingo!

A farmácia popular é lucrativa. O patrão que não deve ser nem bobo nem burro certamente quer vender por ela. O funcionário que cria dificuldades para que isso aconteça é porque não gosta do patrão, nem do próprio emprego ou é realmente mais um detentor da burrice que assola e aumenta o Custo Brasil.

Pobre País!

Edson Pinto

Julho’ 2015

25 de jun. de 2015

297) EFEITO BORBOLETA, OU O PORQUÊ DE VIVERMOS UM CAOS ECONÔMICO?

Todas as noites, exceto aos domingos, dentro do Jornal Nacional da Globo, William Bonner e sua parceira Renata Vasconcellos chamam ao telão a charmosa Maju, Maria Júlia Coutinho, para falar sobre o tempo. Com extrema simpatia e desenvoltura a bela moça reproduz de forma fácil e inteligível aquilo que os meteorologistas, em jargão cientifico e ao longo do dia, transmitiram a ela como fruto de suas complexas e ininterruptas investigações das condições climáticas do País. Saber o que o tempo nos reserva para os dias seguintes é tema do maior interesse para quem produz na agricultura, na indústria ou na construção civil. Importante também para quem vai sair de férias ou mesmo para quem tem que decidir se no dia próximo  sai de blusa, se leva o guarda-chuva ou vai de motocicleta, de ônibus ou carro...

Todos nós sabemos do alto grau de precisão das previsões para o dia seguinte ou mesmo para uns poucos dias mais à frente. Mas, já perceberam que nunca temos uma previsão confiável para períodos mais longos, como algumas semanas ou mesmo alguns meses, por exemplo? Sim, é verdade! E olha que é realmente muito difícil, diria até mesmo improvável, que isto seja alcançado mesmo quando levamos em conta o avanço dos computadores, as coletas de dados cada vez mais sofisticadas, os "big data" dessa área cientifica, bem como tudo o mais que os cientistas em geral, matemáticos e meteorologistas em especifico, podem hoje contar.  Portanto, previsão boa para o curto prazo, tudo bem... Para o longo prazo, nem pensar...

Embora historicamente já houvesse sinais de que algumas áreas do conhecimento humano são tão complexas que tornava impossível seguir os modelos objetivos da Física, esta uma ciência exata, só foi por volta de 1950 que o meteorologista e também matemático americano Edward Lorenz concebeu a sua chamada “Teoria do Caos”. Suas análises indicaram que minúsculas mudanças na atmosfera tinham o poder de gerar fortes alterações nas condições do tempo no porvir. Daí deriva a formulação alegórica de que um simples bater de asas de uma borboleta no Brasil pode levar a um ciclone no sul dos Estados Unidos, por exemplo.

Trazida essa ideia para o campo da Economia, temos que os formuladores das políticas em geral presumem que as pessoas agem racionalmente e que tudo segue o modelo físico de causa e efeito. Assim, dada uma ação espera-se por tal ou qual efeito. Os modelos teóricos da Economia, fortemente baseados nas leis de movimento da Física Newtoniana, indicam que a cada ação correspondem resultados previsíveis. Fosse isso verdade absoluta, poderíamos dizer que a Economia teria alto grau de previsibilidade.  Como, contudo, cada pessoa pode agir de forma infimamente diferente das outras, essas pequenas variações podem levar a resultados bastante diferentes dos previstos. Isso nos permite concluir que a Economia, tal qual a Meteorologia, é um campo do conhecimento bem caótico, mesmo quando consideramos que as pessoas em geral apresentam comportamentos assemelhados.

Vejam o que estamos vivendo neste momento no país: A maioria dos eleitores acreditou nas palavras da candidata que garantia, com juras até, que a economia caminhava muito bem. Bastaram pouquíssimos meses do segundo mandato para essa maioria que reconduzira a presidente viesse a descobrir que tal não era verdade. A economia, como se vê agora, está um caos, e o pior, infelizmente, ainda nos dá sinais de recrudescimento. Será mais desemprego; inflação acirrada; aumento do endividamento das pessoas e das empresas, bem como suas consequências sociais nefastas como o aumento da insegurança pública e outras mazelas.

Somente devido à imposição das circunstâncias, um ministro com perfil conservador foi colocado para ver se consegue dar um jeito no caos. Vem dizendo, já há meses, que todo o arrocho é necessário para por as finanças em ordem. Mas, curiosamente, esse arrocho parece só ser aplicado sobre o cidadão contribuinte que terá de pagar mais impostos; sobre o chefe de família e a dona de casa que terão elevadas as suas contas de luz, de água, escola e plano de saúde entre outras; sobre as empresas que pagarão mais impostos, também. Quase nenhuma pressão sobre os custos enormes da máquina estatal. Os 39 ministérios continuam os mesmos e os ajustes e benesses do funcionalismo público parecem intocáveis.

Como os indivíduos, cada qual com suas próprias circunstâncias, olham com desconfiança o que vem acontecendo, suas ações nunca serão uniformes a tal ponto para oferecer certa previsibilidade aos resultados da desesperada política econômica que o governo vem adotando. O temor maior, e plenamente explicado pela Teoria do Caos, é que essas borboletas que andam batendo asas na Praça dos Três Poderes, Esplanada dos Ministérios e adjacências possam provocar, mais à frente, uma tempestade de grandes proporções em todo o país. Nesse momento, não haverá guarda-chuva, bote de salvamento ou mesmo uma arca de Noé que pelo menos nos garanta uma forma de começar tudo de novo.

