9 de dez. de 2008

63) MENSAGEM DE FIM DE ANO

Há uma feliz proximidade de datas: O Natal e o Ano Novo separados por apenas uma semaninha. Sorte nossa!

No Natal - festa máxima do cristianismo - comemoramos o nascimento de Jesus que, com sua mensagem de humildade e amor ao próximo, conquistou corações e mentes ao longo dos últimos 2000 anos.

Mal o aroma nostálgico do peru natalino ameaça abandonar a memória de nossos sentidos e chegamos ao Ano Novo. Este sim, momento em que, sendo cristãos ou não, comemoramos em uníssono um marco especialíssimo: Deixamos um ano e adentramos outro. Fazemos balanço das realizações e dos fracassos do ano terminado ao mesmo tempo em que renovamos promessas para o próximo.

Não importa a crise econômica, o rebaixamento do nosso clube para a segunda divisão, a chuva que em excesso desmancha morros e faz vítimas inocentes, a violência das ruas, o tráfego infernal das grandes cidades. O que importa é a esperança que depositamos em dias melhores. E isso é mais do que o suficiente...

Deixemos, portanto, que a canção de Charles Aznavour, “Hier Encore”, “Ainda Ontem”, tão bela e cheia de significados reforce em nossos corações as sábias lições de vida que ela contém, para nunca termos de nos arrepender das ações que praticamos quando ainda, há pouco, tinhamos nossos 20 anos...

Um feliz Natal para todos e um Ano Novo muito melhor do que este que já está por terminar.

Volto a atualizar o meu blog somente em janeiro próximo.

Edson Pinto e família
Dezembro’2008
Clique na seta abaixo para rememorar a bela canção de Charles Aznavour:

62) MERO PIXEL (dez'08)

 __ Meu amigo, você sabe quantas estrelas existem na Via Láctea, o conjunto estelar dentro do qual se encontra esse ponto insignificante que é o nosso planeta Terra? São 200 bilhões de estrelas iguais ou maiores do que o nosso provedor de vida, o rei Sol. E veja que a Via Láctea é apenas uma das galáxias de um total estimado de 100 bilhões de outras. Multiplique - se conseguir - os dois números e concluirá que não há espaço suficiente nesse seu caderninho aí para registrar todos os zeros que virão depois do número 2. Então, tente se for capaz!

__ E digo mais: se olhar apenas para a Terra, verá que você nada mais é do que uma simples unidade de uma população que já beira aos 7 bilhões de terráqueos. Portanto, meu caro, você não é nada de especial. Diria eu, agora fazendo uso de uma linguagem mais high-tech, você não passa de um mero e banal pixel. No máximo, no máximo, algo como um daqueles minúsculos pontinhos que na tela do aparelho de TV da sua casa reproduz um pálido fragmento de luz.

__ Espero que já se tenha dado conta de quão insignificante você é diante da grandeza infinita do espaço sideral. E vem, neste momento, se colocar como um ser tão especial como se o universo postasse aos seus pés e, sobre tudo o que ele contém, pudesse reinar soberanamente para mudar sem escrúpulo nenhum a ordem correta das coisas em seu benefício próprio?

__ Se pudéssemos materializar a sua vaidade e transformá-la em uma estrela, aí sim, poderíamos vê-la como uma de especial grandeza, superior ao Sol e até mesmo a quaisquer outras das tantas que inundam o firmamento. Mas, como isso não é possível, resta a você, meu caro, apenas manter-se quieto e ordeiro no lugar que ocupa. Tire definitivamente dessa sua cabecinha presunçosa qualquer intenção de se colocar na minha frente para realizar prioritariamente o seu intento.

__ Mas, senhor, eu só precisava urgentemente...

__ Que falta de humildade, meu irmão. Passar na minha frente, nunca. O melhor que você faz agora é usar as folhas de seu caderninho e limpar-se ali por detrás daquela coluna, pois como um mero pixel que é, pode até brilhar, mas exalar esse cheiro horrível que já me incomoda, nunca...

__ Vá seu mero e fedorento pixel para detrás da coluna e limpe-se como puder! Chegou a minha vez e tenho que pentear os meus cabelos...

Edson Pinto
Dez'08

4 de dez. de 2008

61) CRENÇA E CONHECIMENTO


Pergunta 1: Quem é a única prima da sobrinha do pai do irmão de sua mãe?

Se você não conseguir responder rápido a essa pergunta, não tem problema. Poucas pessoas conseguiriam dar uma resposta imediata. A maioria, desde que pegue papel, lápis e tenha paciência e algum método investigativo chegará à conclusão correta de que a tal mulher só pode ser a sua própria mãe.

Outra pergunta: Por que os espelhos invertem nossa imagem da direita para a esquerda, da esquerda para a direita, mas nunca de cima para baixo ou de baixo para cima?

Novamente, difícil de se obter uma resposta imediata. Talvez, com a ajuda da Ciência, você consiga alguma explicação mesmo que parcial para esse enigma que desde Platão, o grande filósofo grego, tem se colocado no rol das especulações metafísicas. Não quero ser leviano nem pretensioso a ponto de oferecer aqui e agora uma resposta para o enigma. Deixemo-lo, pois e pelo momento, para a investigação de mentes sofisticadas e bem iluminadas.

O que penso ser interessante considerar dos dois questionamentos é o fato de a vida nos colocar, em geral, situações prontas para as quais raramente nos sentimos motivados a questioná-las. Tomamos todas como verdades inquestionáveis e assim poupamos a necessidade de pormos em funcionamento os bilhões de neurônios com os quais a Natureza nos presenteou.

Sendo mais confortável aceitar que no espelho meu braço direito vira o esquerdo e vice versa porque sempre foi assim, por que, então, deveria eu especular a fundo sobre a razão disso, jogando fora, desse modo, o meu precioso tempo? Sabendo, como sei, que sua mãe é prima de Maria por que deveria eu passar pela intrincada análise da relação de irmão, pai comum, tio e filha do tio?

Mas, e a vida como um todo? Não é muito diferente: Por comodismo, obediência servil, falta de motivação para agir, fraqueza moral e outras razões, temos a tendência a nos encaixar no que filosoficamente chamamos de zona de conforto, onde nada pode nos incomodar. Ficamos ali quietinhos, torcendo para que ninguém nos veja e assim vamos assistindo, incólumes, o marasmo do passar do tempo. Tal qual a figura do aluno obediente que se esconde nas fileiras do meio e nunca se atreve nem para bagunçar, nem para questionar, muito menos para apresentar as suas idéias, se é que as tem. Termina o curso, pega seu diploma e se torna um número na série da infinita mediocridade.

Em boa medida o que deveríamos cultivar seria certo grau de ceticismo em relação à realidade que percebemos, especialmente quanto às crenças que consolidamos ao longo de nossa experiência terrena. Não é sem razão que os grandes filósofos sempre argumentaram em favor da distinção clara entre conhecimento verdadeiro e crença.

Por exemplo: O cidadão americano pode pensar que Barack Obama representa a esperança na política de seu país apenas por causa do inusitado histórico de ser - pelo que já foi dito - a novidade na política de seu país. A crença de que Obama trará progresso pode ser, de fato, verdadeira. Mas, o fato de ser "a novidade" não é a irrefutável evidência de sua condição de arauto da esperança e promotor do progresso. Neste exemplo é improvável que sua crença seja conhecimento, mesmo considerando que ela seja verdadeira. O que confirmará a esperança depositada no fenômeno Obama será a forma e efetividade como ele ajudará os EUA, e a reboque o resto do mundo, a adentrar-se a uma nova fase de progresso econômico e social que, como infelizmente tudo indica na atual situação, parecer estar rapidamente se esgotando.

A minha crença nessa possibilidade é verdadeira, afirmo. Só não posso afirmar se ela se sustenta em base sólida de conhecimento real. Resta-me esperar...

Edson Pinto
Dezembro’08

28 de nov. de 2008

60 ) SAGRAMATHA OU CHOMOLUNGMA

Por muito tempo, no passado, foi tomada como certeza a existência de uma estrela a qual se dava o nome de Hesperus, ou Estrela da Tarde. Tomava-se também, por povos de outra longitude, como certa, a existência de outra, Phosphorus, ou Estrela da Manhã. Com o passar do tempo, aquilo que pareciam ser dois astros distintos na verdade era um só, o planeta que hoje conhecemos como Vênus.

Quase que pela mesma lógica, o pico Everest, mais alta montanha do mundo na cordilheira do Himalaia, é considerado pelos nepaleses como Sagramatha (rosto do céu), mas para os tibetanos, que a vêem do norte, como Chomolungma (mãe do universo). Como as propriedades físicas são as mesmas, é perda de tempo discutir se são duas ou uma única montanha. É a mesma coisa e pronto...

Desde que o filósofo alemão Leibniz propugnou que objetos idênticos deveriam compartilhar as mesmas propriedades, fica difícil imaginar como a simultaneidade de visões díspares aplicadas a um mesmo tema poderia subsistir a um rigoroso teste de sua validação. Aplica-se à identificação de uma estrela, de uma montanha e até mesmo para a visão objetiva das variadas facetas do mundo em que vivemos.

Nessa linha de raciocínio, a crise mundial que toma a forma do grande leviatã bíblico, devorador imaginário dos navegadores de antigamente, não poderia, ao mesmo tempo, apresentar-se como um tsunami de proporções catastróficas para alguns e uma “marolinha” para outros como nos quis fantasiar o presidente Lula. Dissimula o presidente ou, como disse FHC, brinca de Polyana ao esconder dos brasileiros a dimensão real da crise.

