19 de dez. de 2014

284) BOAS FESTAS

Como faço há anos, eu sempre dedico o texto que publico no meu blog, antecedendo ao Natal, para falar de amenidades.

Abro mão, portanto, das crônicas, às vezes mordazes que faço sobre as mazelas que nos rodeiam, ou poupo os meus amigos de lerem as veleidades que eventualmente me meto a publicar na forma de contos, mesmo os leves.

O importante para mim, nessa época do ano, é poder me dirigir a todos para externar os meus votos de que tenham um Feliz Natal e, no ano novo que se aproxima, as suas esperanças sejam convertidas em realidade.

É muito gratificante – olhando pelo plano da existência humana – nos darmos conta, justo quando fechamos mais um ciclo, de que ainda estamos fazendo parte dessa festa monumental que é a vida. Impossível não sermos tomados pela plenitude de nossas consciências de que ela, a vida, é transitória e, o quanto, para cada um de nós, se tomada isoladamente, é microscópica quando considerada a infinitude do tempo.

Assim, termos a certeza de que ainda estamos vivos, representa-nos mais do que uma grande sorte, senão uma grande benção. Vivemos, pois, um momento ímpar...

Se não fosse a percepção que às vezes nos assalta o espírito de que as circunstâncias que nos rodeiam, de quaisquer naturezas que sejam, sinalizam possíveis duros e, não raro, amargos desafios para o ano seguinte, ficaríamos tão acomodados que a vida perderia o seu real sentido.

Saber disso é reconhecer que nascemos para a luta e não para o conforto inconsequente. Ansiamos - pela nossa própria natureza - com a possibilidade da renovação. O “próximo ano” renova-nos sempre a oportunidade de um novo ciclo em nossas próprias vidas.

Então, que tenham todos, um Feliz Natal e um Ano Novo magnífico!

Volto a publicar no meu blog somente depois do Carnaval.

Edson Pinto 

Dezembro’2014 

12 de dez. de 2014

283) NÃO VAI FAZER FALTA?


½  galeto americano = R$29,00    ½ galeto brasileiro = R$49,00


Em recente viagem aos Estados Unidos e encontrando-me então com o senso critico mais aguçado, fiz observações pessoais várias sobre diferenças existentes entre a forma como se dá o pensamento e a ação na cultura de negócios dos americanos e na nossa brasileira. O que chama a atenção é o fato de sermos ambos capitalistas e, por isso, imaginava haver de se esperar muita semelhança e poucas especificidades que as tornassem em certos aspectos muitíssimo diferentes. Quero nesta crônica citar um exemplo trivial que faz parte do dia a dia que qualquer cidadão demandante de serviços de restaurantes:

Qual brasileiro que em viagem aos Estados Unidos não se surpreende com a grande quantidade de alimentos que é servida em qualquer prato que se peça em um restaurante? A comida é farta a ponto de ser exagerada. A bebida normalmente é servida no sistema de “free refill” aquele em que se pode, pelo mesmo preço, renovar o seu copão de Coca Cola ou outras bebidas quantas vezes quiser e suportar. Gastronomicamente falando, não deixa de ser uma aberração, porém a análise aqui é de cunho mercadológico e não sobre hábitos alimentares. Tudo é generosamente servido e com o propósito explicito de encantar o freguês. Este é o ponto...

No Brasil, e para não ficar numa generalização inconsequente, pois há exceções, cito o caso de uma cadeia de restaurantes cuja especialidade é servir “galetos”, mas eu poderia citar dezenas de outros que conheço e que procedem da mesma maneira. Sou teimoso e esquecido, por isso, vez por outra, vou até esse restaurante e, confesso, sempre saio de lá com o mesmo desprazer. Pede-se um meio galeto que custa quase o dobro de pratos similares em restaurantes americanos e recebe dois minúsculos pedaços do frangote, pressupostamente oriundos de um galetinho muito mal nutrido. Não que comer menos do que o estomago pede não seja até recomendável, mas a quantidade é desrespeitosa de tão pequena. E olha que estamos no país onde a avicultura é considerada uma das maiores do mundo. 
  
Por que, então, os restaurantes americanos servem em abundância e a preços menores do que a maioria dos restaurantes aqui do Brasil? Fiz algumas investigações empíricas, sem o recomendável respeito ao método cientifico, é claro, mas suficiente o bastante para alcançar uma hipótese plausível e estarrecedora quanto à falta de visão de negócios de nossos empresários do ramo de alimentação:

Perguntem a qualquer dono de restaurante que saiba bem administrar o seu negócio, quanto em percentual a matéria prima, isto é, os alimentos propriamente ditos, representam do custo total de seu negócio. Eu fiz essa pergunta e descobri que esta parcela do custo, também chamada de variável, pois oscila diretamente com a quantidade de refeições vendidas, quando muito, fica sempre abaixo de 20% dos custos totais do restaurante. Os custos com aluguel, pessoal, energia, taxas e outros que tem caráter de fixos, isto é, independem do volume de refeições servidas, representa os demais 80%. Guardem bem estes números!

Como pensa o americano: “Se aumento em 25% a quantidade de alimentos nos pratos dos clientes proporcionando-lhes uma quantidade generosa e encantadora eles não só ficam satisfeitos como se sentem estimulados a voltar. Esse 25% a mais no custo da matéria prima acresce no máximo 5% dos meus custos, mas, com isso, atraio muito mais clientes e ao contrário de meu custo total relativo ao faturamento aumentar, ele diminui, pois tenho mais margem sobre os custos fixos que são a maior parte do custo total da operação”. Bingo! Os restaurantes americanos ficam lotados, os preços são menores e a clientela volta com assiduidade.

Como pensa o brasileiro em geral e, em especifico, esses do restaurante do galeto mirrado que às vezes frequento: “Tenho que reduzir meus custos, então coloco menos comida nos pratos dos clientes. Além disso, servindo pouco eles podem pedir mais pratos e assim eu faturo mais”. Infelizmente não se dão conta que a consequência disso é exatamente oposta ao obtido pelo americano. O cliente não fica satisfeito e não volta, ou volta com menos assiduidade ou por esquecimento como tem sido o meu caso; o restaurante tem menos faturamento e consequentemente redução de sua margem, pois os custos fixos permanecem inalterados; para compensar a redução da margem aumenta o valor dos pratos e o circulo vicioso de aumento de preço, redução de negócios se instala até que tenham que fechar as portas e amargando prejuízos vultosos.

É claro que temos empresários brasileiros que já percebem isto e se dão muito bem com seus restaurantes cheios e lucros apetitosos, mas falta à grande maioria essa dose de capitalismo que os americanos dominam com maestria. Penso que ainda pagamos um preço elevado pela falta de cultura de livre mercado no Brasil. Nossa república sempre primou pelo excesso de intervenção na atividade privada o que leva à criação de um empresariado arisco, voltado para o lucro imediato e cheio de espertezas. Ou nunca se dão conta, ou esquecem a sagrada lei maior da economia: Aquela que correlaciona para a maioria dos produtos e serviços o preço com o nível da oferta e da demanda. Menores os preços, maiores as vendas. Maiores os preços, menores as vendas.

Para não ser indelicado com o garçom que nada tem a ver com a falta de visão estratégica do seu patrão, uso sempre de uma inocente e delicada ironia quando ele me traz essas porções desrespeitosamente diminutas. Pergunto: Será que não vai fazer falta?

Edson Pinto
Dezembro’2014 

2 de dez. de 2014

282) NÃO HÁ LIBERDADE NEM EQUILÍBRIO ORÇAMENTÁRIO QUANDO O EXECUTIVO E O LEGISLATIVO SE UNEM INCONDICIONALMENTE


Acostumamo-nos com a ideia de que a república e outras formas de governos democráticos são constituídas de três poderes autônomos e independentes: O Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Por quais razões, nos países democráticos, a estrutura política deve ser organizada segundo esta ordem? A resposta pode ser encontrada em vários momentos históricos desde os gregos e os romanos, a partir do século VI antes de Cristo, até os dias atuais. Para não irmos tão longe à busca da gênese desse conceito, fiquemos com o aquele redesenhado no Iluminismo, importante período histórico que floresceu no século XVIII e que teve como cenário inicial a França de Rousseau, de Voltaire e de Montesquieu:

Primeiro vamos entender o porquê da existência, por tanto tempo, das monarquias absolutistas. Tudo começa – imaginem meus amigos! – com a autoridade inconteste da Igreja. O que ela falava era lei e não se discutia. Quem tentou discordar de seus dogmas se deu mal. Vide Galileu Galilei (1564 – 1642) que, para não perder a vida, teve que manifestar - evidentemente a contragosto - a sua “concordância” com a crença dogmática da Igreja de que o Sol girava ao redor da Terra e não o contrário. Só lhe restou - como sabemos - murmurar entre dentes ao sair do tribunal da Inquisição: "Eppur si muove" (mas ela se move...).

