29 de mai. de 2010

122) LÁGRIMAS QUE ENSINAM

Uma lágrima (ou seria algo como a gota de orvalho de que Tom e Vinicius nos falaram na famosa canção?), escorreu langorosa face abaixo até ser absorvida pelo seu vestidinho surrado pelas brincadeiras do dia.

Ainda sem dizer uma única palavra, olhou piedosamente para o alto e, ajoelhada como numa prece, pediu perdão com os olhos, mas não com a voz. Esta ela já não conseguia mais articular. E nem precisava. Nada mais verdadeiramente comovente do que o olhar triste de uma criança, inocente e pura traduzindo sua fraqueza, implorando a absolvição.

Deus estava ali, ao lado, tenho certeza. Não para repreendê-la pela peraltice que acabara de cometer e que tanta aflição causara à mãe. Esta, agora, agitada e momentaneamente desprovida da paciência dos que perdoam. Cena um tanto surreal, embora compreensível sob o ponto de vista de como nós erramos até que tenhamos encontrado o caminho correto a ser seguido. Sandrinha, contudo, estava aprendendo pelo método mais doloroso possível como é difícil tomar decisões em um mundo que se nos apresenta com tantos perigos.

__ Que não me faça mais isso! – gritou a mãe enquanto lançava olhar severamente colérico sobre a inocente criaturinha ali aos seus pés.

Era preciso corrigi-la, caso contrário jamais aprenderia que o respeito aos animais é tão necessário como o respeito ao próximo. Sandrinha tinha colocado o gatinho Felix na geladeira e lá o deixado por muito tempo imaginando sabe-se lá o quê. Uma peraltice dessas que ficam na memória de quem a pratica para todo o sempre. Nunca quis, mesmo porque na sua inocência de criança não imaginava que o gatinho de que tanto gostava poderia morrer congelado. Era só uma brincadeira, uma curiosidade, um estranho deleite infantil passando por cima de toda a lógica que os seres humanos experientes acabam, às duras penas, por aprender.

O jogo da vida é fantástico, mas também cruel. Ganhamos a vida de presente sem que recebamos um manual de instruções para bem operá-la. É no dia-a-dia que vamos descobrindo as suas peculiaridades, cada um de seus truques, os perigos e até mesmo a felicidade. Esta existe sim, mas deve ser buscada nas entranhas e não na superfície das pequenas e grandes coisas que fazemos na vida. Para Sandrinha, a felicidade daquele momento ímpar foi a de ver seu gatinho assustado dentro de uma geladeira escura e em seguida tremulante, mas ainda carinhoso, encolhidinho no aconchego de seus braços. Só queria ser feliz...

O moço poderoso socialmente, já deputado estadual, com sua máquina de velocidade já passara da infância e da adolescência, mas ainda continuava acreditando que dirigir a 160 km por hora lhe dava felicidade. Esquecera de que outras pessoas poderiam também estar cruzando aquela mesma esquina. Não aprendera o suficiente e, por isso, lá se foram as vidas de dois outros jovens no Paraná. Hitler brincou com as armas que conseguiu produzir e com o exército poderoso que conseguiu montar. Foi preciso que milhões de inocentes dessem suas vidas numa fratricida guerra até perceber que não aprendera na infância o respeito aos seus iguais. No bunker, em desalento, puniu-se a si mesmo. Ahmadinejad ainda brinca pirracentamente de construir uma bomba atômica. Muitos outros países já têm uma ou várias, por que nós - pensa ele - não podemos ter a nossa também.

Essa brincadeira do líder iraniano tem todo o sintoma de uma aventura inconseqüente, até mesmo infantil. Os desdobros de tal leviandade podem guardar surpresas muitos ruins. Seria preciso uma mãe severa para dizer ao irresponsável filho de que colocar o gatinho na geladeira pode até ser engraçado, mas pode também levar a um fim indesejável. Melhor ser repreendido com rigor agora do que ter que rolar lágrimas mais tarde. Os que apóiam Ahmadinejad precisam saber que uma criança mimada gera adultos perigosos.

Sandrinha teve a lição de sua vida. Certamente, naquele momento em que Felix era enterrado no quintal de sua casa, marcou para sempre a sua vida. Cada atitude perigosa que vier a tomar no futuro haverá de ser sempre confrontada com o que lhe ocorreu naquele dia infeliz.