E, por que tsunami e marolinha devem ser a mesma coisa como o são Hesperus e Phosphorus ou Sagramatha e Chomolungma?

É porque ambas as metáforas, tsunami e marolinha, compartilham de forma “sui generis” as mesmas propriedades. Então, devem obrigatoriamente ser a mesma coisa e nunca coisas diferentes. Com o entrelaçamento das atividades humanas, quer no comércio, na cultura, na política e em tantas outras facetas impostas pela globalização de tudo, não é possível imaginar que o mesmo fenômeno leve a conseqüências diferentes dependendo do alvo. Ao cabo da confirmação da crise isso será, infelizmente, um tsunami para todos ou, se formos felizes, uma “marolinha” também para todos, mas nunca uma coisa para uns e outra para outros.

Dá até para entender que o presidente Lula queira amenizar o sofrimento dos brasileiros usando a velha estratégia de comunicação gradual do problema na base do “o gatinho subiu no telhado”. O que não pode, pois isso nos faria mais mal do que bem, é ficarmos fazendo castelinho de areia na praia imaginando como única ameaça uma “marolinha” e aí sermos surpreendidos por um tenebroso tsunami.

No fundo, tanto faz que o nome do Everest seja Sagramatha ou Chomolungma, desde que seja o mesmo. O que nos deveria interessar é a manutenção da consciência de que nossos sentidos não sejam iludidos por distorcidas versões de falsos oráculos.

Edson Pinto
Novembro’08

24 de nov. de 2008

59) O TEMA DA VITÓRIA E ALGUMAS LIÇÕES BÁSICAS (nov'08)

 O resultado do exame de imunofenotipagem trouxe a conclusão: “O clone da célula anômala foi extirpado”. Isto pode não dizer nada para quem – graças ao bom Deus – desfruta de saúde e que por isso deve, ou pelo menos deveria, gozar com intensa alegria a plenitude do maior dos dons que aos humanos deram os céus: a vida.

Mas, para nós, a tradução pedestre dessa frase cientifica revelada no exame soa como o “Tema da Vitória”, aquele mesmo que embalava cada conquista do nosso Ayrton Senna, o inesquecível herói das pistas, e assim nos colocava embebidos de contentamento no ponto mais alto do pódio da existência terrena.

Há seis meses, fomos surpreendidos com diferente resultado do mesmo exame que, infelizmente, conjugado com outros de idêntico rigor científico, indicavam à Jane, minha esposa, estar acometida por um severo mal em seu organismo. Se não atacado de imediato e com os melhores recursos da farmacologia moderna, corria-se o risco de vê-la com a saúde agravada até limites e conseqüências que só o Supremo poderia determinar quais seriam e de que forma.

Vencemos! O resultado mencionado nas primeiras linhas deste texto tem o valor de um certificado de sua plena e boa saúde.

Talvez, não por acaso, a palmeira de nosso jardim floriu nesses últimos dias com inusitada exuberância como se fosse para saudar a vitória da Jane no que se apresentou para nós como um dos períodos mais tensos já enfrentados na vida a dois. Mesmo que apenas poucos amigos saibam disso, enfrentar uma doença é – quer queira ou não – um ato de valentia e superação que deve ser enfrentado com persistência dia-a-dia e com serenidade.

Sem que tenhamos a intenção de propor um modelo, pois cada caso é um caso, cada pessoa e suas circunstâncias determinam condutas e visões diferentes quanto ao desafio que tem pela frente, ousamos transformar nossa experiência em um guia com algumas lições básicas para aqueles que, como foi o nosso caso, vierem a enfrentar desafios assemelhados:

Primeira: Nunca se apavore com a dimensão que o problema a princípio pareça ter, nem subestime a sua própria capacidade de superá-lo. Há de se confiar em que os recursos da medicina atingiram alto grau de eficácia e, portanto, que vale muito a pena neles confiar. A esperança, necessariamente, pavimenta qualquer desejo forte para a vitória. O ser humano sem esperança assemelha-se a um barco sem o mar; a um pássaro sem asas; a uma atmosfera sem oxigênio. Esperança é, portanto, pré-requisito para o bom embate.

Segunda: Embora a realidade do sistema de saúde no país ainda deixe muito a desejar - por incrível que pareça – mostra que temos recursos e um arcabouço legal a garantir o acesso de todos os brasileiros aos melhores procedimentos médicos necessários para o sucesso de um tratamento. Além disso, o necessário e incontornável franco embate com a doença tem o dom de nos iluminar caminhos antes impensados e de nos levar a soluções a priori tomadas como impossíveis.

Terceira: Se o seu Plano de Saúde apresenta dificuldades para a cobertura de grandes procedimentos médicos, lembrem-se de que é na porta da Justiça que se deve bater. A urgência e os altíssimos custos de tratamentos modernos com muita certeza facilitam a obtenção de uma liminar em que o Juiz determina a quem de responsabilidade o imediato cumprimento de suas obrigações. Se ficar quieto nada acontece. Agir com base legal supera as inúmeras barreiras que a burocracia – em geral – demonstra no trato dos direitos da cidadania.

Quarta: Você se surpreenderá como os amigos verdadeiros serão solidários e farão por você mais do que poderia vagamente imaginar. Muito além de apoio material, surgirão, como que por encanto, a maior das manifestações de amizade que se pode conceber: A solidariedade. Cada amigo, em função de sua disponibilidade e sensibilidades, o apoiará ora com visitas, ora com telefonemas e mesmo orações. É como se essas forças superiores nos mostrassem o poder da fé que não se explica pelos meios clássicos da razão, mas que existe como força metafísica. Outros, contudo, passarão bem ao largo como se ainda estivessem na Idade Média e que a Peste Negra que assolou meio mundo fosse o mal de que você padece. Quer momento mais interessante para separar o joio do trigo?

Quinta: Passada a tempestade e agora já em mar calmo é hora de refazer o estilo de navegação que vinha adotando em sua vida. Menos estresse; mais foco nas coisas essenciais; menos importância para as coisas miúdas que fazem do dia-a-dia um torvelinho sem fim; mais valor às amizades verdadeiras; mais amor a Deus e à natureza por Ele personificada; mais alegria com cada dia, cada noite e com cada pessoa que nos rodeia...

E se um dia, por essas coisas incompreensíveis do destino, Ele te colocar à prova, lembre-se de que a palmeira de sua vida pode voltar a florir como floresce, agora, a do nosso jardim...


Edson Pinto
24/11/08

20 de nov. de 2008

58) PERESTROIKA DIVINAL (nov'08)

A coisa estava ficando cada vez mais complicada e até Deus que não gosta de se intrometer na maneira como usamos o livre-arbítrio - presente que nos deu no crítico momento em que titio e titia comeram o fruto proibido no Paraíso - julgou ser a hora de tomar alguma providência.

__ Sabe Pedro, você como secretário geral para os assuntos de desavenças terrestres dê uma olhadinha com mais cuidado naquele território que tanto beneficiamos com benesses naturais e veja o que pode ser feito...

__ O Senhor fala do Brasil?

__ Meu caro secretário, asseverou o Supremo, intriga-me a displicência da sua pergunta e por isso respondo com outra. __ Acaso poderia ser outro país?

__ Desculpe-me Senhor, é prá já, e saiu agitando mais do que o normal a sua longa veste imaculadamente branca. Enquanto mudava apressadamente de nuvem, Pedro deixou escapar em alto e bom som certo lamento. __ Cansei! Agora só me resta aplicar o “job rotation” naquela turma! Vou implantar meu projeto Perestroika em 5 pontos! Dito e feito:
  • O Delegado Protógenes passa a comandar a seleção brasileira que vinha de mal a pior nas mãos de Dunga.
  • Dunga assume a FUNAI onde a gestão da política indigenista caminhava para fazer com que toda a população voltasse a usar tanga se não quisesse ser humilhada com o facão da índia Tuíra.
  • Marcos Valério é deslocado para o Ministério da Justiça em substituição ao ex-comunista Tarso Genro que estava prestes a viajar para o Vaticano com o seu pleito de canonização de toda a turma da PALMARES, da COLINA e dos antigos militantes da Política Operária (POLOP) onde inclusive floresceu Dilma Vana Rousseff Linhares, a atual mãe do PAC.
  • Lula deixa a Presidência da República e assume a gestão das obras do metrô de São Paulo onde os buracos não paravam de desabar, e
  • Daniel Dantas é escalado para o lugar de Silveirinha na novela “A Favorita” em decorrência da dubiedade de ações deste, ora a favor de Flora ora a favor de Donatela.
Antes de repousar na tranqüilidade de sua nuvem, Pedro ainda se conecta telepaticamente com o Supremo e Lhe dá informações gerenciais sobre o programa recém-implantado, prometendo "feedback" em momento apropriado.

__ Senhor, já são passados 30 dias desde que Lhe comuniquei o programa de “job rotation”, a minha Perestroika, implantado no Brasil. Por isso venho humildemente reportar o fracasso de minha tarefa.

__ Claro que sei de tudo meu bom Pedro. Afinal, minha onisciência está perfeitamente calibrada com os acontecimentos da Terra e alhures. De qualquer forma, apreciaria ouvir de sua própria voz o que aconteceu. Fique a vontade!