 Aos reis, a Igreja, obviamente por interesses outros, atribuía-lhes o direito divino de mandar nos seus súditos. Isto é, o monarca estava acima de tudo e de todos. Para que, então, três poderes distintos? O Rei era o Executivo, o Legislativo e o Judiciário tudo ao mesmo tempo. Agia de forma soberana, pois o poder para isso era de origem divina. Ninguém contestaria outorga desse naipe, certo? E olha que isso funcionou relativamente bem até que as descobertas científicas geradas pelo Iluminismo colocaram em xeque as “verdades” defendidas pela Igreja. Ora, se ela estava errada em tantas coisas, por que também não o estaria quanto a esse pretenso poder divinal que atribuía aos monarcas? Pronto! Com isso, tudo mudou, inclusive a forma de conduzir politicamente os aglomerados humanos.

Montesquieu defendeu a tese de que o poder despótico dos reis e de outras autoridades, inclusive o da Igreja, era a maior das ameaças às liberdades individuais. Só via uma forma de evitar a degradação social a que isso levava: Seria a separação dos poderes do estado. Sugeriu constituições que preservassem isoladamente os três poderes: o Executivo, aquele responsável pela condução do estado e a aplicação das leis; o Legislativo, como responsável pela produção e emendas das leis e finalmente o Judiciário como responsável pela interpretação das leis. Com a separação de funções e independência entre si, o protagonismo de cada poder nunca superaria as responsabilidades do outro. A constituição americana e mesmo a Revolução Francesa que vieram a seguir, bem como em quase todas as democracias que surgirem nas décadas seguintes, sempre contemplou, de alguma forma, esse magnífico sistema tripartite.

No Brasil também?

Imaginávamos que sim. Mas aqui – como em muitos aspectos de nossa cultura – as coisas não se aplicam tal qual original e bem intencionadamente concebidas. O Legislativo deveria apresentar-se com um grau de independência do Executivo tal que pudéssemos dizer para Montesquieu: “Olha, nós também entendemos bem o seu conceito de poderes independentes e estamos aplicando-o por aqui”. Infelizmente, em que pese termos que aceitar que o Executivo precisa de apoio do legislativo para suas boas propostas de lei, isto não deveria significar que esse apoio se desse de forma incondicional para quaisquer bobagens que venham dele. Mesmo sendo da base de apoio, há temas que o legislador deveria dizer: Nan, nan, nin, nan, não! Isto não passa, porque não é o melhor para o País. Mas o que vemos é que tudo passa, mesmo que seja para arruinar as nossas vidas e tornar o País perigosamente ingovernável.

O episódio da alteração da Lei Orçamentária só para proteger o governo Dilma que fracassou na execução do orçamento de 2014 é a prova mais cabal de que Montesquieu está sendo traído. Não há independência de poderes, mas sim um servilismo “interesseiro” e muitíssimo prejudicial ao País. Por que o Legislativo não ajuda com outras medidas legais o Executivo para que este possa cumprir o orçamento e não para burlar os compromissos antes assumidos? Que votem leis que reduzam o tamanho do estado; que demitam funcionários caros e ociosos; que privatizem empresas estatais ineficientes; reduzam os gastos com as mordomias e parem de dar dinheiro para repúblicas bolivarianas. Assim, seria alcançada a meta do superávit fiscal necessária para a amortização da enorme dívida pública que temos acumulado nos últimos três governos.

Sabem o que vai acontecer com a alteração da lei orçamentária? A dívida pública continuará crescendo, pois não economizamos nada para amortizá-la. Pelos critérios internacionais de análise da solidez financeira, o País perderá graus na avaliação e isto implicará em menos investimentos externo e taxas de juros mais elevadas. Como reflexo na vida de todos nós, tenderemos a caminhar para mais desemprego, mais inflação e menos certeza quanto ao futuro. O Senador Romero Jucá e outros de seus pares da base aliada que apoiam incondicionalmente o governo e que compõe a Comissão Mista de Orçamento encarregada de admitir ou não a proposta de alteração da lei do orçamento acabam de nos dar um exemplo tão concreto quanto negativo de que a independência do Legislativo em relação ao Executivo não passa de uma fantasia.

Montesquieu há de se ter remexido, incomodado e desiludido na sua tumba em L'eglise Saint-Sulpice, Paris, onde deveria estar descansando em paz...

É triste, mas é verdade...

Edson Pinto
Dezembro'2014 


24 de nov. de 2014

281) O MAIOR MAL É UM GOVERNO SEM LIMITE

“Quanto mais o estado planeja, mais difícil se torna para o indivíduo traçar seus próprios planos”. (F. A. Hayek)

Com a expressão título deste texto, “o maior mal é um governo sem limite”, o economista austro-britânico Friedrich Hayek legou-nos, em 1960, na sua obra “The Constitution of Liberty”, uma das mais importantes advertências sobre os malefícios do excesso de protagonismo dos governos de tendência à esquerda. Ela está fundada em evidências de que o planejamento econômico fortemente centralizado no governo é incapaz, por natureza, de entender e atender com eficácia e eficiência às necessidades dos indivíduos. Como o planejador central falha nessa tarefa, e para não perder a governabilidade, ele se vale da coerção e com isso passa a restringir as liberdades individuais. À medida que essa incapacidade vai se mostrando incontornável, esses governos - para manterem o poder - inclinam-se ao totalitarismo.

“Uma reivindicação por igualdade material só pode ser satisfeita por um governo com poderes totalitários”. (Friedrich Hayek)
Por outro lado, quando os mercados operam livremente eles captam com elevado grau de precisão as necessidades individuais e agem proativamente para o bem da economia como um todo. Dessa constatação, fica-nos a lição de que os mercados precisam de liberdade, e para que isso aconteça, os governos devem ter um papel muito tênue na dinâmica da economia de tal modo a permitir que a sociedade, por si só, promova o progresso. O papel do governo há de se limitar ao mínimo necessário para garantir especialmente a justiça e pouco mais do que isto. Portanto, dizer que o maior mal a que podemos nos submeter é o de vivermos sob um governo totalitário, onipresente, excessivamente regulador e patrimonialista metendo-se na esfera da atividade privada é, de fato, um grande infortúnio.

“O controle econômico não é meramente o controle de uma parte da vida que pode ser separada do restante; é o controle dos meios para todos os nossos fins”. (Friedrich Hayek)

Quem viveu como adulto a época de Margaret Thatcher a partir de 1975 há de se lembrar de que a esfacelada economia inglesa que ela encontrou ao assumir o governo foi remodelada segundo as ideias de Hayek. Ela enxugou o Estado, privatizou estatais ineficientes, desregulou setores viciados em proteção governamental, reviu o exagerado estado de bem-estar social de tal modo a sacudir o conforto daqueles que só sugavam as tetas da nação e nada davam em troca. Do outro lado do Atlântico, na mesma época, e com base nas mesmas ideias liberais de Hayek, Ronald Reagan, nos EUA, agia também em favor de mercados livres e com ampla liberdade de ação. Simplificaram a máquina governamental, tiraram as amarras que cerceavam a atuação dos empreendedores e reduziram impostos para permitir que as pessoas – em gastando mais – promovessem, elas mesmas, o progresso de suas respectivas nações. 
Como visto, estamos aqui no Brasil exatamente na contramão de práticas liberais, pois o nosso governo está cada vez mais se intrometendo em tudo. Pagamos o preço da excessiva regulação dos mercados, dos atabalhoados programas sociais que injetam recursos para dar o peixe e não para ensinar a pescar e sofremos ainda pela onipresença do estado na atividade que poderia ser privada. Para os que procuram provas internas de que o estado mais leve é melhor, basta que nos recordemos que nos governos FHC tivemos sucesso com várias privatizações. Senão vejamos: Esperávamos décadas para ter um telefone. Com o sistema Telebrás privatizado hoje temos telefones em abundância e o governo, ao contrário de ter que financiar as operações, hoje arrecada altos impostos. E a Embraer? Já imaginaram se estivesse ainda nas mãos do governo? O mesmo raciocínio aplica-se à Vale do Rio Doce e partes do sistema Eletrobrás. Deu certo, disto ninguém tem dúvidas. Mas, muita coisa ainda ficou por ser feita.

