28 de jun. de 2012

207) DISCUTINDO A RELAÇÃO

__ Ângela, amor da minha vida, você já pensou como tudo poderia ter sido diferente se tivéssemos optado por outro caminho que não este que acaba de nos levar a tamanha decepção?

__ Claro, Oscar, meu anjo! Nem é preciso pensar muito sobre isso. Cada caminho, com raras exceções, é óbvio, nos leva a destinos diferentes. A vida é um estar permanente em encruzilhadas. Temos sempre que optar para que lado seguir, se é que queremos ir em frente. O problema é que às vezes nos deixamos enganar por falsas moralidades, por paraísos imaginários, efêmeros. A lição a se tirar disto tudo é que pouco nos ajuda ficar choramingando sobre o leite derramado. É hora de levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima, como nos ensina a canção popular.

__ Torço, minha querida, para que você tenha razão. De minha parte só posso manifestar meu desejo de, no futuro, voltar a acreditar, mas não agora. A vida nos dá e nos tira oportunidades como se fosse num jogo de escolha de alternativas desconhecidas. Algo parecido com aquela brincadeira do programa de TV em que se oferece um prêmio oculto em troca do real e conhecido que já está em nossas mãos. O que nos leva a arriscar é sempre a possibilidade de que o desconhecido seja mais valioso do que aquilo que já possuímos. No nosso caso, erramos ao optar por aquilo que se encerrava na caixa de surpresa.

__ E o pior, meu arcanjo, é que temos a tendência de esquecer as lições com que a vida nos presenteia, sejam elas boas ou más. Eu jamais poderia ter me iludido sabendo que por conta desse meu sentimento egoísta provocaria no homem que verdadeiramente amo esta imerecida frustração. Sei que fui vaidosa, inconseqüente e ingênua. A minha única esperança, como já disse, é que amanhã possamos acertar.

__ Não poderia deixar de dizer também, luz da minha estrada, que eu igualmente tenho lá a minha parcela de culpa. Deveria ter prestado mais atenção aos sinais que as circunstâncias que nos rodeiam vinham emitindo. Fui também crédulo, egoísta, presunçoso e de uma arrogância detestável. Só agora me dou conta disso. O rompimento é, portanto, inevitável e necessário...

__ Rendo-me à sua decisão, meu querubim. De agora em diante, fica assim, estamos livres para escolher o caminho que quisermos. Tê-lo cativado para acreditar no PT e dar o seu voto ao filho de Dona Lindu foi, de fato, um tremendo equivoco. O caminho não era obviamente esse. O homem até que parecia ser uma boa pessoa, mas agora veja no que deu. Teriam seus neurônios sido afetados pela megavoltagem radioterápica do recente tratamento de saúde a que se submeteu?

__ Será o fim?

Edson Pinto
Junho’2012

21 de jun. de 2012

206) GROSSERIAS DO FAUSTÃO

Há tempos venho ensaiando escrever uma crônica sobre uma das figuras de maior visibilidade da televisão brasileira desde que Chacrinha se foi. Fausto Correia da Silva, mais conhecido como Faustão, detém o privilégio de apresentar seu programa na TV Globo, emissora de maior audiência do País, bem ao longo das nossas doces tardes de domingo. O Papa Gregório III na famosa reforma do calendário de 1582 consagrou o domingo como “Dies Dominica” (Dia do Senhor). É, portanto, esse dia, desde há muito, dedicado a reflexão espiritual e ao descanso, justificadamente nestes tempos modernos de tantos afazeres. Salvo condições especiais de cada um, é nele, em geral, que nos recolhemos ao aconchego do lar, até mesmo como concentração e preparação para a semana de trabalho que começa logo no dia seguinte.

É no domingo que a família tende a se reunir. Na tradição italiana, para a famosa macarronada da “mamma”. Com os parentes e amigos para o churrasquinho descontraído, o futebol, jogado ou mesmo assistido pela TV. Para os católicos, a ida à missa, a visita aos parentes e amigos e - como ninguém é de ferro - para entregar-se, ao final das tarde e início da noite, ao relax merecido em frente à TV. A televisão tem lá suas muitas vantagens e desvantagens. Uma delas que pode servir tanto ao bem como ao mal, dependendo da intensidade, momento ou conveniências pessoais, é a de poupar o uso de nossos neurônios. Sabemos que assistir TV não requer o esforço intelectual de uma boa leitura, por exemplo, mas, como o cérebro exige pausas para descanso, apresenta-se assim como uma alternativa muitíssimo adequada.