__ Senhor:
  • Protógenes na seleção desandou-se a grampear conversas dos adversários com o intuito de prever suas táticas e deu tudo errado. Como não resistia a um holofote, deu bom dia a cavalo e não fez outra coisa senão deixar o Brasil, pela primeira vez na história, fora de uma Copa do Mundo.
  • Dunga, na FUNAI, quis aplicar a sua conhecida “simpatia” e acabou como uma peneira de tanto que foi espetado pelo facão da índia Tuíra.
  • Marcos Valério, na pasta da Justiça, resolveu cobrar “pedágio” de todos os terroristas prestes a serem canonizados e agora agraciados com polpudas aposentadorias. Ao insistir na comissão de 80%, acabou sendo obrigado pelos extorquidos a viver com Delúbio em sua fazenda goiana.
  • Lula, nas obras do metrô, foi infeliz ao discursar efusivamente para um buraco nas proximidades do Rio Pinheiros. Mal acabara de pronunciar a sua frase mágica “Nunca antes na história deste p...” toneladas de terra se encarregaram de lançá-lo de uma vez por todas para os anais da História.
  • Daniel Dantas, com o poder econômico que tem, subornou João Emanuel Carneiro, o autor da novela, e conseguiu desmentir tudo o que vinha sendo mostrado pela Venus Prateada. Flora, não era a fria assassina. Ela estava apenas sonhando. Foi Donatela, de fato, quem matou toda aquela gente, inclusive Silveirinha, isto é, o próprio Daniel Dantas.
__ É o que sempre digo meu caro Pedro. Não há, ainda, como mudar essa situação. Foi assim antes mesmo de Pedro Álvares Cabral se aportar por lá. É assim agora e assim será "ad eternum"...

__ Mas, Senhor, se não tem jeito, por que então ficarmos com essas vãs tentativas?

__ Aí é que reside a verdade meu dileto Pedro! __ Lembra-se que quando te chamei para essa missão referi-me ao Brasil como aquele país em que colocamos benesses mil? Justo, como sou - e você bem sabe disso - ao te pedir tal ação, isso foi com o intuito de sacudir um pouco a poeira brasileira e nunca para melhorar nada, pois não há como abrir mão do meu divino senso de justiça para com todo o povo da Terra.

__ A felicidade média há de ser mantida e, infelizmente amado Pedro, a Natureza do Brasil continua exuberante.

Edson Pinto
Novembro’2008

17 de nov. de 2008

57) COMO SE FORMAM OS GRANDES ORADORES (nov'08)


O presidente Lula entrará em breve na metade final de seu segundo e último mandato constitucional como chefe supremo do Executivo brasileiro. 
Viu, nesses últimos 6 anos, passar figuras importantes no cenário político mundial e falou com tal desenvoltura com todas que – queiram os críticos ou não – fica difícil contestar a láurea que acaba de receber como o líder ibero-americano de maior prestígio em 2008. Assim nos mostra a séria pesquisa feita pela ONG chilena Latinobarómetro recentemente repercutida na imprensa mundial. 
Deixou para trás o Rei Juan Carlos I da Espanha, bem como o seu primeiro ministro José Luis Rodriguez Zapatero e de resto todos os outros que os respectivos destinos os fizeram “hablar español” ou falar português. 
Mal o Bush, com quem mantém quase fraternal relacionamento, tenha começado a limpar as gavetas do salão oval, Lula já entrava em contato com Barack Obama para oferecer-lhe, como sempre fez com Bush, conselhos político/econômicos, todos com o propósito de mostrar ao jovem presidente americano que o título recém conquistado por ele, Lula, não fora por mero acaso. 
Embora o senso comum dê conta de que o nosso presidente não é lá muito chegado a uma leitura, nem a elucubrações filosófico-intelectuais, pois, como ninguém, confia em sua inata capacidade de convencer pessoas com um discurso objetivo, simples e de tom profético que não raro leva multidões ao delírio, não se pode, enfim, dizer que ele chegou a essa magnífica performance sem qualquer treinamento. Ledo engano! 
Já perceberam a facilidade com que Lula pode falar com gente simples, com crianças e até mesmo com seres de espécies menos privilegiadas pelo Criador? E, o mais importante do estilo de nosso presidente é que ele tem o discurso certo e adequado para cada público. Com reis se porta nobremente, com a plebe fala de cachaça e de futebol, aos sindicalistas chama “companheiros” e quando desenvolve intimidade pode se dirigira ao interlocutor como, por exemplo: “Ô Bush”! 
O que ninguém sabia – mas eu faço questão de revelar aqui - é como o nosso presidente tem treinado para encantar as multidões. Quando você acionar a seta que inicia a apresentação do vídeo abaixo, não se incomode em não entender o que ele estará falando. Nem precisa... Afinal, ele está usando a linguagem adequada para entusiasmar o público do momento.
Apenas traduzo a primeira frase do discurso: "Nunca antes na história deste país". O resto você deduz...

Novembro’08
Edson Pinto

14 de nov. de 2008

56) O ESPECIALISTA (nov'08)

A borboleta tropical Heliconius melpomene põe seus ovos somente nas folhas do maracujazeiro. Suas larvas, ao eclodirem, têm como único alimento para o seu processo de desenvolvimento, vida e futura reprodução a folha sobre a qual nasceram. A Ecologia, ciência que se dedica ao estudo das inter-relações dos seres vivos e do meio ambiente, faz profunda análise do conceito de hábitat e neste, especificamente, sobre o que chama de nicho e especialização:

O mesmo artifício que propicia o surgimento cômodo da bela borboleta traz em si uma armadilha das mais sinistras: desaparecendo o maracujazeiro em um determinado ecossistema ela desaparece também, pois ao, teimosamente, se tornar especialista, apresenta dificuldades incontornáveis para se adaptar às constantes mudanças do seu hábitat. Não se entende com outras folhas que não sejam as da planta em que se especializou.

A lição que esta faceta da natureza nos propicia é que nós, os humanos, temos, talvez por comodismo ou outros fatores mais específicos, uma tendência pela especialização aos moldes da Heliconius melpomene. A grande vantagem para a sociedade é que temos sempre alguém muito entendido em alguma coisa, mais do que poderíamos esperar de quem se ocupasse de diversos temas simultaneamente. O problema é que desaparecendo ou raleando o objeto da especialização temos indivíduos amargurados, desolados e – se for muito tarde para uma mudança – condenados a sofrimento sem fim.

Julião passou a vida se especializando em carburadores de automóvel. Regulava de ouvido, como os virtuoses regentes afinam suas orquestras. Ninguém conseguia superá-lo naquele mister. Seu negócio prosperou enquanto os adulterados combustíveis da vida maltratavam os coletores de admissão, os elementos filtrantes ou as rebimbocas das parafusetas. Tão a sério levava aquela especialização que nunca leu nada nem falava nada, nem se divertia ou vibrava com assuntos outros que não girassem em torno de seu mundo carburadorizante.

Acabaram-se os carburadores e Julião sentiu-se como uma Heliconius melpomene sem o seu maracujazeiro vital. Não conseguia ver graça em nada. Sua sensibilidade para as coisas espirituais apagara-se por falta de uso e estimulo. Nem o entrosamento social tão necessário para o gozo saudável da vida que lhe restava ainda longa parecia alcançável. A especialização de Julião mostrava a sua face oculta no momento e na condição mais imprópria possível.

E veja que não falo de uma opção profissional, apenas. Falo de uma opção inadequada de vida ao esquecermos que existem tantas outras coisas a serem exploradas, profissionalmente ou não; que são capazes de oferecer alternativas para uma ocupação produtiva e feliz, principalmente, quando aquilo que pensávamos ser o “perpetuum móbile” de nossas vidas, de repente, se ver privado de sua folha de maracujazeiro.

A vida vai nos dando paulatinamente estímulos para que desenvolvamos o gosto por algo. Pode ser o hobby da infância que já nos despertava para um determinado tipo de trabalho. Uma maior sensibilidade para as artes, o esporte, o envolvimento com tarefas sociais. Ler, escrever, pintar, fazer trabalhos manuais, pesquisar temas que dêem satisfação pessoal, enfim, milhares de ocupações que tornam a vida de qualquer pessoa mais leve e mais interessante.

É, portanto, um erro muito grave entregarmos total e exclusivamente a um único tema de interesse. É possível sim sermos especialista em algo por uma boa parte do tempo disponível, mas reservarmos uma parte, ainda que menor, mas considerável, para que outras ocupações, quer intelectuais quer físicas, nos sirvam de alternativa à folha do maracujazeiro de nossas vidas.

É triste ouvirmos de pessoas fisicamente saudáveis que estão perdidas, por que passaram a vida só fazendo isso ou aquilo e que agora, aposentadas, não conseguem ocupar-se de modo gratificante. Reflitamos, portanto, quanto à nossa opção pela cega especialização!

Edson Pinto
Nov'08

6 de nov. de 2008

55) ANARQUISTA, SIM SENHOR... (nov'08)

O juiz determinou 4 minutos de prorrogação. __ Isso é um absurdo, exclamou Justiniano, a figura mais metódica daquela família de gente com comportamento tão diverso, porém muito unida. Unida em torno do mesmo time de futebol, mas não em todas as outras coisas, especialmente na visão de ordem a ser seguida.

__ Veja, completou, ele: __ As interrupções durante o jogo, por faltas, atendimento de jogadores machucados e substituições totalizaram conforme minhas próprias anotações 3 minutos e 34 segundos. Este deveria ser o tempo da prorrogação e não os 4 minutos que ele deu. __ Não me conformo!