 Infelizmente, o governo PT pensa diferente. Ele é Keynesiano e totalitário no sentido de que entende que só o governo pode promover o progresso via gastos públicos elevados. Imagina que estamos na mesma situação em que o mundo se encontrava no pós-29, época da grande depressão. Não percebe, por exemplo, que suas estatais são ineficientes pela razão natural de se auto identificarem como entes públicos. Mais do que contribuir com impostos acabam por sugar o erário que, com frequência, precisa socorrê-las. Por que devemos manter públicas empresas como os Correios, as companhias de Docas, a Petrobrás, vários bancos, empresas do setor elétrico e outras que seriam mais eficientes quando operadas pelo setor privado? Há, sim, uma resposta bem simples para estas perguntas: Assim como nos ministérios e milhares de repartições públicas é também nessas empresas que o governo encaixa seus apaniguados para todos os propósitos de que já somos sabedores. Competência nunca é pré-requisito, mas QI (quem indicou), sim.

 Com a reeleição de Dilma e com o ideário petista - se é que podemos dizer hoje que o PT ainda tem alguma ideologia - nossas perspectivas futuras não são das melhores. O Estado continuará onipresente na vida dos cidadãos. A máquina estatal continuará sugando a quase totalidade dos impostos que pagamos; as estatais e os setores que contratam continuarão a ser controladas por malfeitores que irão se locupletar a custa de produtos e serviços cada vez mais caros que teremos de pagar; os mercados serão impedidos de agir livremente conforme os fatos e oportunidades indicam, pois os planejadores de Brasília ficarão ainda mais distantes da realidade e finalmente as nossas liberdades individuais poderão ser cerceadas, pois, como disse Gerald Ford, ex-presidente americano:
 
“Um governo grande o suficiente para lhe dar tudo o que você quer é forte o bastante para tirar tudo o que você tem”. (Gerald Ford)

Edson Pinto
Novembro’2014 

15 de nov. de 2014

280) O PIOR CEGO É AQUELE QUE NÃO QUER VER


Entrei na loja Tommy Hilfiger no Premium Outlet da International Drive e escolhi algumas camisas que tinham o preço unitário ao redor de 22 dólares, correspondente a 55 reais quando tomada a cotação daquela sexta-feira, inicio deste novembro, na ensolarada Orlando, Florida. Idênticas camisas; mesma marca comercial; mesma origem e nas lojas de mesmo nome instaladas em alguns de nossos luxuosos Shopping Centers, aqui em São Paulo, podem ser compradas por cerca de 200 reais. Portanto, quatro vezes mais do que o preço no próspero e rico país do norte. Está surpreso? Aguarde, pois volto mais adiante à narrativa da minha experiência na mencionada loja.

Por que tanta diferença de preço?

Seria a carga tributária em nível elevadíssimo aqui do Brasil? (No Brasil cerca de 40% do PIB e nos EUA, 25%). Seria o custo de locação de espaço nos Shoppings Centers controlados por grupos poderosos e gananciosos? O custo da burocracia que torna a vida do empresário algo assemelhado ao inferno de Dante? Os custos trabalhistas, a infraestrutura precária e cara, os altos preços da energia elétrica e dos combustíveis? A ineficiência e roubalheira de nossas empresas públicas, como a Petrobrás, repassadas aos preços de tudo? O custo do dinheiro para capital de giro já que temos as taxas de juros mais elevadas do mundo? O custo do risco do negócio, as “caixinhas” escusas, mas necessárias, que são disponibilizadas para as “autoridades” que fiscalizam com rigor “extremado” a vida das empresas? Arrisco a dizer em resposta à minha própria pergunta que todas essas causas contribuem de forma associadas, entrelaçadas, cruzadas e cumulativas. Tudo isso junto tem contribuído para que o Brasil já tenha, de uns anos a esta data, perdido a competitividade no mundo capitalista. Estamos ficando do lado de fora do baile da economia mundial, infelizmente. Corremos o risco de voltarmos a ser o eterno fornecedor de matérias-primas baratas, sem indústria e de perfil colonial...

Voltando à loja:

Com as camisas na mão dirijo-me ao Caixa. Espanto! Tive que entrar numa fila que dava volteios ao estilo das atrações da Disney. Vai-se caminhando por um corredor limitado por faixas ligadas a cavaletes; faz-se a curva e volta-se praticamente ao mesmo lugar até que, ufa, chega-se ao destino final, o Caixa. Nada a queixar disso, mesmo porque essa forma de organização resolve o desrespeitoso “salve-se quem puder” da nossa cultura tupiniquim onde os mais valentões, os mal-educados e os mais atrevidos são atendidos na frente. Foi, contudo, ali e durante aqueles vários minutos de fila, que fiz algumas boas constatações seguidas obviamente de reflexões pertinentes:

A primeira constatação foi a de que das 90 pessoas (contei-as uma a uma) que formavam a longa fila comigo, 85 – sem medo de errar – eram de brasileiros, todos enlouquecidos com montanhas de peças nas mãos. Disso conclui que é generalizada a noção e mesmo a certeza de que os preços no Brasil encontram-se tão altos que vale à pena vencer os sete ou mais mil quilômetros que nos separam daquele país mesmo considerando todos os inconvenientes de uma viagem cansativa para fazer compras por preços justos. Não havia como imaginar que as compras devessem unicamente ao fato de que as mercadorias fossem exclusivas e sem correspondentes no Brasil. A questão era e continua sendo basicamente os preços...

A segunda constatação foi a de que os sotaques percebidos representavam o Brasil de norte a sul. Ouvi “tchê”, “uai”, “mermão”, “mainha” e vários outros de nossos pitorescos regionalismos. É fácil saber, pois o brasileiro tanto compra quanto fala. E fala bem alto... Fiquei, por um lado, feliz ao perceber que há uma classe ascendente ansiosa por consumo e disposta a vivenciar uma experiência internacional, mas, por outro lado, fiquei triste por constatar que neste País que se apregoa a 7ª economia do mundo os consumidores precisam ir tão longe para comprar a preços justos itens tão prosaicos como cuecas, chinelos e bonés.

Até mesmo o atrativo da diversão propiciado pelos magníficos parques de diversões de Orlando poderiam ter similares por aqui, pois somo 200 milhões de consumidores e isso é um mercado - convenhamos - nada desprezível. A propósito, perguntei a funcionários da Disney qual o estrangeiro mais presente em suas atrações. Adivinhem! Nós os brasileiros. Se não amados, pois no mundo do dinheiro o que se respeita é o recheio da carteira e não a meiguice dos sorrisos ou a extroversão do povo, somos pelo menos bem respeitados pelo nosso poder de compra. O carregador de malas no Aeroporto de Orlando, disse-nos tudo: “Sempre me espanto com a quantidade de malas que os brasileiros levam para casa”. Respondi, maliciosamente, que estamos empenhados em ajudar a reerguer a economia americana, uma vez que a nossa já se encontra uma “maravilha”...

A terceira constatação foi a de que, vários brasileiros com os quais andei conversando, eram funcionários públicos. Lembrei-me da época que meu pai, oficial militar reformado, mesmo tendo bonificações por ter lutado na Segunda Guerra Mundial tinha que administrar com muito juízo o soldo sagrado, sob pena de privações. Já de 12 anos a esta data, o funcionalismo público em geral goza de remuneração que supera em muito às encontradas na iniciativa privada. Isto explica boa parte do porquê pagamos tantos impostos. Não que funções públicas bem qualificadas não mereçam boa e justa remuneração, mas o que não pode deixar de ser visto é o fato de que gigantismo do Estado, com a sua onipresença muitas vezes desnecessária na vida do cidadão, requer, e cria ocasião, para a montagem de uma máquina muito grande, o nosso próprio e cruel Leviatã. Assim, a máquina pública ficou caríssima. Já pagamos cerca de 40% do PIB em impostos e o custo de pessoal da máquina pública já passa dos 70% desse montante. O que sobra, mal dá para pagar os juros da divida pública e fazer alguns poucos investimentos.

Quando o avião deixou o belíssimo, confortável e gigantesco aeroporto de Orlando, várias vezes maior do que os nossos principais (Orlando tem uma população de apenas 250 mil habitantes), olhei para o Sul e até onde minha vista alcançava vi nuvens negras que partiam da Venezuela e se estendiam tenebrosamente ao Sul do continente. Seriam finalmente as chuvas que andam escassas por aqui ou seriam outros sinais que precisam ser interpretados de forma mais incisiva, embora hoje tão evidentes?

