19 de dez. de 2013

254) DE NOVO O NATAL

Se o Natal não existisse, e independente das razões pelas quais ele, de fato, existe, haveria de ser inventado, pois a humanidade dele não prescinde para pelo menos uma boa causa: Nunca vi outro momento ao longo do ciclo anual e repetitivo da vida que se mostrasse mais adequado para a celebração de sentimentos tão nobres quanto a amizade, a irmandade, a fraternidade.

Por que todo mundo quer se encontrar em algum momento no final do ano? Por que queremos estar à mesa com os nossos entes queridos mesmo que seja para uma confraternização que pode durar não mais do que uma única noite? Por que queremos dar um presente, por mais simples que seja, a alguém que muito consideramos? Por que queremos ser solidários com os mais necessitados, com uma criança órfã, com um ancião esquecido ou com uma família que vive na penúria? Por que queremos abraçar, beijar, sussurrar palavras de conforto ou mesmo declarar o nosso amor?

Tudo isso podia ser feito a qualquer momento, mas - convenhamos - fazê-lo nas proximidades do final dos anos parece ser o mais apropriado. É ou não? Em “Perfume de Mulher”, não exatamente no Natal, mas próximo dele, o filme estrelado por Al Pacino no papel do carrancudo tenente-coronel reformado Frank Slade, cego em um acidente na guerra, encontra o seu próprio momento para celebrar uma vida que ele julgava inútil e que, na cabeça dele, deveria ser levada a cabo. Ele foi buscar em coisas que lhe faziam sentido, como dançar um tango com a mulher que exalava um doce perfume, dirigir uma Ferrari, mesmo sendo cego, ter um encontro amoroso e ainda reencontrar a família com a qual nunca se deu bem, o seu momento de sentimentos nobres.

No final do ano, tudo isso nos aflora e é por isso que nos lembramos de muitas coisas, especialmente dos amigos. Mesmo e principalmente daqueles que nunca ou raramente respondem o seu e-mail; não têm tempo ou não conseguem se organizar o mínimo suficiente para responder um cartão eletrônico, já que o tradicional de papel enviado pelos correios já está em desuso; telefonar para um breve alô ou curtir o seu post no site da rede social. O espírito do Natal traz embutido em si este milagre: Ele é capaz de entender que as amizades são tão profundas que prescindem de atos simbólicos. Ela pode ser percebida mesmo que não estejamos na mesma sintonia, uma vez que a vida é para cada um de nós um desafio particular. Muito embora os mundos corram em paralelo, vez por outra eles se cruzam aqui e ali já que a essencialidade que caracteriza o trilho de cada um encontra correspondência com a dos amigos.Se nunca encontra, então não é amizade verdadeira...

Mensagem de Natal também precisa ser breve, principalmente neste mundo moderno de muita correria. Por isso, vai aqui nestas poucas linhas o meu fraterno abraço a todos os amigos guardados no meu coração: Desejo a todos não só encontros significativos com seus familiares e outros amigos neste final de ano, mas que tenham um novo ano intenso como intensa e rica deva a ser a nossa vida, esta passagem rápida, por este mundo material finito, com eventos transitórios, riquezas que se extinguem, raivas que se diluem, egoísmos que não perduram, alegrias que sucumbem, porque – penso assim – é na outra fase que sentimentos nobres como a amizade, a irmandade e a fraternidade mostram todo o sentido de serem eternos.

Feliz Natal e próspero 2014!


Edson Pinto 
Dezembro' 2013

13 de dez. de 2013

253) REFLEXÃO SOBRE O PAÍS DAS CAÇAMBAS

O novo prédio acaba de ser finalizado. Opa! Agora, todo aquele transtorno provocado pelo vai e vem de caminhões, montanhas de materiais de construção, fluxo de trabalhadores, guindastes e outras imposições que uma grande obra provoca está terminado. O trânsito fluirá célere e o que incomodava não nos incomodará mais. Certo? Errado! Agora que está tudo pronto começa um novo martírio: A rua é tomada por caçambas. É isto mesmo, caçambas, aqueles recipientes de aço, normalmente com o número do telefone do proprietário estampado em letras garrafais que são colocados nos lugares onde deveriam estacionar os veículos e que já se tornaram verdadeira instituição nacional. Por que isso acontece?

