27 de ago. de 2011

178) MENSAGEM A GARCIA


Há mais de século, certo Sr. Helbert Hubbard, tomado de divina iluminação, dessas que incidem e presenteiam um único ser humano entre milhões, produziu um texto tão verdadeiro e forte que deveríamos tê-lo colado no espelho do nosso banheiro. Assim, todos os dias, pela manhã, quando lá exercitamos nossa vaidade, lustrarmos nosso narcisismo e ficamos frente a frente com a nossa genuína face humana, fossemos obrigados a relê-lo à exaustão.

Dizem ser o artigo mais publicado no mundo. Pela sua atualidade, mesmo sendo centenário, está longe de ser esquecido no fundo da gaveta da história. Quis o Sr. Hubbard, a partir de um fato real, traçar um paralelo com o comportamento da maioria das pessoas frente aos desafios que a vida lhes impõe. O texto, cujo título é homônimo da minha crônica desta semana, deveria ser lido quantas vezes a vida nos permitisse. A cada leitura, uma nova reflexão há de emergir como o sol que a cada dia se irrompe por detrás da colina e da linha infinita do oceano para nos reafirmar o fantástico milagre da vida. Ao fim deste texto forneço o acesso para a original MENSAGEM A GARCIA. É você quem decide se quer lê-la antes do restante desta crônica ou se prefere primeiro entender a origem da famosa frase. De qualquer forma, o próximo parágrafo sintetiza a tal história:

Em um instante crucial da guerra entre Estados Unidos e Espanha no final do século XIX era absolutamente necessário fazer com que uma carta escrita pelo presidente americano, Mac Kinley, chegasse às mãos de Garcia, o chefe dos insurretos, que se encontrava em local desconhecido nos sertões de Cuba. Esse homem era Rowan que recebeu a missão e, sem fazer questionamentos tolos ou colocar dificuldades para tão árdua tarefa, cumpriu-a de forma extraordinária e no menor tempo possível para as condições da época. A lição que disso ficou e que continua ainda muito atual é o quanto as pessoas, em geral, se sentem dispostas a cumprir uma missão sem que para isso levem seus superiores ao desespero.

Bem, a sociedade desenvolveu-se de forma fantástica desde o advento da Revolução Industrial de meados do século XVIII e não parou de evoluir até os dias presentes. Os modernos meios de transporte, os avanços da medicina, a contínua marcha à frente das ciências, as telecomunicações e a rede mundial de computadores que nos sanciona o atrevido sacrilégio de imaginarmos quase ubíquos e oniscientes, são realidades incontestes. A humanidade nunca esteve tão preparada para resolver seus problemas adquiridos e – quem sabe – até mesmo seus pecados originais. Os instrumentos estão ao alcance de nossas mãos e só não os utilizamos em sua plenitude porque a maioria das pessoas continua incapaz de levar uma mensagem a Garcia.

__ Por que eu? __ Por que comigo? __ Por que isso? __ Por que aquilo? __ Por que agora?

Tente distribuir uma tarefa, por menos árdua que seja, para uma centena de pessoas que, além de terem alguma responsabilidade direta sobre ela e até mesmo se beneficiarão com o seu produto e constatarão, se tiver sorte, que apenas uma ou outra arregaçará as mangas para cumpri-la de maneira satisfatória e sem pedir algo em troca, sem se lastimar pelo infortúnio de ser escolhida e sem a preguiça e má vontade que em geral domina grande parte dos espíritos. A maioria esmagadora preferirá permanecer na confortável posição de quem espera apenas o momento de gozar dos frutos do trabalho alheio. Por que se esforçar se outros farão a tarefa por ela?

Convoque os maus empregados para uma tarefa em horário extraordinário e verá como ficarão felizes. Não pelo desafio em si, mas sim pelas horas-extras que serão pagas em dobro aumentando os seus salários. O político que usa o jatinho do empresário interesseiro e que ainda arrecada de modo escuso para a pretensa campanha do partido é o mesmo que adora uma convocação extraordinária do Congresso, pois receberá adicional aos seus já elevados ganhos. Convoque uma assembléia do condomínio para decidir algo de grande importância para a comunidade e lá verá as mesmas pessoas de sempre, as poucas aptas a levarem a mensagem a Garcia.