Edson Pinto
Novembro’ 2014 

26 de out. de 2014

279) MEDO E ESPERANÇA


Estamos vivendo uma semana de grande expectativa quanto ao resultado da eleição deste domingo, 26 de outubro de 2014. Agora, quando começo a escrever este texto, são 17h20 da quinta-feira, 23/10, portanto, há menos de três dias do pleito. Por sinal, o pleito eleitoral que apresenta - sem precedentes históricos – um enorme potencial para mudar a vida de todos nós, brasileiros.

Pensei: Vou realmente começar a escrever agora mesmo, mas com a ideia de finalizar o texto somente no domingo, quando a apuração das urnas já tiver nos revelado quem será o novo presidente da República. Ao fazer isso, tenho em mente conseguir registrar com a maior fidelidade possível o que as informações disponíveis nos dois momentos me propiciaram de emoções verdadeiras. Vou manter esta primeira parte inalterada para só, no domingo, escrever o seu complemento.

ANTES DO PLEITO (23/10)

Acabo de ver a nova pesquisa do Datafolha liberada há minutos. Ela me traz, com espanto, a informação de que Dilma atingira 53% dos votos válidos e Aécio 47%. Se verdadeira, Dilma será reeleita. É espantoso porque a pesquisa revela uma virada sem nenhuma correspondência com tudo o que temos visto desde a semana passada. Aécio com o seu discurso lógico, seu bom programa de governo, sua competência de bom administrador, seu carisma e postura de verdadeiro estadista contrapunha-se de forma arrebatadora ao amontoado de calúnias que vinha sendo a marca da campanha de sua adversária.

Nas redes sociais - só não vê que não quer - a grande adesão dos internautas ao nome de Aécio. Estou estarrecido e torcendo para que esses institutos de pesquisa estejam novamente errados. Meu sentimento neste instante é de tristeza e profunda apreensão. Vejo o País sendo dividido pelo ódio plantado pelos petistas e especialmente pela exótica figura do ex-presidente Lula. Penso que será um retrocesso sem precedentes na vida do Brasil e, infelizmente, não apenas um flerte como nos tem parecido até agora, mas sim o casamento com o regime retrógado e totalitário bolivariano.

Meu Deus! Quão precária é a democracia que permite que toda uma nação seja submetida, por força da manipulação de gente simples que é comprada com os benefícios assistencialistas na base do “dar o peixe, mas não ensinar como pescá-lo”. Estou apreensivo e com medo pelo que poderá afetar o futuro dos nossos filhos, dos nossos netos e de todos que mantém esperanças por um Brasil melhor.

AINDA ANTES DO PLEITO (26/10, pela manhã):

Passei os últimos dois dias lendo e analisando tudo o que surgiu sobre as eleições. Os debates e especialmente as novas pesquisas. Minha ansiedade continua oscilando entre o medo e a esperança. O sentimento que me domina é equivalente àquele de ver o goleiro do meu time obrigado a defender a cobrança de um pênalti decisivo. Paro de escrever o texto exatamente agora, 17h, e vou - com o coração na mão e certo amargo na boca - ver o que a TV nos mostrará logo mais. Agora, é torcer...

DEPOIS DO PLEITO (26/10, 21h)

Meu relógio marcava poucos minutos após as 20 horas quando ouvi o resultado final favorável à Dilma. Instantaneamente interagi e compartilhei com amigos da rede social na internet o meu desapontamento com o resultado. A esperança que me alentava a alma e fortalecia a minha torcida pela vitória de Aécio Neves partia da quase certeza que tinha de que em Minas haveria uma virada em favor do seu grande ex-governador. Não aconteceu. É difícil - e eu pessoalmente já vinha constatando isto quando conversei nos últimos dias com pessoas que têm parentes que usufruem do “Bolsa Família” - fazer as pessoas entenderem que um novo governo Aécio não lhes tiraria os benefícios que recebem. E Minas Gerais, como sabemos, é o estado mais dividido socialmente que temos na federação. Rico até a sua metade e extremamente pobre, por isso dependente dos programas sociais do governo federal, na sua parte de cima.  

Temo que, com o País dividido  como agora se afigura, venhamos a assistir a um acirramento dos ânimos e como consequência uma guinada para o famigerado regime bolivariano que tanta desgraça tem propiciado a muitos de nossos irmãos latino-americanos. Posso até manter esperanças de que a presidente reeleita consiga recompor sua equipe e se cercar de gente responsável para fazer o que não conseguiu fazer até agora. As frutas podres que se encontram no mesmo cesto – a menos que sejam rapidamente retiradas – tendem a contaminar todas as outras.

Se a economia não for reformada e o País não voltar a crescer, caminharemos para dias muito difíceis que comprometerão a nossa vida e nosso futuro. Está na hora de entendermos que o peso tributário que recai sobre os ombros dos que pagam os impostos mais elevados do mundo nos tem feito mais escravos do que os verdadeiros escravos que vieram da África para construir o País em seus primórdios.

A sociedade não suportará mais tanto sacrifício se não tiver certeza de que a sua pesada contribuição em impostos se transforma em retorno para todos. Sem isso, infelizmente, o nosso medo atual, ao invés de se tornar em esperança, pode se acirrar e se solidificar em mais medo. E isso, nós não merecemos mais...

Edson Pinto

26/10/2014

18 de out. de 2014

278) A ALDEIA GLOBAL

Quem diria que há apenas poucos anos, nós os brasileiros, tal qual já acontece desde sempre quando o assunto é futebol, também nos tornaríamos fanáticos por política, especialmente quando em momentos - como agora - temos eleições presidenciais? Debates políticos na TV, notícias frequentes, atualizadas, assustadoramente reveladoras e comentários abundantes nas novíssimas redes sociais da internet tem levado o debate político a níveis jamais imaginados. Vivemos outros tempos e isso merece uma análise:

Desde o início dos anos 60 o mundo vinha se familiarizando com a expressão “Aldeia Global” cunhada pelo filósofo canadense Marshall McLuhan. Em 1962, publicou o seu famoso livro “A Galáxia de Gutenberg” e mais tarde, em 1964, o já conhecido por todos aqueles que cumpriram a matéria de Sociologia ou Comunicações ou análogas nas Faculdades o mais emblemático de seus livros “Os Meios de Comunicação como Extensão do Homem”.  

O que há por trás deste termo Aldeia Global que merece ser entendido? Tão forte como simples, ele nos diz que dois conceitos fisicamente opostos, “Aldeia” que denota uma pequena comunidade onde a comunicação, por razões obvias, é rápida e abrangente, mas limitada e, “Global” que nos remete à extensão máxima do mundo implicando exatamente o contrário, isto é, pela grande extensão e distâncias a comunicação não deveria fluir nem rápida nem de forma abrangente como ocorre em uma prosaica aldeia.

Ao juntar “Aldeia” com “Global” ficamos com uma aparente impropriedade. Se for aldeia, algo local, não pode ser global, algo extenso ao seu máximo possível, exceto, é claro, pela maravilha propiciada pelas novas tecnologias da comunicação eletrônica farta. Consideremos hoje, e de forma especial, as telecomunicações e as redes mundiais como a internet. Estas tecnologias que nos assustam a cada momento com as suas permanentes evoluções tem nos colhido de surpresa. Não falo de surpresas ruins como muitas das coisas que ocorrem no mundo, mas de surpresas interessantes, estimulantes, desafiadoras que mais do que em outras épocas tem transformado de modo radical a maneira de nos relacionar socialmente.

Assim, se eu posso receber no momento uma informação que venha de outra parte do mundo e interagir com ela, envolvendo meu ciclo de relacionamento, eu estou agindo tal qual agiria se o estivesse restrito à minha pequena aldeia. Ficamos todos interconectados de tal modo que a antiga lacuna de informações que nos impedia de sermos cidadãos ativos e participativos deixa de existir. A imprensa que vem desde Gutenberg no século XV teve o mérito de nos abrir a janela para o mundo fora da nossa aldeia, mas ela, enquanto jornais, livros e revistas apenas impressos em papel ainda era insuficiente para nos permitir a rápida interação que temos hoje. Só com os meios eletrônicos modernos, o telefone, o rádio, a televisão e agora culminando com a internet é que conseguimos trazer o mundo para dentro de nossa aldeia e interferir no seu desenrolar.

Peguemos esta pequena maravilha que é o Smartphone! Recebemos pelas redes sociais as quais estamos ligados ou de sites de notícias, informações instantâneas que complementam as que já havíamos recebido no jornal impresso diário, da TV, revista semanal ou mesmo aquelas que ouvimos de parentes, de colegas do escritório ou quaisquer outras fontes. Imaginem vocês o quão diferente isso era há apenas uma geração: Afora os jornais impressos e de acesso elitizado, tudo o que se dizia sobre a política, especialmente sobre as eleições que porventura estivessem por ocorrer, era fruto tão somente do que os candidatos verbalizavam em seus comícios e em peregrinações seletivas. Falassem verdade ou mentira, não havia tempo para se aferir com antecedência ao dia do pleito se aquilo era uma informação boa, correta, importante ou por outro lado, falsa, preocupante ou desonesta. A democracia era, dessa forma, exercida de maneira – digamos – precária.