Justiniano era a essência do homem metódico: Tudo tinha que acontecer segundo regras muito estritas desenvolvidas pela sua mente alucinada com a excelência que cada um dos atos humanos devia ter: Entendia e exigia dos seus circunstantes que cada tarefa seguisse rigorosamente uma seqüência que de tão lógica roubavam-lhes a criatividade, esse necessário jogo de cintura que devemos desenvolver para nos safar dos imprevistos, das armadilhas da vida.

Ele era implacável! Levantava sempre no mesmo horário e minutos que o seu relógio de cabeceira marcava; tirava o pijama e o dobrava com absoluta perfeição até colocá-lo na gaveta; depois o banho, o café, a higiene pessoal criteriosa, penteava com esmero os cabelos e, do bigode, extirpava com precisão cirúrgica os fios que ousassem entrar em desalinho. Saia de casa na mesma hora, no mesmo minuto e cruzava a rua para tomar o ônibus contando sempre a mesma quantidade de passos. Nada podia sair diferente...

Casou-se, não vem ao caso, como, com Maria Lacerda. Ela, se não totalmente anarquista, ao menos se identificava como uma mulher libertária, feminista que considerava a ordem excessiva um sério empecilho ao desenvolvimento humano. Seu sonho era viver livremente em uma comunidade afastada do burburinho urbano onde não haveria as opressões da Igreja, do sistema educacional, dos dogmas religiosos, da exigência de boa forma física e da escravidão estética. Enfim, livre de tudo, especialmente de Justiniano, desejo esse que desenvolveu penosamente ao longo de tantos anos de casamento. O tempo passou rápido, os filhos chegaram, cresceram, casaram e deixaram a dupla contraditória sozinha, naquela infinda discussão sobre método e desordem.

Maria desarrumava, Justiniano arrumava. Justiniano pedia o almoço para as 12 e 35, Maria servi-o as 14 e quaisquer minutos. E a vida seguia assim por mais de 30 anos, sem solução. Fazer o que? Maria Lacerda já havia, finalmente, se conformado com a necessidade de mudar para garantir o mínimo de convivência com o metódico marido.

Após uma longa reflexão durante um providencial refúgio de três semanas na casa de sua mãe no interior, Maria volta com o nobre propósito de ser outra, isto é, se não igual, pois isso seria impossível para qualquer ser humano, pelo menos o mais próximo possível de Justiniano: Seria disciplinada nos horários e caprichosa nos trabalhos do lar. Era, pensava ela, tudo o que Justiniano sonhava para a sua mulher.

Entra em casa e não encontra Justiniano. Procura aqui, procura ali, até encontrar uma carta do companheiro de tantos anos recentemente colocada sob a porta de casa: Dizia a carta, na verdade, mais um bilhete:

“Querida: Depois de tantos anos submetidos ao rigor metódico de meu comportamento; depois de tantos sofrimentos desnecessários impostos a você e aos nossos queridos filhos; depois de tantas picuinhas a atormentar o nosso dia-a-dia, por um capricho pessoal, estúpido e infundado, quero lhe dizer que tomei uma decisão definitiva em minha vida: Estou, desde a semana passada, morando na Comunidade Hippie Shangri-La e dividindo com gente muito interessante um modo alternativo de vida. Adeus rotina diária; adeus TV; adeus horário rigoroso para as refeições; adeus abdominais para manter a minha barriguinha no lugar. Agora sou feliz! Assinado: Justiniano, anarquista, sim senhor”.

Maria nem teve tempo para refletir sobre aquela nova situação. Caiu de costas e quando acordou já estava de malas prontas para Shangri-La ao encontro de Justiniano e da vida que sempre sonhou.

Será que estão felizes?

Edson Pinto

Novembro’08


 

1 de nov. de 2008

54) ESTUPIDEZ E INOCÊNCIA (nov'08)


Você também não ficaria chocado?

Quão tênue se torna a vida quando os instrumentos do mal produzidos pelo próprio homem podem ser disponibilizados para atos de incúria!

As cenas do filmete abaixo contém em si mesmas - apesar do desfecho trágico - uma lição que mentes racionais e equilibradas poderão delas extrair: A inocente criatura que dispara o bólido da morte parece querer passar-nos a mensagem de que a humanidade, ao optar pelo caminho do ódio, acaba se autodestruindo e com isso destacando as imperfeições irreconciliáveis de nossa espécie.

Desde que Schopenhauer no início do século XIX, com a sua visão nitidamente atéia, decretou a morte de Deus e preconizou o mundo como sendo governado por forças irracionais onde se destacam a ambição e o sofrimento, somos - com freqüência - abalados em nossa necessária fé na transcendência. Mesmo Nietzche que comungava da idéia de eliminação da dimensão espiritual humana ainda procurou uma solução para o mal-estar provocado pelo morte de Deus.

E nós, como ficamos? Devemos nos enterrar no niilismo cômodo dos neutros inúteis ou arregaçarmos as mangas para uma contribuição, por mínima que seja, para a construção de uma nova era?

Refletindo sobre os sofrimentos do mundo, ficamos entre o conformismo e a esperança. Esta, só a transcendência pode nos explicar porque continua, ainda e apesar de tudo, viva na substância que nos amalgama a razão e a fé...

Clique na seta e veja a que ponto chega a estupidez humana.


Edson Pinto
Nov'08

53) O POMBO-PAPO-DE-VENTO, AS GALINHAS E AS UVAS

O pombo-papo-de-vento, de peito inflado como um balão de festas, cheio de soberba e vaidade toma assento no ponto mais alto do aviário. A princípio, as galinhas não se deram pelo intruso, até porque, ali, naquele mesmo poleiro, outrora, muitas outras aves, incluindo pavões majestosos, fizeram pousadas curtas, médias e longas.

Ninguém se importou com ele até o momento em que quis mostrar não ser um pombo qualquer, mas sim, um legítimo, cosmético e ornamental “papo-de-vento”, o mais nobre da Ordem...

Desdenhou a vara suja, repouso perpétuo das galinhas, cuspiu o milho que lhes fartava, redecorou a própria gaiola, sem portas, e pediu uvas. Só uvas maduras, brilhantes, dúlcidas; quanto mais, melhor...

“Se você deixar de existir não ficarei chateado”, disse ele ao tratador que lhes jogava o sagrado milho do dia-a-dia. “Cansei”, expressava com tédio, a todo o momento, para deixar bem claro os tipos especiais de hábitos que queria cultivar.

“Que falta de criatividade botar sempre os mesmos ovos branquinhos e elípticos”. Já não lhe bastava ter em conta apenas os ovos que remanesciam em estoque nas entranhas das galinhas. Queria coisas novas que não fossem só eles e queria, sobretudo, mais cacarejos, custasse o que custasse.

O tempo fluiu rápido e com ele tudo o mais.

__ Vou partir! Não me agradam as uvas... Estão verdes!


Edson Pinto
Nov'08

19 de out. de 2008

52) O SUPER-ZEZÉ


Passei bons anos da minha vida tão ocupado com o trabalho e com a luta diuturna, que – confesso – sobrou-me pouco tempo para apreciar com mais profundidade coisas deste mundo que não estivessem ligadas a números, projetos, desafios profissionais, decisões de negócios e competitividade.

Não carrego sentimento de culpa por isso, porque sei que a vida é assim mesmo. Mais para uns, menos para outros, lutar é, inexoravelmente, o nome do jogo. Penso, até, que a sabedoria inescrutável do Criador impõe-nos regras de precedência para as preocupações de nossa terrenidade: primeiros as básicas, materiais e fisiológicas e só depois as mais filosóficas e anímicas. Neste último grupo situa-se a recém-desperta em mim vontade de mergulhar no coração das pessoas do meu dia-a-dia e com isso desbravar - como um Marco Pólo de almas - mundos novos e deles desenterrar tesouros de sabedoria e simplicidade.

A objetividade que a vida nos impõe, simplifica enormemente a avaliação que fazemos das pessoas. Somos, normalmente, levados a analisá-las apenas pelas suas características mais visíveis, sem nos questionarmos se por detrás daquele ícone não encontraríamos preciosidades surpreendentes. Cada pessoa é um universo tão complexo e amplo de particularidades que por mais que o sondemos, jamais conseguiremos compreendê-lo na sua plenitude, especialmente a da real infinitude de seu amor.

Zezé é o apelido de um amigo de infância, um contraparente especial, recentemente redescoberto, não no que diz respeito à sua existência física, mas naquilo que mais nos faz chamar a atenção, ou seja, a pureza de sua alma. Assim, ele se nos revela, agora, como verdadeiro detentor desse oculto tesouro a que me refiro. Não pelo que conquistou materialmente na vida, pois foi muito pouco, mas pelo que tem guardado em sua alma de homem simples:

Tranqüilo como um lago em seu recesso plácido; 60 e poucos anos. Disse pra Nicinha - pelo que consta, a mulher mais influente e única de sua vida - que casamento só quando perdesse o juízo. Como nunca o perdera, restou-se aposentado, com a cabeça sem um único fio de cabelo branco, lendo jornais, todos; assistindo os noticiários da TV, também todos e torcendo de paixão para o Cruzeiro que é o seu time da infância, mas também para qualquer outro time. Neste caso, só e quando um sobrinho com outra preferência clubista se apresenta a ele. São Paulino roxo porque dois de meus filhos o são, mas também Santista porque o meu terceiro filho nutre desbragada paixão pelo time da Vila Belmiro. Faz do altruísmo inconsciente o seu modo de ser. Só fica feliz se o outro estiver feliz. Coloca-se, verdadeiramente, à disposição de qualquer pessoa para ajudar naquilo que lhe é possível e até mesmo impossível. A palavra “Não” parece excluída de seu vocabulário já de há muito.