Bem, meus amigos! São essas caçambas que sugerem uma reflexão sobre como o ser humano, especialmente nós os brasileiros, conduzimos nossas vidas: O prédio foi planejado; os compradores visitaram os stands de vendas e tiveram acesso ao modelo decorado; a compra foi efetuada, às vezes com certo sacrifício financeiro, pois os juros de financiamento – como sabemos – são escorchantes neste país de economia nunca estabilizada e tudo parece ter chegado a um final feliz. Não! A felicidade completa parece que está em dar aquele toque pessoal e exclusivo na nova habitação, mesmo que signifique derrubar algumas paredes, trocar os azulejos da cozinha, o piso da sala, o desenho do gesso do corredor ou qualquer outra coisa que diga para quem o fez algo como: É assim que eu gosto e quero! E lá se vão toneladas de entulho de materiais recentemente instalados. Outras toneladas adentrarão ao prédio ou à casa para substituir as primeiras.

Há algo errado com essa liberdade das pessoas em quererem personalizar o próprio lar? Claro que não! A vida só é plena quando nos sentimos bem com as coisas que temos; com as pessoas que nos rodeiam; e, obviamente, também como o lugar que consideramos nosso teto. Mas, apesar disso, penso que deve existir algo de muito peculiar aqui na nossa terrinha. Minha experiência pessoal, incluindo a de ter vivido fora do país por algum tempo, não me registrou pelos lugares que freqüentei e vivi tanta sanha para reformar as habitações como vejo aqui no Brasil. Visitem qualquer país europeu e verifique se há tantas caçambas nas ruas como temos por estas bandas... Fica aqui o desafio!

Seria essa sanha de reformar o imóvel algo relacionado com a ascensão social de parte da nossa sociedade que, além de recursos financeiros agora disponíveis, também começa a ter gostos mais refinados? Será que em outros países as habitações já não são mais definitivas de tal modo que as reformas que se fazem são mais leves ou utilizam materiais que geram menos entulhos ou, por último, mas não menos importante, será que as demandas e preferências pessoais de sociedade mais evoluídas, como um todo, não são mais equânimes, parecidas, e por isso exigem menos reformas?

Se fossemos um país comunista, o que graças a Deus não somos, talvez as casas, sendo todas de propriedade social, fossem - por razões obvias - padronizadas e os gostos individuais já teriam sido, há muito, massacrados pelo estúpido principio da igualdade forçada. Sermos capitalistas nos dá essa liberdade, mas também deveria nos sinalizar para medidas que possam contribuir para a redução do desperdiço. Por que não planejar melhor? Será que as construtoras não poderiam adotar tecnologias que minimizassem os transtornos das eternas reformas? Será que individualmente não poderíamos ser menos “inovadores” neste sentido de mudar por mudar, reformar por reformar? Será que há certa dose de mimetismo a levar as pessoas a seguirem uma determinada moda? Tudo é possível, tudo é justificável, nada é em vão...

E por usar a expressão “em vão” fica aqui uma lição que podemos depreender dessa “filosofia de caçamba” tão peculiar ao nosso cotidiano. Quem sabe não passemos a distribuir caçambas metafóricas para remover o entulho da política brasileira; os azulejos envelhecidos da corrupção; o gesso podre do nepotismo; o piso rachado do gosto pelo eterno poder por parte dos mesmos mandatários de sempre? Esse, sim, seria o entulho maior que não nos aborreceria com tantas caçambas quantas fossem necessárias para removê-lo e depositá-lo no mais longínquo e profundo depósito de rejeitos que se possa conceber.

Edson Pinto

Novembro’2013 

4 de dez. de 2013

252) QUESTÃO DE COMPETÊNCIA

O jovem na casa dos 30 sai à procura de um novo trabalho. Inscreve-se para processos de seleção em várias ofertas de cargos compatíveis com o seu conhecimento e adequados aos seus planos de carreira profissional. Prepara o Curriculum Vitae, submete-se a entrevistas, dinâmicas de grupo, teste específicos, comprova com diplomas a sua formação educacional, submete-se a avaliações no idioma Inglês, Espanhol e em matérias técnicas. Comprova experiência anterior e atende a várias outras exigências feitas pelos futuros empregadores. É, se demonstrar potencial competência, admitido. Fica num período de experiência quando suas habilidades são analisadas com lupa até que prove ser exatamente o profissional que a empresa necessita para os propósitos de seu negócio. Competência e preparo são, neste caso, o nome do jogo. Agora, com sua efetivação ele pode ser útil à empresa e fazer, ali, se quiser, a sua carreira profissional até atingir posições de maior destaque e relevância. Começará com assistente sem responsabilidade pelos resultados do setor, mas, um dia, se tudo correr bem e ele ratificar os seus méritos, poderá ter sob sua batuta o orçamento de todo um departamento da empresa.

