12 de mar. de 2011

156) EM SE PLANTANDO, TUDO DÁ.

"As águas são muitas; infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo; por causa das águas que tem!"

Desta forma, Pero Vaz de Caminha, em 1º de maio do ano de 1500, uma sexta-feira, dirigiu-se por escrito ao Rei Dom Manuel enaltecendo uma das muitas maravilhas da Ilha de Vera Cruz, há pouco descoberta pela armada de Cabral.

Ninguém ao longo dos quase 511 anos de história do Brasil conseguiu desmentir o escrivão que, a mercê do Rei de Portugal, dava em minudências poéticas as belezas do reino então ampliado. As terras eram e continuam sendo férteis. Somos o celeiro do mundo. Temos terras boas em abundância e considerável parte da água doce do planeta. Em se plantando tudo dá. E dá mesmo...

Mas dá também muito mais do que soja, milho, cana, café e outros frutos da terra. Dá qualquer coisa entre este céu azul de anil que Deus pôs sobre nossas cabeças e o solo verde da terra amada em que pisamos. Nessa estreita faixa atmosférica dá de tudo o que nossa imaginação for capaz de conceber:

Dá gente séria, trabalhadora e patriota, mas dá também políticos que vendem votos, garimpam propinas e roubam o erário. Dá bons empresários que geram empregos e colocam no mercado produtos honestos, mas dá também espertalhões que enganam o consumidor com falsas soluções para os problemas de sempre.

Dá a faxineira Ana Rute Bento, de Lages, Santa Catarina, marido desempregado e dois filhos pequenos que, encontrando R$315,00 no lixo da Universidade em que trabalha, ao contrário de ficar com o valor procurou até encontrar a pessoa que o havia perdido e o devolveu. Mas, dá também a mulher que mata a filha de 6 anos do amante em vingança por que ele não cumpriu a promessa de dar-lhe certa quantia em dinheiro.

Dá pessoas que têm consciência de seus direitos e lutam para fazê-los respeitados, mas dá outras que se acomodam com a realidade adversa preferindo meter a cara na TV para mais um BBB insensato enquanto espera que outros façam por elas o que não tiveram coragem nem fibra para fazer.

Dá gente que leva a sério a importância do voto e reflete na escolha do seu representante na estrutura política do País, mas dá gente que tem a disposição e a estupidez de ir até a urna e depositar o seu precioso voto no candidato analfabeto, ou no candidato sabidamente corrupto, ou no candidato notoriamente preguiçoso e espertalhão.

Pero Vaz de Caminha não podia ver isso quando se desmanchou de amor pela nova terra, pois, os puros nativos que encontrou, sequer necessidade de cobrir suas partes intimas sentiam. Eram felizes pelo que a natureza lhes dera; não tinham as doenças que os brancos trouxeram; nem as ambições materiais que a dita civilização tanto prezava; nem o ódio entre semelhantes; nem o ciúme, a traição, a ganância e o desejo desenfreado pelo poder.

E Caminha, de grande escrivão das coisas belas da natureza de nosso futuro País, começou contribuindo para que nesta terra graciosa e fértil, já pudesse desde o início florescer os frutos malsãos da política, do compadrio e do nepotismo:

“E, pois que, Senhor, é certo que tanto neste cargo que levo como em outra qualquer coisa que de Vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro, o que d'Ela receberei em muita mercê.”

Edson Pinto
Março de 2011

Um comentário:

Blog do Edson Pinto disse...

De: Edson
Para: Amigos

Caros amigos:

Toda vez que ocorre uma catástrofe no mundo somos levados àquele sentimento de alívio porque tais coisas, por mero beneplácito da natureza, não acontecem por aqui. Até mesmo as tragédias das chuvas, como as mais recentes nas serras fluminenses, são mitigadas pelo nosso orgulho pátrio sob a alegação de que para evitá-las bastaria que nos preveníssemos, isto é, depende só de nós. Um terremoto, um tsunami e coisas do gênero, contudo, são desafios invencíveis até mesmo para povos ricos e previdentes.

Nesta semana liguei esses fatos e refleti sobre a maravilha da terra descoberta por Cabral. EM SE PLANTANDO, TUDO DÁ é o tema da minha crônica.

Bom fim de semana a todos!

Edson Pinto