De tão puro e especial, as poucas pessoas de sua casa: sua mãe octogenária e uma irmã solteira super-zelosa, esperam de Zezé um comportamento irretocável. Por isso, cobrem-lhe de cuidados mais apropriados para um garotinho travesso do que para um sessentão aposentado. __ Zezé, não demore, veja lá aonde você vai, viu? E lá vai o Zezé, sem reclamar, para alguma tarefa muito bem especificada que tanto pode ser uma pequena compra, uma visita ao Banco ou uma obrigação corriqueira de menor importância. Porém, o que nunca é revelado nessas saídas é o seu propósito, não manifesto, de tomar um sagrado chopinho – nunca passa de dois – no primeiro balcão que encontrar, principalmente, se tiver alguém disposto a jogar, como ele, um pouco de conversa fora.

Uma única vez por mês, Zezé se dá a uma extravagância que nem o seu comportamento altruísta de priorizar a felicidade dos outros, no caso a das duas mulheres que lhe controlam a vida, a mãe e a irmã solteira, é respeitado. Recebe o dinheiro da aposentadoria, separa alguns trocados e se manda para o mercado municipal da cidade. Para quem não sabe, Belo Horizonte tem um mercado que depois de uma reforma muito feliz tornou-se um agradável point cult freqüentado por descolados e turistas de todas as tendências. Claro que Zezé não vai comprar queijo, nem cebolas, muito menos o melhor bacalhau que só se encontra por lá. Zezé é figurinha manjada no boteco do “Manuel Doido”. É lá que ele chega, sempre no primeiro sábado depois de ter recebido a aposentadoria, para exercer em total plenitude a liberdade que nem Nicinha conseguiu lhe tirar.

Das 10 da manhã até as 6 da tarde, chopes se combinam maravilhosamente com torresmos, mandioca frita, linguicinha de pura carne de porco e muita conversa mole. Nos primeiros chopes, Zezé é ainda contido tal qual o é no seu dia-a-dia. Depois, à medida que os chopes passam e a conversa rola solta, lá está o super-Zezé: histórias de conquistador de mil mulheres, proezas do jogador de mil vitórias e arroubos fantasiosos de rico fazendeiro que não sabe onde gastar toda a sua fortuna. Ri e encanta como ninguém. Para as garotas que se aproximam, promete jóias valiosas, vestidos de arrasar, viagens inesquecíveis e casamento de princesa.

E lá vai Zezé de volta para o conforto e segurança de seu ninho real: __ Zezé, você tomou umas e outras? __ Que nada, responde ele. Entra no seu quarto, pega o jornal do dia, ainda não lido, sintoniza a TV no primeiro Noticiário que encontra e dorme tranqüilo. Amanhã tudo será igual. E o super-Zezé? Só no mês que vem quando receber de novo a aposentadoria.
Edson Pinto
postado em 19/10/08

5 de out. de 2008

51) PROJETO MEU PRIMEIRO EMPREGO



A minha caixa de correios – e aposto que a sua também – esteve nesses últimos dias entupida de panfletos coloridos, tamanhos diversos, textos mal escritos, criatividade gráfica duvidosa, que, além de números em dimensões garrafais estampavam, ora posudas, ora bizarras, fotos de astutos candidatos a uma vaga na Assembléia Legislativa ou mesmo para a cadeira de alcaide do nosso município.

Quanto cinismo travestido de falsa sinceridade cívica: “Construirei o trem-bala”. Seria uma versão mais robusta e criativa das tormentosas balas perdidas que com grande freqüência encontram os inocentes que passam de trem? “Lutarei por viagens grátis nos ônibus da cidade”. Quem paga a conta? “Sou corintiano, por isso votem em mim”. E daí, o que esse fato melhora a vida da cidade? Uns se apropriam de imagens, trejeitos e idéias de outros, sempre imaginando que no mar de desavisados caiam alguns votos na sua rede de esperteza.

Por anos tem sido uma diversão analisar as listas dos candidatos aos pleitos de sempre. Alguns já não se dão nem mais ao trabalho de atualizar as promessas, os refrões e as musiquetas surradas. Tudo, tudo, com o beneplácito de partidos políticos que os acolhem e os usam. Uns apelam para parentes assumindo um paroxismo de pieguice fajuta. Outros vêem no bizarro a forma de angariar incautos.

Entra pleito, sai pleito e lá estão os postulantes do momento com os seus projetos pessoais a lhes garantir um lugar na história, mesmo que seja pelo reconhecimento público do ridículo de seus sonhos. Despreparados para coisas tão simples como escrever o próprio nome ou ler com proveito intelectual um texto por mais simples que seja, ainda, se julgam bons o suficiente para subirem a uma tribuna e de lá defenderem em nome de todos nós seus projetos devotados ao bem da sociedade.

Há o grupo de velhas raposas que nem precisaria de mais cargos para o enriquecimento ilícito já conseguido no passado, mas com toda a certeza, vêem no cargo público um refúgio seguro à justiça ainda a lhes atormentar o sossego.

Agora uma nova categoria de postulantes: Os que buscam no cargo público o seu primeiro emprego: Socialites que nunca dirigiram nada, malandros que nunca pegaram no batente, playboys que vivem nas costas de famosos, garotos que mal terminaram o segundo grau escolar e outros, querem, porque querem ser vereadores, prefeitos ou qualquer que seja o cargo em disputa.

Como toda onda comportamental tem sua gênese, somos forçados a pensar que antecedentes bem-sucedidos e conhecidos de todos – Lula e Obama, por exemplo - dão respaldo aos sonhos dos membros dessa nova categoria.

Em sã consciência: Você lhes daria esse primeiro emprego?

Edson Pinto
05/10/08

2 de out. de 2008

50) A VOZ (out'08)


Levantou-se de súbito quando aquela voz novamente chegara ao seu ouvido. Não fazia o menor sentido tratar-se de um pesadelo seguido de outro e de forma tão insistente. Que razão teria alguém - já não mais deste mundo, como se lhe parecia - querer passar-lhe recados sobrenaturais. Não era a voz das já falecidas mãe Irene e vovó Matilde. Muito menos de Madre Tereza de Calcutá que só conhecera pela TV.

A voz era real, isto sim. Dava para sentir-lhe os graves e os agudos ressoando pelas paredes do quarto, dentro do seu automóvel ou mesmo debaixo do chuveiro. Seria um zumbido desses que atormentam milhões de estressados cidadãos habitantes das cidades grandes cheias de ruídos do trânsito, dos bate-estacas de construções mil, ou ainda, dos feirantes que em alegre desordem enchiam as manhãs das quartas-feiras de seu bairro? Não, não era! Soava algo que ele reconhecia como voz, mas na verdade não podia compreender completamente.

Começou consultando o Centro Espírita onde freqüentou, sem êxito, seções de contatos com a turma do Além. Foi a Umbanda para um descarrego. Subiu a Penha de joelhos para penitenciar-se e finalmente submeteu-se à hipnose, tudo na vã esperança de desvendar a razão daquela voz misteriosa. A única descoberta feita depois de tão exaustivo périplo era de que a voz surgia sempre que ele pensava no casamento com Laura.

Só agora se dera conta de que tudo havia começado naquela noite em que Laura, sua noiva há mais de 20 anos, não tendo conseguido novamente tirar-lhe um compromisso para o sempre adiado casamento, metera-lhe, sem dó nem piedade, um tapalhão em seu ouvido, enquanto ele - para uma vez mais escapar daquela responsabilidade - fingia falar ao celular. Coincidentemente, desde então, seu danificado e agora mal remendado telefone celular nunca mais gravara mensagens de seus amigos. Claro, Laura o quebrara em vários pedaços naquela fatídica noite e o conserto só reparara partes de suas funções.

Quando o incomodo e o desespero já se mostravam insuportáveis, ei-lo no Pronto Socorro do bairro implorando para que lhe fizessem alguma intervenção no ouvido, naquele momento completamente inundado pela voz misteriosa de sempre.

O chefe da junta médica sai da sala de cirurgia e dirige-se para Laura que pesarosa padecia em um canto da sala de espera: __ Veja minha senhora, não sabemos como, mas por alguma razão misteriosa este chip de gravação de mensagens de um telefone celular qualquer se alojou no duto auditivo de seu noivo. Por alguma razão, igualmente misteriosa, repito, um pensamento tenebroso que lhe é recorrente, produz uma corrente elétrica em seu ouvido forte o suficiente para acionar as mensagens gravadas no chip.

Laura agradece emocionada ao mesmo tempo em que se dá plena e total conta de seu não-casamento...

Edson Pinto
postado em 02/10/08

24 de set. de 2008

49) PANEM ET CIRCENSES (set'08)


__ “De omni re scibili et quibus dana allis”. Isto é, meus amigos, de tudo o que se pode saber e mais alguma coisa, expresso aqui perante tão augusta platéia a certeza de que minha demanda ao cargo de prefeito dessa magna municipalidade encontrará abrigo em vossos corações agigantados. “Tempus fugit”!