Nos dias de hoje é tudo bem diferente. A Aldeia Global nos propicia tudo de forma instantânea. O debate de ontem, por exemplo, que pode ter sido ou não assistido diretamente na TV, pelo rádio ou mesmo online na internet já foi profundamente esmiuçado e divulgado e as pessoas que por ele se interessam não só puderam fazer seus juízos de valor como até mesmo interagir de maneira participativa. Ouvem-se as opiniões de amigos ou mesmo de pessoas que nunca viram, mas cujas ideias podem fazer sentido ou não. Política, então, passou a ser um assunto também interessante. E tudo que é interessante tende a virar paixão...

Não sei se isto está acontecendo com você, meu amigo, mas comigo e com muitos que me são próximos temos sentido que esta eleição presidencial tem se mostrado muito emocionante a ponto de se igualar a eventos de paixões já consagradas como o futebol. Penso que – para o bem de todos nós – o Brasil político não será mais o mesmo após esta eleição de 2014. Não só porque muitos dos que não nos agradam serão substituídos no Legislativo e no Executivo, mas porque o brasileiro, graças à Aldeia Global agora viabilizada e consolidada pela comunicação farta, fácil e barata, tendem a nos tornar cidadãos mais interessados no destino do País. Afinal, quando nos mostramos desinteressados pelos rumos do País estamos renunciando ao nosso sagrado direito de interferir no destino de nossas próprias vidas.

Bem ou mais informados como parece que já estamos agora, só nos falta irmos às urnas no dia 26, domingo da próxima semana, e clicar alguns poucos números. Depois é torcer para que o resultado seja o melhor para o nosso País. E será...

Edson Pinto

Outubro’ 2014

23 de set. de 2014

277) A FOME DE MARINA

Será que a “Nova Política” tão propalada pela candidata à Presidência, Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima (é assim mesmo, e é bom que comecemos a nos familiarizar com este nome tão longo quanto pitoresco), ou simplesmente Marina Silva, para demonizar o PT e o PSDB ao mesmo tempo é assim, de fato, tão nova? Ela diz que irá governar com os “melhores” independentemente de quais partidos venham ou pertençam. Isso soa como música aos ouvidos de todos os brasileiros que já se acostumaram a identificar os políticos e os que compõem a máquina do Estado como sendo gente de baixa qualificação técnica e princípios morais duvidosos.

Diz também que será paradigma de honestidade; combaterá a corrupção como nunca e governará com o povo, blá-blá-blá, blá-blá-blá... Tão logo indicada para substituir Eduardo Campos e, no calor da comoção que o desaparecimento do jovem governador de Pernambuco, deu um salto gigantesco nas pesquisas. Mesmo perdendo alguns pontos nas duas últimas semanas já começa a consolidar seu eleitorado em nível tal que dificilmente deixará de marcar presença no segundo turno das eleições. Para ir à presidência, então, é só contar com o voto da boa parte dos apoiadores de Aécio Neves, aqueles que correm da Dilma e do PT mais do que o diabo da cruz.

Mas o PT arrepiou-se todinho com a inesperada exuberância eleitoral de Marina e resolveu abrir a sua caixa de ferramentas: Disparou impropérios à nossa Madre Teresa de Calcutá tupiniquim, culminando com a própria Dilma a fazer uso de uma ardida injúria quando diz que, se eleita, Marina acabaria com o Bolsa Família. Algo parecido a isto teria sido insinuado ou mesmo dito: “Vocês, povo brasileiro, vão voltar a passar fome porque o Bolsa Família não mais existirá se Marina tomar o meu lugar”.  

Pegou, evidentemente, bem direto no estomago da magérrima Marina que - mais do que simplesmente ter sido afetada em algo que lhe é, por experiência própria, muito caro - ou seja, a vida em um ambiente pobre no longínquo e muito tropical estado do Acre, viu a oportunidade de dar o troco à altura. O único problema é que a forma que escolheu para fazê-lo foi lançando mão de um dos mais clássicos recursos da “Política Velha”, exatamente aquela que ela atribui aos adversários e que não só abomina como promete combater diuturnamente. O Povo, dentro do conceito de Política Velha, só decide pela emoção. Disso ela já tinha certeza desde o dia 13 de agosto quando a desdita levou o candidato Eduardo Campos abrindo-lhe a oportunidade de substituí-lo como candidata titular da chapa.

Marina Silva foi uma verdadeira artista: De um palanque em Fortaleza contestou veementemente Dilma com o argumento de que jamais acabaria com o "Bolsa Família", pois ela, mais do que ninguém, sabia muito bem o que significava passar fome. Juntou fatos com característica de verossimilhança (no Aurélio: aquilo que parece verdadeiro, que não repugna a verdade, provável) com uma emoção tão convincente que lhe embargou a voz por vários segundos. Tudo muito parecido com o que o experiente Lula, com extrema maestria, sempre soube usar para comover suas plateias:

"Dilma, você não pode combater com as suas armas a nossa verdade, o nosso respeito e as nossas propostas. Nós vamos manter o Bolsa Família. Sabe por quê? Porque eu nasci no seringal Bagaço, eu sei o que é passar fome. Tudo o que minha mãe tinha para oito filhos era ovo, um pouco de farinha e sal. Eu me lembro de olhar para minha mãe e meu pai e perguntar: vocês não vão comer? E eles responderam: 'Nós não estamos com fome'. E uma criança acreditou naquilo, mas eu depois entendi que eles há mais de um dia não comiam. Quem viveu essa experiência jamais acabará com o Bolsa Família. Não é um discurso, é uma vida".

Quem não se emocionaria com um discurso desses? As pessoas que já sofreram privações em algum momento das suas vidas são sempre muito emotivas, sabemos disso. É por isso que o bom entrevistador sabe muito bem a importância de se buscar aqueles pontos de fragilidade emocional do entrevistado sempre com o propósito de levá-lo, se possível, às lágrimas. Marina foi esperta ao receber essa bola levantada por Dilma. Sem pestanejar, enfiou um rebote de primeira e marcou, do ponto de vista político, um gol espetacular. Disso ninguém tem dúvidas.

O que as pessoas não conseguem racionalmente colocar em suspeição é se aquela história do ovo, da farinha e do sal retratava exatamente o que era a vida de uma família seringueira. Não quero por em xeque as agruras que devem ter realmente passado, mas me pergunto: Como uma família ambientada na floresta onde abundam alimentos consegue passar fome? Dá até para entender que podem faltar coisas que independam da floresta: faltar uma ferramenta para o dia a dia, um remédio, a eletricidade, uma roupa apropriada, o combustível para o barco, a televisão, a geladeira e coisas tais. Mas - convenhamos - não ter o que comer quando a floresta dá alimentos vegetais, peixes e caças em abundância, já me parece um exagero.

Claro que não tem McDonalds, nem Pizzarias, mas tem tacacá, tucupi, jambu, tucumã, banana, guaraná, castanha, cupuaçu. E dos seus caudalosos rios, os maiores do mundo, o tambaqui e o pirarucu só para citar algumas das riquezas extrativistas da floresta. Passar fome nessas condições é como diz a voz do povo, padecer no paraíso. Lula - "como nunca antes na história deste país" - é mestre em explorar essa fragilidade emocional das massas. É da velha Política e parece que agora que também da Nova. Mais uma vez corremos o risco de votar pela emoção. Quem tem um histórico de fome, independente das razões que o levou a esse infortúnio, tem mais chances de se eleger do que outro que em sua vida já tenha superado isso.  

Já que o estilo é o da Política Velha será que a campanha do Aécio não poderia inventar uma história de fome também? Sugiro na falta de uma ideia melhor, que o Aécio rememore em um discurso carregado de emoção que uma vez sua babá esqueceu-se de lhe preparar a mamadeira e que ele, assim e por várias horas, passou fome... Deve funcionar!

Edson Pinto
Setembro’ 2014

18 de set. de 2014

276) ME ENGANA QUE EU GOSTO...

