28 de nov. de 2008

60 ) SAGRAMATHA OU CHOMOLUNGMA

Por muito tempo, no passado, foi tomada como certeza a existência de uma estrela a qual se dava o nome de Hesperus, ou Estrela da Tarde. Tomava-se também, por povos de outra longitude, como certa, a existência de outra, Phosphorus, ou Estrela da Manhã. Com o passar do tempo, aquilo que pareciam ser dois astros distintos na verdade era um só, o planeta que hoje conhecemos como Vênus.

Quase que pela mesma lógica, o pico Everest, mais alta montanha do mundo na cordilheira do Himalaia, é considerado pelos nepaleses como Sagramatha (rosto do céu), mas para os tibetanos, que a vêem do norte, como Chomolungma (mãe do universo). Como as propriedades físicas são as mesmas, é perda de tempo discutir se são duas ou uma única montanha. É a mesma coisa e pronto...

Desde que o filósofo alemão Leibniz propugnou que objetos idênticos deveriam compartilhar as mesmas propriedades, fica difícil imaginar como a simultaneidade de visões díspares aplicadas a um mesmo tema poderia subsistir a um rigoroso teste de sua validação. Aplica-se à identificação de uma estrela, de uma montanha e até mesmo para a visão objetiva das variadas facetas do mundo em que vivemos.

Nessa linha de raciocínio, a crise mundial que toma a forma do grande leviatã bíblico, devorador imaginário dos navegadores de antigamente, não poderia, ao mesmo tempo, apresentar-se como um tsunami de proporções catastróficas para alguns e uma “marolinha” para outros como nos quis fantasiar o presidente Lula. Dissimula o presidente ou, como disse FHC, brinca de Polyana ao esconder dos brasileiros a dimensão real da crise.

E, por que tsunami e marolinha devem ser a mesma coisa como o são Hesperus e Phosphorus ou Sagramatha e Chomolungma?

É porque ambas as metáforas, tsunami e marolinha, compartilham de forma “sui generis” as mesmas propriedades. Então, devem obrigatoriamente ser a mesma coisa e nunca coisas diferentes. Com o entrelaçamento das atividades humanas, quer no comércio, na cultura, na política e em tantas outras facetas impostas pela globalização de tudo, não é possível imaginar que o mesmo fenômeno leve a conseqüências diferentes dependendo do alvo. Ao cabo da confirmação da crise isso será, infelizmente, um tsunami para todos ou, se formos felizes, uma “marolinha” também para todos, mas nunca uma coisa para uns e outra para outros.

Dá até para entender que o presidente Lula queira amenizar o sofrimento dos brasileiros usando a velha estratégia de comunicação gradual do problema na base do “o gatinho subiu no telhado”. O que não pode, pois isso nos faria mais mal do que bem, é ficarmos fazendo castelinho de areia na praia imaginando como única ameaça uma “marolinha” e aí sermos surpreendidos por um tenebroso tsunami.

No fundo, tanto faz que o nome do Everest seja Sagramatha ou Chomolungma, desde que seja o mesmo. O que nos deveria interessar é a manutenção da consciência de que nossos sentidos não sejam iludidos por distorcidas versões de falsos oráculos.

Edson Pinto
Novembro’08

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