Platéia tomada de grande emoção sob o embalo de ruidosos apupos. Aquilo lhe era, na essência, incompreensível, menos para o ex-padre Rosário que ao cabo de tanto estudo do latim tomara gosto pela cachaça da terra e assim considerou a conveniência de abandonar a batina e viver mundanamente. “Alea jacta est” A sorte está lançada, pronunciou com a ênfase do outrora pastor de almas para encerrar em alto estilo o discurso apoteótico de sua campanha política.

Tinha certeza de que seria eleito. Na cidade, quase todos o conheciam pelo seu apego ao tradicional subproduto da destilação do sumo da nossa “Saccharum officinarum”, como ele, em latim, se referia à caninha que consumia à farta. Como não fazê-lo agora prefeito para tornar realidade o seu apregoado projeto da “Bolsa Cachaça” com distribuição gratuita em todos os dias da semana, exceto, frisava com a veemência de quem sempre professava a fé, aos domingos, dia sagrado que haveria de ser respeitado pelo bem da família e pelo necessário temor a Deus?

Nem por sonho Miguelão, oposicionista, que prometia “Escola e Trabalho para Todos” conseguiria vencer o ex-padre Rosário com seu atraente plano de governo. Até as pesquisas de boca de botequins confirmavam: Rosário 99%, Miguelão 0%, Votos nulos 1%. Favas contadas, isto é, pingas tomadas.

A apuração pega Rosário de surpresa. Miguelão ganha com expressiva diferença contrariando todas as expectativas e até mesmo certezas que se formaram ao longo da campanha. O que teria acontecido? A população teria se conscientizado de que “Estudo e Trabalho” eram mais dignificantes do que o programa pão e circo de Rosário? O comportamento furtivo de seus até então fiéis companheiros de boteco parecia indicar que algo de muito estranho ocorrera nos momentos derradeiros da campanha.

Tudo esclarecido: Enquanto Rosário permanecia até o último minuto da votação no boteco de sempre, Miguelão, numa jogada de mestre, abordava eleitores na boca da urna com a promessa de troca do seu “Escola e Trabalho” por plano equivalente ao de Rosário de distribuição gratuita de cachaça, porém não apenas de segunda a sábado, mas, também, aos domingos.

E o povo votou “feliz e consciente”. À Rosário, inconformado com a traição dos agora ex-amigos, restou-lhe a decisão de um último trago e a partida para outra, não sem antes maldizer: carpe omnium: aproveitem tudo!!

Edson Pinto
23/09/08

17 de set. de 2008

48) O ESTALO DE DICÃO (set'08)



Dicão usava e abusava de seu corpo avantajado. Negro retinto, quase 2 metros de altura, 120 quilos quando fazia dieta, sorriso mordaz e zagueiro sanhoso. Impossível de ser tratado como arma secreta do time da vila, pois aquela montanha de ébano era insubmergível e inocultável. Tê-lo em campo já lhes dava uma vantagem defensiva preciosa, mesmo porque, Dicão também tinha certa intimidade com a gorduchinha.

Prestativo, risonho, amigo e afável até entrar em campo. Dali em diante, era mais feroz do que o urso-negro de regiões boreais. Batia sem dó. Seu inamistoso comportamento no campo refletia uma inquietude existencial permanentemente a fustigá-lo. Fritavam-lhes os miolos quando, no aconchego do lar, refletia sobre o seu modo de ser. Questionava-se: __ Devo ser brando ou bravo com os meus adversários? __ Se Deus me fez tão forte por que não usar isso em favor de meus propósitos? __ Devo agradar a todo mundo? Dicão era, de fato, uma mente atormentada a procura de uma definição. E isto nunca acontecia...

Então, algo inesperado: Dicão, num lance em que tenta tirar uma bola adversária, bate a cabeça no travessão superior. Jogam-lhe uma água fria na nuca e, apesar do estalo que lhe sobrevém, dá uma voltinha pra conferir se estava tudo bem e volta para dominar, como sempre o fizera, o espaço mais perigoso do campo: a zaga.

Primeiro ataque adversário, um franzino atacante ao constatar aquela montanha em sua frente tropeça na bola e cai. Dicão, fraternalmente, levanta o garoto e pergunta se estava tudo bem. Como o juiz havia marcado uma falta, embora Dicão sequer tenha tocado no franzino atacante, ele mesmo posiciona a bola para a cobrança do adversário. Dado o atordoamento do atacante, Dicão, para espanto de todos, bate a falta e marca contra.

Meu Deus, o que está acontecendo! Perplexidade geral, mas Dicão calado, humilde, com ar de responsável se posta sem nenhum sentimento de culpa. Na saída, depois do gol, a bola é recuada à zaga. Dicão a domina, vira-se para o próprio gol, dribla com elegância o companheiro de zaga e marca novamente contra.

Correria sem fim... O time inteiro se reúne aos gritos do desesperado sô Chico, o técnico da equipe. ___ Dicão, o que está acontecendo? Você enlouqueceu? Dois gols contra em menos de 2 minutos, abilolou-se? Dicão, sem dizer uma só palavra, abaixa a cabeça e aceita placidamente a substituição, sentando no banco de reservas com um olhar contemplativo como nunca tivera.

De Bíblia na mão, Dicão passou a ser visto aboletado sobre o banco da praça da vila pregando aos que tinham a paciência de ouvi-lo. O estalo na cabeça daquele seu último jogo reposicionara seus miolos e agora, acreditava ele, teria em fim descoberto que sua missão era fazer o bem, seja a quem fosse, até mesmo aos seus adversários.

O time da vila perdeu o seu melhor zagueiro e a praça ganhou mais um fanático com uma história um tanto absurda, mas especial. Dá para acreditar?

Edson Pinto
postado em 17/09/08

12 de set. de 2008

47) ÊTA MUNDO NOVO!









Bem recentemente acompanhei de soslaio meu filho caçula, 19 anos, na Internet, trabalhando um tema para uma tarefa de sua Faculdade a ser entregue no dia seguinte.

Em menos de 30 minutos, tempo em que eu, ao seu lado, lia os editoriais do meu jornal preferido, ele já imprimia um opúsculo de 12 páginas contendo textos, gráficos, fotos e a indispensável referência bibliográfica.

Embora seja eu, também, um amante e como tal apaixonado pela Internet e por todas essas modernidades que nos assombram a cada momento, acabei traído pela responsável desconfiança de pai zeloso e, com certo ar de suspeita, pedi para ver o que a impressora produzia com tamanha velocidade.

Com o olhar mais de professor do que de pai me dei conta de que o trabalho era bom. As pesquisas fundamentaram bem o conteúdo, havia material enciclopédico clássico, um artigo bem recente publicado por uma revista especializada e várias fotos. Essas, então, enriqueciam de maneira fantástica o tema abordado. Fiz-lhe algumas perguntas e constatei, para minha agradável surpresa, que ele não só se conduzira bem nas diversas e rápidas etapas do trabalho, como ainda retivera em sua mente o essencial do conhecimento que se espera de um jovem em formação.

__ Parabéns, disse eu. E completei: __ Como vocês jovens de hoje são felizardos por contarem com recursos tão fantásticos como a Internet, um bom processador de texto, impressão de qualidade e veloz e a rápida possibilidade de divulgação. Ele acabara de encaminhar por e-mail o novinho trabalho para seus colegas de classe que também estavam envolvidos com a matéria.

__ Por que você dá tanta ênfase a esse assunto que para mim é tão corriqueiro, pai? __ Desde que entrei para o segundo grau e quando você me deu aquele primeiro computador, tenho feito quase tudo desta forma. Não é assim que todo mundo faz? Perguntou-me um tanto curioso...

__ Ainda não todas as pessoas que precisam desenvolver pesquisas ou trabalhos intelectuais, penso. __ Mas, certamente as próximas gerações, mais do que a sua, não conhecerão outra forma de trabalho senão essa que você já domina tão bem. __ Todos aqueles que, como eu têm mais de 50 anos, tiveram a experiência de um mundo menos favorável para a ampliação do nosso conhecimento. __ Sabe, esse trabalho que você acaba de fazer em 30 minutos? Nos anos 60 e 70 quando eu estava na Faculdade teria sido feito, também. Só que demandaria, no mínimo, umas duas semanas até concluí-lo:

__ Veja! Falei:

__ Teríamos que reunir a turma num final de semana; depois dividiríamos as tarefas; uns iriam à biblioteca da Faculdade ou a uma biblioteca pública e implorariam para a bibliotecária lhes indicar referências e ajudar na localização dos textos; tirar cópias nem pensar, pois os recursos eram escassos e caros; depois alguém com mais habilidade desenharia os gráficos; fotos só as recortadas de revistas, se disponível; datilografar, então, era a parte mais crucial e ficava normalmente para as garotas mais habilidosas do grupo. Duas semanas depois, talvez, estaria pronto o trabalho, com erros ortográficos, rasuras e estética pobre.

__ Incrível que haja ainda saudosistas desse tempo, quis completar meu raciocínio. __ Eu mesmo acreditava que o árduo processo de garimpar textos em uma biblioteca dava-nos conhecimento mais sólido do que usar o serviço de busca de meu computador. __ Bobagem pura! O efeito é – conclui – exatamente o contrário: quanto mais fácil encontramos respostas para nossas dúvidas mais nos sentimos estimulados a procurar mais e mais informações. No final, ampliamos o conhecimento de forma mais intensa e em tempo bem mais curto.