Alguém tem dúvida da razão pela qual o Comunismo como sistema político e econômico sucumbiu? A resposta se apresenta cristalina aos olhos de todos nós. Naufragou como o Titanic porque ficou melhor para muitos simplesmente participar da socialização do fruto do trabalho dos outros sem precisar suar o próprio corpo. Existia, como ainda existe, uma carta a ser entregue a Garcia, mas infelizmente poucos se dispõem a fazê-lo como Rowan.


Edson Pinto

Agosto’2011

19 de ago. de 2011

177) O LEGADO QUE VALE A PENA


Vez por outra, conceitos ou até mesmo palavras entram na moda. E moda, como nos sugere o uso rotineiro do termo é coisa passageira. Chega quando menos se espera, conquista os adesistas clássicos dos primeiros momentos, os chamados inovadores, e logo se espalha por um universo mais amplo até chegar o momento em que cai em desuso.

Neste tema recorrente da Copa do Mundo que acontecerá aqui no Brasil em 2014, o termo “legado” virou moda. Primeiro o que dizem os dicionários sobre este substantivo masculino: herança, disposição feita em testamento em benefício de alguém, entre outras. No sentido que tem sido aplicado na questão da Copa do Mundo quer se referir aos investimentos em infra-estrutura urbana e social a serem feitos no País por exigência do caderno de encargos da FIFA e que permanecerão para benefício de todos os brasileiros quando terminado o evento.

Nada mais simples de ser entendido: Qualquer cidadão pode compreender bem isto quando compara o que acontece na sua própria casa. Em função de um evento familiar importante como, por exemplo, o casamento de um de seus membros, a casa é reformada, pintada, móveis novos são comprados para que os parentes que virão de longe e que lá se hospedarão tenham uma boa impressão e sejam bem recebidos. Passado o casamento, a casa ainda bonita fica, por um bom tempo, servindo à família. Isto é legado.

Levando-se em conta tal enfoque, só os “desmancha-prazeres” inatos seriam capazes de apor restrições à realização das obras que ficarão como legado. Obviamente, não lhes tiro a razão do temor legitimo e justificado que também tenho quanto ao exagerado custos das obras e ao desvio do dinheiro público devido à endêmica corrupção e desmandos daqueles que deveriam bem zelar pelo erário da pátria, mas não o fazem. Neste particular é que vejo a oportunidade de contarmos com um legado maior do que simplesmente as obras físicas em aeroportos, sistemas de transportes urbanos mais confortáveis e ágeis, estádios decentes que atraiam famílias por que terão estacionamentos sem flanelinhas, banheiros limpos, assentos confortáveis e segurança. Teremos ainda uma rede hoteleira mais ampla, novas soluções para o combate à violência, visibilidade mundial e outros tantos benefícios que surgem na esteira da efeméride.

O legado que poderíamos conquistar seria a moralidade no trato da coisa pública. Vejo com bons olhos a limpeza que a presidente Dilma vem comandando no seu ministério. Já foram, por motivos diversos, quatro defenestrados, algumas dezenas de barnabés de comportamentos escusos e tem potencial de irem muitos outros. Tudo isso acontecendo no momento em que se discutem as obras da Copa. Vejo aqui a oportunidade ímpar para darmos apoio à faxina que ora acontece. Não devemos ficar indiferentes ao visível desconforto que a turma do mal, do Congresso, por sinal a maioria, já começa a manifestar contra a limpeza na malandragem de partidos e seus agentes arrecadadores infiltrados na máquina pública.

Se em função desse apreço do brasileiro para com o futebol soubermos tirar proveito da nova moralidade em curso, já com boa parte dos corruptos sendo expurgada pelas espanadas da presidente Dilma, ai teremos a possibilidade de sonharmos com o legado que valerá a pena conservar no pós-copa. Afinal, não é só de Copa do Mundo e de Olimpíadas que vivemos. O País todo está para ser construído. Se for sem corrupção, tanto melhor!