Estaria eu sendo muito pessimista?

Edson Pinto

Junho’2015 

11 de jun. de 2015

296) QUAL É O SEU TEMPERAMENTO?

(Fonte: The Psychology Book, Globo, 2012, vários colaboradores)

Gosto sempre de organizar meus pensamentos pela cronologia. Assim, imagino, as ideias encontram consistência e fica mais fácil fazer-se entendido. Considerem, portanto, esta sequencia de fatos históricos:

495 – 435 a.C. : Empédocles, filósofo grego, argumentou que as características dos até então considerados quatro elementos básicos da natureza (terra, ar, fogo e água) estavam na origem de todas as substâncias conhecidas. E quais eram essas características? Terra (fria e seca); ar (quente e úmido); fogo (quente e seco); água (fria e úmida).

460 – 370 a.C. : Hipócrates, também grego e considerado o pai da medicina, foi na cola de Empédocles e desenhou o seu modelo médico servindo-se das características dos mesmos  quatro elementos básicos. Propôs que elas se manifestavam no corpo humano na forma de fluídos corporais a que chamou de humores.

129 – 201 a.D. : Galeno, médico e filósofo romano, aplicou a teoria de Hipócrates que era basicamente corporal também para a personalidade. Ele não tinha dúvidas da correspondência direta entre a quantidade de humores que havia em cada pessoa com o seu temperamento.

Daí a teoria de Galeno:

As pessoas, dependendo da prevalência de determinado humor, podem ser classificadas em quatro tipos de temperamentos, cada qual com as suas próprias características: Vejam também a figura que ilustra este texto!

Sanguíneas, por terem muito sangue, são em geral, alegres, otimistas, confiantes, mas podem ser também egoístas;

Fleumáticas, apresentam excesso de fleuma, frieza e normalmente são quietas, tranquilas, racionais e coerentes, mas também podem ser lentas, tímidas e desinteressadas.

Coléricas, acumulam muita bílis amarela oriunda do fígado e por isso são impetuosas, enérgicas, apaixonadas, mas em contrapartida podem ser irritadiças.

Melancólicas, apresentam excesso da bile negra vinda do baço e se destacam pelas suas tendências poéticas e artísticas, mas isto lhes custa suportar as companhias nada agradáveis da tristeza e do medo.

Para Galeno, é da harmonia desses quatro humores que se obtém uma vida feliz. O fato de que um deles se sobressaia não preocupa, apenas determina a sua característica, ou seja, o temperamento da pessoa. Quando, contudo, isso se apresenta de forma excessiva é que reside o busilis, o xis da questão. Aqui de volta ao eterno “virtus in medium est”. A virtude está no meio, no equilíbrio, ou, nem tanto ao céu nem tanto à terra...

Não sou credenciado nem é minha intenção tratar das terapias que se desenvolveram para a busca do equilíbrio desses humores. O que sei é que na busca da paz e para que tenhamos uma vida mais saudável, o equilíbrio desses humores é condição “sine qua non”, mesmo porque – pelo que já se sabe – a teoria de Galeno mostrou-se posteriormente desprovida de base científica e portanto caiu em desuso.

Mas, mesmo fora de moda, temos que reconhecer que a teoria de Galeno continua sendo muito interessante para explicar os temperamentos que as pessoas em geral apresentam. Quem não conhece, ou mesmo se identifica como sendo, um colérico, um fleumático, um sanguíneo ou um melancólico? Estes temperamentos estão por toda parte, nas pessoas conhecidas, nas desconhecidas ou em nós mesmos.

Isso é bom, ruim ou não tem importância para o convívio social a que nos submetemos?

É sempre uma batalha inglória a tentativa de dar a um colérico, por exemplo, um pouco de fleuma ou transformar um melancólico em um tipo alegre e confiante como se encontra nos sanguíneos. O caminho mais correto para esse reequilíbrio - penso - deveria ser o autoconhecimento, pois é só com ele que podemos mudar nossa essência. Portanto, nos autoanalisemos. Temos o dom da inteligência e a prerrogativa do livre-arbítrio. Equilibrar nossos humores é algo que diz respeito a cada um e a mais ninguém.

Edson Pinto

Junho’2015 

28 de mai. de 2015

295) SERÁ QUE TEM JEITO?


Olhem bem para a foto que ilustra esta crônica! Fui eu mesmo que a fiz no último dia 18 de maio quando de mais uma de minhas raras e nostálgicas perambuladas pelas ruas de Belo Horizonte, uma das mais progressistas e bem planejadas cidades do País. Quando vou até lá para visitar parentes não há como deixar de ir ao centro, tomar um cafezinho na Praça Sete, um “pit stop” na Savassi, uma visita ao Restaurante do Porto ou mesmo dar um pulinho no indefectível Mercado Municipal próximo à conhecida Praça Raul Soares. O mosaico português está em toda a parte, como nesta pobre calçada. Já explico!

Sim, eu disse “planejada”! Belo Horizonte é mais velha, mas nasceu como Brasília e algumas poucas outras cidades brasileiras. Fruto de um bom projeto político que demandou para a sua consecução a inteligência, a competência e o bom gosto de próceres da engenharia, da arquitetura, do paisagismo e até mesmo de profissionais da bem conhecida e muito apreciada calcetaria portuguesa.  Desta arte, o exemplo magno no País são as calçadas de Copacabana que já viraram símbolo da cidade do Rio de Janeiro.

