4 de jun. de 2011

168) AVENTURAS DE AURELIANO, O BURRINHO - I


Aureliano mal passava de um metro e cinquenta. Respondia com bom humor por apelidos que retratavam muito de sua personalidade e gostos pessoais. No escritório da Construtora onde trabalhava como Escriturário podia ser chamado de Baixinho, por razões óbvias, por Sentado, pois visto a certa distância no meio do escritório, mesmo de pé, dava a impressão de estar tranquilamente acomodado em uma cadeira, por Possuído ou por Água devido ao seu apego ao mais famoso néctar da cana-de-açúcar popularmente chamado de cachaça, ou mesmo por Burrinho, pois era um pau pra toda obra, verdadeiro burro de carga.

Para efeito desta história que será contada em alguns capítulos vamos tratá-lo doravante apenas de Burrinho. Aliás, embora nunca reclamando dos outros apelidos, era esse que parecia lhe dar mais alegria. A propósito, esta história é dos tempos em que a palavra “bullying” e o conceito de assédio moral, hoje tão em voga, não passava de estranhas teorias psicológicas ainda não assentadas na cultura vigente, mesmo porque - se fosse - não se aplicaria ao caso de Aureliano, pois ele não só compactuava com a zombaria como sentia verdadeiro prazer em estimulá-la. Por isso, Aureliano era uma figura diferente, especial.

Baixinho de chamar a atenção, fazia cara de sério, mas era alegre como se nunca tivesse problema na vida, amigo de todos, voluntarioso e verdadeiro "puxa-saco" dos patrões. Fazia pequenos trabalhos burocráticos no arquivo, no envio das correspondências, no copiador de faturas, operava como ninguém uma calculadora daquelas de fita para conferência dos saldos do Contas a Receber, do Contas a Pagar, dos impostos, tudo. Ao mesmo tempo, voluntariamente, se colocava como motoristas dos engenheiros quando tal se fizesse necessário. Ia aos Correios para expedir uma correspondência ou passar um telegrama de última hora. Corria aos bancos para quaisquer tarefas tantas vezes quantas fossem necessárias, sem nunca reclamar, alegre, espirituoso e ligeiro.

Faltou a faxineira? Burrinho se despia de sua pose de escriturário e cuidava da retirada do lixo, da limpeza dos banheiros e fazia o café que, alegremente, servia a cada um dos chefes do escritório. A máquina de escrever quebrou? Burrinho dava um jeito e tudo voltava a funcionar. Quem devia chegar cedo para abrir o escritório, ou ser o último a sair para apagar as luzes conferir se os equipamentos foram desligados das tomadas, as janelas bem fechadas e as torneiras bem ajustadas? Claro, era o Burrinho...

Ao mesmo tempo em que se prestava para tudo, incondicionalmente, era amado por todos. Nem seu hábito de traçar, com freqüência mais do que a normal, umas canjebrinas semanais não lhe tirava o santo halo de figura multiuso, verdadeiro super-homem do escritório. Além disso, alimentava umas ilusões típicas de classe média, embora estivesse disso bem distante. Era um trabalhador de recursos escassos como a casinha que construíra ao longo de anos e anos. Lá vivia feliz com Ubaldina e seus dois filhos. Queria apenas ser reconhecido pela sua eficiência e no fundo, embora nunca tenha dito, queria ser amado por todos. E isto, de fato, era.

Dada esta apresentação de Aureliano, o Burrinho, a história verdadeira desse cidadão comum, terá prosseguimento em capítulos futuros. Hei de lhes contar de como Burrinho se impôs com o visitante colocando-se na ponta dos pés para demonstrar-se mais alto. Contarei também como, na ausência do Engenheiro Chefe, ele resolveu sentar-se a sua mesa e atender a ligação de um importante cliente de São Paulo passando a impressão de que tinha um cargo elevado na empresa e o que disso resultou...

Contarei, ainda, como Aureliano, o Burrinho, vendeu a sua casa só para ter dinheiro na Poupança e com isto ser respeitado pelo gerente do banco que até então o desdenhava. Há, entre outras, o que também contar sobre sua interferência nas festas da empresa sempre preocupado em economizar ao máximo para o bem financeiro de seus patrões. Aureliano, o Burrinho, fazia tudo ao seu peculiar modo de ser, e isso merece ser contado...

Aguardem os próximos capítulos!

Edson Pinto
Junho’2011

Um comentário:

Blog do Edson Pinto disse...

De: Edson Pinto
Para: Amigos


Caros amigos:

Acho que, por essas coisas de origem, gosto muito de ouvir “causos mineiros”, embora para passar-lhes à frente prefiro fazê-lo da forma que me sinto mais confortável que é escrevendo.

Vou lhes contar, a partir desta semana, alguns casos do falecido Aureliano, lá de “Belzonte”, repassados a mim por minha cunhada Junia que conviveu proximamente com a fantástica figurinha no escritório em que juntos trabalhavam.

Bom final de semana a todos!

Edson Pinto

ET:
Se não acharem graça no meu caso, fiquem com este que é verdadeiramente um “causo mineiro”:

INDO PARA A PESCARIA...
Us dois minero si incontra nu pondi ônibus pruma pescaria.
- Intão cumpade, tá animado? pergunta o primero.
- Eu tô, home!
- Ô cumpade, pro mode quê cê tá levano esses dois emborná?
- É que tô levano uma pingazinha, cumpade.
- Pinga, cumpade? Nóis num tinha acertado qui num ia bebê mais?
- Cumpade, é qui pode aparece uma cobra e picá a genti. Aí nóis disinfeta cum a pinga e toma uns goli qui é pra mode num sinti a dô.
- É... e na otra sacola, o que qui cê tá levano?
- É a cobra, cumpadi. Podi num tê lá...