Edson Pinto
Maio’2010

21 de mai. de 2010

121) LULA, O FILHO DE KRYPTON


Antes que o planeta Krypton explodisse, Jor-El, o grande cientista de lá, enviou seu filho pequeno, Kal-El (filho das estrelas no idioma kryptoniano) em uma nave para sua viagem salvadora à Terra. Só muito recentemente, ao mundo, foi dado saber que a nave de Kal-El acabou por aterrissar em Caetés, Garanhuns, no agreste pernambucano, bem no fundo do quintal de Dona Lindu.

Isso teria ocorrido em 27 de outubro de 1945. Dona Lindu com sua grande alma materna tomou para si a responsabilidade de criar aquela figurinha extraterrestre ímpar, barrigudinha, cabeça ligeiramente achatada e que em pouco tempo na nova família demonstrava incrível habilidade em manipular com seus 9 dedinhos quaisquer objetos que lhe colocassem ao alcance.

Pensou chamá-lo Joel em homenagem ao pai kryptoniano, Jor-El. Dona Lindu, contudo, disse não, não e não... Será Luiz, ou melhor, Lula, Lulinha, pois, ao que imaginava, viera da Lua. Krypton, convenhamos, era e ainda continua sendo um lugar pouco conhecido por aquelas bandas do Nordeste.. Como Dona Lindu, que nascera analfabeta como já disse o ilustre filho, poderia saber, com precisão científica, a origem do pimpolho como sendo de um planeta tão estranho e que já nem mais existia?

Não tardou até que o pequeno Lula começasse a demonstrar os seus super poderes. Sabe-se agora que o Sol de Krypton irradiava a cor vermelha. Na Terra, Lula, ao receber a radiação amarela do nosso Sol e, por força da diferença de freqüência eletromagnética entre elas, tinha as células de seu pequeno corpo e de sua caixa craniana, como já disse, ligeiramente achatada, carregadas de extraordinária força. Seus músculos se tornavam incrivelmente rijos a ponto de eliminar os efeitos da gravidade. Lulinha passou a voar e - revelo-lhes, agora, caros leitores - desenvolveu ainda a visão raio-X, a visão de fogo, o super sopro e o sopro de gelo.

Modesto a principio, esperou pacientemente o cumprimento de uma jornada terrena adaptativa. Ocultou por anos e anos os seus super poderes. Passou por um simples torneiro mecânico, sindicalista pragmático, fingiu-se deputado e até tornou-se corintiano. Pura estratégia! Dispensou, contudo, a necessidade de frequência aos bancos escolares. Com sua visão raio-X, sua capacidade de voar, bem como contando com o super sopro, que problema haveria em dizer “menas”, “pobrema” e tomar pinga? Foi o que fez!

Tornado o presidente de todos nós, decidiu por começar a revelar de forma gradual, é claro, os seus super poderes até então um tanto secretos. Primeiro, voar. Assim comprou o "aerolula" e voou, voou, voou... E, à medida que o mandato de presidente mais se aproximava do fim, pensou: Por que não usar também a visão raio-X de que disponho, o super sopro que me é exclusivo, a minha visão de fogo matadora e o meu não menos super poderoso sopro de gelo que a tudo congela?

Salvou os pobres do Brasil não só matando-lhes a fome, mas estimulando-lhes para o gozo do ócio remunerado. Com um de seus super poderes criou o Bolsa-Família, o Bolsa-Gás e o Bolsa-Tudo. Trabalhar prá que? Com seu sopro de gelo esfriou o mensalão. Com o seu super sopro isolou o Zelaya na Embaixada do Brasil em Honduras, evitou que democratas incomodassem os irmãos Castro em Cuba, Hugo Chaves na Venezuela, Rafael Correa no Equador e Evo Morales na Bolívia. Com sua visão de fogo voou ao Oriente Médio e incendiou a arrogância de Ahmadinejad ao mesmo tempo em que conseguiu confrontar-se com o Conselho de Segurança da ONU.

Em uma história parecida com esta que venho agora a lhes revelar, outro personagem com o codinome de Clark Kent exercia-se profissionalmente na redação do Planeta Diário. Quando transformado em Superman lá estava com a sua indefectível sunginha por cima das calças e fazia justiça, combatia a bandidagem, a violência doméstica e salvava o mundo de seus inimigos.

Lula, que em breve deixará o seu Planeta Diário, ficará livre também para - de sunginha vermelha na cor do PT - bem incrementar o uso de seus super poderes no combate aos males do mundo. Esperam por ele trabalhos que somente o filho de Krypton tem condições de realizar: acalmar o vulcão Eyjafjallajkull lá na Islândia; promover a paz entre as Coréias; reconstruir o Haiti; dar bons modos ao Berlusconi; conquistar o coração da Carla Bruni; recompor as geleiras dos pólos; reconciliar Israel com os Árabes; acabar com a crise econômica mundial; replantar a Amazônia e até mesmo acabar com o vazamento de petróleo no Golfo do México.