O Engº Aarão Reis, vencedor com o melhor projeto para a nova capital mineira, a erigiu em cerca de quatro anos partindo de uma visão futurista e forte influência do positivismo da época. Construída para substituir a topograficamente acidentada Ouro Preto e também para suportar o crescimento que a recém-nascida República haveria, portanto, de proporcionar mais espaço e mais conforto para uma população que já vinha crescendo de modo acelerado. Sua inauguração foi no dia 12 de dezembro de 1897. Hoje BH já é uma senhora de 117 anos, 2,5 milhões de habitantes na sua área urbana e 5,8 milhões em sua região metropolitana. Atingiu um IDH 0.810, classificado como “muito alto” até mesmo para os padrões internacionais. Mas tem problemas...

Ainda sobre o projeto da cidade Aarão Reis argumentou a seu favor:

Foi organizada, a planta geral da futura cidade dispondo-se na parte central, no local do atual arraial, a área urbana de 8.815.382 m² dividida em quarteirões de 120 m x 120 m e ruas largas e bem orientadas que se cruzam em ângulos retos e por algumas avenidas que as cortam em ângulos de 45º. Às ruas, fiz dar a largura de 20 metros, necessária para a conveniente arborização, a livre circulação dos veículos, o tráfego dos carros e trabalhos da colocação e reparações das canalizações subterrâneas. Às avenidas, fixei a largura de 35 metros, suficiente para dar-lhes a beleza e o conforto que deverão, no futuro, proporcionar à população (…)”.

Assim nasceu BH, orgulho dos mineiros, mas que como qualquer outra cidade deste País constitui-se num cadinho de culturas formada por gente vinda de todos os quadrantes. Uns cultos, outros ignorantes. Cultos trabalhadores, organizados, mas também cultos ociosos, displicentes, desinteressados. Ignorantes bravos que arregaçaram as mangas para o trabalho e o fazem o melhor que podem. Muitos ignorantes desleixados, despreparados, incompetentes.  À frente da sociedade, políticos cultos, políticos incultos. Uns zelosos, honestos, outros calhordas, preguiçosos, irresponsáveis e despudorados. Nesse cadinho real o bom e o ruim, o bem e o mal se misturam, se fundem, e formam uma massa estranha, difícil de ser compreendida e explicada.

A calçada da foto é consequência da parte dessa massa gelatinosa que, por descuido do lado bom da sociedade, ainda prospera impune. O calceteiro caprichoso dos primórdios fez o desenho harmônico com os mosaicos e criou o efeito de ondas que se expandem ao infinito. Passam-se os anos, o que, em geral, nos sugeriria mais aperfeiçoamento técnico e mais gosto estético e nos vem os “profissionais” da vez. Provavelmente para embutir uma fiação sob a calçada eles se mostram incapazes de recolocar os históricos mosaicos em linha com o desenho original. Simples assim: pretas com pretas, brancas com brancas. O único desafio para apenas dois ou três neurônios seria o de respeitar o desenho original. Aposto quanto quiserem que uma criança de apenas três anos saberia como fazê-lo melhor.

No mesmo cadinho sou tentado a jogar algumas perguntas para tornar a massa cultural mais palpável: Por que dar um serviço a quem não tem o menor preparo para tal? Quem contrata o serviço não deveria fiscalizar e exigir qualidade antes de pagar por ele? Por que muitos acham que o problema não é deles e sim dos outros e se omitem enquanto a sociedade engole calada sem se mexer, protestar, reclamar e exigir respeito? Por que temos esta postura de achar que as pequenas coisas não são importantes e que por isso podem ser relevadas? Quando vamos ter consciência de que o bem público é feito e mantido com o dinheiro dos impostos que pagamos e que, portanto temos o direito de exigir qualidade no seu gasto?

Quando nos perguntamos por que nunca ganhamos um prêmio Nobel enquanto há países que os tem às dezenas fica-nos um travo na garganta, um desconforto insuportável de ver que em nosso País cada vez mais a impressão que nos fica é que temos involuído. A Política era atividade nobre e honrada, hoje é abominável. Os profissionais eram competentes, hoje são uns porcalhões. A calçada era bem cuidada e elegante, hoje é um lixo.

Será que tem jeito?

Edson Pinto
Maio’2015

PS: Clique aqui: Calceteria Portuguesa



13 de mai. de 2015

294) COLORINDO A VIDA


É da natureza feminina a prodigalidade verbal. Nós homens, exceções à parte, somos mais comedidos. Escutamos mais, falamos menos. As mulheres foram dotadas de qualidades únicas exatamente para propiciar a criação dos filhos da maneira mais competente. Suspeito que a fala abundante tem muito a ver com isso... Os homens não manejam com a maestria devida os instrumentos da educação filial. As mulheres, sim, e devemos dar graças a Deus, pois isso nos libera tempo para curtir o futebol, mexer no carro inúmeras vezes e - por que não - também ficar escrevendo patacoadas?

A base cientifica da constatação de que a mulher fala mais do que o homem encontra-se espalhada por estudos de várias universidades americanas e europeias. Como este meu texto não é um tratado formal, sequer de um ensaio literário, o que requereria de mim mais embasamento eu me sirvo apenas do registro que a psiquiatra americana, Louann Brizendine, fez em seu livro “O Cérebro Feminino”. Nele, ela menciona - e não se assuste, por favor - que estudos comprovam que as mulheres falam em média 20.000 palavras por dia, enquanto os homens falam míseras 7.000.