Edson Pinto
Agosto’2011

13 de ago. de 2011

176) SEMANA RUÇA, MONTANHA RUSSA

 A semana que acaba desenrolou-se frenética, ruça. Também, quem imaginou pudesse ser diferente? Já no topo da montanha russa, nos instantes que precedem ao grande mergulho, a adrenalina acelera o coração, a pressão arterial sobe aos píncaros e os brônquios se dilatam a não mais poder. Chegado ao fundo, nova subida, chacoalhante e marcada por suspiros recuperadores até que o novo topo prenuncie mais emoções. Haja coragem!

Assim tem sido essas últimas semanas de tantas incertezas econômicas e políticas aqui e alhures: Obama consegue se safar na undécima hora com a elevação do endividamento da até então mais confiável economia de todas, mas o mundo reage com os problemas disto decorrentes. A adrenalina volta pulsante, os ânimos se acirram, o bloco europeu sacoleja e riquezas virtuais se derretem no sobe e desce das bolsas mundo afora. Já quebraram a Grécia, a Irlanda e Portugal. Quebrarão a França, a Itália e a Espanha? E as economias em desenvolvimento, como a nossa, passarão incólumes ou não há como deixar de serem respingadas pela carnificina da economia global? No meio, de novo, o Brasil. Outra marolinha ou o que se nos apresenta é o refluxo típico das ondas que antecedem os tsunamis?

No universo de Brasília, a já chamada “espanada nos ministérios” joga algum alento àqueles que acreditam haver uma forma de vermos os cofres públicos saqueados com mais decência e não da forma descarada que se tornou o padrão da original Esplanada. A base aliada - esta figura exótica e de propósitos escusos - treme, porque a “espanada” tende a chegar a mais gente, com grande probabilidade, a quase toda. A nação da mais elevada carga tributária, da mais exorbitante taxa de juros, dos elevados índices de corrupção e de outras mazelas sacode o seu pó, mas não o aspira. A casa continua suja e a culpa é do espanador...

E à base? Ah! À base só resta a ameaça de obstruir os projetos do governo choramingando por quanto seus pleitos não estão sendo saciados. Que pleitos legítimos defendem? São, por certo, os cargos na miríade de ministérios com o poder de receber, cada qual, uma cópia da chave das burras do erário público. De lá tiraram, tiram e certamente tirarão, de forma impiedosa, para os partidos, para os padrinhos e para si mesmos o que o Leviatã tirou do povo sacrificado por uma das maiores cargas tributárias do mundo.

Mais adrenalina ainda porque quem foi preso era do partido A ou do partido B e, como que traídos, se sentem desprestigiados pela presidente que preza mais a honestidade que a rapinagem. Será que Dona Dilma consegue segurar essa barra?

De Jacundá, onde 96% da população não têm acesso à rede de esgoto, porém, nenhum sinal de desespero. Quem não tem água tratada, nem luz elétrica para substituir a lamparina, nem feijão suficiente na panela e nem consciência do que acontece, não há como perceber a existência de tanta gente importante momentaneamente tão estressada. Que importa esse frenesi das bolsas e esses engravatados que levam milhões da Republica já em avançado estado de putrefação de costumes? E la nave va!

Há semanas que têm razão para serem recordadas. A famosa semana de fevereiro de 1922 rompeu com o passado e nos levou ao modernismo. As que ocorrem nestes tempos em que vivemos nos rompem com a pasmaceira, mas nos embarcam, ruçamente, na montanha russa de sistemas econômicos perversos.

Que a próxima já nos seja melhor!