Conseguirá? Não tenho dúvidas de que sim! Afinal, fragmentos de kriptonita vermelha ainda irradiam super efeitos a partir dos destroços de sua nave hoje cercando o galinheiro da saudosa Dona Lindu lá na árida Caetés.


Edson Pinto
Maio’2010

14 de mai. de 2010

120) O EFEITO BORBOLETA


Tanto a Física, a Matemática como outras áreas do conhecimento humano se servem de uma teoria para explicar a razão pela qual, em sistemas complexos e dinâmicos, os resultados podem, e, quase sempre, se apresentam instáveis, nunca absolutos, jamais perfeitos, frequentemente mutáveis.

__ O que isso significa?

__ Olhemos para o céu! As nuvens se apresentam em um dado formato. Fechemos os olhos por alguns instantes! Ao reabri-los perceberemos que já não prevalece a mesma formação anterior. Infinitas micro-influências de temperatura, pressão atmosférica, velocidade dos ventos, composição química das nuvens bem como de outros elementos interagem para determinar um resultado - na prática - impossível de ser previsto com absoluta certeza. Chamam a isso de Teoria do Caos.

As condições pré-formação do Universo eram caóticas assim como também o são as condições meteorológicas com as quais nos relacionamos com muita freqüência em nosso dia a dia. O Universo era antes de ser tal qual agora e para todo o sempre caótico por excelência.

__ E, por que é tão difícil, ou quase impossível, projetar um resultado estável sobre a evolução de um sistema complexo?

__ A complexidade das interações dos elementos dentro do sistema, associadas, ou não, a aleatoriedade, ruídos e erros microscópios conduzem ao caos. A ilustração mais clássica disso toma a alegoria da borboleta que ao bater suas asas em um ponto qualquer pode desencadear uma tempestade de grandes proporções, tempos depois, do outro lado do mundo. O Universo, em sua grandiosidade e os encantos da natureza, em que pese sua harmonia estética, traz aleatoriedade e caos.

O conhecimento humano sobre a mecânica celeste e sobre o movimento das placas tectônicas, por exemplo, é apenas um verniz na complexidade que conduz ao caos. Não há como prever hora precisa, local exato e intensidade de terremotos como os que mataram milhares de pessoas no Haiti, no Chile e na China. Quando, como e com que fúria exatamente viriam as chuvas do Rio, a nevasca da Europa ou a erupção do vulcão Eyjafjallajkull na Islândia.

Se a Teoria do Caos e seu efeito borboleta encontram-se entranhados nas ciências exatas imaginem se também não estaria nas relações humanas? A psique, as interações sociais, o exercício das artes, da música e das religiões, só para citar algumas áreas em que o acaso, o fortuito, o acidental e o conveniente prevalecem, só podem ter característica de caos.

Mas, que triste seria se as ações humanas tivessem a previsibilidade estável se nem os elementos naturais têm?

Cada um de nossos atos pode, tal qual o bater de asas de uma borboleta, desencadear reações que nem sequer imaginávamos possíveis. Por que não?

Edson Pinto
Maio’ 2010

2 de mai. de 2010

119) PAPAI SABE TUDO...



Dei ao meu novo celular, Motorola, Milestone com o sistema Android 2.0 da Google o apelido de Jim Anderson. Mais adiante, você meu caro leitor, entenderá o porquê. Por ora, valho-me de reminiscências:

Lá pelo início dos anos 60 ainda era possível assistir na TV preto e branco da época um dos seriados de maior prestígio entre famílias de todo o mundo. Sabidamente, Robert Young, no papel de Jim Anderson junto com Jane Wyatt, no papel de Margaret Anderson, representavam o ideal da família americana. Bem estruturada, com seus probleminhas normais, mas que, com a liderança e sabedoria do papai, conseguia resolver tudo com competência e harmonia.

Por trás daquele modelo de família perfeita, havia o interesse norte americano de demonstrar a supremacia do modo ocidental de vida em contraposição à sanha marxista liderada pela União Soviética que, junto com os aliados, saíra igualmente vitoriosa do mais sangrento de todos os conflitos de que se tem notícias, a Segunda Guerra Mundial. O senador americano, Joseph MacCarthy, deu o tom necessário - no que foi prontamente seguido pela mídia ocidental - para a eliminação de todos os vestígios de atrativos possíveis e imagináveis do modo marxista de ser. Chamou-se a esse movimento e período da História de “Caça às Bruxas” e de “Macarthismo”.