Verdade cientifica ou não, o fato da vida é que poucos discordariam da evidência de que a mulher fala mais do que o homem. Pronto! Quem tem mulher e filhas em casa sabe muito bem do que estou falando. Eu só tenho mulher e filhos homens, mas tenho uma neta e o meu universo familiar mais amplo incorpora donzelas aos montes. Como homem, às vezes, me surpreendo questionando se o volume de ideias e pensamentos está diretamente relacionado ao de falas produzidas. Fosse isso verdade, seria forçado a admitir que nossas esposas são verdadeiras "Einstein’s" de saia, e nós, pelo pouco falarmos, constituiríamos um exército de néscios insensatos. Minha suspeita relevante sobre isto é que as mulheres externam em falas tudo, ou quase tudo, o que pensam, enquanto os homens selecionam, ponderam, postergam e até descartam muito do que lhes vem à mente. Seriam, então, as mulheres mais sinceras por não censurar a liberação do que pensam? Espero ainda uma resposta da ciência...

Agora vem algo que, em função dessa superioridade verbal, as mulheres falam de nós de forma cada vez mais frequente e aberta: “Eles fingem que nos escutam, mas, na verdade, o que falamos entra-lhes por um ouvido e sai pelo outro. Homem nunca se lembra do que a mulher falou”. Ainda no campo científico, isso me traz à mente um estudo que li há alguns anos sobre a impossibilidade do cérebro captar mais de uma informação em simultâneo. A nossa memória de curto prazo - explicava o estudo - funciona com um tubo na forma de “Y”, no qual informações vindas de mais de uma fonte se afunilam na junção com a base do “Y” e somente uma delas é admitida para processamento. Assim, se a mulher fala ao mesmo tempo em que o repórter da TV fala sobre o gol do seu time somente uma das informações será acatada. No homem, imagem qual? Foi Donald Broadbent, psicólogo inglês e professor em Oxford, que disse: “Quando ouvimos duas vozes, selecionamos apenas uma, sem levar em conta se o que está sendo dito é correto, e ignoramos a outra voz”. Isto é cientifico!

Mas, milagrosamente, algo aconteceu no meu hábitat. A neta chegou e, ato contínuo, eu me preparei para começar a ajustar o meu “Y” interno às 40.000 palavras que, cientificamente, me dizem seriam produzidas pelas duas princesas de minha vida. Nunca conferi este número, nem pretendo fazê-lo, mas o acato, a princípio. Jornal da TV muito improvável, leitura concentrada, suspensa por ora. Adaptativo com deve ser o homem moderno e ajuizado já me contentava com o William Waack e a Christiane Pelajo no jornal da Globo que – felizmente neste caso – vem-nos cada vez mais próximo do horário em que o galo canta. A essa altura, certamente elas já terão caído nos braços de Morfeu.

Havia, contudo um misterioso silêncio. Ouvia-se o roçar do vento agitando a palmeira do quintal. Os bem-te-vis que nunca deixaram de cantarolar agora se faziam mais ouvidos, mais graciosos. Ecoou claro o som de um cão latindo à distância; de uma porta que se bateu na casa do vizinho. Ao longe, o ruído de uma máquina de cortar grama quebrava docemente o vazio de ruído. Comecei, confesso, a sentir a falta daquele burburinho até então por mim criticado. Ele já fazia parte da minha vida. Não estava preparado para uma mudança tão radical de hábito. Sai do meu esconderijo, o escritório de casa, e fui conferir a razão pelo qual Louann Brizendine, a psicóloga americana, falhava naquele momento. Estariam abalados os pilares mestres da Psicologia Cognitiva ou o que mais poderia ser?

A passos lentos, eu vou até a sala. O que vejo me surpreende, me emociona e ao mesmo tempo me faz esquecer tudo o que pensava saber sobre a diferença comportamental entre a mulher e o homem. Era o mundo se adaptando, se renovando, se reencontrando com a sua trajetória de paz. Elas tinham em mãos um livro de figuras esboçadas no qual, com a habilidade que também é privilégio das mulheres, munidas de dezenas de lápis de cores, coloriam figuras como se o mundo a seu redor tivesse deixado de existir.

Não falei nada para não lhes tirar a concentração, mas tomado de um fervor incomum, postei as mãos e as elevei aos céus agradecendo a Deus pela dádiva. Falei com Deus, e por não ser egoísta, não apenas em meu exclusivo nome, mas de todos nós, os homens de 7.000 palavras.

Creiam!

Edson Pinto

Maio’ 2015

7 de mai. de 2015

293) SUA MAJESTADE A MESA


Muito se fala da roda como sendo a grande e revolucionária invenção de todos os tempos. Foi a partir dela, dizem, que o homem teria avançado e alcançado o progresso dos dias de hoje. Falam-se ainda de invenções outras igualmente importantes: a prensa tipográfica que permitiu a difusão do livro e por extensão da cultura e do saber; a máquina a vapor que foi fundamental na revolução industrial do século XVIII; o papel; o avião; o computador e por ai afora...

