5 de jun. de 2010

123) DURO NA PARADA


Felipão estava indignado com as notícias que a TV não parava de repercutir sobre a parada gay que aconteceria no final de semana. A Avenida Paulista com seus mais de dois quilômetros ficaria totalmente lotada por nada menos que três milhões de pessoas adeptas do movimento.

Foi doloroso para Felipão verificar no dia seguinte que o número de participantes da parada até superara as previsões iniciais. Um mar de frescor movimentou-se pela Avenida Paulista, desceu a Consolação, aboletou-se na Praça Roosevelt e se espalhou pela cidade de São Paulo como a água furiosa da represa de Cocal rompida lá no Piauí no ano passado, lembra-se?

Felipão se sentiu como um dos últimos homens sobre a face da terra, até que, tomado de sua convicta masculinidade, resolve contra-atacar, à altura: Forma, então, o movimento que denominou de “Parada do Orgulho Hétero”. O movimento visava à reunião de um número extremamente maior de “espadas” para demonstrar ao mundo que nem todos tinham debandado para o outro lado.

Mobilizou arduamente todas as suas forças e recursos para a grande parada que aconteceria no mesmo local, isto é, partindo da Av. Paulista, descendo a Consolação e, como imaginava, apoteoticamente transbordaria para toda a cidade. Não como a represa rompida do Piauí, mas como um tsunami que avançaria bairro a bairro a dizer: “Ei minha gente, nós somos mais numerosos e ainda mantemos o controle da situação!”

Na data e horário amplamente divulgados pela mídia, ao chegar na Av. Paulista, encontro meia dúzia de héteros aos quais me junto para tentar erguer o moral abatido de Felipão. Fomos em frente. Atravessamos a deserta Avenida, descemos a Consolação sem encontrar uma alma viva sequer e chegamos à Praça Roosevelt que se encontrava entregue a dois ou três cães vadios que reviravam uma lata de lixo.

Felipão pronuncia seu discurso magno. Reconhece a derrota e, ato contínuo, dá por encerrada a sua malograda marcha. Entre emocionado e desiludido aperta a mão de cada um de seus apoiadores e baixa à bandeira. Compadeço-me com ele e olho, minuciosamente, os rostos de cada um dos poucos que ali compareceram.

Desculpe-me, mas não me lembro de ter visto você. Será que já se tornou simpatizante da outra banda? Ah, já sei o que vai me responder engrossando a voz, é claro: “Não preciso disto para provar que sou “espada” ou, “priorizei assistir aos jogos da Copa do Mundo”... ah, ah, ah...


Edson Pinto
Junho’09

Um comentário:

Blog do Edson Pinto disse...

De: Edson Pinto
Para: Amigos

Caros amigos:

A Antropologia Cultural se ocupa da descrição e análise do ser humano quanto aos grupos em que se divide. Definição um tanto científica e formal, confesso, porém necessária para o bom entendimento de que nós nos dividimos, social e culturalmente falando, em grupos.

Agora, por exemplo, vivemos o momento em que nos dividimos entre os apreciadores do autêntico esporte bretão e os indiferentes à estética e emoções provocadas pelo mais famoso de todos os eventos quadrienais que se têm notícias, a Copa do Mundo. Existe, ainda, outro grupo que nesta mesma época do ano, ruidosa e alegremente, acha de se manifestar em grande estilo...

Antropologicamente maledicente como me encontro, resolvi com o texto desta semana, DURO NA PARADA, brincar um pouco com meus amigos e leitores homens. Não me levem a sério, é só uma brincadeira, coisa de quem já se prepara para comer pipoca enquanto assiste à Copa do Mundo na TV.

Bom final de semana a todos e que tenhamos um bom começo de Copa!

Edson Pinto