Edson Pinto
Agosto’2011

6 de ago. de 2011

175) ESTRATÉGIA DE SOBREVIVÊNCIA










O mundo animal é pródigo em exemplos de estratégias que são adotadas pelas várias espécies face ao repleto cardápio de infortúnios que a vida lhes apresenta. As despreparadas para o enfrentamento das mutantes adversidades do meio ambiente tendem a desaparecer. Há, como todos sabem, inúmeras espécies que já sucumbiram ou que caminham celeremente para a sua extinção. Não vem ao caso citá-las aqui, pois a crítica é curta e se assenta exclusivamente sobre uma espécie bem identificada, conforme citarei mais adiante nesta minha crônica.

Há, contudo, espécies que adotam a mais singular das estratégias para que não sejam extintas. Enquanto muitas outras lutam contra seus predadores, mimetizam, se escondem, inoculam veneno nos inimigos, atacam ou hibernam, há as que simplesmente optam pela rápida reprodução e em quantidade. Assim, aceitam que muitos de seus membros serão eliminados precocemente na batalha da vida, mas mesmo assim sempre existirão outros para substituí-los e desta forma garantir a sobrevivência da espécie.

Além da voracidade e do modo assemelhado de agir para a apropriação do que pertence aos outros, e mais ainda por essa estratégia da vasta reprodução, é que o rato simboliza tão bem a figura dos corruptos que assaltam o erário público, tal como fazem os seus homólogos ao devorarem o estoque de grãos do celeiro. Um ladrão, um corrupto e um rato são, na essência, a mesma coisa.

Em algumas espécies de roedores, as fêmeas ficam prontas para a reprodução com apenas seis semanas de vida e chegam a gerar até setenta filhotes ao longo de um único ano. Quando em algumas situações especificas não são combatidas, a população cresce de forma assustadora. Fosse a falta de predadores - hipoteticamente - um padrão de muito longo prazo, provavelmente esse roedor repensaria sua estratégia de sobrevivência e começaria a reduzir o incômodo e exagerado tamanho da prole. Também podemos especular sobre o contrário: dado um padrão de maior predação, maior seria o tamanho da prole. Mera conjetura sem base científica, porém verossímil!

Com os corruptos do Brasil parece que este segundo movimento está permanentemente em curso. Quanto mais se descobre e mais se tenta eliminar os corruptos, mais eles se reproduzem. Com toda a certeza, essa espécie social é regida por alguma inteligência genética que orienta o seu instinto de sobrevivência. Como está se tornando difícil mimetizar, se esconder, inocular veneno no inimigo, atacar ou mesmo hibernar só lhe resta a estratégia da acelerada e abundante reprodução.

Vejam o que nos demonstram os incontáveis casos de corrupção que têm sido detectados nos últimos anos. Fiquemos apenas nos mais recentes para não congestionar a nossa pobre memória que não tem espaço para tantos registros nesta área de preocupações: caso Celso Daniel, caso Roseana Sarney, escândalo dos bingos do Waldomiro Diniz, escândalo dos Correios do Mauricio Marinho, Mensalão, escândalo das ambulâncias, Renangate, escândalo dos cartões corporativos, operação Boi Barrica do filho do Sarney, mutretas da Erenice Guerra, lodaçal do DNIT. Ufa! E veja que são apenas 11 casos que pincei de uma lista de quase 70 registrados desde o ano 2000.

Em matéria de corrupção e de escândalos, parece não haver remédio que elimine o mal. A metástase é evidente... Não há desinfetante, por mais poderoso que seja, capaz de curar essa ferida escancaradamente aberta. No tal do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) começou com um, mas rapidamente chegou-se a quase trinta e serão muitos mais se a desinfecção puder progredir. E mesmo quando terminar, porque na vida tudo tem que terminar um dia, ainda ficarão outros exemplares de roedores que voltarão a saquear o celeiro ao mesmo tempo em que se reproduzirão de forma acelerada.

No dizer simples do velho sambista Bezerra da Silva, a síntese de toda essa problemática que torna a nossa democracia uma ficção, uma solução imperfeita, uma utopia para manter os espíritos crédulos ainda vivos:

Se gritar pega ladrão, não fica um meu irmão...”

Edson Pinto

Agosto’ 2011