Quem já trabalhou em uma empresa razoavelmente organizada, especialmente em uma de grande porte, sabe muito bem do que falo:

É muitíssimo provável, quase certo, diria, que eventuais malversações gigantes sejam rapidamente descobertas e exemplarmente punidas em curtíssimo prazo. As múltiplas e variadas pequenas malversações podem até demandar mais tempo para serem detectadas, mas, mesmo assim, ainda que em longo prazo, tendem a ser igualmente punidas e coibidas. Contudo, a perversa condição de que grandes malversações possam permanecer ocultas por um prazo muito longo ou mesmo que nunca sejam descobertas é, na prática, quase tão impossível quanto submergir no Mar Morto. Tal qual rolhas de cortiça, as “lambanças”- para não usar outro termo de ordem escatológica - ficam flutuando para conhecimento de todos, especialmente daqueles que mantém interesse no sucesso da empresa, da organização, do Estado...

Embora a chamada Ciência Administrativa mostre sua face como tal somente a partir da Revolução Industrial da Inglaterra em meados do século XIX e que os princípios da boa administração de Fayol, Ford e Taylor são avanços da aurora do século XX, o homem sempre soube controlar com razoável competência as suas contas. Não quero fazer uma digressão histórica, mas peço que considerem que os Faraós do Egito, três mil anos antes de Cristo; a administração pública das cidades/estados gregas, séculos VI a IV a.C; o Império Romano no início da Era Cristã; toda a estrutura de registros da Igreja Católica aos longos dos últimos dois mil anos e as grandes navegações dos séculos XV e XVI desenvolveram formas de controles adequados para que os recursos escassos de sempre fossem bem administrados.

Em uma empresa da atualidade tudo é - ou deveria ser - muito bem controlado. Não se entra em suas instalações sem a devida identificação; tudo o que se movimenta com reflexo nos resultados e no patrimônio da empresa é registrado pela Contabilidade na famosa e cientifica forma de que a cada débito corresponde um crédito; Há gestores de gastos, gestores de contratos, gestores de receitas, gestores de tudo. Há, ainda, Auditoria Interna, Auditoria Externa, Conselho Deliberativo, Conselho Fiscal, Conselho de Administração e várias outras instâncias que controlam o que as outras fazem.

Agora imaginemos a nossa Petrobrás: Criada em 1954 por Getúlio Vargas em resposta ao clamor popular nacionalista do “O Petróleo é Nosso”. Sessenta anos de existência; exitosa na prospecção, no refino e na distribuição de petróleo e seus derivados; mais de oitenta mil funcionários; por bons anos uma das maiores empresas do mundo e com atuação de destaque em um setor de vital importância como é o da energia, acaso não contaria com os tradicionais e bem testados sistemas de controles internos e externos para se evitar a vexatória ocorrência de mais uma deslavada rapinagem como a do recente episódio Paulo Roberto Costa em favor dos interesses escusos daqueles que dirigem o País?

Por onde andaram nos últimos 12 anos de governo petista os contadores da Petrobrás; os seus auditores internos e externos; os seus Conselhos Deliberativo, Fiscal e de Administração e toda a miríade de controladores que desta grande empresa recebem regiamente suas contrapartidas em salários, benefícios sociais, bônus e remuneração de contratos com prestadores de serviços? Sumiram ou se omitiram? É difícil pontuar corretamente o que foi que aconteceu, mas por uma simples lógica cartesiana dá para se concluir: se os órgãos existem, se os sistemas de controle estão disponíveis e se o seu pessoal é de bom nível técnico, então só nos resta concluir tratar-se de omissão. Pronto!

É inadmissível o fato de um Diretor, mesmo que todo poderoso como o Engº Paulo Roberto Costa, tenha executado tantos desmandos como o dinheiro da Petrobrás sem que gente a ele subordinada; de áreas paralelas ou mesmo seus superiores; os órgãos de controles da empresa como Auditoria e Conselhos não tenham, em doze anos, percebido que algo de anormal vinha ocorrendo. Só dá para inferir que a estrutura, de alto a baixo, esteve também comprometida com os desmandos, caso contrário, estaria faltando créditos para débitos na contabilidade; existiriam notas nos relatórios de auditórias; pedidos de esclarecimentos nas atas dos Conselhos e até mesmo desconfiometros ativados daqueles que tem a obrigação de zelar pela coisa comum, seja pública ou privada, porque – lembremos – a Petrobrás além de ser uma empresa pública conta com a participação acionária de centenas de milhares de brasileiros que ali puseram suas poupanças e até mesmo o seu FGTS na forma de ações.

E o pior é o caradurismo daqueles que deveriam se sentir responsáveis pela empresa que ainda propagam ser ela detentora de uma administração exemplar, orgulho dos brasileiros e paradigma das melhores do ramo. Pode? Sim, pode, pois é exatamente essa irresponsabilidade e ganância sobre o patrimônio público é que está por trás dos desmandos que ora se revelam assustadores. Não fosse uma articulação intencional e o aparelhamento conveniente das diversas instâncias operacionais e de controle da empresa, tais abusos não teriam ocorrido.

Fica aqui, amigos, uma grande lição. E ela vale tanto para a coisa pública quanto para a coisa privada: Os sistemas de gestão e controles são bons e funcionam a contento tão somente quando as pessoas que têm o poder das decisões são sérias. O único lenitivo que nos acorre é o de que mais cedo ou mais tarde, com as ferramentas oferecidas pela Administração moderna, um ato impróprio sempre será descoberto. O único problema é quando os interessados no sucesso da empresa sem omitem. Assim, fica indiferente para os espertinhos se seus atos flutuem como nas águas densas do Mar Morto, ou não.

Enquanto isso, só nos resta o alinhamento ao que a sabedoria popular nos lega de forma propositalmente jocosa na forma de “Me engana que eu gosto”.

Edson Pinto

Setembro’2014 

12 de set. de 2014

275) FORÇA DE VONTADE


Assim como a gasolina move o carro, a eletricidade dá imagem ao televisor e o vento gira a pá do moinho, a força de vontade interna também movimenta a nossa existência. Thomas Carlyle nos legou a frase de que “o homem nasceu para lutar e que por isso a vida é uma eterna batalha”. Já que temos tanta certeza de que um ser humano apático, desprovido de motivação, de força de vontade tende a ser um pária, por que então nos ocorre de ver tanta gente arruinada pelo simples fato de não conseguir se organizar e de se motivar para fazer das suas vidas um projeto exitoso?

De todas as deficiências que podem acometer o ser humano, certamente a falta da chamada “força de vontade” é uma das maiores. Ela imobiliza o homem naquilo que tem de mais precioso e que se constitui no maior dom recebido do Criador: o seu livre-arbítrio. Se fosse para viver imobilizados, sem atitudes e sem contar com a força de vontade que movimenta o nosso corpo, as nossas decisões, as nossas atitudes para superar desafios, então teria sido melhor que tivéssemos nascido no ramo vegetal e não no animal. Como plantas, estaríamos - pelo menos em tese - libertos da necessidade de criar motivações para agir, mas estaríamos, por certo, condenados a viver no mesmo local e a depender do que outras forças da natureza viessem a nos ofertar graciosamente como a água, o adubo, o sol e a brisa que refresca.

William Shakespeare metaforizou que o nosso corpo é como se fosse um jardim, e que a nossa força de vontade é como se fosse o jardineiro que o faz prosperar viçoso. O que devemos entender é que a determinação, o poder de tomar decisões e as ações que disso decorrem são como o combustível que nos faz mover e nos faz acontecer no palco transitório da vida. Quando não se tem vontade, não se tem força para nada. Um homem forte fisicamente, mas que não tem a vontade de remover um objeto que lhe obstrui o caminho certamente não prosseguirá na sua caminhada. Ao contrário, uma vontade férrea para ser aprovado no vestibular de uma determinada Faculdade dará força e concentração suficientes para o sucesso profissional e pessoal de um jovem determinado a vencer na vida.

Há uma janela de oportunidade para o desenvolvimento do poder de decisão e da “força de vontade” no ser humano. Como quase todas as demais facetas do caráter, esta também se encontra aberta, de par em par, no período da infância. Aos pais e educadores cabem criar estímulos que levem as crianças a exercitar a suas iniciativas e o enfrentamento de desafios bem como das obrigações que precisam ser vencidas para a consecução de certos propósitos. Aqueles que são criados com a ajuda e assistência exageradamente generosa de provedores fartos tenderão - no futuro - a continuar na dependência dos outros ou, o que é ainda pior, estarão sempre postergando decisões e ações que por suas naturezas clamam pela necessária, pessoal e intransferível “força de vontade”.

Você é do tipo que está sempre deixando para fazer amanhã aquilo que já poderia ter sido feito hoje mesmo?