Como qualquer pessoa de bom senso, eu também não deixaria de concordar com a importância das mencionadas invenções. A favor delas apenas gostaria de pontuar que uma invenção torna-se importante não necessariamente pela sua complexidade, pelo maior grau de pesquisas envolvidas no seu desenvolvimento ou ainda pela notória genialidade de quem a concebeu. Uma invenção é memorável quando permanece por muito tempo na vida das pessoas e das sociedades. Pode ser até uma invenção bem simples, mas - desde que tenha utilidade e longevidade - ela se torna realmente digna de ser rotulada como uma “grande invenção”.

Você já parou pra pensou sobre uma prosaica mesa?  Esse móvel simples, prático e útil que há milênios desempenha um papel relevante à humanidade?  Ela estava nos palácios dos Faraós do Egito; na Dinastia Shang da China antiga; na Grécia de Platão; na Roma do Imperador Tácito e do poeta Virgilio; nas reuniões secretas dos Templários e na conspiração dos Inconfidentes Mineiros. Ela está, hoje, em nossas casas, nos escritórios, nas lojas, nas oficinas, nos museus, nas escolas, nos bares e em mil outros lugares, especialmente em restaurantes.

 Não dá para imaginar uma casa que não tenha uma sequer, na maioria das vezes até para múltiplo uso. Serve para a refeição do dia a dia, para o estudo das crianças, para o chá das visitas, o corte do tecido da dona de casa costureira. Serve para suportar o arranjo de flores que dá vida e alegria ao lar; serve para receber as compras quando se chega do supermercado e, metaforicamente, até para a discussão da relação do casal e da família quando a ela se apela dizendo: “vamos colocar nossos problemas sobre a mesa”. E não esquecendo de que marcam as primeiras lições de Inglês dos nossos pequenos quando se afirma, mesmo que jocosamente, “the book is on the table”...

Nos escritórios não dá nem para imaginar como, sem uma mesa adequada, se produziria os relatórios, escreveriam os textos, calculariam os resultados e fariam reuniões de trabalho. Em uma loja, ela é imprescindível para demonstrar a mercadoria, fazer o pacote e servir ao cliente em potencial o cafezinho que estimula o fechamento do negócio. Nas oficinas é com ela que se consertam as peças, lixam-se a madeira, faz-se polir o metal, apertam-se os parafusos e soldam-se as peças quebradas para fazer reviver o velho aparelho doméstico. É ela que suporta esculturas nos museus, os livros da professora na escola, os cadernos que os alunos aprendem as primeiras e as mais avançadas letras, como também – em um bar – é nela que o boêmio afoga as mágoas do amor perdido...

Nos restaurantes, ela acomoda os casais, os grupos de amigos e as famílias que procuram um lugar tranquilo para uma das atividades mais prazerosas que o ser humano pode ter: uma boa refeição, um vinho na medida certa e acima de tudo um momento de convívio especial que o tira da rotina e o coloca em uma nuvem de paz. Soubessem todos os "restauranters" da importância de uma mesa para quem valoriza esses momentos, jamais colocariam algumas no corredor, próximas a lugares barulhentos, coladas à porta do banheiro ou em locais que sejam potencialmente capazes de anular toda a atmosfera que se exige de um lugar aprazível.

Aqui eu entro com o que o pessoal de casa atribui a mim como sendo uma das minhas chatices mais exageradas: sempre tomo a iniciativa da escolha da mesa que julgo ser das melhores do restaurante. Meu critério é muito simples: evito mesas em lugares de passagem onde circula muita gente; busco uma que esteja em uma área bem arejada, de pouco ruído e de preferência em um cantinho mais isolado que me permita falar sem incomodar ou ser incomodado. Fujo daquelas que ficam coladas no toalete, na boca da cozinha onde os garçons transitam com frenesi ou nas proximidades de outras mesas onde grupos barulhentos já se instalaram.

Isso é ser chato?

Penso que não! Mesmo porque, não sou de chegar tarde a restaurante e ter que ficar com a única mesa que todos que me antecederam já recusaram. Principalmente, se sou frequentador assíduo de determinado restaurante já até tenho a minha mesa de preferência e é para ela que eu me dirijo. Onde frequento pouco, ou estou indo pela primeira vez, é que me dou ao capricho dessa chamada chatice.

Será que eu estou errado ou prestando uma reverência a essa majestade soberana, indispensável e de efeito mítico que é a mesa?

Edson Pinto

Maio’2015 

1 de mai. de 2015

292) SÓ PARA GÊNIOS?


De diversos amigos do Facebook recebi o desafio que ilustra este texto.  Se você é participante da rede social deve tê-lo visto também, pois ele faz parte dessas publicações virais que vez por outra surgem na internet.  Li várias respostas na seção de “comentários”, sendo que a totalidade fazia algum sentido e se escudava em raciocínio aparentemente lógico e demonstrável.

 Uns afirmavam que o resultado seria 90, pois considerava a lógica de se multiplicar, em cada linha, o número da esquerda pelo numero da mesma posição que dá continuidade a sequencia numérica e que está, ou estaria, na linha seguinte. Assim, como na linha do número 5 (à esquerda) a sua multiplicação pelo número 6 da linha seguinte levou ao resultado 30, bastaria a multiplicação do 9 pelo seu lógico sequente que seria o 10. Neste caso o resultado seria, obviamente, 90. A hipótese aqui assumida é a de que os algarismos 7 e 8 foram propositadamente omitidos apenas para confundir o desafiado.