Nos dias de hoje, são dezenas de canais disponíveis até mesmo na TV aberta. Há, portanto, alternativas em abundância para quem não gosta de determinados programas. O controle remoto libertou-nos do incômodo “senta levanta” dos primórdios da TV e - não raro - mais de um televisor em casa nos dá a alternativa de satisfazer, em simultâneo, interesses pessoais dos vários membros da família. Em que pese isto, é curiosa a tendência das famílias se reunirem em frente ao mesmo aparelho de TV. Deve ser, imagino, para o exercício da nobre e necessária socialização dos seus membros.

Pensava que a birra que tenho para com o apresentador Faustão fosse uma chatice exclusivamente minha. Por que não troco de canal ou vou para outro aparelho enquanto minha família fica assistindo o Domingo do Faustão? Antes, é preciso esclarecer que tenho respondido a mim mesmo com outra pergunta: “Se não assisto ao programa como poderei criticá-lo?” Não quero ser como uma querida tia que detesta arroz sem nunca ter provado um grão sequer. Quando digo que não gosto de algo, procuro fazê-lo com base na experiência negativa que tive com aquilo. Depois, assisto, às vezes, o programa, porque ele tem atrações interessantes, reportagens bem produzidas e até mesmo novidades e emoções. O que continua sendo criticável, e muito me incomoda, é a postura do seu apresentador.

Antes de iniciar esta crônica fui ao Google e fiz pesquisa com o título que escolhi para ela, isto é, “grosserias do Faustão”. Encontrei exatos 50.300 resultados que tratam do mesmo tema, o que me dá a certeza de que a questão não é exclusivamente pessoal. Muitos brasileiros compartilham comigo da mesma critica. Faustão pode ser uma boa pessoa, aparentemente um homem generoso com seus amigos mais próximos, porém demonstra um primitivismo e certa arrogância típica de quem se julga superior aos semelhantes. É desrespeitoso, falastrão, usa palavras chulas chegando às raias da malcriadez.

O incrível é que o chamado padrão global da grande emissora é completamente ignorado quando Faustão intervém, sempre de forma jocosa e cínica, atropelando os comentários dos seus entrevistados. Dificilmente um entrevistado consegue concluir o seu pensamento sem que o apresentador interceda com uma observação despropositada. As piadinhas de duplo sentido, principalmente relacionadas a sexo, são de uma vulgaridade incompatível com o perfil de famílias que assistem ao programa. As desrespeitosas brincadeiras que faz com seus colegas da área técnica, colaboradores profissionais dedicados e sérios, por exemplo, já estão tão manjadas que perderam, desde há muito, todo o sentido de diversão que ele imagina ter.

Aí que saudades de Chacrinha! Pelo menos o velho guerreiro não só fazia suas palhaçadas como se caracterizava para tal.

Vocês querem bacalhau?

Edson Pinto
Junho’2012

14 de jun. de 2012

205) QUEM PAGA A CONTA?

O assunto não é novo, mas sempre que vem à tona ficamos com aquela sensação de que nos defrontamos com ele pela primeira vez, tamanho o seu absurdo. Aprendemos que a forma social de viver é a mais adequada para a nossa espécie. Não fosse isso, seriamos apenas uma espécie dispersa, talvez em extinção, e não teríamos dominado a Terra e o pedaço de Universo que se acerca de nós. A vida comunitária, tal qual a exercemos, exige solidariedade, renúncias e organização. Ao Estado toca a parte principal desta tarefa que é o de agregar, sob um mesmo território e mesmas leis, todos os cidadãos. Fazemos isso contribuindo com o nosso trabalho, com os impostos que pagamos e outras renúncias voluntárias ou coercitivas para que a máquina estatal exista e cumpra o seu papel de gerir a coisa comum. Quando temos consciência disso, exercemos com responsabilidade o nosso direito de votar e/ou ser votado.