Outra situação: Jovem, como no exemplo do parágrafo anterior, ou mais jovem ainda, talvez sem qualquer preparo executivo ou boa formação educacional, ou mesmo já adiantado na idade, semi-analfabeto e sem qualquer experiência na direção de qualquer atividade, nem mesmo uma lojinha de R$1,99, resolve optar pelo caminho da política. Aproxima-se de um partido político, faz umas gracinhas midiáticas e/ou vale-se de seu prestígio em alguma área do entretenimento de massa e sai candidato a um cargo político. É eleito pela massa ignara e logo assume a possibilidade de comandar ou interferir na gestão de um orçamento público superior em milhares de vezes ao daquele sob responsabilidade do cidadão do parágrafo anterior. Assume o poder de legislar sobre temas que vão influenciar no desempenho da indústria, do comércio, das empresas em geral, dos cidadãos. Ou, no poder Executivo, assume o comando de um ministério, uma secretaria ou um órgão público com ação sobre verbas astronômicas. Não precisou fazer entrevistas prévias; não teve que fazer provas de Inglês, Português, Matemática ou mesmo de quaisquer outras matérias técnicas. Não precisou provar experiência anterior para gerenciar qualquer coisa que fosse...

Não soa absurda essa situação? Sim! Mas é exatamente assim que o processo dito democrático seleciona os homens que têm o poder de comandar, não um departamento ou uma empresa, mas sim toda uma cidade, um estado ou a federação. Nada contra o fato de ser legitimo o direito de todos os cidadãos aspirarem a um cargo político, mas tudo contra o fato de que não se exija deles nenhuma prova de competência e preparo adequado para a função de tão larga responsabilidade. E parece que a coisa nem sempre foi assim. Foi com o passar do tempo e com o emburramento da coletividade associado ao desprezo generalizado pelo mérito e pelas funções públicas que acabamos nos submetendo às regras políticas elaboradas exatamente pelas mesmas pessoas despreparadas que, democraticamente, colocamos no poder.
Sócrates, o grande filósofo grego, já propugnava o mérito como sendo critério “sine qua non” para a escolha dos dirigentes da sociedade. Aí se incluía a educação, a moral, a aptidão e o preparo para o exercício de determinado cargo. Muitas sociedades atuais incluem em seus processos eleitorais essa vertente da meritocracia como elemento garantidor de uma gestão política de bom nível. Infelizmente, não é o que ocorre na nossa sociedade brasileira. Os exemplos de “falta de preparo” abundam o nosso cotidiano e nos leva ao desânimo, ao desperdício de recursos públicos e à injustiça social. Quer exemplos?

Sabe aquelas estradas que mesmo tendo recursos financeiros disponíveis nunca saem? Aquele projeto de linha férrea que nunca consegue sair do papel? A transposição do São Francisco que vem desde o período do Império e que nunca se conclui? O Metrô que não se expande conforme o crescimento das cidades? O gasto público sempre mais elevado do que seria razoável imaginar? O sistema de saúde que perde recursos com equipamentos que não funcionam porque não há infraestrutura correta para operá-los? O parque eólico do Nordeste que já está montado, porém a energia não tem redes de transmissão para ser distribuída porque faltou planejamento? Ficaria aqui horas e horas listando exemplos de incompetência na gestão do nosso país que nos priva de uma vida melhor e ainda elevam aos píncaros o custo Brasil.

Não devemos esperar que um dia uma determinada reforma política crie esses mecanismos para assegurar maior competência no Estado. Há, sim, uma forma de que se encontra em nossas mãos para evitarmos o descalabro. É o voto consciente. Precisamos criar a mentalidade de que dar o voto a alguém é como chancelarmos a admissão de um empregado em nossa empresa, ou da empregada que cuidará da comida e das coisas de nossa casa, do técnico que dirigirá o nosso time de futebol ou mesmo do gerente do Banco que cuidará das nossas economias colocadas sob sua responsabilidade para guarda e aplicação. Quando tivermos isso em mente colocaremos no governo gente séria e competente, com experiência, domínio de técnicas administrativas, ou seja, bons gerentes para cuidar e bem aplicar os impostos que pagamos cada vez em volumes maiores.

Edson Pinto

Dezembro’2013