Outra resposta que também faz sentido é considerar que o resultado de uma linha corresponde ao resultado da linha anterior acrescido do dobro do número da primeira coluna da linha analisada. O 42, por exemplo, se explicaria pela soma do resultado de 30 da linha anterior somado ao dobro de 6, isto é, 12, da linha para a qual se faz o cálculo. Por essa lógica, o 90 como resultado da linha da interrogação se justificaria, pois o número 72, que se pressupõe estaria na linha anterior omitida, somados ao dobro de 9, isto é, 18, levariam ao mesmo 90.

O que pega neste exercício é saber o que há por trás da omissão dos números 7 e 8 na sequência. Seria exatamente esse o enigma a ser desvendado? O número 234569 (formador da sequência da primeira coluna) teria alguma propriedade especifica como, por exemplo, ser um número primo, um fatorial, um número perfeito, poligonal, ou mesmo um número de Fibonacci, de Bell ou Catalão? Não é nada disso. Há de se questionar, então, se trata de uma omissão capciosa ou se devemos respeitar a sequência tal qual apresentada?

Sem querer polemizar, pois meu objetivo neste texto é outro, como saberão no parágrafo seguinte, eu me arriscaria a dar a resposta que considera a sequência tal qual demonstrada, isto é, nada foi omitido sem que isso tivesse sido explicitado na formulação do desafio. Parto, portanto, do principio de que as informações só são essas. Assim, diria eu que o resultado seria 60.  Explico: Já que não há como garantir que o próximo número seria o 10 ou o 0 ou mesmo o 1, então eu só posso trabalhar com os números dados. Usei o resultado da linha anterior, 42, somando duas vezes o número 9 da linha pedida. Se for isso que o autor do teste esperava como resultado, ou se é o 90 ou outro número qualquer só ele pode explicar. Devolvo o desafio a ele...

Eu fico, contudo, com a lição que esse problema nos sugere, ou seja, a de que a verdade é uma das questões mais profundas e difíceis para nós os seres racionais. Não é por outra razão que filósofos desde priscas eras têm discutido o tema sem que uma conclusão satisfatória e definitiva se tenha alcançado. Fala-se em vários tipos de verdades, inclusive em verdades relativas, aquelas que se moldam a cada circunstância. O que para uma pessoa faz todo o sentido para outra pode nada significar.

Quando olhamos o quadro político em que vivemos somos – não raro – surpreendidos com a multiplicidade de verdades que são apresentadas para um mesmo fato, um mesmo comportamento. Temos inúmeras versões dos mesmos eventos, suas relativizações, suas temporalidades, a exegese das nossas leis, os costumes presentes e pretéritos e, acima de tudo, os aspectos morais. Pode ser legal, mas não ser moral. E até mesmo, em sendo moral, nem tanto...

Resolver os enigmas da vida não é um desafio só para os gênios como se instiga no desafio matemático acima. Pode e deve ser algo muito simples, pois, como nos ensinou o mestre Khalil Gibran:

“A simplicidade é o último degrau da sabedoria”.

Edson Pinto

Maio’ 2015

23 de abr. de 2015

291) NO PAÍS DAS PEDALADAS


O prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, concebeu e vem aos trancos e barrancos executando um ambicioso plano para prover a cidade com 400 quilômetros de ciclovias e “ciclofaixas” até o final de seu mandato. A diferença entre os dois termos é sutil e não vem ao caso de aqui perder preciosas linhas para o esclarecimento. Usarei apenas o terno ciclovia que além de mais sonoro é o que se encontra registrado no Aurélio. O importante é que, obviamente mirando-se em exemplos de cidades europeias, quer o prefeito petista fazer de Sampa uma terra de ciclistas e assim passar glorificado para a história. Neste mérito me recuso a entrar...

Como todo projeto polêmico este anda eivado de criticas pelo seu fraco planejamento e principalmente pela forma atabalhoada com que vem sendo executado. Os moradores e comerciantes das ruas afetadas não são previamente ouvidos e, não raro, faixas pintadas de vermelho sobrepõem-se a buracos e encontram postes e árvores e outros obstáculos intransponíveis pela frente. O importante para a Administração petista é tocar as obras, custe o que custar. Neste particular, a propósito, há até quem já apontou que vêm custando muitíssimo mais do que custa em outros países. Mas isso é outra questão. De outro lado, um grande contingente de ciclistas aprecia em muito a iniciativa e isso é positivo...

O ciclismo é uma atividade impecável. Eu mesmo já tive, no passado, a experiência de usufruir de saudáveis pedaladas quando por dois anos morei na Holanda. Posso dizer, portanto e por experiência pessoal, que esse simples e econômico meio de transporte aperfeiçoado pelos ingleses no final do século XIX continua sendo – dada as circunstâncias – o que há de melhor, pois alia meio de locomoção prático e econômico com a saudável atividade física e - em tempos de acirrada preocupação com o meio ambiente – um ato ecologicamente perfeito. Eu disse perfeito e não prefeito...

Há, contudo dois grandes obstáculos para o sucesso dessa iniciativa em muitas das cidades brasileiras: A primeira é que as vias urbanas já estão definidas e nessa circunstância é muito mais difícil achar espaço para as ciclovias do que tê-las já definidas quando do projeto urbanístico. Construir uma faixa para uso exclusivo de ciclistas rouba espaço do transporte público, dos automóveis, das áreas de paradas e até mesmo dos pedestres. O outro problemão refere-se à topografia. Na Holanda, o país referência para o ciclismo, é um território essencialmente plano. Os ciclistas têm condições confortáveis para pedalar e o clima de ameno a frio ajuda em muito. Em São Paulo, salvo em áreas bem especificas, temos muitas vias íngremes que dificultam em muito a prática confortável do ciclismo, especialmente quando sob temperaturas elevadas. As realidades, com se vê, são bem distintas, porém não de todo irreconciliáveis.