O estado moderno, especialmente os democráticos, deu-nos mais liberdade e conforto, mas também passou a nos exigir mais esforço em prol do bem comum. Os impostos que pagamos, por exemplo, são cada vez maiores. A princípio, porque a vida moderna requer serviços mais complexos e mais dispendiosos. Há, por fim, a questão da redistribuição de renda para promover a necessária harmonia social.

É aqui que uma questão importante da realidade econômica se afigura como de difícil compreensão, notadamente pela parcela alienada do povo: Mesmo que razões políticas recomendem ações de forma diferente, ainda assim a racionalidade econômica pode e deve ser aplicada. Partindo-se do principio de que os recursos, independente de sua natureza, são, em geral, escassos e que, como tal, devem ser usados com parcimônia, compete aos gestores desses recursos a busca incessante da otimização do seu uso de tal modo a maximizar o resultado esperado.

Há uma lei universal que determina a busca do melhor resultado pelo menor dispêndio possível. A maior felicidade pelo menor sofrimento, o maior ganho pelo menor esforço, os melhores produtos e serviços pelos menores custos. No campo estrito da vida econômica, nada mais fazem os seus agentes do que perseguir o melhor resultado com o menor custo possível. Uma fábrica, qualquer que seja o seu produto, não usaria pelo mesmo custo e investimento um motor menos eficiente do que outro. Ao mesmo preço, compramos a roupa que se apresenta como sendo a melhor para nós, o espetáculo teatral que nos dê mais divertimento e ainda matricularíamos nossos filhos na escola que oferece o melhor ensino. Os economistas sintetizam esse mecanismo como o principio do “Custo x Benefício”.

Embora essa racionalidade devesse prevalecer sobre todas as ações humanas, temos que admitir que os aspectos egoístas que a governam tendem a fazer o contraponto numa constante tentativa de se conseguir brechas para que o benefício de uma parte se sobreponha à da outra. O vendedor esperto e desonesto sempre tentará empurrar o produto ou serviço de menor custo pelo maior preço possível. Se não formos assertivos e se não houver alternativas, há grande chance de cairmos na esparrela. Neste caso, o vendedor indigno desequilibra, obviamente a seu favor, uma relação que deveria ser boa para as duas partes, e não foi. Mas, isso ocorre no âmbito das relações privadas, fora do governo.

Agora imagine a relação entre o “ente sem face”, o Estado, assim entendido a sua multiplicidade de agentes, ministérios, secretarias e setores de serviços que tradicionalmente têm sido alocados aos poderes constituídos da República. Veja quão desequilibrada é a relação entre o provedor e o tomador desses serviços! Primeiro, não há aqui o concurso da salutar concorrência. Atuar monopolisticamente em qualquer ramo de negócio é o sonho de todo esperto e o Estado é tipicamente monopolista. Segundo, a arrogância do Estado, as falhas de controle que se tem sobre ele, o espírito de corpo prevalecente em suas corporações e a falta de visibilidade e divulgação adequada de seus atos torna a relação cidadão/estado uma covardia em favor deste último.

No recente episódio dos salários dos funcionários da Câmara Municipal de São Paulo e que foram publicados por força da novíssima lei de acesso à informação, ficamos sabendo que o supervisor da sua garagem ganha quase R$20 mil/mês; suas enfermeiras R$26 mil/mês. Salários parecidos ganham ainda técnicos administrativos de curso secundário daquela egrégia casa legislativa. Fica, assim, dolorosamente demonstrado, mais uma vez, que o principio da otimização dos resultados não é ali, nem em outras atividades públicas, minimamente respeitado. A consequência disso é que o ente governamental precisa de mais e mais impostos para sustentar essa máquina perdulária e de retorno social duvidoso.

Agora pense se - dadas as proteções legais que essa turma tem - conseguiremos, algum dia, corrigir essas aberrações? Numa empresa privada far-se-ia uma reorganização e os disparates seriam eliminados para garantir, assim, a competitividade e a sua sobrevivência em um mercado com concorrentes mais eficientes. Na máquina pública isto não acontece e, infelizmente, só tende a piorar.

Por isso, a única resposta à pergunta feita como título desta crônica é: “Somos nós...” E o pior é que o País perde competitividade, condenando-nos à eterna condição de País do futuro e nunca do presente...

Edson Pinto
Junho’ 2012

6 de jun. de 2012

204) QUEM TEM MEDO DO MENSALÃO?

