25 de jul. de 2014

270) FUTEBOL, EMOÇÕES E SENTIMENTOS

Talvez não devesse insistir em continuar falando da Copa do Mundo recentemente encerrada. Pode parecer algo como a deselegante inconveniência de se ficar cutucando a ferida quando o melhor seria deixar que ela se cicatrizasse com o tempo. Sim! O Brasil deu o que podia dar nessa Copa. O atestado definitivo da sua capacidade (ou seria incapacidade) foi emitido simbólica e formalmente no grande evento do último dia 8 de julho lá no Mineirão com o histórico 7 a 1. Ganhou até epíteto: Mineirazo.

Felizmente, joga a nosso favor a grande contribuição que só o passar do tempo é capaz de dar aos derrotados, ou seja, o esquecimento, mesmo que não total e absoluto, mas pelo menos amenizador. No entanto - por ora - não dá para apagar da memória um questionamento que se faz ainda presente e de forma azucrinante a todos nós brasileiros: Por que nossos meninos demonstraram, especialmente naquela partida contra o Chile, nas oitavas de finais, em 28 de junho e também no Mineirão, tamanho descontrole emocional? Teria sido aquilo uma vantagem ou uma desvantagem perante os desafios daquele momento em particular? Em que extensão aquele show de emoções nos ajudou ou prejudicou tanto naquela partida como nas que a ela se sucederam?

Transcorridos alguns poucos dias dos fatos e vendo agora o desfecho do famigerado oito de julho, com direito a repeteco em 12 de julho com o 3 x 0 da Holanda, isso até pode nos sugerir que aquelas manifestações de emoções exacerbadas registradas no jogo contra o Chile já seriam o prenúncio de que algo bem pior estava por acontecer. As emoções dos nossos jogadores estavam em seu ponto extremo. Enquanto nossos meninos choravam convulsivamente e tremiam, os jogadores de outros países em jogos diversos - com raras exceções, é claro - pareciam administrar seu emocional com a devida parcimônia. Os alemães, por exemplo, vinham se comportando como seres robóticos desprovidos de alma e com pleno domínio da razão. Mas, afinal, o esporte, futebol em especifico, é emoção ou razão?

Fui checar isto com mais cuidado e descobri que existe um campo da Psicologia que se dedica ao estudo, e por consequência ao entendimento, dos propósitos pelos quais as emoções existem e como elas nos ajudam a sobreviver ou até mesmo a nos desenvolver. Este mesmo campo de estudo da psicologia dedica igual atenção a outro processo a que conhecemos como “sentimentos”. Emoções e sentimentos são processos inconscientes, isto é, surgem fora do controle da nossa razão, porém cada qual tem suas peculiaridades.

No seu livro seminal “As leis da emoção” o psicólogo holandês, Henri Frijda, demonstra as regras que regem as emoções: Para ele - e é fácil aceitar esse argumento - as emoções se situam na encruzilhada de nossa carga biológica com a nossa capacidade cognitiva, ou seja, a consciência. Várias emoções que são fundamentais à preservação da vida nós as herdamos pela via biológica, como, por exemplo, o medo. São forças produzidas espontânea e inconscientemente para nos preparar para enfrentar determinados perigos imediatos. Induz-nos a agir com eficiência e de forma concentrada para defender, atacar e a fugir do perigo. As emoções, portanto, fogem completamente de nosso controle consciente. Curiosamente, elas podem ser facilmente lidas pelas outras pessoas pelo simples observar das expressões físicas que produzimos: um semblante de pavor, uma risada, um arrepio, um grito e até mesmo um choro ameno ou convulsivo, por exemplo.

Quando, contudo, o nosso consciente consegue interpretar essas emoções, passamos a produzir o que se chama de “sentimentos”. Estes já deixam de ser meramente biológicos e passamos a controlá-los de forma consciente. Assim, com base nos sentimentos, podemos tomar decisões importantes. Uma vez que os sentimentos são submetidos ao controle da consciência, isto é, da razão, podemos deliberadamente camuflá-los e - ao contrário do que ocorre com as emoções - impedir que os outros os leiam com base no nosso comportamento ou mesmo expressões físicas como ocorre com as emoções e disso tirem proveito tático e estratégico. Não devemos esquecer que um jogo de futebol é como uma guerra. O inimigo está sempre à espreita para captar os nossos pontos fracos...

Podemos aceitar que o que realmente vale não é tanto a carga de emoções biologicamente produzida, mas sim a forma como nós, racionalmente, as transformamos em sentimentos. Estes, bem administrados, podem nos ser mais úteis do que as emoções em seu estado puro. Quem disse que os alemães, aparentemente frios e autocontrolados, não se encontravam também submetidos às mesmas intensas emoções como aquelas dos nossos meninos? Claro que estavam. Isto foi demonstrado nitidamente depois de se sagrarem tetracampeões mundiais, quando extravasaram toda a alegria e abriram os corações ao declarar amor ao futebol, à família, à sua pátria e até mesmo ao Brasil. Faltou-nos, portanto saber como canalizar nossas “emoções brutas” em “sentimentos úteis” e assim não ter deixado que os adversários tivessem lido nas faces de muitos de nossos ainda impúberes garotos o temor que os dominava naquelas batalhas.

Como se muda isto?

Só há uma resposta: amadurecimento. Só o tempo e as experiências, principalmente as negativas, podem propiciar esse aprendizado ao ser humano. Culpa parcial dos dirigentes que preferiram abrir mão de alguns craques com mais experiência de vida, talvez não em tão boa forma física como os meninos quase adolescentes, mas com a alma calejada e já tendo desenvolvido suficientemente a capacidade de transformar emoções em sentimentos produtivos.

Vivendo e aprendendo!

Edson Pinto

Julho’2014 

2 comentários:

Blog do Edson Pinto disse...

De: Edson Pinto
Para: Amigos

Caros amigos (as):

Duas leis comportamentais são atribuídas a Murphy:

“Nada é tão ruim que não possa piorar” e

“Na guerra, o inimigo ataca em duas ocasiões: quando ele está preparado e quando você não está”.

Ambas retratam a situação do futebol brasileiro do pós-oito de julho de 2014, a data do 7 x 1 histórico.

A primeira tem tudo a ver com a solução, agora adotada para salvar a paixão nacional, via o exercício paleontológico de desenterramento do já fossilizado Dunga. Esse mesmo que faz do mau-humor a sua marca registrada. Torço para que dê certo, porém - já estando na 6ª década de vida - afirmo nunca ter visto exemplos concretos de mudanças reais de temperamentos. Será que poderemos vislumbrar, neste caso, um milagre?

A segunda é a que me levou a refletir sobre o estado emocional dos nossos pupilos. A crônica desta semana, FUTEBOL, EMOÇOES E SENTIMENTOS visa a buscar em outra área do conhecimento humano, a Psicologia, um entendimento ligeiramente mais aprofundado sobre o que aconteceu com os nossos jovens craques na Copa do Mundo recém-concluída.

Bom final de semana a todos!

Edson Pinto

Blog do Edson Pinto disse...

De: Luiz Ragatieri
Para: Edson Pinto


Olá Edson,

Você é formidável...........
Os textos são todos muito prazerosos de ler, esse sobre os meninos da Seleção então..........você acertou na mosca.
Parabéns,
Abraço,
Luiz Regatieri