De qualquer forma, eu sou daqueles que consideram que a ideia é boa e que mesmo se pouco se avançar nesse projeto pelo menos ele já terá o mérito de despertar a consciência dos planejadores urbanos para que os novos projetos viários considerem o espaço adequado e seguro para os ciclistas. Cidades menores e mais planas certamente têm muito a ganhar, e muitas já ganham, com criação de ciclovias. Até mesmo por uma questão econômica, pois custa muito menos construir ciclovias do que construir grandes avenidas para suportar o crescente aumento da frota de automóveis.

A lição que nos fica desse projeto é que ele – infelizmente para o prefeito Haddad – é a associação que somos levados a fazer entre as pedaladas ciclísticas com as maluquices que o seu partido, o PT, vem demonstrando na condução da economia do País. Não sei quem imita quem, mas o fato é que Dilma, mesmo morando em Brasília, mostrou-se também fã de pedaladas, só que de natureza fiscais e não ecológicas. Já se desconfiava, mas agora o Tribunal de Contas da União demonstrou a prática da criminosa pedalada com as contas públicas em flagrante desrespeito à lei de Responsabilidade Fiscal.

Para mostrar que as contas andavam bem, o governo (Tesouro Nacional) deixava de transferir aos bancos os valores para pagamento de obrigações como, por exemplo, o Bolsa Família. Passava a ideia de que fazia superávit fiscal o que significa boa administração e deixava, o que é proibido e, portanto criminoso, que os Bancos oficiais como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil fizessem os pagamentos numa forma oculta de empréstimo. No mês seguinte pagava-se o devido e fazia-se nova jogada. A isso, o mundo dos negócios convencionou chamar de pedalada. É como, ao andar de bicicleta, não poder interromper as pedalas sob pena de se levar um tombo.

Agora estamos neste imbróglio: Brasília pedalando, São Paulo de Haddad pedalando e o povo pagando a conta. Ou quem sabe, o povo, já massacrado com a carga tributária e com a inflação corroendo suas rendas, também já não aprendeu a pedalar a sua sobrevivência?

Afinal, parodiando Fernando Pessoa: viver não é preciso, pedalar é preciso...

Edson Pinto

Abril’2015 

16 de abr. de 2015

290) QUASE UMA SANTA



Decidimos e vivemos muito mais em função de fatores psicológicos do que de circunstâncias objetivas. Quem gosta, acompanha e entende um pouco de futebol, essa paixão popular, sabe bem do que estou falando: O elenco é de alto nível, os salários dos jogadores estão sendo pagos rigorosamente em dia, a torcida é fiel, vibrante e apoiadora, mas o time, misteriosamente, insiste em não vencer, até mesmo desafios considerados fáceis.

Observem que, em geral, não se atribui o fracasso do time a um ou a poucos de seus jogadores, mesmo quando eles não andam na melhor de suas formas físicas e técnicas.  A responsabilidade é na maioria das vezes atribuída ao técnico. Como forma de se contornar esse problemão, o técnico invariavelmente é trocado. Tanto faz o quão convincente e admirável seja o seu currículo profissional.

Como visto, o que prevaleceram não foram exatamente os fatores objetivos da realidade, mas sim os psicológicos. Quando algo precisa mudar, nossas mentes se condicionam a achar que as coisas só podem tomar outro rumo se removido o líder. Fica difícil para a mente humana acreditar que quem está errando no que faz tenha condições de admitir isso e assim assumir uma mudança substancial em suas ações.

Ações, como sabemos, decorrem dos pensamentos e das condições intuitivas e das crenças arraigadas que temos.  Isto é psicológico e, portanto, elemento determinador de grande parte de nossos atos. O técnico que tenha consciência disso e sabedor de que a sua permanência pode mais prejudicar do que ajudar o time, não raro toma a iniciativa de acertar com a direção do clube a sua saída. Nessas circunstâncias sair com espontaneidade adquire até um caráter de grandeza espiritual.

Transportada essa situação para a política o que vimos hoje é uma presidente que anda errando muito na condução de seu time. Mesmo que apontem fatores objetivos que viessem a sustentar a sua permanência, o psicológico da questão já se sobressai a tudo o mais. Até mesmo aqueles mais crédulos que alimentavam a esperança de uma reviravolta na forma como a nossa presidente vem conduzido o país já se renderam às evidencias de que é necessário trocar o técnico do time. Infelizmente, a encrenca em que nos metemos requer, agora, muito mais desprendimento e espírito cívico elevado do que se possa imaginar.

Quando o humor das massas entra em desequilíbrio como tem ocorrido presentemente tornam-se pouquíssimas as esperanças de que o mal possa ser corrigido com a técnica que foi responsável por ele. Assim como um clube que não pode prolongar em excesso a sua trajetória de insucesso, um país também não pode seguir sangrando por mais quatro anos só porque tem que sustentar a decisão infeliz de ter reconduzido a líder que não vai nada bem. Mais do que uma questão de honra e de defesa de interesses políticos o que se faz de maior relevância é a necessidade de que não deixemos o país ficar pior a cada dia.