__ Você quer saber o porquê do progresso vir de forma tão acelerada nos últimos tempos? Perguntei-lhe, antes que ele apressadamente deixasse o computador que agora tocava música e não mais pesquisava matérias escolares:

__ A base de tudo é sem dúvida a estonteante velocidade com a qual o conhecimento vem sendo disponibilizado de forma democrática. Hoje, e mais ainda no futuro, o conhecimento forma a base da revolução silenciosa que tem tornado o mundo mais igual. Nem as guerras, nem o poder econômico que ainda se concentra nas mãos de poucos, muito menos as ditaduras impedirão o avanço do conhecimento. __ Você está, meu filho, devidamente alojado na cápsula dessa espaçonave que já decolou para um mundo melhor.

__ Fico pensando o quanto meu pai, seu avô, sofreu quando, depois de tantos anos de duro trabalho recolheu-se aposentado, pelo peso da idade, aos pequenos afazeres domésticos. Teria vivido mais 20 anos além do que viveu se pudesse, como podemos hoje, ter acesso ao mundo da Internet; pesquisar assuntos que sempre quisemos no passado e que a dura vida não nos permitia; ler as últimas notícias desse mundo cada vez mais agitado porém muito interessante; ver fotos de gente bonita; trocar e-mails com amigos; cumprir tarefas que outrora requeriam nossa presença física e mil outras coisas que esse universo de informatização e telecomunicação nos propicia.

__ Eu já mudei! Falei-lhe com tom de quem já estava por dar por encerrada uma conversa que começou despretensiosa e escambara para uma reflexão de cunho tecnológico tão saudosista quanto futurista, típica de quem, como eu, não tem mais a obrigação de marcar presença diária num worksite qualquer.

__ Só admito espanar meus livros cheios de traças e lubrificar a velha Remington Rand, anos 50, porque eles fazem parte de minha memória nostálgica, formam o meu relicário, meu baú de ossos, minhas referências contraditórias, antípoda de mim mesmo.

__ Tá bom, pai! Entendi “tudinho”. Agora, dá um "logoff" nessa sua Remington e "deleta" esses arquivos obsoletos do seu HD, isto é, da sua memória...

Fui!

Edson Pinto
11/09/08


6 de set. de 2008

46) A EXTINÇÃO DO DODÔ (set'08)


Imagine uma ave de cerca de 1 metro de altura, 16 quilos, não-voadora e que ainda fosse muitíssimo dócil! Um peruzão de bondade. Assim era o Dodô (Raphus cucullatus), espécie nativa das Ilhas Maurício, costa leste da África, onde, até o final do século XVII vivia em perfeita harmonia com os outros componentes do seu ecossistema. Nesse ponto da história torna-se vitima da própria docilidade. Presa fácil dos caçadores humanos recém chegados que lhes comia a carne e dos ratos, que vieram com os homens, e lhes comia os ovos, bobinhos que eram, foram extintos para sempre...

Por tempos, o Dodô tem sido tomado como exemplo de que a bondade sem limites de alguns seres humanos e a falta de disposição para a luta pode lhes custar a preservação. Parece contraditório que preguemos a paz, o amor, a confiança plena no semelhante, o desprendimento e principalmente a entrega incondicional a tudo e a todos quando sabemos que o mundo não se nos apresenta assim tão favorável.

O preparo para a luta e até mesmo a luta propriamente dita, quando necessária, são os reguladores da extrema “dodolização da vida”. A cada momento é preciso tomar uma decisão importante: ser forte e vencer, ou ser fraco e se extinguir. O enfrentamento não é só com os nossos semelhantes, mas, principalmente, com o inimigo interno que nos tolhe o impulso para o bom combate; com o desânimo que nos impede a realização de uma nova e importante tarefa; com a fraqueza no cara a cara altivo com a doença que sói nos incomodar, e assim por diante. A aparência de bondade não deve necessariamente significar fraqueza por lutar. Mahatma Ghandi por trás de seu angelical semblante tinha uma estratégia de luta e soube vencer.

“Si vis pacem parabellum” esta locução latina quer dizer que se buscamos a paz temos que estar preparados para a guerra. A vida é uma guerra, queiramos ou não. Passar por ela sem ter que ultrapassar obstáculos, derrotar inimigos, sofrer privações e trilhar caminhos ásperos é mero exercício de ilusão. Aos gladiadores jogados na arena dos leões só lhes fazia sentido a vitória para continuar vivendo. Assim é também a vida...

A reflexão que faz todo o sentido para o sucesso contra os males que nos açoitam a cada momento é se devemos lutar como um gladiador, "matando um leão por dia" e assim continuarmos na arena dos vencedores ou se devemos nos entregar com a candura de um Dodô e sermos extintos para sempre?


Edson Pinto
postado em 06/09/08

1 de set. de 2008

45) PINGOS NOS I's (set'08)


Tem circulado de forma insistente pela Internet uma carta atribuída a uma pessoa de origem holandesa, sem identificação do nome, que tece loas ao Brasil, ao mesmo tempo em que nos chama a atenção para a baixa estima a nos acometer quando falamos de nós mesmos.

Nada contra sermos objeto de criticas tão doces. Combate nosso complexo da gata borralheira e nos vinga com exemplos mundo afora - diga-se de passagem, muito questionáveis - para com isso mostrar que somos um povo inteligente, esperto, generoso, progressista e com tantos predicados que até nos comove. Será?

Fiquei com a impressão de que o texto é uma daquelas farsas ultranacionalistas para atender a interesse do governo de plantão, ou ainda, a lavra de um gozador ao estilo do saudoso Stanislaw Ponte Preta ou mesmo da turma do Gazeta e Planeta. Se o espírito é pobre, claro, cai nessa esparrela de capturar ingênuos.

Preferi lê-la com o meu “desconfiômetro” ligadinho. Assim, para não deixá-la prosperar impunemente, fiz uma análise de ponto a ponto de tal carta, deixando em cada um deles o meu comentário e com isso colocando os pingos nos seus devidos i’s. O início de cada item, em preto, é da autora da carta. Os comentários, em azul, são meus. Para ver se você concorda com a minha análise clique aqui para acesso ao texto.

Edson Pinto
01/9/08

30 de ago. de 2008

44) UMA ESPÉCIE DESORIENTADA (agosto'08)


A espécie humana, ou o que chamamos de Homo sapiens (o homem racional que somos hoje) surgiu na face da Terra há aproximadamente 100 mil anos. Parece ser muito tempo, mas na verdade corresponde a um ínfimo pedaço da trajetória de existência de nosso planeta de mais de 4,5 bilhões de anos.

Tomemos uma analogia para melhor compreensão do que significa nosso tempo de vida na Terra: Se a história da Terra, contada desde o momento em que a Terra foi criada, acumulasse até este momento, 24 horas, correspondendo a um dia inteiro, teríamos então: Ás 5h15 surgiram as primeiras evidências de vida nos oceanos; Às 21h30 os oceanos estavam cheios de vidas e começava a vida no solo; Às 23h apareceram os dinossauros que se extinguiram às 23h42; Às 23h59 registram-se os primeiros antepassados da espécie humana; Às 23h59m58, ou exato 1,7 segundo para 24 horas, surgiu a nossa espécie.

A nossa experiência de mundo, enquanto espécie é, portanto, de apenas 1,7 do total de 86.400 segundos que tem um dia. Nem é necessário fazer mais cálculos para mostrar o quão insignificante é a trajetória humana sobre um meio ambiente de formação tão longa. O homem, em fração minúscula de tempo, se apoderou do patrimônio terrestre e caminha para destruí-lo com a voracidade de seus 7, 10 bilhões em futuro não distante, de consumidores insaciáveis com os recursos naturais obviamente limitados da mãe Terra.

Será que estamos no caminho certo, ou seria necessário mandarmos a astronave Terra parar um pouco enquanto repensamos o nosso futuro? Quais limites seriam aceitáveis para o crescimento desenfreado da população humana e principalmente de seus padrões de consumo a exigirem cada vez mais recursos que não podem ser renovados? Claro que algumas poucas gerações ainda conseguirão usufruir das benesses da mãe natureza, mas certamente em momento não muito distante faltará água, faltarão combustíveis fósseis, faltarão alimentos e assim desaparecerá o equilíbrio saudável de nossa biosfera.

Nunca é demais lembrar que a questão do aquecimento decorrente do efeito estufa acelerador do degelo dos pólos, a destruição da camada de ozônio incumbida de nos proteger da nociva radiação solar ultravioleta, a poluição do meio ambiente degradadora da qualidade de vida e muitos outros desmandos dessa especiezinha chegada nos últimos 1,7 segundos, continua sem solução adequada. Não há como não ver a espécie humana agindo como um adolescente deslumbrado que ao ganhar mesadas generosas sai gastando de forma irresponsável sem a menor preocupação com o futuro. Assim, infelizmente, parece também agir a humanidade.

Mas nem tudo está perdido. E, simplesmente nos comportarmos de forma pessimista, mais prejudica do que ajuda. O importante é que os lideres do mundo saibam como conduzir a humanidade para o uso racional dos escassos recursos da Terra, distribuindo-os de modo equânime, evitando o desperdício e principalmente incentivando a reciclagem dos recursos não renováveis de tal modo a reduzir a exploração desenfreada das limitadas reservas naturais.

O sistema educacional tem um papel importante na formação de uma mentalidade preservacionista nos jovens de hoje, consumidores e lideres do dia de amanhã. Mas por que esperar que apenas a Escola faça a cabeça dos jovens? Os adultos poderiam muito bem começar, em casa, no escritório, na fábrica ou mesmo na comunidade em que interagem a implantar medidas de conservação dos recursos naturais. Como os governos não têm sido efetivos na implantação de programas de coleta seletiva do lixo, por exemplo, e que permite a reciclagem, por que não forçarmos da base para o topo?

