Em 2006, com a nobre intenção de comemorar o centenário do primeiro vôo do 14 Bis de Santos Dumont, o erário público desembolsou 10 milhões de dólares para que o tenente-coronel Marcos Pontes da Força Aérea Brasileira pegasse uma carona na nave espacial russa Soyuz que em cooperação com a NASA opera a estação espacial, ISS. Ficou dez dias no espaço em companhia de astronautas de outros países. Entremeado por abundantes tchauzinhos siderais e sorrisos cósmicos cumpriu umas oito tarefas de pequena expressão científica entre elas o plantio de um pezinho de feijão tal qual fazem as crianças ainda na pré-escola.
Ao final de março próximo serão passados seis anos desde que autoridades constituídas se ufanaram com o evento mesmo com resultado zero para o País. Para Marcos Pontes, porém, tudo se mostrou diferente. Foi imediatamente reformado mantendo os soldos, é óbvio, e desandou a dar palestras motivacionais, dar entrevistas e tornar-se figurinha manjada em programas televisivos. É forçoso reconhecer que a figura tem simpatia e habilidade para esta nova missão. Não a espacial, é claro, mas a mental que tem o poder de levar as pessoas crédulas ao consumo. Aposto que até a sua empresa estaria disposta a pagar R$ 15 mil para ouvi-lo desenvolver o tema “Sua empresa é sua espaçonave” ou “Sou membro da tripulação e a importância do trabalho em equipe”. Pagaria ainda, você, R$50,00 por um travesseiro NASA do astronauta Marcos Pontes. Comovente!
Mas a Soyuz levou Marcos Pontes mais alto ainda, pelo menos no que diz respeito aos seus objetivos pessoais. Não é que minha esposa motivada pela esperta propaganda do travesseiro NASA com a chancela do primeiro astronauta brasileiro se viu convencida de que aquele pedaço de espuma sintética com sua foto em macacão espacial deveria ser realmente fruto de uma daquelas oito experiências que ele fez no espaço? Pimba! Mais um travesseiro indeformável, hipoalergênico de maciez irresistível acaba de ser vendido. E - que todos saibam - lá prá casa.
Por essa mania de quem já se escaldou muitas vezes, fico com medo até mesmo de água fria. Por isso, decidi ler atentamente a embalagem do produto. O astronáutico sorriso de Marcos Pontes encimando um fardamento adequado para as jornadas cósmicas com direito a símbolo da NASA e bandeirinha do Brasil no braço ocupa mais da metade do grande folheto. Em letras garrafais sugere que o “viscoelástico” provém da pesquisa espacial indo diretamente para o nosso dia a dia. Era tudo o que qualquer ser humano moderno gostaria de desfrutar! Só no rodapé e em letras que, de tão pequenas é quase impossível ler, está a grande verdade: NASA que como todos nós sabemos significa “National Aeronautics and Space Administration” para este produto revolucionário significa “Nobre e Autêntico Suporte Anatômico”. Portanto, não é a NASA que pensávamos e sim a NASA que a esperteza inata tupiniquim achou por bem adaptar para que fossemos todos enganados.
Neste mundo, e mais especificamente neste País, em que enganar passou a ser um de nossos traços culturais mais importantes, até que o astronauta brasileiro não inovou extraordinariamente. Votamos no político que mais nos engana com falsas promessas; compramos a gasolina que nos é oferecida pelo menor preço, porém de duvidosa qualidade; atravessamos o semáforo vermelho para chegar mais rápido; falamos que o trânsito estava péssimo para justificar nosso atraso quando na verdade, por preguiça ou mau planejamento, perdemos o horário; dizemos que amamos para camuflar o ódio que toma conta de nossas almas e, hipocritamente, falamos em solidariedade enquanto fechamos os olhos às injustiças que nos rodeiam. Por que, então, só Marcos Pontes haveria de ser ético e sincero?
O travesseiro já entrou em uso aqui em casa e, pelo menos, até agora, não se mostrou nem tão ruim nem nada de extraordinário. Diria, é um travesseiro trivial que dispensaria pesquisas espaciais para nos fazer dormir bem. A única coisa que nos suscita como dúvida é se o astronauta consegue colocar a cabeça no seu próprio travesseiro da NASA e dormir com a consciência tranqüila.
Será isso, ou nada disso?
Edson Pinto
Janeiro’ 2012
Um comentário:
De: Edson Pinto
Para: Amigos
Caros amigos:
Como chove neste início de ano por estas bandas paulistas!
A chuva, quando excessiva, causa estragos e dor.
Mansinha, inspira os poetas.
Gotejando, então, ao pé da janela, acalma a alma e abençoa o sono, principalmente se a consciência estiver tranqüila e o travesseiro for bom...
Exatamente por pensar neste último quesito é que escrevi o texto desta semana NASA OU NADA DISSO.
Abraço a todos!
Edson Pinto
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