Penso que o processo de impeachment mesmo sendo legal é uma “via crucis” que submete a toda a nação a um sofrimento de grandes proporções. Penso mais ainda que tudo isso seria evitado para o bem de todos se a presidente, fortalecida de sua civilidade e patriotismo, apresentasse a sua renúncia. Mostraria, no mínimo, a nobreza de espírito que caracteriza os grandes líderes. Passaria para a história como a presidente que abriu mão de suas vaidades e não a imagem da teimosa que conduziu o País ao descalabro.

Como Pedro Stédile, líder dos MST, recentemente definiu Dilma Rousseff como praticamente uma “santa”, bem faria a ela se acatasse de pronto essa designação e tal qual Santa Maria Madalena, na foto que ilustra este texto, também renunciasse de suas posses e passasse para a história santificada e não amaldiçoada. Deixaria de ser “quase” para ser uma verdadeira santa...

Edson Pinto

Abril’2015 

12 de mar. de 2015

289) DE NOVO OS BICHOS

Meu amigo José Roberto dos Santos me repassou um texto/desabafo que - de forma pretensamente didática - eu tentei resumir e acomodar na tabela abaixo. Não são necessariamente pontos de vista pessoais, quer seja do meu amigo, quer sejam meus, mas sim a síntese de uma reflexão sobre o que paira no ar. Não se deve, portanto, subestimar a sua fácil aplicação ao momento que ora vivemos. Reagrupei os temas, acrescentei algumas firulas, mas respeitei integralmente o seu espírito original.

Sua leitura, creio, pode levar a cada um de nós à necessária conscientização de que vivemos, infelizmente, em um país cada vez mais apartado das convicções e dos valores que nos impulsionavam os ideais até um passado não tão distante. 

Leiam com cuidado os pontos e em seguida - se tiverem paciência - leiam também o texto que escrevi em outubro de 2010 na antevéspera da primeira eleição da presidente Dilma e cujo link forneço em seguida.

O QUE FIZ E SOU...
... E O PREÇO QUE PAGO POR ISSO.
Meus pais foram responsáveis e rigorosos comigo me propiciando escola e educação. Assim, estudei e pude adentrar ao mundo do conhecimento.
Agora sou rotulado de pertencer a uma minoria privilegiada. Omitem por conveniência  o mérito dos meus pais e os meus próprios.
Com  esforço e sacrifício do meu tempo de lazer trabalhei de dia e às noites frequentei a Universidade e me diplomei
Hoje, me consideram burguês. Não raro, um privilegiado membro da elite. Se eu bato panela em protesto à calamitosa situação do País me assacam um “Elite Gourmet”
Trabalhei arduamente por 35 anos na mesma empresa e consegui formar meu patrimônio, pequeno, mas sólido.
Sou visto com um membro da elite, um esnobe que não tem pena dos despossuídos. Esquecem-se dos exorbitantes impostos que pago que se bem aplicados fariam adequada justiça social.
Não votei no PT, no PCdoB e em outras dessas siglas exóticas.
Hoje me chamam de fascista, de neoliberal, de direita caviar.
Sou hétero e cristão, mas respeito e defendo o direito dos outros quanto às suas próprias preferências.
Mas quando expresso essa minha condição me rotulam homofóbico e infiel.
Não sou sindicalizado, por opção.
Isto me torna um traidor da causa operária e um subserviente aliado do patrão.
Tenho minhas próprias convicções e opiniões. Não aceito quaisquer  versões que o governo, mentindo, diz como se verdades fossem.
Por isso, tacham-me de golpista. Quando reclamo dos altos impostos que pago, me rotulam de sonegador. Se eu critico os roubos na Petrobrás, atacam o meu patriotismo.
Sou adepto incondicional da meritocracia.
Rotulam-me de antissocial, de egoísta, de insensível, de elitista.
Sou muito grato aos meus pais que me educaram com disciplina e me ensinaram a respeitar os outros.
Hoje, quando defendo maior rigor na criação dos filhos me consideram um carrasco a impedir-lhes o pleno desabrochar.
Respeito a vontade popular e confio na instituição das forças armadas para garantir a segurança constitucional do País.
Quando falo isto me chamam de oposição golpista de ser um saudosista do regime militar.

Como já disse, em 1/10/2009 eu escrevi e publiquei neste mesmo blog, o texto de nº 138 intitulado, “Eleição dos Bichos” (clique neste link para ter acesso a ele: http://blog-do-edson-pinto.blogspot.com.br/2010/10/138-eleicao-dos-bichos.html)

Sugiro a leitura, porque o tema desta crônica de hoje tem muito a ver com o que lá expressei. A situação é outra, mas os bichos são os mesmos...

No texto, para resumir, fiz referencia ao importante e ainda atual clássico de George Orwell, “A Revolução dos Bichos”. Lá, ele satiriza a experiência socialista empreendida pelos bichos da Granja Solar liderada pelo porco Napoleão. Havia ainda, assessores manipuladores da mesma espécie, ovelhas alienadas, burros esforçados e galinhas dispersas. Os valores inicialmente estabelecidos para nortear as ações dos comandantes foram perdendo consistência, esquecidos, modificados e adaptados aos seus interesses pessoais.

Alguma semelhança?

Edson Pinto
Março’2015