Não precisamos esperar que chegue o dia em que preservar a natureza será obrigação passível de punição. Ou agimos de forma espontânea ou teremos que dar razão ao alerta das poucas e boas cabeças dessa espécie dos últimos 1,7 segundos:

"Quando a última árvore tiver caído/Quando o último rio tiver secado/Quando o último peixe for pescado/Vocês vão entender que dinheiro não se come”.
Edson Pinto
30/08/08

24 de ago. de 2008

43) ESTARIAM OS DEUSES CONTRA NÓS? (agosto'08)




Cornelius Horan, aquele ex-padre irlandês, maluco, atravessou a pista e num gesto tão inusitado quanto hilário, impediu que o nosso atleta Vanderlei Cordeiro de Lima confirmasse a sua vitória na maratona das olimpíadas da Grécia em 2004. Antes, em 2000, o grande cavaleiro Rodrigo Pessoa viu escoar por entre os seus dedos a medalha de ouro em Sidney, Austrália, quando o seu famoso cavalo Baloubet du Rouet refugou ridiculamente diante de um simples obstáculo igual a tantos que o conjunto havia superado com grande facilidade em centenas de outras competições do mesmo naipe.

Chegamos a 2008, Olimpíadas da China, e o orgulho de sermos brasileiros agora turbinado por atletas brilhantes e com precedentes de vitórias nos permite sonhar com medalhas, cerimônias de podium e a execução do “ouvirundum”, enquanto o “símbolo augusto da pátria” subisse ao alto dos ginásios de esporte para admiração de bilhões de terráqueos pregados às TVs de todo o mundo.

No entanto, judocas campeões mundo afora caem diante adversários teoricamente mais fracos. Nossos hábeis e já afamados ginastas aterrissam fora do tablado, caem de costas no último e decisivo salto, dão belas piruetas no cavalo de pau, mas chegam ajoelhados para desencanto de milhões de aflitos patriotas que atravessam madrugadas acordados pelo cândido sonho por uma medalhinha sequer.

O futebol dos estrelados e milionários marmanjos imita Baloubet du Rouet justo na frente do obstáculo mais indesejável de todos: a Argentina. E se não bastasse isso, somente algo sobrenatural para explicar o sumiço da vara de saltar da nossa promessa Fabiana Murer, que, mesmo considerando a real dificuldade de superar a russa Yelena Isinbayeva, viciada em quebra de recordes, pelo menos poderia nos trazer uma vistosa medalha de prata. Some a vara da Fabiana e com ela as nossas esperanças...

Estariam os deuses contra nós? Galvão Bueno, arauto-mor da brasilidade transbordante de otimismo dirá que não, e ainda nos responderia com uma outra pergunta: Se Deus, sabidamente, é brasileiro, como é que outros deuses de menor hierarquia se atreveriam a ser contra nós?

Lula completaria dizendo que nunca na história deste país os esportes foram tão bem sucedidos e até mesmo não se acanharia em comparar-se ao Barão de Coubertin, claro, devido ao seu idêntico e verdadeiro espírito olímpico. Nem nos causaria espanto se ainda dissesse que a meta de um eventual 3º governo seria propiciar ao menos 3 esportes por dia para cada brasileiro: um pela manhã para alimentar-nos o espírito, outro ao meio-dia para fortalecer-nos o corpo, e um à noite para aplacar-nos as paixões mais recônditas. Afinal, o horário político gratuito já começou e o povo nunca deixará de acreditar no que o presidente disser repetidamente, mesmo que não seja verdade.

Ah, mas ganhamos ouro com a equipe feminina do vôlei de quadra! César Cielo nos deu também o ouro dos 50 metros na natação e Maurren Maggi que ao pular mais de 7 metros buscou o ouro, chorou as lágrimas da atleta injustiçada e nos fez, também, chorar de emoção? As mágicas futebolistas de saia, só nos enchem de orgulho e nos presenteiam com uma brilhosa medalha de prata. Por muito pouco poderia ser a de ouro. Que pena! Essas poucas e preciosas conquistas deveriam nos levar a aceitar passivamente uma classificação além do 20º lugar no quadro de medalhas olímpicas, mesmo considerando o fato de que somos a 10ª economia mundial, caminhando rápido para o 8º lugar, a 5ª população do mundo e que temos sol em abundância, espírito esportivo, alegria transbordante e aprimorada etnia?

Estaríamos sofrendo da terrível síndrome do gafanhoto em que o medo da derrota já nos cerceia o impulso necessário para a vitória? Por outro lado, os sempre vitoriosos americanos e outros, simbolizados pela águia que demonstra força, nobreza e vivacidade prevalecem sobre a nossa timidez, esta covarde aceitação de fraqueza, baixa auto-estima e o famigerado complexo de inferioridade? Isso seria suficiente para nos privar da conquista de vitórias em maior quantidade e qualidade?

Minha observação pessoal indica que não. Não somos vitimas da síndrome do gafanhoto por sermos frágeis como o são esses insetos que podem ser pisados, embora sejam numerosos. O que me parece mais plausível é entender que o Esporte a exemplo de muitas das atividades humanas deixou também de ser um mero exercício de criatividade e recreação para assumir o status de um grande negócio. Negócio, no sentido de que pode gerar receitas fantásticas para organizadores, patrocinadores e produtores de conteúdo na mídia do entretenimento massificado. Além disso - e não é novidade - governos e nações, principalmente aqueles que mantêm grande poder econômico, descobriram há tempos o poder do uso do Esporte em favor de seus objetivos de ampliação do bem-estar social de seus povos ao mesmo tempo em que impõem ao mundo as suas supremacias.

Dito isso, só nos resta abandonar o romantismo das disputas esportivas pelo seu prazer lúdico e encararmos a necessidade de investimentos de longo prazo, tendo como base uma infância melhor assistida com cuidados de saúde e educação. A antiga expressão “Mens sana in corpore sano” parece ter recuperado nos dias de hoje a importância que nos legou a Grécia Antiga.

É claro que os deuses não estão contra nós. O que poderíamos ouvir do Galvão Bueno e de outros ufanistas inveterados é que na verdade Deus – dado à abundância de benesses generosamente a nós concedidas - como florestas verdejantes, praias encantadoras, território livre dos grandes desastres naturais, povo alegre e bonito, precisaria buscar certo equilíbrio nos dando escassas medalhas olímpicas.

Por que, já pensaram, se ainda fossemos bons de medalhas? Aí é que a garganta de nosso querido Galvão Bueno estouraria pelos incessantes gritos de seu ufano amor pelas coisas da nossa terra.

Brasil, sil, sil, sil.... E que o mundo nos aguarde em 2012! Pelo menos, uma nova medalha de ouro já está garantida: choro coletivo

Edson Pinto
24/08/08

42) A CUECA DO ABADIA (agosto'08)

Nada conseguia abalar a exuberância do seu ego. Se um amigo dissesse: “Veja esse Matisse que comprei por 2 milhões de reais”, ele logo retrucava: “Mas você não viu o Rembrandt que tenho na minha sala de jantar? Custou-me, no leilão, o dobro do seu, e em euros”, complementava para que não ficasse nenhuma dúvida sobre a sua condição superlativa. Recentemente, é bom que se diga, vinha mudando suas referências monetárias. O dólar americano perdia valor e seu ego, já de algum tempo atrelado a até então mais forte das moedas, não poderia ser arrastado ladeira abaixo. Agora só falava em euros...

Não nasceu rico, mas fez-se próspero fruto do auto-esforço. Seria de se esperar que a sua origem de homem simples se refletisse no comportamento do empresário bem sucedido de agora, boa família e vida abastada. Porém, por intrincadas artimanhas psicossociais, talvez em decorrência de tantos e velhos sofrimentos que considerava injustos; do passado de permanentes competições profissionais que reputava torpes e, ainda, de mil coisas de foro íntimo impossíveis de serem compreendidas, acabou por imaginar-se bem na máscara de todo-poderoso.

Assim agindo, tudo aquilo para o qual, no seu passado de humilhação, olhava e não conseguia alcançar, agora estava aos seus pés podendo, metaforicamente, chutar, pisar e até mesmo cuspir-lhe de soberba. A polpuda conta bancária e a habilidade de grande jogador respaldavam-lhe a empáfia. Se o destino lhe tivesse feito francês, certamente se autodenominaria o “Rei-Sol” e a expressão "L'État c'est moi" lhe cairia muitíssimo bem. Absolutista, mandava, além da conta, na mulher, nos filhos, nos empregados. E mais: no cachorro que late, no carro que sacode, no semáforo lento, na porta fechada, na demora do elevador, enfim, em tudo que ousasse a não lhe atender na forma, no momento e com a perfeição determinada pela sua frivolidade sem fim.

Aí a vida lhe impôs duro revés. Conta corrente zerada, sem mulher para servir-lhe, sem ninguém nem mais nada para mandar. Sem Rembrandt na parede, sem cachorro para chutar, sem reino, sem ombro amigo para o aconchego ou ouvidos complacentes que lhes suportassem as afrontas, resta-lhe, ainda, a vaidade mais comezinha:

__ E aí meu amigo não vai ao novo leilão de artes? Há de tudo, de Rembrandt a Brecheret.

__ Não, hoje não! Voltei do outro leilão onde arrematei, em euros, a cueca do Abadia...

Edson Pinto
22/08/08