Feriados estendidos com finais de semanas, ou o inverso, já fazem parte do nosso brasileiríssimo modo de ser e de gozar a vida. Só muito raramente e por eventuais descuidos do generoso São Pedro, temos essa benesse prejudicada com condições climáticas adversas. Tudo indica, infelizmente, que o Corpus Christi deste ano junto com o final de semana que lhe sucede se enquadra nesta indesejável exceção, pois, pelo menos aqui no sudeste, teremos chuva em prodigalidade e algum frio.

Em isto de fato acontecendo, nada melhor do que curtir a própria cidade em que moramos e não sair arriscando a vida pelas estradas superlotadas e mal cuidadas de um país que sofre do eterno paradoxo econômico de não crescer mais celeremente porque não tem infraestrutura adequada e de não ter ainda infraestrutura adequada porque não consegue crescer mais celeremente. Durma-se com um barulho desses!

Tenho uma boa sugestão para quem vai ficar em casa. Se tiver luz e a Internet funcionar bem, acesse este link (clique sobre ele):


e saboreie o relatório do ministro do STF, Joaquim Barbosa, relator do processo do Mensalão, a ser, em breve (espera-se), julgado pela suprema corte do País. São 122 páginas escritas de forma concisa utilizando-se de linguagem compreensível a todos nós mortais, isto é, pouco juridiquês, e que traça um quadro cristalino do episódio mais vexatório que a política brasileira produziu em tempos recentes. Mesmo sendo 122 páginas - garanto, pois li todo o relatório - dá para se fazer uma leitura rápida e dela extrair apenas os temas mais importantes e que nos interessam.

Resumo para aqueles que não tiverem condições de fazer a leitura:

O PT tinha, e obviamente ainda tem, um plano de governo para um prazo muito longo, ao menos pelo tempo em que Lula, José Dirceu e outros da turma estiverem vivos. Era, em 2003, necessário não só garantir a governabilidade do Lula recém-empossado, “comprando” apoio de parlamentares apoiadores, bem como pagar dívidas pretéritas ao mesmo tempo em que se procurava fazer caixa para as futuras que disso decorreriam.

O núcleo de comando das peraltices era liderado por José Dirceu com a participação estreita de Delúbio Soares, José Genoíno e Silvio Pereira. Valeram-se do núcleo de agências lideradas pelo ex-carequinha Marcos Valério. Este era o responsável pela engenharia financeira que criava empréstimos falsos, gerava verbas de propagandas nunca feitas, abocanhava comissões de mídias não devolvidas aos anunciantes governamentais e outras mágicas, tudo organizado para entregar dinheiro vivo a um mundo de malfeitores e “vendihões” traidores do voto popular.

O termo Mensalão, nunca reconhecido por Lula que até hoje jura nada saber, na verdade quer se referir às mesadas distribuídas fartamente e ao arrepio das leis lesando o erário público, saqueando empresas estatais, corrompendo políticos, dirigentes de empresas públicas e privadas, partidos políticos aliados e tudo o que a desfaçatez humana é capaz de produzir quando submetida ao mais vil de seus propósitos que é o da manutenção duradoura no poder. Isto, como a História nos ensina, costuma ter êxito por algum tempo, mas nunca para sempre. A lógica imediata e mesquinha de quem o pratica é que, se ao menos durar o tempo em que seus atores atuais estejam vivos, já está de bom tamanho. Aos que ficarem, a batata quente...

Se tudo ocorrer como o povo brasileiro deseja e merece, o julgamento do Mensalão haverá de se constituir em uma grande contribuição à nossa cultura ao sinalizar que fatos dessa sordidez não voltem mais a acontecer. Atrevo-me a classificar esse processo para algo além das necessárias implicações jurídicas quando os malfeitos devem ser punidos. Imagino alguma coisa parecida com os propósitos da Comissão da Verdade, recém-implantada, e que tem como objetivo maior extrair dos fatos históricos lições que aprimorem o presente e o futuro da nação. Afinal, os homens passam, mas a nação com nossos descendentes perduram.

Agora, objetivamente falando: Leia o relatório acima mencionado e descubra quem, na verdade, tem medo do julgamento do Mensalão.

Edson Pinto
Junho’ 2012