O papai sabe tudo (father knows best) reforçava o conceito de família. Lembro-me, quando pequeno, que a ideia de comunismo recebida na época fantasiava com a informação de que, nos países comunistas, os filhos, ainda jovens, eram retirados do seio familiar e levados para formação educacional, militar e política em ambientes controlados pelo Estado. Isso metia medo, é óbvio... Nesse contexto, uma família bem estruturada como a de Jim e Margaret Anderson, criando filhos saudáveis, enchia-nos de orgulho por sermos capitalistas ao mesmo tempo em que reforçávamos o ódio ao Marxismo e à utopia do Comunismo.

O título do seriado “Papai Sabe Tudo” foi tão forte que até hoje, já passadas algumas décadas desde a sua regular exibição na TV, ainda faz todo o sentido. Isso, com o conhecimento da psicologia que temos nos dias de hoje, pode até nos indicar uma espécie de propaganda subliminar funcionando, é claro, em favor do sistema capitalista que enriqueceu algumas nações e pauperizou muitas outras. Penso até que funcionou bem, porque tivesse o mundo debandado para o marxismo e seu desdobramento em estados centralizadores, antidemocráticos e manipulados por títeres, já teríamos, de há muito, derrubado, por fome e desorganização típica do modelo centralizador, os nossos próprios muros de Berlim. Tanto melhor que isso não tenha acontecido...

“Papai sabe tudo”, sabia mesmo. Cada problema que a família apresentava, Jim Anderson sabia dar trato a ele e sempre com um “grand finale” estava tudo resolvido. Mas, de onde esse homem ocidental, maravilhoso, tirava toda a sua sabedoria? Tudo girava ao redor do modo ocidental de ser. Bastava ser otimista, esforçado, trabalhador, voltado para a família e para a pátria e tudo se explicava bem dento do conceito.

Temos que considerar, contudo, que nos dias de hoje, se por um lado, a gurizada já não faz mais perguntas constrangedoras, mas simples, como as dos tempos de Jim Anderson, talvez as dificuldades de encontrar respostas apresentem-se maiores devidos à complexidade do mundo moderno:

__ Papai, como são gerados os bebês?

Nada disso faz mais sentido, hodiernamente. As perguntas, agora, podem ser mais complexas, pois saíram do universo das dúvidas existenciais e passaram para os universos da tecnologia, das ciências e das questões políticas. Poderiam ser, então:

__ Papai, minha conexão em banda larga não consegue fazer os meus downloads prediletos. Será que você pode me ajudar? Ou:

__ Papai, se o Lula sabia do mensalão por que permite que o José Dirceu continue freqüentando com a maior cara de pau o núcleo do poder?

Respostas a tais perguntas que tenho certeza Jim Anderson, nos dias de hoje, teria muita dificuldade em fornecer e assim manter o capitalismo altivo. Porém, como o Comunismo já está nos seus estertores, felizmente, o “papai sabe tudo” teria sua vida facilitada, pelo menos no que concerne a necessidade de manter a “caça às bruxas”.

Mas, legal! Às vezes podemos também sentir a presença de Jim Anderson. Ocorreu comigo! A tecnologia facilita muito as nossas vidas: Estava eu sentado na sala de espera da Clínica onde faria um exame. Muitas pessoas sérias, compenetradas, com aquele respeito característico de quem têm algo em comum, uma coleta de sangue, por exemplo, mas que não se conhecem o suficiente para uma troca de palavras. Minha mulher, ao lado, concentrada nas “Palavras Cruzadas” e eu, discretamente absorto entre um caderno do Jornal e o meu novo celular.

__ Edson, me falta responder, aqui, que evento de repercussão mundial ocorreu na cidade de Belém em 2009?

Impossível que toda aquela gente ali apinhada não passasse a participar da mesma dúvida. Suspense geral a espera de uma resposta... Com absoluta naturalidade e sem ao menos desviar o meu olhar que todos pensavam estar no Jornal, digito na barra de consulta do Google do meu maravilhoso novo aparelhinho a expressão: “evento internacional em Belém” E, em pouquíssimos segundos, respondo em voz um pouco mais alta para que a dúvida fosse sanada também da cabeça dos circunstantes:

__ “Fórum Mundial”.

No que minha mulher prontamente responde com dócil orgulho: “Papai sabe tudo!”

__ Eu não! – replico baixinho - é o meu Jim Anderson!

Edson Pinto
Maio’ 2010