Se sim, saiba que você pode ter sido acometido dessa que é a mais básica das deficiências do ser humano. Se não tem organização e vontade para fazer as coisas acontecerem, com muita certeza, todos os outros problemas que reconhecidamente você já tem, não serão resolvidos. A mesma falta de vontade que o impede de começar a caminhar para ter uma saúde física mais saudável; iniciar aquele curso que sempre imaginou; podar aquela árvore de sua casa que está com o crescimento para o lado errado ou marcar aquela consulta sempre adiada a determinado médico especialista é a mesma que lhe rouba a disposição para se tornar mais paciente com os outros; menos arrogante; prestar mais atenção ao que lhes falam; colocar mais ordem na própria vida e tantas outras deficiências que o impede de ser feliz ou mais feliz ainda do que já é.

Lembremo-nos de Ésquilo: “Quando um homem tem força de vontade, os deuses dão uma ajuda”. E de Mahatma Gandhi: “A força não provém da capacidade física, mas sim da vontade férrea”.

Edson Pinto

Agosto’ 2014 

29 de ago. de 2014

274) CONTA DO ABREU

Há uma expressão popular que se encaixa à perfeição ao que eu gostaria de expor na crônica desta semana. Pode ser que os jovens, hoje informados maciçamente pela Internet e de vida tipicamente urbana com hábitos, cultura e ideias bem diversos dos nossos, não a conheça muito bem.  Mas posso garantir-lhes que sua contextualização é atemporal, pois é tão verdadeira hoje como o era em qualquer tempo pretérito. Desde que o mundo é mundo e desde que Cabral avistou terras nesta banda previamente definida em Tordesilhas, já era comum assumir responsabilidades confiando não em si mesmo, mas em outrem. Portanto, nem é necessário entender historicamente a origem da expressão para compreender o que ela quer dizer:

“Põe na conta do Abreu, se ele não pagar, nem eu”.

O pobre do “Abreu” (talvez assim escolhido apenas por rimar bem com o pronome eu) pode ser o futuro, o destino, o acaso, as circunstâncias ou mesmo os sonhos malandramente convertidos em promessas. Aquele que assume a façanha de comprar os votos dos bem-intencionados eleitores prometendo-lhes pagar mais adiante quando estiverem encastelados no poder, ou mesmo mantidos no trono que já lhes servem, certamente corresponde ao “eu”, esse esperto que já sabe de antemão que suas promessas são irreais. Entenda, então, e desta forma, a mesma expressão agora com a devida adaptação à realidade política brasileira:

“Dê-me o seu voto em troca da realização futura de tal ou qual promessa, mas ponha na conta do futuro incerto. Se ele, o futuro, não honrar com os compromissos que acabo de assumir, infelizmente, nem eu terei como honrar”.

Legal, não?

Pois é exatamente assim que as coisas acontecem no nosso ambiente político. Estamos em plena campanha eleitoral. Os compradores de votos estão mais excitados do que nunca. Infelizmente, grande parte da nossa população mais simples não dá conta da importância de seu voto e dos poderes que conferem a um presidente, por exemplo, e aos seus partidos coligados.

No nosso sistema político, a presidência da republica com a coligação partidária que precisa formar para ter apoio e sucesso no Congresso, pode – se bem sucedida nesse grande, penoso e execrável concerto - fazer tudo o que quiser: Tornar o País mais democrático, menos democrático, mais liberal, mais fechado; com imprensa livre ou controlada; economia centralizada, aberta ou mesmo levar à “bolivarização” de tudo o que entenderem compatível com os modelos cubano ou venezuelano, só para citar alguns.

Da morte trágica de um homem público com enorme potencial futuro emergiu a candidata Marina Silva, tal qual a baratinha da história infantil, com a sua caixinha cheia de votos amealhados nos momentos de irracionalidade e falta de alternativa da eleição anterior. O seu discurso é o da Terceira Via, este eufemismo para captar os dissidentes das forças que ela considera polarizadoras da Política Velha, como se as ideias que ela representa fossem nitidamente novas. Na verdade, o que ela procura ocultar é a sua incipiente experiência como administradora e a inconsistência ou mesmo ainda inexistência de um programa governamental minimamente esclarecedor de seus propósitos quando estiver à frente da Nação. Aqui, vejo, infelizmente, amadorismo e aventura. O País não pode mais se dar ao luxo de perder novos quatro anos.

O governo atual quer se manter a qualquer custo e para isso manipula de forma irresponsável os dados de que dispõe para tentar convencer a população de que fez e faz muito mais do que a realidade de um PIB que já sinaliza recessão, uma inflação ainda elevada e as contas públicas descontroladas estão a nos demonstrar. Os quarenta ministérios e a obesa máquina pública com a acomodação da militância obviamente não quer perder as benesses, ainda que isso continue sendo suportado por uma carga tributária cada vez mais elevada.  Neste quadro, vejo incapacidade de os mesmos gestores que erraram feio na condução de nossa economia agora mudem o comportamento e façam tudo diferente. Como justificar que estavam errados nos últimos anos?

O candidato da oposição direta ao governo atual pode até ter lá também suas restrições, mas é o que, pessoalmente, me parece o mais sério e o que mantém mais os pés no chão para o enfrentamento dos problemas que nos aguardam a partir de 1º de janeiro do ano que vem. Gosto da clareza de ideias e do dinamismo do candidato Aécio Neves. Também me deixa certo conforto saber dos nomes que fazem parte do seu provável futuro governo. Tem pontos fracos? Certamente que os tem, como todos os outros, mas inspira-me mais confiança quanto a pontos que considero fundamentais de um novo governo: novos rumos da economia; política externa mais responsável; projeto para enxugamento e racionalização da máquina pública e o seu desejo manifesto de conduzir uma reforma tributária que levem as empresas e os cidadãos a recuperarem o seu vital necessidade de respirar. Estamos sufocados com tanta burocracia e tanta voracidade tributária. Se ainda não estamos parados, já estamos quase...

Bem, penso que defini o meu voto e de coração aberto o expus. Respeito democraticamente as escolhas diferentes da minha, só esperando que sejam racionais e não emocionais, pois – embora não pareça – política é coisa séria que afeta muito as nossas vidas. Se eu não ficar com a maioria que elegerá o próximo presidente, paciência. Manterei, contudo, a consciência tranquila de que estou sendo coerente com a visão de mundo que tenho. O que devemos por fim considerar é que se o Abreu não honrar os compromissos do próximo eleito, quem irá com toda a certeza fazê-lo não será o candidato malandro, mas sim nós mesmos. Afinal, quem paga a conta é sempre o povo, o Abreu não existe. É como Papai-Noel...

Edson Pinto

Agosto’ 2014

21 de ago. de 2014

273) O CONTO DO VIGÁRIO

Contam que em século pretérito as paróquias do Pilar e da Conceição, ambas em Ouro Preto, MG, disputavam entre si o direito de terem definitivamente em seus respectivos altares certa imagem de Nossa Senhora muito adorada pelos fiéis da época.

Num gesto aparentemente conciliador, o vigário da paróquia do Pilar fez ao outro a proposta para que amarrassem a imagem da santa num burrico que naquele momento vagueava pelas vielas do povoado: Liberado em ponto equidistante às duas paróquias, deixariam que o angelical muar se dirigisse livremente para aquela que mais lhe apetecesse.  A paróquia, assim escolhida, tomaria a posse definitiva da santa. Dito, tratado e feito. O burrico quase que sem pestanejar marchou célere para a paróquia do Pilar.

Passado algum tempo soube-se que aquele burrico dócil pertencia já de há muito ao vigário da Paróquia do Pilar e era lá que tinha a sua morada e o capim de cada santo dia. Ao delegar a decisão ao “tertius burrico”, o esperto vigário omitiu tal fato. Já sabia, de antemão, que era para lá que ele se dirigiria, uma vez que, como muita gente que conhecemos hoje de sobeja, mesmo sem ter as orelhas longas do protagonista em questão, mas por mera parvoíce, visão bitolada, cabeça-dura e dependência alimentar, faria sempre a mesma coisa. Estava assim estabelecida a versão brasileira do conto do vigário. Há outra versão de origem portuguesa que se atribui a Fernando Pessoa pelo seu conto homônimo, mas que não vem ao caso citar aqui. Fiquemos com esta versão bem brasileira, bem mineirinha...

Como sabemos, já há tempos, toda vez que nos deparamos com uma “esperteza” lembramo-nos do vigário e mais especificamente do substantivo que ele, a contragosto, imagino, conseguiu incluir em nosso léxico: “vigarice”. Atenção, portanto, amigos: Quando alguém, de forma dissimulada, maneirosa e dócil lhes oferecer alguma operação vantajosa tenha sempre em mente que isso ou vem de sua adorável mãezinha ou vem do vigário da paróquia do Pilar...

