4 de jun. de 2009

82) O ATENEU DOS MALANDROS

A personalidade controvertida do escritor Raul Pompéia, considerado um dos principais nomes do Realismo literário brasileiro, levou a sua própria vida a extremos inusitados:

Primeiro, devido a uma rixa intelectual com Olavo Bilac, desafia-o a um duelo armado. Isso decorre no bojo da escalada de ofensas pessoais entre ambos quando o grande poeta torna publico o fato de que Raul Pompéia tinha como hábito se “masturbar às altas horas da noite, numa cama fresca e à meia-luz da lamparina mortiça, enquanto recordava amoroso e sensual, todas as beldades que vira durante o dia”.

Que maldade!

O duelo só não se consumou porque o árbitro da luta em eficiente mediação consegue que ambos os desafetos desistam, na hora H, de tamanha insanidade. Trocam um aperto de mãos e dão o episódio por encerrado.

Não muito tempo depois, aos 32 anos, no Natal de 1895, o irrequieto escritor suicida-se, deixando uma obra literária importante com tonalidades que o aproximava do estilo impressionista. É de Raul Pompéia a obra “O Ateneu” que todo amante da língua portuguesa deveria ler. A propósito, ateneu é o local público onde na Grécia antiga lia-se obras literárias. Pode significar também academia ou local de ensino. No caso deste romance, refere-se ao nome do colégio que o personagem freqüenta no Rio de Janeiro de fins do século XIX.

Quero pegar desse episódio apenas a face irrequieta e defensiva do escritor para relacioná-la com figuras muito comuns nos dias de hoje. Aliás, personalidades com sensibilidade extremada como as de Raul Pompéia inundam o nosso cotidiano. Masturbam-se ou não, isso não me interessa. Interessa, sim, constatar que bravateiros ferozes continuam desafiando com absoluta desenvoltura a todos aqueles que lhes apontam comportamentos escusos.

A governadora do Rio Grande do Sul, estado de rica história e de enorme peso no cenário nacional, Yeda Crusius, ao ser confrontada com uma séria e bem documentada acusação de que lançara mão de doações de campanha para benefício pessoal, resolve contra-atacar na mais típica forma de duelo: Desafio a provarem o que estão falando! Processarei quem me acusa! Nunca fiz nada de errado e coisas do gênero...

Marcelo Cavalcante, seu ex-assessor que misteriosamente morreu nas águas do Paranoá, em Brasília, e que seria o pivô das acusações, é, por razões óbvias, carta fora do baralho. Os interesses partidários locais conduzem à manutenção da governadora até o final de seu mandato independente da apuração da verdade sobre o caso. Usou dinheiro da campanha? Comprou uma casa com tal dinheiro? Isto tudo não tem a menor importância para aqueles que só pensam em defender o seu próprio interesse. Esse caso nos cheira a Celso Daniel e a outros que o tapete da pátria amada ultimamente tem escondido com tanta freqüência e naturalidade.

O duelo de Raul Pompéia não chegou a acontecer, embora a figura irrequieta do polêmico escritor o tenha levado ao extremo ato de tirar a própria vida. Mas, convenhamos, isso ocorreu nos tempos em que masturbar-se à meia-luz de uma “veilleuse” mortiça era coisa muito séria...

Edson Pinto
Junho’ 2009

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