O telefone toca:

__ Boa noite senhor, aqui é da Vivo. Gostaria de falar com o proprietário da linha.

__ Sim, é ele.

__ Senhor, esta ligação por motivo de segurança está sendo gravada (isto dá certa seriedade à conversa, não é?). A Vivo tem uma excelente oferta para o que o senhor “possa estar reduzindo” o valor da sua conta do telefone fixo (olha o gerúndio!).

__ Ótimo que esteja sendo gravada. Aprecio muito esta providência. Assim, quem sabe ela poderá me ser útil mais à frente. Farei o mesmo do lado de cá. Neste caso, se vocês a perderem eu poderei usar a minha...

__ Senhor, estamos vendo aqui no nosso cadastro que o senhor tem uma linha fixa e que o seu gasto tem sido ao redor de R$200,00 por mês. Gostaríamos de oferecer-lhe a possibilidade de migrar para um plano de 100 minutos que lhe custará apenas R$31,00/mês. É muita economia!

__ Ué (assim mesmo, bem mineiramente), vocês da Vivo não estão precisando de dinheiro? Por que abririam mão dos meus R$200,00 e se contentariam com apenas R$31,00? Será que entendi? Nem precisa explicar, já captei...

__ Senhor...

__ Espera aí! O que há por trás disso? Já sei. Provavelmente eu que uso muito mais do que 100 minutos (menos que duas horinhas por mês) deverei ser penalizado pesadamente com os minutos que excederem a isto, não é mesmo? Cada “papo” semanal com a minha mãezinha leva no mínimo duas horas. No mês já seriam oito horas. E os meus compadres e as comadres da minha mulher que ainda nem sabem da existência do WhatsApp? Nada feito!

__ Senhor, mas...

__ Além disso, "minha querida", eu não consigo entender a lógica capitalista dessa grande empresa. Enquanto todas as atividades econômicas buscam maximizar os seus lucros, esta, surpreendentemente, optaria por reduzi-lo? Façamos o seguinte: Como estou satisfeito com o que pago e com a utilização que dou ao meu telefone deixarei tudo como está. Agradeço a sua gentileza. Boa noite!

Telefone desligado vem a reflexão:

É incrível como as empresas que prestam serviços através dos chamados “Call Centers” são ineficientes para nos atenderem quando precisamos de alguma informação, reclamação ou quaisquer outros tipos de serviços pós-venda, mas se mostram tão rápidas e “generosas” na hora que querem nos envolver em manobras que nos levem a gastar mais com elas.

Alguém já imaginou a concessionária da rodovia, espontaneamente, reduzir o valor do pedágio? Algum hospital baixar, sem que se peça, o preço de uma internação? O supermercado onde você compra regularmente lhe mandar um cheque correspondente a um desconto que julgarem que você fez por merecer?
 
Será que estamos às vésperas de uma grande mudança conceitual do capitalismo? Errou de novo Marx ao prognosticar que o capitalismo clássico por não lograr superar suas contradições internas levaria inevitavelmente ao comunismo? Claro, ele não contava com a hipótese de que – pelo menos aqui no Brasil – já estarmos promovendo a transição do capitalismo clássico, selvagem, para um capitalismo generoso, este mesmo que leva empresas a procurarem insistentemente seus clientes para lhes oferecer faturas menores mesmo que com isso lucrem menos.

Edson Pinto

Agosto’2014

14 de ago. de 2014

272) CONHEÇA A SI MESMO


Organizando os meus livros antigos, encontrei um que me chamou a atenção não apenas pelo seu sugestivo título, “Deficiências e Propensões do Ser Humano”, mas pela imediata lembrança que me fez suscitar. O livro é de autoria do pensador argentino Carlos Bernardo González Pecotche (1901 – 1963), fundador da doutrina ético-filosófica mundialmente conhecida como “Logosofia”. Importante e atemporal como são todas as coisas que formam o alicerce de trajetória humana, revisitá-lo teve para mim o sabor agridoce das lições que nunca perecem. Comprei o livro na Fundação Logosófica que no meu tempo de Belo Horizonte ficava lá na Rua Piauí, no Bairro dos Funcionários. Sei que a Fundação ainda está lá e em mais um par de outros endereços demonstrando que a doutrina de Pecotche - com razão – mantém-se de forma sólida.

Curiosamente encontrei dentro de livro, já amarelado, o recibo de sua compra. Paguei exatos NCR$ 15,00 (quinze cruzeiros novos) em 26/3/1972, portanto há 42 anos. Movido pela sede de desvendar mistérios, busquei converter o valor original da compra, em Cruzeiros Novos, agora para Reais que é o nosso padrão monetário em vigor. A cifra correspondente apurada foi abaixo de zero. Isto demonstra o quanto a nossa moeda perdeu valor em quatro décadas. A moeda virou pó, todos nós já sabemos disto, mas, felizmente, o conteúdo do livro nunca perdeu um centavo de sua enorme importância. Arrisco-me até a dizer que nos dias que correm, com tantos desacertos individuais e políticos, deve até estar sobrevalorizado...

Andei frequentando a Fundação Logosófica por cerca de um ano até que me transferi para São Paulo e nunca mais tive oportunidade de retomar o estudo que ministravam. Com 20 e poucos anos de idade é de se admitir que, na época, a cabeça também não se mostrava muito interessada no entendimento de si mesma, principio básico e razão de ser da Logosofia. A doutrina estruturada por Pecotche deu corpo ao que pensadores gregos como Sócrates e Platão conjecturaram sobre a necessidade do autoconhecimento no papel de pré-requisito a evolução humana consciente. A ideia é a de que é necessário se autoconhecer para assim poder diagnosticar as deficiências e as propensões negativas que delineiam o nosso comportamento. Só a partir daí, metódica e insistentemente, iniciar e manter a prática de suas antideficiências.
   
Sempre achei muito difícil uma pessoa mudar a sua essência. A Psicologia, as religiões, a Filosofia e genericamente a Educação não cansam de buscar meios para que tal transformação ocorra. Atrevo-me, contudo, a dizer que se trata de uma empreitada muitíssimo árdua, embora não totalmente impossível. De qualquer modo, entendo que só há um meio de se operar uma mudança no comportamento e na maneira de ser das pessoas dominadas por características ruins e prejudiciais à suas respectivas vidas sociais. Este meio é o do autoconhecimento, sem dúvida...

O mérito da doutrina logosófica é - a principio - a identificação de 44 deficiências e de 22 propensões nefastas que, se dominadas adequadamente, levariam as pessoas a desfrutarem de um patamar qualitativo mais elevado em suas próprias existências. Enquanto as deficiências dominam efetivamente o psicológico da pessoa, as propensões são mais brandas, porém mesmo assim tendentes a interferir nas decisões e no modo de ser e de reagir das pessoas por elas afetadas. Para cada uma das 44 deficiências o método logosófico propõe a prática de uma atitude oposta benéfica e restauradora.

Alguns exemplos:

À deficiência da Aspereza contrapõe-se a Afabilidade; à Credulidade, o Saber; ao Egoísmo, o Desprendimento; à Impaciência, a Paciência Inteligente; à Indiferença, o Interesse; à Intolerância, a Tolerância; ao Rancor, a Bondade; à Soberba, a Humildade; à Vaidade, a Modéstia e à Veemência, a Serenidade. Citei apenas 10 deficiências para não me alongar, mas são 44 ao todo.

Das 22 propensões, para as quais não há a explícita nomeação de antipropensões, poderia também citar 10, tais como: a propensão a Adular, que significa bajular, lisonjear de forma servil; à Dissimulação ou fingimento; à Discussão, por quaisquer e tolos motivos; ao Desespero, também por quaisquer razões, mesmo as mais simples; à Desatenção; ao Pessimismo; à Licenciosidade; à Frivolidade, que é o interesse por coisas fúteis, comportamento leviano e volúvel; a Prometer, mesmo sabendo da impossibilidade de cumprimento; ao Abandono e ao Exagero, quando a pessoa dá asas a sua imaginação muito além do que recomendaria a sua própria inteligência e à dos outros.

Se o amigo acha que dessas deficiências e propensões nenhuma lhes cabe, tudo bem. Se sim, ou mesmo se pode ser de alguma utilidade para proveito de seus orientados, então sugiro a leitura do mencionado livro. O título e o autor são aqueles aos quais já fiz menção ao longo do texto. A publicação é da Editora Logosófica. Dentro do possível, voltarei ao tema para analisar pontualmente algumas dessas deficiências e propensões. Não me esquivarei, por certo, nem mesmo daquelas a que me considero também acometido.

Edson Pinto
Agosto’2014